No dia 16 de Bichat de 170 (16.12.2024) realizamos nossa prédica positiva, dando continuidade à leitura comentada do Apelo aos conservadores (em particular da sua "Introdução").
Na seqüência, apresentamos a programação de final e de início de ano:
- 16 de Bichat (17.12): última prédica positiva de 170 (2024)
- Segundo dia adicional (31.12): celebração da Festa das Mulheres Santas, por Hernani G. Costa
- 1º de Moisés (1.1): celebração da Festa da Humanidade
- 19 de Moisés (19.1): celebração do nascimento de Augusto Comte (1798)
- 7 de Homero (4.2): primeira prédica positiva de 171 (2025)
Sobre a espontaneidade
(16.Bichat.170/17.12.2024)
1. Invocação inicial
2. Exortações iniciais
2.1.1. Sejamos altruístas!
2.1.2. Façamos orações!
2.1.3. Como Igreja Positivista Virtual,
ministramos os sacramentos positivos a quem tem interesse
2.1.4. Para apoiar as atividades dos
nossos canais e da Igreja Positivista Virtual: façam o Pix da Positividade! (Chave Pix: ApostoladoPositivista@gmail.com)
3. Efemérides
3.1. Dia 16 de Bichat (17.12):
transformação de Eduardo de Sá (1940)
3.2. Dia 20 de Bichat (21.12): início do
verão
4. Programação de final e início de
ano:
4.1. Dia 16 de Bichat (17.12): última prédica
positiva de 170 (2024)
4.2. Segundo dia adicional (31.12):
celebração da Festa das Mulheres Santas, por Hernani G. Costa
4.3. Dia 1º de Moisés (1.1): celebração
da Festa da Humanidade
4.4. Dia 19 de Moisés (19.1): celebração
do nascimento de Augusto Comte (1798)
4.5. Dia 7 de Homero (4.2): primeira prédica
positiva de 171 (2025)
5. Leitura comentada do Apelo aos conservadores
5.1. Antes de mais nada, devemos
recordar algumas considerações sobre o Apelo:
5.1.1. O Apelo é um manifesto político e dirige-se não a quaisquer pessoas
ou grupos, mas a um grupo específico:
são os líderes políticos e industriais que tendem para a defesa da ordem (e que
tendem para a defesa da ordem até mesmo devido à sua atuação como líderes
políticos e industriais), mas que, ao mesmo tempo, reconhecem a necessidade do
progresso (a começar pela república): são esses os “conservadores” a que
Augusto Comte apela
5.1.1.1.
O
Apelo, portanto, adota uma linguagem
e um formato adequados ao público a que se dirige
5.1.1.2.
Empregamos
a expressão “líderes industriais” no lugar de “líderes econômicos”, por ser
mais específica e mais adequada ao Positivismo: a “sociedade industrial” não se
refere às manufaturas, mas à atividade pacífica, construtiva, colaborativa,
oposta à guerra
5.1.2. Como nosso amigo Hernani G. Costa
sempre realça, é necessário insistir em uma idéia que o materialismo e o
ceticismo contemporâneos desprezam: não é
possível entender a política proposta pelo Positivismo isoladamente da Religião
da Humanidade
5.1.2.1.
Aliás,
o desejo de separar a política dos valores e das concepções gerais de fundo é
precisamente um dos problemas contemporâneos, é precisamente um dos sintomas da
anarquia contemporânea
5.1.3. A religião estabelece parâmetros
morais, intelectuais e práticos para a existência humana e, portanto, orienta a
política, estabelece as suas metas, as suas possibilidades e os seus limites
5.1.3.1.
Outro
lembrete: a religião, conforme o Positivismo estabelece, não é sinônima de
“teologia”
5.2. Últimas observações preliminares:
5.2.1. Uma versão digitalizada da tradução
brasileira desse livro, feita por Miguel Lemos e publicada em 1899, está
disponível no Internet Archive: https://archive.org/details/augustocomteapeloaosconservadores
5.2.2. O capítulo em que estamos é a
“Introdução”, cujo subtítulo é “Advento dos verdadeiros conservadores”
5.3. Passemos, então, à leitura
comentada do Apelo aos conservadores!
6. Sermão: sobre a espontaneidade
6.1. O sermão desta semana foi sugerido
pelo nosso confrade Eugênio Macedo – na verdade, foi sugerido publicamente por ele, em uma consulta
que fiz (e que mantenho) à comunidade
6.1.1. Ao justificar esse tema, Eugênio
lembrou que ele é um ator e que a espontaneidade é algo importante em sua
profissão
6.1.2. Essa é uma justificativa
importante: a relação das artes com o que é espontâneo – mas é claro que a
espontaneidade é importante em todos os aspectos da vida
6.2. A espontaneidade é um tema
realmente desafiador, na medida em que ela é um aspecto da vida de todos e cada
um de nós, mas, ao mesmo tempo, oferece algumas dificuldades para conceituar,
por ser um pouco diáfana
6.3. Como podemos entender a
espontaneidade? Uma primeira abordagem sugere que é espontâneo é aquilo que
ocorre naturalmente, isto é, sem um
esforço (interno ou externo), a
partir de impulsos internos
6.3.1. Essa definição inicial já indica
que a espontaneidade tem íntimas vinculações com as artes – entretanto, não abordaremos
tais relações nesta exposição
6.3.2. Há muitas situações em que a
espontaneidade é altamente valorizada; geralmente são as situações em que
manifestamos atributos afetivos e/ou altruístas: generosidade, respeito, apoio,
alegria, simpatia etc.
6.3.2.1.
Inversamente,
a falta de espontaneidade com freqüência é desvalorizada e entendida como um
comportamento frio, mecânico, apático, ou mesmo puritano ou reprimido
6.3.3. A noção de espontaneidade como ação
baseada em impulsos internos, sem esforço (e, em particular, sem força externa), indica imediatamente
que o ser humano – e, na verdade, todo animal – age de fato a partir de
motivações internas, sejam elas ou não devidas a reações ao ambiente
6.3.3.1.
Essas
motivações internas com freqüência são chamadas de “instintos”
6.3.3.1.1.
Os
instintos, por sua vez, são orientações gerais em determinadas direções, com
freqüência são potencialidades e mudam de intensidade ao longo da vida; assim,
os instintos não são fatalidades nem implicam comportamentos e ações específicos
6.3.3.2.
Essas
motivações internas rejeitam a tese do automatismo (como proposta por
Descartes, afirmada por Hobbes e, no século XX, retomada por B. Skinner), como
se os seres humanos e os animais fossem máquinas que apenas reagem passivamente
a estímulos ambientais
6.3.3.3.
Isso,
é claro, não significa que não ajamos
de maneira espontânea em reação a
estímulos externos aplicados sobre cada um de nós: a dor e o medo são
exemplos fáceis, mas o carinho, a simpatia, o respeito, a honra também são estímulos
exteriores que podem resultar em reações mais ou menos espontâneas
6.3.4. Em suma: a espontaneidade, então, consiste em manifestarmos externamente e com
facilidade atributos internos
6.3.5. É importante notar que a
espontaneidade pura e descontrolada não “funciona”, ou seja, não tem resultados
adequados e satisfatórios para os indivíduos e a sociedade, não é adequada nem
à felicidade individual nem ao bem-estar coletivo: dessa forma, todos precisamos de autocontrole sobre
nossos instintos
6.3.5.1.
Isso
se vê com clareza nas crianças, em que uma parte importante da educação
consiste precisamente em desenvolver e aplicar o autocontrole
6.3.5.2.
A
necessidade de controle e orientação dos impulsos (e, portanto, da
espontaneidade) torna-se evidente quando consideramos que permanentemente é
necessário o estímulo do altruísmo e a subordinação a ele do egoísmo
6.3.5.3.
Além
disso, diferentes sociedades, em diferentes épocas, estimulam o autocontrole de
alguns impulsos e, inversamente, estimulam a maior espontaneidade de outros
impulsos: em outras palavras, há diferentes maneiras de conduzir e de lidar com
os impulsos
6.3.5.3.1.
Ao
mesmo tempo, em toda sociedade há um sem-número de situações em que
manifestamos de maneira obrigatória nossos sentimentos (o choro no funeral) ou
em que somos proibidos de manifestar esses sentimentos (o riso alegre no
funeral)
6.3.5.3.2.
O
resultado disso é que diferentes sociedades orientam diferentemente as
espontaneidades
6.3.5.4.
Considerando
as restrições e os estímulos sociais, podemos considerar que o que chamamos de
espontaneidade refere-se, então, de maneira específica, à manifestação de
nossas características (especialmente dos sentimentos) no dia a dia, na vida
cotidiana, em que agimos mais ou menos sem provocação externa
6.4. Precisamos insistir sobre as
características sociais da espontaneidade; o processo da educação e as
variações sociais já indicam então que a espontaneidade é bem mais que a mera manifestação
de impulsos internos
6.4.1. De modo geral, a ausência de
esforço que caracteriza a espontaneidade pode ocorrer devido à natureza das coisas ou então devido a um aprendizado
(ou seja, a hábitos que foram internalizados) – ou a uma combinação dessas duas possibilidades
6.4.2. Os hábitos criados e internalizados
não criam nenhuma habilidade que já não exista no ser humano (seja no ser
humano individual, seja na espécie); o processo de educação apenas estimula e
regula aquilo que já existe em nós, na forma de potencialidades
6.4.3. Além disso, muitas dessas
potencialidades manifestam-se sozinhas ao longo do tempo da vida de uma pessoa:
o processo de estímulo e orientação dos nossos instintos variam de acordo com a
idade da pessoa
6.4.3.1.
Esse
é um dos motivos por que a verdadeira educação não se limita à infância, mas é
um processo que se estende ao longo de toda a vida
6.5. Nos termos apresentados acima,
torna-se claro que a espontaneidade aproxima-se da chamada “intuição”
6.5.1. A intuição refere-se ao
conhecimento, enquanto a espontaneidade refere-se a todos os impulsos internos:
a intuição são idéias e processos mentais que se tornam tão automáticos, exigem
tão pouco esforço, que parece que não exigem esforço nenhum e que “sempre
estiveram lá”
6.5.2. Assim, podemos dizer que a intuição
são os processos especificamente intelectuais aprendidos que se tornaram
espontâneos devido a um longo treinamento
6.6. O que expusemos até agora se resume
no seguinte:
6.6.1. A partir da natureza humana geral,
cada indivíduo tem uma espontaneidade “geral”, básica, comum a todos os seres
humanos, além de espontaneidades específicas
6.6.2. Essas diversas espontaneidades, que
correspondem à manifestação de atributos e potencialidades, são estimuladas,
controladas e orientadas de diferentes maneiras nas diferentes sociedades: essa
orientação social dos atributos individuais corresponde à subordinação da Moral à Sociologia, na escala enciclopédica
6.7. O que comentamos até agora sobre a
espontaneidade refere-se aos atributos individuais, que são estimulados,
controlados e orientados pela sociedade: mas há também a espontaneidade propriamente
social, ou sociológica
6.7.1. As sociedades têm estruturas,
funcionamentos e resultados específicos e diferentes dos dos indivíduos: é
devido a essa realidade que se pode falar verdadeiramente em “leis
sociológicas” e em Sociologia (em vez de tratarmos a sociedade como uma
justaposição de indivíduos)
6.7.2. Toda sociedade tem, naturalmente,
uma estrutura, que em seus elementos mínimos é estudada pela Estática Social:
espontaneamente toda sociedade tem no mínimo linguagem, governo, família,
religião e propriedade
6.7.3. Da mesma forma, toda sociedade
desenvolve-se ao longo do tempo; esse desenvolvimento é estudado pela Dinâmica
Social e, em linhas gerais, segue as leis sociológicas dinâmicas, isto é, as
três leis dos três estados
6.7.4. Vale notar que o estímulo, controle
e orientação social dos instintos individuais corresponde à espontaneidade
social conduzindo a espontaneidade individual
6.7.5. Por que eu comecei a falar da
espontaneidade individual antes da social, se a social precede a individual? Simplesmente
porque a espontaneidade individual é mais fácil de tratar, pois é ela que vem à
mente quando tratamos da espontaneidade
6.8. Tudo o que falamos até agora se
baseia no Positivismo e em reflexões filosóficas e sociológicas; mas como o
Positivismo aborda esse tema de maneira mais direta e sistemática?
6.8.1. O dogma fundamental do Positivismo
– isto é, a concepção intelectual fundamental do Positivismo – é a das leis
naturais, das relações constantes de coexistência ou sucessão
6.8.2. A partir das leis naturais, o que o
Positivismo faz é sistematizar a
realidade (e a atividade) espontânea do mundo – o que equivale a dizer que a espontaneidade é pressuposta pelo
Positivismo
6.8.3. Na verdade a idéia de que a matéria
tem movimento espontâneo é uma das mais importantes, fundamentais e difíceis de
ser apreendida:
6.8.3.1.
O
fetichismo considera que tudo tem movimento espontâneo, ou seja, autônomo; o
fetichismo vincula esse movimento à vida (no sentido de que tudo move-se porque
tudo é vivo)
6.8.3.2.
A
teologia substitui o fetichismo; em tal substituição, acaba com a concepção de
que tudo move-se espontaneamente (porque tudo estaria vivo) e passa a pressupor
que tudo o que se move deve o seu movimento a forças externas (que são os
deuses)
6.8.3.2.1.
Tal
substituição empobreceu o entendimento afetivo e intelectual da realidade; mas,
por outro lado, ela foi necessária para o começo da pesquisa das leis naturais
(disfarçada sob a teologia pela pesquisa das causas)
6.8.3.3.
Aos
poucos, a ciência – a ciência moderna
– retomou a concepção do movimento espontâneo da matéria, ao mesmo tempo que
abandonava as noções de deuses e de causas
6.8.3.4.
O
desenvolvimento completo das leis naturais básicas (com a constituição da
escala enciclopédica) e o estabelecimento do relativismo foram sistematizados
pelo Positivismo, que completou esses aspectos pela necessária incorporação
positivada do fetichismo
6.8.3.5.
A
noção de que a matéria tem atividade espontânea, isto é, atividade própria independente
de impulsos externos, começa na Cosmologia, passa para a Biologia e daí segue
para a Sociologia e a Moral; em outras palavras, a atividade espontânea é de
fato uma concepção geral do dogma positivo, pressuposta pela noção de leis
naturais
6.9. O Positivismo afirma a importância
e a necessidade da espontaneidade na fórmula “agir por afeição e pensar para
agir”
6.9.1. A espontaneidade está implícita na fórmula acima
6.9.2. Augusto Comte apresentou essa
fórmula em duas passagens: a primeira no v. III da Política positiva (p. 78-79), de 1853, a segunda no Catecismo positivista (p. 67-68[1]),
de 1852; das duas, a que nos interessa diretamente é a do Catecismo:
O verdadeiro espírito
filosófico consiste, de fato, como o simples bom senso, em conhecer o que é,
para prever o que há de ser, a fim de o aperfeiçoar tanto quanto possível. Um
dos melhores preceitos positivistas declara, até, viciosa, ou, pelo menos, prematura,
toda sistematização que não for precedida e preparada por um suficiente surto[2]
espontâneo. Esta regra resulta logo do verso dogmático com que o Positivismo
caracteriza o conjunto de nossa existência:
Agir por afeição e pensar para
agir.
O primeiro hemistíquio[3]
corresponde à espontaneidade e o segundo à sistematização consecutiva.
Quaisquer que sejam os inconvenientes que a atividade irrefletida suscite, só
ela pode ordinariamente fornecer os primeiros materiais de uma meditação eficaz
que permitirá agir melhor.
6.10.
Em suma:
6.10.1.
A espontaneidade, como manifestação
dos sentimentos (em particular dos sentimentos altruístas), é efetivamente um
valor a ser buscado
6.10.1.1.
A espontaneidade é necessária em
termos afetivos, práticos e até intelectuais
6.10.1.2.
A espontaneidade é a atividade
própria, interna, aos corpos; no caso dos animais e do ser humano, é chamada de
“instintos”
6.10.2.
Devemos lembrar, entretanto, que
assim como a espontaneidade é importante e necessária, o autocontrole e o
controle social dos impulsos também é importante e necessário
6.10.2.1.
O estímulo do altruísmo e o
controle e a orientação altruística do egoísmo é o melhor exemplo dessa
necessidade
7. Exortações finais
8. Invocação final