Extrato da correspondência Comte-Clotilde
(Prédica de 16.Carlos Magno.170/2.7.2024)
1. Exortações
1.1. Sejamos
altruístas!
1.1.1. “30 atos
de bondade” (Sociedade do Bem, Portugal – https://sociedadedobem.org/2016/02/25/30-atos-de-bondade/)
1.2. Façamos
orações!
1.3. Façamos
trocas:
1.3.1. Pensamentos,
idéias, sentimentos: conversemos!
1.3.2. Façam o
Pix da Positividade!
2. Efemérides
2.1. Dia
19 de Carlos Magno (5.7): transformação de Richard Congreve (1899)
2.2. Dia
4 de Carlos Magno (21.6), dia de Santo Henrique: nascimento de Kasparas Leona,
filho da nossa amiga, a antropóloga Vaida Norvilaite
3. Indicação
de livro:
3.1. Gestos de bondade, de Maladee McCarthy
4. Explicação
sobre o sinal positivista
4.1. Amor
(sentimentos): bondade
4.2. Ordem
(inteligência): dedução
4.3. Progresso
(atividade prática): perseverança
5. Orações
transcritas:
5.1. Publicação
no blogue Filosofia Social e Positivismo
(https://filosofiasocialepositivismo.blogspot.com/)
5.2. A
partir do opúsculo Comte e Clotilde
(organizado por Teixeira Mendes, em 1903, originalmente em francês)
5.3. Orações:
5.3.1. Orações cotidianas de Augusto Comte
5.3.2. Orações para as refeições (Teixeira Mendes)
5.3.3. Hino ao amor (Teixeira Mendes)
6. Leitura
comentada do Catecismo positivista
7. Extrato
da correspondência entre Augusto Comte e Clotilde de Vaux
7.1. Os
trechos reproduzidos abaixo foram extraídos do opúsculo Comte e Clotilde; como comentado acima, esse livrinho foi organizado
por Teixeira Mendes em 1903 (originalmente em francês e, em 1936, traduzido
para o português)
7.2. A
correspondência completa possui 181 cartas, trocadas entre 30.4.1845 e
18.3.1846 e publicadas no Testamento
de Augusto Comte
7.2.1. O
testamento de nosso mestre é de 22 de Bichat de 67 (24.12.1855)
7.2.2. Também
publicadas no Testamento de nosso
mestre estão as suas orações cotidianas (bem como os acréscimos, as peças
justificativas, as confissões anuais e a adição secreta)
7.2.3. Também no Testamento lemos como, segundo as
próprias palavras de nosso mestre, como é difícil passar da mudança de idéias
(do absoluto para o relativo, da criticidade metafísica para as construções
positivas) para a mudança de sentimentos (da violência, da beligerância, do
egoísmo e do individualismo para a simpatia, para o amor, para a sociabilidade)
e daí para a mudança de comportamentos (do reacionarismo e do revolucionarismo
para a construtividade)
7.3. Os
trechos abaixo compõem as orações cotidianas de Augusto Comte, ou seja, foram
selecionados por nosso mestre para suas efusões matinais
8. Essa
correspondência é belíssima e exemplar
8.1. Ela
evidencia todas as qualidades morais e intelectuais que Augusto Comte atribuía
a Clotilde: sensibilidade, refinamento, entendimento do ser humano
8.2. Ela
evidencia a superioridade moral de Clotilde, que aliava a ternura à pureza
8.3. Ela
indica o quanto Clotilde era u’a moça sofrida na vida e oprimida pela família
8.4. Ela
indica o profundo respeito de Augusto Comte para com Clotilde
8.4.1. Aliás,
mais do que isso: essa correspondência indica que os sentimentos de amor entre
ambos eram verdadeiros, recíprocos e profundos
8.5. Ela
evidencia o quanto a superioridade moral afirmada e proposta pela Religião da
Humanidade não é uma idealização ingênua nem uma pieguice tola
8.6. Em
contraste com o item anterior, ela evidencia o quanto a nossa moralidade
contemporânea, em particular a afirmada pelo feminismo, é vulgar, banal e
grosseira
8.6.1. Nesse
sentido, essa correspondência indica o quanto atualmente se considera que as
relações entre os sexos limitam-se ao sexo e, de modo degradantemente pior, à
violência entre os sexos
9. Vejamos,
então, os trechos selecionados por nosso mestre para suas efusões.
Vim agradecer-vos, Senhor, o
vosso encantador mimo. (A sua visita do lunedia[1] 2
de junho de 1845, com a sua mãe e o seu irmão.)
Iniciação fundamental
Junho – Estima. Deixai-me livremente trabalhar no vosso
aperfeiçoamento, pois que é a minha principal maneira de ocupar-me com a vossa
felicidade, que me será sempre cara, sejam quais forem o grau e a forma pelos
quais possa concorrer para ela. (A minha carta de 6 de junho.)
É indigno dos grandes corações
derramar as perturbações que sentem. (A sua Lúcia,
publicada a 20 de junho.)
Julho – Confiança. O meu coração vê finalmente em vós, na realidade
presente, uma perfeita amiga, e, nos meus sonhos de futuro, uma santa esposa.
(A minha carta de 3 de julho.)
Eu vos estendo a mão bem
sinceramente, eu vos sou ternamente devotada, e terei sempre prazer em
proporcionar-vos, nas nossas relações, toda a felicidade de que posso dispor:
vossa de coração. (A sua carta de 4 de julho.)
Agosto – Afeição. O meu surto direto do amor universal se consuma
sob a estimulação contínua do nosso puro apego. (A minha carta de 5 de agosto.)
Adeus, caro e digno amigo; vedes
que eu vos aprecio e creio em vós: contai com o coração de Clotilde de Vaux. (A
sua carta de 11 de agosto.)
A cada suspensão do meu trabalho,
a vossa cara imagem volta docemente a apoderar-se de mim: longe de prejudicar
depois a minha meditação, ela a sustenta e a anima. (A minha carta de 26 de
agosto.)
Crise decisiva
Setembro. Se credes poder aceitar todas as responsabilidades que se
prendem à vida de família, dizei-mo, e decidirei da minha sorte... Eu vos
confio o meu resto de vida. (A sua carta de 5 de setembro.)
Eis o meu plano de vida: a
afeição e o pensamento. (A sua carta de 6 de setembro.)
Sinto-me ainda desgraçadamente
impotente para o que ultrapassa os limites da afeição. Ninguém apreciar-vos-á
como eu o faço; e o que não me inspirais, nenhum homem mais mo inspira; porém o
passado faz-me ainda mal, e foi um erro meu querer arrostá-lo. Sede generoso a
todos os respeitos, como o sois a certos. Deixai-me o tempo e o trabalho,
expor-nos-íamos agora a cruéis pesares. (A sua carta de 8 de setembro.)
Desde a Santa Clotilde,
verdadeiro início das nossas relações seguidas, nenhum pensamento carnal tinha
até então, quer na vossa presença, quer mesmo na vossa ausência, jamais
perturbado a minha íntima adoração. Retomo pois, sem esforço, os meus caros
hábitos de ternura cavalheiresca. (A minha carta de 10 de setembro.)
Sinto quanto vos amo de coração
vendo-vos sofrer. (A sua carta de 13 de setembro.)
Compreendi, melhor do que
ninguém, a fraqueza da nossa natureza, quando ela não é dirigida para um alvo
elevado, que seja inacessível às paixões... Restam-me aos menos fontes de
ensinamento para os outros; é ainda um interesse real na minha vida; quero
explorá-lo... Contai com tudo que eu tenho de bom e de afetuoso no coração. (A
sua carta de 14 de setembro.)
Envio-vos o dom do coração com
simples atavios que lhe deu a natureza; o pensamento é o único artista capaz de
ornar semelhantes nadas. O meu proveito próprio está em ser-vos agradável, e
compenetrar-me da sinceridade do vosso apego, ao qual ligo todo o apreço que
merece. (A sua carta de 25 de setembro.)
Não encontrei ainda senão em vós
a eqüidade unida a amplas exigências do coração... Por que não vos conheci mais
cedo? (A sua carta de Garges[2]!)
Amemo-nos profundamente, cada um
à sua maneira, e poderemos ainda ser verdadeiramente felizes um pelo outro. (A
minha carta de 2 de outubro.)
Transição Final
Outubro – Expansão total. Caminhemos apoiados um ao outro, meu caro
filósofo, deixemos que o tempo nos guie e nos forme. (A sua carta de 2 de
outubro.)
As vossas cartas causam-me sempre
prazer e sempre me fazem bem... Adeus, caro homem, amai-me e ficai certo que
vo-lo retribuo bem. (A sua carta de 18 de outubro.)
A nossa espécie, mais do que as
outras, precisa de deveres para fazer sentimentos. (A sua carta de 25 de
outubro.)
Eis aí o que eu compreendo melhor
do XIX século: é a tendência universal dos seres para a razão em toda a sua
simplicidade. Vendo as mais modestas inteligências participarem naturalmente e
sem esforço de todas as luzes obtidas, sinto cada dia mais que a ciência não
carece senão residir no ápice das sociedades para enriquecê-las na sua massa
inteira: e, palavra, que me consolo de não ter sido iniciada nas maravilhas do
quadrado de hipotenusa. (A sua carta de 30 de outubro.)
Novembro – Abandono sem reserva. Se fosse preciso que não me
amásseis senão um quarto de hora por dia para o vosso repouso, eu desejaria, de
todo o meu coração, que isso se desse desde amanhã. (A sua carta de 2 de
novembro.)
Aqueço-me e visto-me como mulher
delicada, graças a vós. (A sua carta de 8 de novembro.)
A vós, em troca, o pensamento tão
doce de haverdes reanimado um ente aniquilado, e vertido o bálsamo em um
coração ulcerado. (A sua carta de 9 de novembro!)
Oxalá estivesse eu certa de
tornar-vos feliz por vínculos mais íntimos! Eu não hesitaria em formá-los. (A
sua carta de 18 de novembro.)
Sois o melhor dos homens; tendes
sido para mim um amigo incomparável; e sinto-me tão honrada como feliz pelo
vosso apego. (A sua carta de 23 de novembro.)
É, pois, unicamente a vós, minha
Clotilde, que deverei não mais deixar a vida sem ter dignamente experimentado
as melhores emoções da natureza humana. (A minha carta de 24 de novembro.)
Dezembro – Familiaridade contínua. Congracemo-nos habitualmente,
minha Lúcia, em torno dessas sublimes concepções, que ligam diretamente a nossa
afeição mútua ao conjunto da evolução humana. (A minha carta de 9 de dezembro.)
Contai com o apego mais terno que
possa experimentar... Tenho por vós hoje mais do que o coração de uma
parenta... É preciso que não esteja em meu poder o tornar-vos feliz para não o
fazer... Seja qual for a nossa sorte, espero que só a morte quebrará o laço
fundado na minha afeição, a minha estima, e o meu respeito. (A sua carta de 10
de dezembro.)
Esse incomparável ano fez surgir
em mim o único amor, a um tempo puro e profundo, que comportava o meu destino.
A excelência do ente adorado permite à minha madureza, mais bem tratada do que
a minha juventude, de entrever em toda a sua plenitude, a verdadeira felicidade
humana. (A minha carta de 26 de dezembro.)
Estado Normal
Janeiro – Intimidade completa. Tendes o coração de um cavalheiro,
meu excelente filósofo. (A sua carta de 8 de janeiro.)
Todos nós temos ainda um pé no ar
sobre o limiar da verdade... Só posso haurir a minha moral no meu coração, e
edificá-la sobre o puro sentimento. É esse, de resto, o quinhão de uma mulher,
e basta. Ela ganha em caminhar modestamente atrás do préstito dos renovadores,
embora tenha de perder assim um pouco do seu elance... Se eu fosse homem,
teríeis em mim um discípulo entusiasta: ofereço-vos, como indenização, uma
sincera admiradora. (A sua carta de 15 de janeiro.)
O vosso nobre ascendente ligou
profundamente o surto habitual dos meus mais altos pensamentos aos dos meus
mais ternos sentimentos. Não fiqueis pois surpresa que eu queira secretamente
inaugurar este décimo sexto serviço anual por uma lembrança especial da minha
bem-amada. Esta curta efusão deve me preparar melhor para o ministério que vou
desempenhar, fazendo espontaneamente prevalecer a disposição d’alma mais
favorável ao meu ofício filosófico. (A minha carta de 25 de janeiro.)
Fevereiro – Perfeita identidade. O vosso coração é o santuário onde
deposito tudo o que constitui a minha vida: os pequenos como os grandes
acontecimentos, tudo dela vos é conhecido; e sabeis que ainda não fiz mal senão
a mim. (A sua carta de 12 de fevereiro.)
Nas minhas horas de sofrimento, a
vossa imagem paira sempre diante de mim. (A sua carta de 23 de fevereiro.)
As almas ardentes e escrupulosas
encontram muitos Gólgotas neste mundo; mas, pelo menos, elas escapam amiúde aos
pesares como aos remorsos. (A sua carta de 24 de fevereiro.)
Março – União definitiva. Os maus precisam muitas vezes mais de
piedade do que os bons. (A sua carta de 2 de março.)
Tenho muitas coisas amigáveis a
dizer-vos. É força cessar por hoje. Recebei a eterna segurança da minha
ternura. (Fim da sua 86ª e última carta, de 8 de março de 1846.)
Para tornar-me um perfeito
filósofo, faltava-me sobretudo uma paixão, ao mesmo tempo profunda e pura, que
me fizesse assaz apreciar a parte afetiva da natureza humana. (A minha carta de
11 de março.)
No meio dos mais graves tormentos
que possam jamais resultar da afeição, não cessei de sentir que o essencial
para a felicidade é sempre ter o coração dignamente cheio. (A minha 95ª e
última carta, de 18 e 20 de março de 1846.)
Vós me haveis de dar um cacho dos
vossos cabelos. (A sua efusão verbal de 20 de março.)
Hoje me fizestes profundamente
sentir o valor da vossa nobre pureza, que nos permitiu, perante a vossa mãe,
conservar ternamente a vossa mão nas minhas, enquanto em contemplava a angélica
fisionomia cuja suave beleza torna-se mais tocante pela sua alteração passageira.
(Fim da minha última carta.)
Não tenho beleza alguma, tenho
apenas um pouco de expressão. (A sua efusão verbal de 22 de março.)
Abril! – Eu quisera bem ir dormir em vossa casa. (O seu voto de 1º
de abril diante de sua mãe.)
Fostes desconhecida, mas eu vos
farei apreciar... Não, jamais nenhuma outra... (A minha efusão verbal de 2 de
abril, perante a sua família, depois da sua extrema unção.)
Não terei tido uma companheira
por muito tempo! (Durante a nossa única noite, de 2 para 3 de abril de 1846!)
Senhora, vós amais a vossa filha
como um objeto de dominação, e não como um objeto de afeição. (A minha
exprobração à sua mãe, perante ela, a 4 de abril.)
Comte, lembra-te que eu sofro,
sem o haver merecido!... (As suas últimas palavras distintas, nitidamente repetidas
cinco vezes seguidas, no domingo à tarde 5 de abril de 1846, por volta das 3
horas da tarde, uma meia hora antes de expirar!!!)
Lembrança preciosa da minha
mocidade, companheiro e guia das horas santas que soaram para mim, evoca sempre
ao meu coração as cerimônias grandes e suaves da capela do convento!... (A sua
inscrição de 1837 na Journée du chrétien
que ela me deu, no domingo 29 de março de 1846, como o seu livro usual no
convento da Legião de Honra, rua Barbette.)[3]
[1] A fim de estabelecer
um paralelismo mais marcado do português com as demais línguas neolatinas no
que se refere aos nomes dos dias da semana, Miguel Lemos propôs a substituição
do “segunda-feira”, “terça-feira” etc. por versões aportuguesadas de lundi, mardi etc. (do francês), de lunes,
martes etc. (do espanhol) etc., da
seguinte maneira:
Segunda-feira: lunedia (dia da Lua)
Terça-feira: martedia (dia de Marte)
Quarta-feira: mercuridia (dia de Mercúrio)
Quinta-feira: venerdia (dia de Vênus)
Sexta-feira:: jovedia (dia de Júpiter).
[2] No final de setembro de 1845 Clotilde fez uma pequena viagem à
vila de Garges-lès-Gonesse (antes de 1941, chamada de Garges-en-France), que
fica nos arredores de Paris (uns 35 km ao norte da capital).
[3] Nota de Raimundo Teixeira Mendes: “O nosso Mestre lia algumas
páginas desse livrinho todos os domingos à tarde, desde a morte de Clotilde.
(Vide Volume Sagrado, Testamento, p. 18.)”