Dia dos mortos, 2 de novembro
Cartaz gentilmente elaborado por João Carlos Silva Cardoso. |
Origem histórica
da data
No dia
2 de novembro comemora-se o Dia de Finados. Essa data tem uma origem católica
que recua no tempo até o século II, quando os cristãos primitivos rezavam pelos
mortos; no século V a Igreja solicitava que um dia do ano fosse dedicado
àqueles que não era possível identificar. Essa prática atravessou os séculos e,
no século XIII, definiu-se o dia 2 de novembro para essa homenagem, logo após o
Dia de Todos os Santos, que é em 1° de novembro.
A bem
da verdade, as orações cristãs no dia 2 de novembro não consistiam em
"homenagens", mas em intercessões em favor das "almas" dos
mortos. Essas intercessões, claro está, eram bem intencionadas mas eram, ao
mesmo tempo, mais ou menos inúteis, considerando as doutrinas da predestinação
e onisciência divina. O culto católico aos santos, existente desde o início do
cristianismo, assim como o culto à Virgem Maria, que surgiu ao longo da Idade
Média, são duas formas de contornar a impossibilidade prévia de remissão das
almas dos mortos.
Concepção
positiva do dia dos mortos
A
Sociologia e a Moral Positiva indicam que, apesar de as "almas" como
emanações etéreas não existam, o respeito aos mortos é um ato profundamente
sociológico e altruísta. É sociológico porque as sociedades que existem
atualmente devem sua existência, seus valores, seus recursos tecnológicos e
materiais, suas idéias a todos aqueles que vieram antes. Aliás, essa é uma
outra forma de dizer que o ser humano é um ser histórico.
Por
outro lado, a homenagem aos antepassados e, de modo mais amplo, a todos os seres
humanos convergentes que nos antecederam é uma forma de reconhecimento de
nossas enormes e crescentes dívidas para com eles; é uma forma de estimularmos
a veneração e a humildade, de reconhecermos nossa fraqueza atual face ao
conjunto do passado. Em suma, essa homenagem é um poderoso instrumento de
desenvolvimento do altruísmo e de compressão do egoísmo.
Assim,
embora as motivações teológicas de respeito aos mortos sejam pura e
simplesmente equivocadas, o fato é que o ato em si de homenagear é correto e
salutar. O duplo aspecto da homenagem aos mortos – sociológico e moral – foi
resumido pelo profundo gênio de Augusto Comte na seguinte máxima:
Os
vivos são sempre e cada vez mais, necessariamente, governados pelos mortos.
Essa frase, não por acaso, está no portão da Igreja Positivista do Brasil, conforme pode-se ver na imagem abaixo.
Fonte: http://filosofiasocialepositivismo.blogspot.com.br/2015/11/dia-dos-mortos-2-de-novembro-cartaz.html. |
Governo subjetivo dos mortos, não objetivo
Não se
deve encarar essa máxima como sendo "macabra". Algo é macabro quando
faz o elogio da morte e do morrer, em detrimento da vida: como vimos, a frase
de Augusto Comte celebra justamente a vida. Da mesma forma, convém ressaltar: o
"governo" que os mortos realizam sobre os vivos é um governo subjetivo, não objetivo: isso quer dizer "apenas" que a sociedade de
hoje é o resultado da ação das dezenas, centenas, milhares de gerações que nos
precederam e que, nesse sentido, somos hoje o resultado da ação dos que vieram
antes de nós[1]. Dessa
forma, concretamente, o que ocorre é que, com base nos materiais morais,
tecnológicos, teóricos provenientes do passado (legados pelos mortos), os vivos
dão continuidade à vida coletiva e individual e governam seus assuntos.
Dia dos Mortos
no Positivismo
Nos dois
calendários positivistas, de caráter sociológico – o calendário abstrato e o
calendário concreto –, o último dia do ano é dedicado à comemoração geral dos
mortos, de acordo com os parâmetros indicados acima. No calendário
júlio-gregoriano, esse dia corresponde a 31 de dezembro e, nos anos bissextos,
a 30 de dezembro.
Dia de Finados
como proposta positivista
Como
vimos, há uma coincidência parcial entre o Dia de Finados católico e o Dia
Geral dos Mortos positivista. No caso brasileiro, como no final do século XIX a
maioria da população brasileira era católica, a Igreja Positivista do Brasil resolveu
aproveitar essa coincidência e buscar a positivização de um hábito já difundido
na população: por esse motivo, propôs que o dia 2 de novembro fosse feriado
nacional, de caráter cívico.
[1] A concepção objetiva do
governo dos mortos é a apresentada pelas várias teologias, segundo as quais os
mortos não estariam de fato mortos, mas estariam vivos em um outro "plano",
"além" deste em que vivemos. Claro que essa concepção, apesar de
pretender-se objetiva, baseia-se apenas na mais pura crença subjetiva; além
disso, não apresenta prova nenhuma de que ocorre; por fim, em última análise,
nos dias atuais, é uma forma de consagrar a irresponsabilidade individual e
coletiva, ao atribuir ao "além" a condução efetiva dos assuntos
humanos.