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09 setembro 2025

"Ordem e Progresso" em tempos de fascismo e identitarismo

No dia 8.9.2025 o jornal carioca Monitor Mercantil publicou o meu artigo "Ordem e Progresso" em tempos de fascismo e identitarismo.

O original está disponível aqui: https://monitormercantil.com.br/ordem-e-progresso-em-tempos-de-fascismo-e-identitarismo/.

Reproduzimos abaixo o texto.

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‘Ordem e Progresso’ em tempos de fascismo e identitarismo

Desmoralização da direita e da esquerda e fim dessa polarização Por Gustavo Biscaia de Lacerda


Bandeira do Brasil - Ordem e Progresso (foto de André Maceira, CC)

Com uma certa e triste frequência, a frase “Ordem e Progresso” é alvo de polêmica. Geralmente, essas polêmicas envolvem o sentido da ordem e sua importância para o progresso, resultando em oposição entre direita e esquerda.

Um exemplo disso é o artigo que Djamila Ribeiro publicou em 28 de agosto na Folha de S. Paulo, intitulado “Independência ou morte”. O subtítulo desse texto resume as ideias e o conhecimento que a autora tem do “Ordem e Progresso”: “Pensar de forma independente é recusar o mito da ordem e progresso”.

Em um artigo que se esmerou em citar autoras feministas, a autora referiu-se uma única vez ao “Ordem e Progresso”, foi incapaz de explicar o que significa essa frase e resumiu a “ordem” à “manutenção da desigualdade”.

À parte sua escandalosa superficialidade, a autora repetiu um procedimento que, infelizmente, é corrente na esquerda, ao resumir a “ordem” ao status quo, à sociedade capitalista, à paz de cemitério ou a uma combinação desses sentidos.


Embora a esquerda faça questão de degradar dessa forma a noção de ordem, a direita faz questão de não se sair melhor ao tratar do “Ordem e Progresso”, na medida em que, por seu turno, despreza o progresso.

Ora, os erros da direita e da esquerda sobre o “Ordem e Progresso” são mais que fruto de ignorância; eles são mais que fruto de preconceitos e revelam disposições morais e políticas profundas e altamente danosas para a sociedade brasileira e para a Humanidade.


2 erros simétricos da direita e da esquerda

Direita e esquerda cometem erros simétricos a respeito do “Ordem e Progresso”. Elas assumem que: (1) ordem e progresso podem e devem ser encarados separadamente; (2) a ordem deve vir antes do progresso. É claro que essas considerações podem ser feitas isoladamente, mas, no caso da frase “Ordem e Progresso”, presente na bandeira nacional, todas elas estão erradas.

É natural que direita e esquerda considerem a ordem separadamente do progresso; na verdade, suas respectivas perspectivas exigem tal separação e definem-se exatamente pela parcialidade de suas vistas. Enquanto a direita valoriza a ordem contra o progresso, a esquerda afirma o progresso contra a ordem.

Para a direita, a ordem é o valor social primordial, tomando como base a memória das relações sociais antigas; o progresso, que implica mudança, corresponde à alteração sistemática das relações sociais — o que, para eles, é ruim. Essa concepção é estática; não por acaso, na direita estão os “conservadores”, embora, no fundo, eles devam ser chamados de “retrógrados”.

Já a esquerda quer o progresso sistemático; sua concepção é dinâmica, mas, por outro lado, ela considera que o passado (quando não o presente) é uma constante e eterna injustiça, que, portanto, deve ser destruída. Embora deseje ser progressista, a esquerda busca ser revolucionária e, ainda mais, destruidora.

Direita e esquerda entendem de maneira oposta a ordem e o progresso. A direita sacrifica o progresso em nome de uma ordem estática que tende a ser retrógrada; a esquerda sacrifica a ordem em nome de um progresso que tende a ser destruidor. É evidente que essas duas perspectivas são inconciliáveis e insustentáveis. A única solução é unir, de maneira íntima, a ordem com o progresso, entendendo-os como dois aspectos de uma realidade única.


Nos termos de Comte, ordem e progresso não são opostos e excludentes

Ora, embora possa parecer banal e trivial, é necessário que ordem e progresso não sejam definidos de maneiras opostas e excludentes, mas complementares. Para que ordem e progresso sejam dois aspectos de uma realidade única, a ordem tem que ser vista como dinâmica, e o progresso tem que considerar a manutenção da sociedade.

Nos termos claros e precisos de Augusto Comte, “o progresso é o desenvolvimento da ordem” e “a ordem é a consolidação do progresso”: apenas dessa forma é possível superar a oposição sociológica, filosófica e política entre a ordem e o progresso.

Unir a ordem ao progresso e, inversamente, o progresso à ordem implica necessariamente que a ordem tem que deixar de ser retrógrada e o progresso tem que deixar de ser destruidor. A direita tem que reconhecer o movimento e a busca de melhorias; a esquerda tem que abandonar o espírito destruidor e a concepção de que a ordem é sempre estática. Ambas têm que deixar de lado as concepções de que o antigo é bom ou ruim e que o novo é ruim ou bom apenas porque o antigo é antigo e o novo é novo.

Direita e esquerda — ou melhor, ordem e progresso — definem-se um em relação ao outro. A oposição mútua entre eles tem vários resultados negativos. O primeiro deles é que, se um nega o outro, nenhum deles é realmente levado a sério e nenhum dos dois se mantém.

Em segundo lugar, a negação mútua da ordem e do progresso faz com que os traços negativos de cada um deles se acentuem: a ordem torna-se cada vez mais retrógrada e o progresso, cada vez mais revolucionário, tornando-se anárquico. Em consequência disso, o embate mútuo torna-se ao mesmo tempo retrógrado e anárquico.

Em terceiro lugar, esse embate descamba para uma oscilação social e política, com períodos de ordem (estática) e de progresso (revolucionário). Essa é a dinâmica ocidental (e, por extensão, mundial) desde a Revolução Francesa.

As narrativas liberais e marxistas reproduzem a oposição entre direita e esquerda, ou seja, entre ordem e progresso, e são incapazes de perceber e reconhecer a oscilação: o século 19 caracterizou-se por isso; o período da II Guerra dos 30 Anos (1914-1945) caracterizou-se pela mesma oscilação; e a Guerra Fria (1947-1991) transformou a oscilação em disputa geopolítica.

A afirmação atual entre, por um lado, os tradicionalismos e sua forma política mais extrema, o neofascismo, e, por outro, os identitarismos, é apenas a versão mais recente e agressiva da oposição entre ordem e progresso.


Superação da oposição entre ordem e progresso

A superação da oposição entre ordem e progresso não é uma política de “centro”; é uma política que é ao mesmo tempo progressista, sem ser revolucionária, e que busca manter as instituições sociais sem ser retrógrada.

Essa política não é de extrema esquerda, o que a torna suspeita para a esquerda; ela não é de extrema direita, o que a torna suspeita para a direita. Ela respeita a história, sem ser tradicionalista; ela afirma o progresso, sem ser destruidora. Essa política não apenas rejeita os graves e profundos erros da direita e da esquerda, como torna esses dois lados (e sua oposição mútua) irrelevantes.

Não é por acaso que essa política é alvo dos fascistas e dos identitários; não é por acaso que tanto os asseclas dos Bolsonaros quanto Djamila Ribeiro critiquem o “Ordem e Progresso”. Eles não o conhecem, não o entendem e rejeitam-no; mas, com certeza, intuem que o “Ordem e Progresso” corresponde à superação de suas perspectivas opostas, ou seja, da necessária desmoralização desses opostos irreconciliáveis e do urgente fim dessa polarização.

Gustavo Biscaia de Lacerda é doutor em Sociologia Política e sociólogo da UFPR.

15 outubro 2024

Monitor Mercantil: "O caso Sílvio Almeida e três padrões da moralidade pública"

No dia 8 de Descartes de 170 (14.10.2024) foi publicado um artigo de nossa autoria no jornal carioca Monitor Mercantil; o artigo intitula-se "O caso Sílvio Almeida e três padrões da moralidade pública".

O artigo pode ser lido no portal do periódico, aqui: https://monitormercantil.com.br/o-caso-silvio-almeida-e-tres-padroes-da-moralidade-publica/

Reproduzimos abaixo o texto.

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O caso Sílvio Almeida e três padrões da moralidade pública 

Em 6 de setembro de 2024 o Ministro dos Direitos Humanos, Sílvio Almeida, foi demitido, sob a grave acusação de assédio sexual – assédio que ocorreria desde final de 2022, seria praticada por um Ministro de Estado, contra uma colega Ministra de Estado (Anielle Franco, titular do Ministério da Igualdade Racial) (além de contra outras mulheres) e alegadamente integrava um padrão de assédio moral do denunciado. Os detalhes do episódio são preocupantes, pois (1) envolvem a alta administração federal em um longo período de tempo e em um governo cuja missão é recuperar a moralidade pública após o caos lavajatista-ultraliberal-neofascista e (2) envolvem uma organização não governamental estrangeira (a estadunidense Me Too), em vez dos adequados órgãos públicos (a Presidência da República e a Controladoria-Geral da União).

Na semana em que esse episódio desenrolou-se houve intensa agitação midiática; mas, como sói acontecer, passados alguns dias o tema desapareceu do noticiário. Ainda assim, vale a pena brevemente o reconsiderarmos, sob uma luz que não foi abordada: as perspectivas de moralidade pública. O nosso argumento é bastante direto: podemos identificar pelo menos três padrões de moralidade, a da direita, a da esquerda e o republicano – dois dos quais são insatisfatórios e um terceiro que não é (não é mais, ou ainda não é) praticado.

Comecemos notando que a vida política tem que se submeter à moral. Essa concepção pode parecer contraintuitiva; a reflexão academicista afirma, a partir de Maquiavel, que a política é “autônoma” em relação à moral, sugerindo assim que a prática política tem parâmetros próprios, irredutíveis, ou melhor, incompatíveis com a moral. Assim, a teoria política academicista postula que no âmbito privado é correto falar a verdade, honrar a palavra dada etc., mas na vida pública dá-se o inverso: mentir, trair, enganar é que seriam as virtudes. Esse amoralismo que logo se revela um imoralismo é vendido como “realismo”.

Claro, essas concepções chocantes são falsas: agir conforme o que se afirma e honrar a palavra dada são princípios elementares em qualquer lugar; inversamente, quem mente e trai, quem é incoerente em termos de alianças e práticas, logo é recriminado e perde apoio. Mais: quando a mentira, a hipocrisia, o cinismo viram a regra, o regime político como um todo perde legitimidade. Evidentemente, se a noção de república – isto é, de “res publica”, de coisa pública – tem algum sentido, tal sentido vincula-se à subordinação da política à moral; quando o bem comum é desrespeitado e usado como uma pomposa desculpa para o enriquecimento privado e o benefício de grupos particularistas e excludentes, o sistema político como um todo entra em crise e buscam-se opções antissistêmicas: essa é a origem profunda da aventura autoritária a que assistimos desde há dez anos, com o lavajatismo, o ultraliberalismo e o neofascismo. Mas, enfim, a crise do sistema confirma o primado da subordinação da política à moral, embora as opções buscadas sejam profundamente antirrepublicanas.

Em face da subordinação da política à moral, a “direita” considera basicamente que os valores morais devem ser “conservadores”; mas isso é uma forma meio enviesada de dizer que a sociedade moderna tem que se pautar por valores teológicos, em particular cristãos; não por acaso, esses conservadores costumam idealizar para as sociedades modernas uma volta no tempo, para quando se seguiam os parâmetros teológicos com ou sem a regulação da igreja (a Idade Média, ou as épocas de Abraão, Moisés ou São Paulo). Lidando mal com as concepções e instituições que não sejam as suas próprias, os conservadores pregam uma desaceleração geral do mundo; assim, de maneira confusa, parcial e muito incoerente pregam um certo respeito à continuidade histórica. Por fim, considerando que o cristianismo em si regulou apenas vida privada mas foi omisso sobre a vida pública, a subordinação da política à moral para a direita conservadora consiste em adotar parâmetros familistas e/ou um clericalismo generalizado.

Uma outra direita, mais recente, só é direita e só é “conservadora” em oposição à esquerda (e à esquerda revolucionária): são os liberais economicistas. Também para eles, a vida pública reduz-se à vida privada; mas em vez de clericalismo ou familismo, os parâmetros privados que devem ser generalizados são os das empresas privadas: a sociedade é vista como um vasto mercado; o Estado deve ser o seu regulador geral; a sociedade compõe-se de famílias e empresas, isto é, de consumidores e vendedores. Moralidade toda própria, sem dúvida.

Da parte da “esquerda”, especialmente a marxista, a moralidade é confusa. Por um lado, a partir do materialismo, finge-se que não há subjetividade nem moralidade em jogo; por outro lado, evidentemente há fortes princípios morais em ação. A moral pública é afirmada sobre a moral privada; mas não existe bem comum, apenas o bem de uma classe sobre outras; como as classes estão perpetuamente em conflito, só haverá bem comum quando não houver mais classes. O passado e o presente são hipócritas ou alienantes; até haver, no futuro, uma revolução salvadora, a moral pública consagra o conflito, a violência, a hipocrisia sistêmica e constitutiva.

Uma esquerda mais recente é a identitária. Ela também consagra a desconfiança e afirma o conflito constitutivo e sistêmico; mas não vê resolução desses problemas. A moral pública, então, basicamente é a moral da “maioria”, que, por definição, é opressora e cujos pecados constitutivos devem ser expiados eternamente. Em face disso, a esquerda identitária promove uma “contra-moral”, em que a história, ou melhor, o estudo da história serve para revelar e estimular a culpa de opressores (que são a “maioria”), bem como o ressentimento dos perseguidos e humilhados (sempre as “minorias”, que devem sempre ser compensadas). As preocupações privadas tomam conta da moral pública, que rejeita a confiança e estabelece um punitivismo sistemático e particularista como objetivo da política.

O caso Sílvio Almeida deve ser entendido com o identitarismo e seu punitivismo, particularismo raivoso e ânsia expiatória. Almeida e Franco são promotores de diferentes vieses identitários: ele, do identitarismo racialista; ela, do identitarismo feminista. Embora a demora para a denúncia sugira uma aliança temporária entre eles, os canais não oficiais, a presunção de culpa do denunciado e a conseqüente rapidez com que o denunciado foi demitido após a denúncia ilustram bem a lógica identitária: ânsia punitivista, desconfiança sistemática e generalizada, intenso particularismo moral e social, estímulo conjugado de culpa e ressentimento. Com dois identitarismos entrando em choque direto, para além da ânsia punitiva não se vê muito bem como o bem público está sendo servido; mas o que se percebe é que, em sendo verdadeiras as acusações feitas contra o ex-Ministro (cuja culpa ainda não comprovada), a mentalidade da “maioria” sempre culpada e da minoria sempre ressentida foi necessariamente insuficiente para regular o comportamento público e privado de um alto promotor do identitarismo e impedir um comportamento inaceitável sob qualquer ponto de vista.

No vaivém entre direita e esquerda, conservadores/retrógrados e revolucionários, ordem retrógrada e progresso anárquico, o bem comum é sacrificado: não se reconhece um efetivo bem comum (sempre sacrificado pelos particularismos, pelos conflitos e pelo punitivismo) nem se valoriza efetivamente a confiança pública (entre governantes e governados e entre os cidadãos). Ora, a solução para isso é deixar de lado as oposições entre ordem e progresso e assumir que esses dois elementos devem andar juntos; que o bem comum deve ser afirmado e que se deve estimular a confiança na sociedade; além disso, os âmbitos público e privado, sem serem radicalmente separados, devem ter suas particularidades respeitadas. Essas concepções, tão incomuns nos dias de hoje, têm um nome e uma autoria: trata-se do republicanismo, conforme delineado pelo fundador da Sociologia, o grande Augusto Comte. Cumpre valorizá-las e aplicá-las.

 

Gustavo Biscaia de Lacerda é doutor em Sociologia Política (UFSC) e sociólogo da UFPR.

22 fevereiro 2023

Comentários sobre direita e esquerda

No dia 17 de Homero de 169 (14.2.2023) fizemos nossa prédica positiva, concluindo a leitura comentada da quinta conferência do Catecismo positivista, dedicada ao culto público.

Na seqüência expusemos algumas considerações sobre os conceitos de direita e esquerda, a partir do Positivismo. As anotações desses comentários estão reproduzidas abaixo.

A prédica pode ser vista nos canais Apostolado Positivista (acesse.one/O6mQo) e Positivismo (encr.pw/VVvpa). Os comentários sobre direita e esquerda podem ser vistos a partir de 49' 50".

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Anotações sobre direita e esquerda

 

-        “Direita” e “esquerda” são duas categorias políticas fundamentais nos debates políticos contemporâneos

o   Evidentemente, com base no Positivismo eu tenho muito a dizer a respeito delas

§  É importante insistir em um aspecto inicial: as reflexões expostas aqui são comentários pessoais, não de Augusto Comte

§  Isso não poderia ser diferente, na medida em que direita-esquerda tornaram-se categorias básicas após a vida de Augusto Comte

o   Mas: elas serem fundamentais nos debates políticos contemporâneos não equivale a dizermos que concordamos com elas e/ou que as consideramos adequadas ou suficientes

o   Nesse sentido, não por acaso, já me manifestei inúmeras vezes a respeito, com publicações no meu blogue (https://filosofiasocialepositivismo.blogspot.com/): “‘Ordem’ e ‘progresso’ como categorias sociopolíticas legítimas”, “Necessidade do ‘ordem e progresso’; superioridade sobre ‘direita-esquerda’, ‘situação-oposição’”, “Comparação entre Positivismo, direitas e esquerdas”

§  Alguns comentários retomarão argumentos expostos antes

§  A esse respeito, aqui está um modesto quadro comparativo que elaborei no início de 2020: https://filosofiasocialepositivismo.blogspot.com/2020/02/comparacao-entre-positivismo-direitas-e.html

·         Esse quadro compara o Positivismo com as extremas direitas, a extrema esquerda, a direita intermediária, a esquerda intermediária, a centro-direita, a centro-esquerda e o centro, em função de 16 conceitos sociopolíticos relevantes ((1) ordem; (2) progresso; (3) tradição; (4) passado; (5) liberdade de pensamento; (6) liberdade de expressão; (7) família; (8) pátria; (9) Humanidade; (10) religião; (11) propriedade; (12) governo temporal; (13) governo espiritual; (14) paz; (15) igualdade; (16) indivíduos e individualidades)

-        O sentido da oposição direita-esquerda varia ao longo do tempo:

o   A origem de direita e esquerda está no início da Revolução Francesa, em que, na sala da assembléia (1789-1792), no alto e à esquerda sentavam-se os jacobinos, embaixo e à direita os reacionários e, no meio, os girondinos

§  Assim, durante o século XIX, a esquerda foi associada ao “progresso” (e/ou à revolução) e a direita, à “ordem” (e/ou à reação)

o   A partir do final do século XIX, a esquerda passou a ser associada a variados movimentos revolucionários: socialistas, comunistas, anarquistas; de qualquer maneira, cada vez mais ao marxismo

o   Com a Revolução Russa, em 1917, a esquerda passa a vincular-se decididamente ao comunismo soviético

o   A direita cada vez mais passa a definir-se de maneira residual e reflexa, como sendo a anti-esquerda ou a não-esquerda

o   Isso se cristalizou durante todo o século XX e, em particular, durante a Guerra Fria; após 1989, a feliz e necessária derrocada do comunismo pôs em questão a validade da oposição direita-esquerda

o   Em 1992 o filósofo italiano Norberto Bobbio reafirmou a oposição direita-esquerda e propôs que o conteúdo específico mais constante e importante da esquerda seria a igualdade e o da direita, a liberdade

§  É necessário admitirmos que essa proposta de Bobbio é muito cômoda e operacional; todavia, ela também é extremamente criticável, tanto no que se refere à direita quanto à esquerda

§  De qualquer modo, essa proposta tem o valor indireto de indicar o quanto a oposição direita-esquerda distanciou-se ao longo dos séculos da sua origem na Revolução Francesa

-        Uma outra forma de entender direita-esquerda é por meio de situação-oposição:

o   A oposição é quem não está no poder

o   Essa concepção é bem mais fraca que as que surgiram com a Revolução Francesa

-        Também é importante notar que, embora fale-se em direita e esquerda no singular, na verdade é necessário distinguir várias direitas e várias esquerdas (no plural), além da posição do “centro”

-        Ilustrando as várias direitas e esquerdas com a situação atual do Brasil:

o   As esquerdas dividem-se em esquerdas radicais, revolucionárias e leninistas (PCO); esquerdas “intermediárias”, de caráter revolucionário mas que aceitam os procedimentos eleitorais (PSTU, Psol, setores do PT); centro-esquerda, que tem perspectivas de esquerda, mas rejeita as revoluções e tem um franco diálogo com setores da direita (PDT, PSD, setores do PT, Rede)

§  Esses grupos afirmam buscar a igualdade social; as esquerdas “intermediárias” e a centro-esquerda assumem, cada vez mais, o facciosismo da política identitária; todos eles consideram que defendem o progresso, que é vagamente identificado com essas pautas

o   No Brasil, as direitas consolidaram-se bastante nos últimos anos; elas abrangem a extrema direita, que é militarista, fascista ou filofascista, evangélica e católica ultramontana, ultraliberal (PSL, PL, Republicanos); uma direita “intermediária”, de caráter liberal ou neoliberal (Republicanos, PL, União Brasil, PSDB)

§  O que dá coerência às direitas no Brasil é a rejeição à esquerda e ao vago progressivismo correlato; assim, as direitas defendem um vago – mas na prática bastante duro – conceito de ordem social, que ora defende o Estado mínimo, ora prega o retorno à Idade Média (ou à época de Moisés!); também se definem como “conservadores”; a presença dos evangélicos aí é cada vez mais pronunciada e agressiva

o   O centro consiste basicamente em políticos tradicionais que vendem seu apoio ao governo em troca de prebendas e que estão sempre prontos a pilhar o Estado; caracteristicamente são políticos favoráveis ao parlamentarismo, sem grande identidade ideológica, moral ou intelectual (PL, Republicanos, União Brasil, PSDB)

o   Para considerar as nossas reflexões sobre o mérito individual, expostas na prédica do dia 7.2.2023: enquanto a esquerda basicamente rejeita o mérito (em nome de seus ideais igualitaristas), a direita teológica considera que o mérito é obra divina (e, portanto, é um sinal da eleição divina, conforme o que o protestantismo prega) e a direita materialista reduz o mérito a uma concepção ultraindividualista e antissocial

-        Para o Positivismo, a oposição direita-esquerda é insuficiente e inadequada:

o   Evidentemente, é uma divisão muito cômoda e, é necessário convir, de modo geral, no dia a dia, ela é muito operacional

§  Essa “operacionalidade” também se deve ao caráter fortemente metafísico da política atual

o   Entretanto, a oposição direita-esquerda ela reduz a dinâmica social ao confronto interminável entre dois pólos, sem que haja nem a possibilidade nem o desejo de que esse confronto seja solucionado

§  Tal oscilação é cansativa, desgastante, degradante e, portanto, daninha para o ser humano

o   Além de manter a dinâmica social presa em uma oscilação virtualmente eterna, a oposição direita-esquerda é muito propícia para as polarizações mais ou menos extremas, com todas as suas conseqüências particularistas, excludentes e agressivas (na lógica do “nós contra eles”)

o   Também é importante notar que essa oposição é particularmente adequada para os partidos políticos, sendo menos adequada à dinâmica social

§  Ainda assim, há momentos em que a sociedade politiza-se de tal maneira que ela acaba partidarizando-se: é o que vemos no Brasil de dez anos para cá

o   Adicionalmente, os conteúdos específicos da direita e da esquerda são extremamente mal definidos, vagos e passíveis das mais variadas manipulações, muitas delas cínicas

o   Também é importante notar que a oposição direita-esquerda associa-se à política metafísica, com toda a demagogia daí resultante

§  A política metafísica propõe a “democracia”; o que se opõe, positivamente, a isso é a sociocracia

§  Para evitar inevitáveis confusões: a “democracia” criticada pelo Positivismo não é o atual regime de liberdades e de garantias; aliás, o regime de liberdades, garantias e opinião pública é a sociocracia; a democracia é o regime absoluto, autoritário, que considera que “a voz do povo é a voz de deus”; que considera que “o povo não erra”; excludente e clericalista, proposto por J.-J. Rousseau e realizado por M. Robespierre

·         Nesse sentido, não há como nem porque não deixar claro: o fascismo é rigorosamente “democrático”, bem como o comunismo

o   Por fim, mas não menos importante, é necessário realçarmos com toda a clareza que os princípios que fundamentam a direita e a esquerda são prejudiciais ao ser humano, por serem estritamente parciais e particularistas, além de absolutistas (sejam teológicos, sejam metafísicos)

§  Embora a direita tenha uma origem teológica, nas últimas décadas ela assumiu um claro caráter metafísico, ao adotar o materialismo economicista e individualista próprio ao liberalismo (ou ao neoliberalismo, ou ao ultraliberalismo)

-        No âmbito do Positivismo, em vez de falarmos em “direita e esquerda”, falamos em “ordem e progresso” e em sociocracia

o   Sociocracia: regime da opinião pública altruísta e voltada para o bem público (que é basicamente a satisfação das necessidades do comum do povo), com fiscalização e responsabilização pública constante; afirmação dos deveres mútuos; liberdades públicas e garantias individuais; reconhecimento e disciplinamento do poder, da riqueza e dos indivíduos

o   “Ordem e progresso”: necessidades sociais igualmente necessárias, devem ser compatibilizadas para que cesse a oposição e a oscilação patológicas entre cada um dos princípios; a união ocorre com o altruísmo, a afirmação dos deveres, a prevalência da moral;

§  A “ordem” e o “progresso”, na sociocracia, têm definições filosóficas e sociológicas precisas: “o progresso é o desenvolvimento da ordem, a ordem é a consolidação do progresso”

-        Em relação aos grupos políticos de sua época, Augusto Comte entendia da seguinte maneira a ordem e o progresso:

o   O grupo da ordem: os reacionários; teológicos (católicos) e monarquistas; afirmação dos elementos da ordem social (de modo geral, da Estática Social), mas com sacrifício do progresso e com justificativas absolutas e teológicas, desejosos de manter os valores do feudalismo ou de retornar a essa época; basicamente passivos politicamente; escola de De Maistre e De Bonald

o   O grupo do progresso: os revolucionários; metafísicos (materialistas ou espiritualistas; juristas ou literatos) e democratas (às vezes parlamentaristas, com freqüência clericalistas); desejosos de realizar o progresso com sacrifício da ordem; revolta contra o poder, contra o capital, contra a história; corresponde ao grupo que tem a primazia política atual; escola de Rousseau, Voltaire, Robespierre

o   O grupo da ordem e do progresso: os positivistas; sociocratas, republicanos; propõem a conjugação necessária, imperiosa e inadiável entre ordem e progresso, com o liame do amor; consagra e disciplina o poder e a riqueza, a partir da história e do altruísmo; escola de Augusto Comte, Diderot, Danton

-        Até onde conseguimos perceber, Augusto Comte era particularmente crítico do grupo do progresso – e isso devido a pelo menos dois motivos:

o   O grupo do progresso afirmava o progresso sacrificando totalmente a ordem (e, em particular, a historicidade humana)

§  Não por acaso, como sabemos, a concepção de progresso mobilizada pela “esquerda” é vaga e/ou quimérica, extremamente crítica e considera que o passado é um pesado fardo

o   O grupo do progresso detém a primazia política, no sentido de que a ele competem as iniciativas e o ativismo sócio-político: só por isso sua importância social é enorme

§  Mas, como os princípios que orientam o grupo do progresso são ruins, a prática política daí derivada também é ruim

o   Esses dois fatores conjugados realçam o fato de que o grupo que possui a liderança social, embora supostamente represente uma das tendências fundamentais da sociedade, é orientada por concepções – mas também sentimentos – erradas, equívocas e imorais

-        Resumindo o argumento:

o   Embora direita e esquerda sejam categorias políticas fundamentais desde o fim do século XIX, elas são inadequadas para a reflexão política e social

o   A inadequação de direita-esquerda é dupla:

§  Por um lado, o seu esquema fundamental é rigorosamente maniqueísta, propondo a oscilação eterna entre os dois pólos, sem que se veja, nem que se deseje, nenhuma solução para isso

§  Por outro lado, cada um dos termos é errado e prejudicial em si mesmo: os princípios que fundamentam a direita e a esquerda são prejudiciais ao ser humano, por serem estritamente parciais e particularistas, além de absolutistas (sejam teológicos, sejam metafísicos)

·         A direita é autoritária e/ou retrógrada e/ou antissocial; a esquerda é contra a ordem, mistifica a “revolução” (que é sempre violenta) e seu igualitarismo é anti-histórico, antissocial e com freqüência reinstitui castas

o   A adequação de “direita e esquerda” aos dias atuais também se dá porque a política atual é fortemente metafísica

o   Em oposição à metafísica da direita-esquerda, é necessário afirmar a positividade sociocrática do “ordem e progresso”:

§  O “ordem e progresso” afirma a conjugação necessária e simultânea de dois, ou melhor, três aspectos da vida humana: a Estática Social (ordem), a Dinâmica Social (progresso), vinculadas pelo amor (a palavra “e”)

§  Não há indefinida oscilação maniqueísta no “ordem e progresso”, mas complementaridade e conjugação constante e permanente de necessidades e anseios sociais

§  Cada um dos termos do “ordem e progresso” corresponde a uma efetiva realidade social, política e moral, que pode e deve ser satisfeita para a harmonia social e a felicidade individual

§  Os termos do “ordem e progresso” correspondem ao caráter histórico de continuidade humana e das suas instituições sociais fundamentais; essa continuidade não é estática, mas dinâmica e desenvolve-se na direção do pacifismo, do relativismo, do altruísmo: qualquer outra proposta é irreal e imoral    

14 dezembro 2022

Comentários sobre o progresso

No dia 11 de Bichat de 168 (13.12.2022) realizamos nossa prédica positiva. Após a leitura comentada do Catecismo Positivista (na Quarta Conferência do livro), fizemos alguns comentários sobre o conceito de "progresso", nas nossas reflexões semanais.

As anotações que serviram de base para esses comentários sobre o progresso estão reproduzidas abaixo. 

A exposição gravada ao vivo dos comentários sobre o progresso está disponível no canal Apostolado Positivista (aqui: https://www.facebook.com/ApostoladoPositivista/videos/1113142389387222) e no canal Positivismo (aqui: https://www.youtube.com/watch?v=NBIfoej-Ejs); no canal Apostolado Positivista, está a partir de 44' 25".

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Comentários sobre o progresso

 -        É importante ter clareza a respeito disto: estas anotações não procuram esgotar o tema

-        O conceito de progresso é um dos mais problemáticos atualmente

o   Durante muito tempo – digamos, desde o final do século XIX e todo o século XX – o progresso foi o principal valor social e político

§  O conteúdo específico do progresso era discutido, mas o valor em si, não

§  A afirmação do progresso podia ocorrer com sacrifício ou não da ordem

o   Neste início do século XXI, o progresso passou a ser rejeitado em nome da ordem, especialmente a partir de perspectivas conservadoras, reacionárias ou retrógradas

§  Em outras palavras, a partir deste século XXI muitos grupos passaram a adotar em relação ao progresso uma perspectiva inversa à que se manteve ao longo do século XX

-        Se ainda fosse necessário dizê-lo: a única filosofia social e política que afirma com todas as letras a necessidade e a possibilidade de conjugar a ordem e o progresso é o Positivismo

o   Dessa forma, embora todas as filosofias sociais e políticas que tratam do progresso abordem a ordem (implícita ou explicitamente), no caso do Positivismo essa referência dupla é obrigatória

o   Cabe lembrar que a divisa “Ordem e Progresso” é de caráter científico e político e é algumas décadas anterior à fórmula moral e religiosa “O amor por princípio...”

-        Para o Positivismo, e ao contrário das concepções teológicas ou metafísicas, tanto a ordem quanto o progresso têm conteúdos positivos, que devem ser afirmados, respeitados e valorizados

-        “O progresso é o desenvolvimento da ordem”

o   Inversamente, “a ordem é a consolidação do progresso”

o   A ordem tem que ser entendida como “arranjo”; aí, o progresso é o desenvolvimento dos elementos, das relações e da “lógica” própria a esse arranjo

§  A ordem a que se refere Augusto Comte e cujo desenvolvimento constitui o progresso não é a “ordem capitalista” (nem a “ordem eurocêntrica”, nem a “ordem patriarcal”): é a ordem própria à natureza humana

o   Assim, o progresso constitui em última análise no desenvolvimento pleno e simultâneo da características da natureza humana (sentimentos, inteligência, atividade)

o   A ordem corresponde à Sociologia Estática (a permanência, a consolidação) e o progresso, à Sociologia Dinâmica (a mudança, o desenvolvimento)

§  Mas não se pode cometer o grave equívoco de considerar que as mudanças em si constituem o progresso

·         Não é qualquer mudança que constitui o progresso

·         Da mesma forma, querer acelerar, sempre e cada vez mais, as mudanças, não é o mesmo que ser sempre e cada vez mais “progressista”

-        Como o progresso que deve corresponder à divisa “Ordem e Progresso” e à fórmula “O amor por princípio” refere-se ao conjunto da natureza humana, a noção de “harmonia” impõe-se e, a partir daí, também as concepções de “síntese”, de “consenso”, de “visão de conjunto” e daí, por extensão e definição, a de “religião”

o   O desenvolvimento contínuo tem por primado e motor a afetividade, isto é, o altruísmo (ou o amor); assim, o principal progresso é o moral; depois, é o intelectual; depois, é o físico; depois, é o material

o   Essa sequência de tipos de progresso – moral, intelectual, físico, material – indica a ordem de importância, de dignidade e de dificuldade (a sequência inversa indica a ordem de facilidade)

-        Fora do âmbito do Positivismo, em termos “populares” há uma associação entre o progresso e a noção de “igualdade”

o   Tal associação é proposta pela “esquerda” como um valor positivo

§  Vale notar que a “direita” também aceita essa associação, embora para criticá-la

§  Enquanto a esquerda de modo geral afirma o progresso (mas de maneira incoerente e irracional), a direita de modo geral rejeita o progresso (e também de maneira incoerente e irracional)

o   O conceito de progresso, aí, é ou indefinido ou é a expansão da “igualdade”

o   O conceito de progresso, aí, opõe-se radicalmente à noção de ordem (que, por sua vez, também é indefinida e/ou equivale a opressão política, exploração econômica e alienação moral)

o   Essa concepção de progresso, embora indefinida e/ou sinônima da “igualdade”, habitualmente é contraposta de maneira frontal à concepção positivista de progresso, que, por sua vez, é entendida pela esquerda (especialmente a marxista) como equivalente ao desenvolvimento do capitalismo

§  A má-fé marxista, além disso, afirma que a concepção positivista de progresso que estabelece antes de mais nada o progresso moral é uma concepção “ideológica” própria à “burguesia”, no sentido de que serviria apenas para iludir o proletariado e manter a opressão-exploração-alienação capitalista

§  A direita católica, reacionária e/ou ultraliberal rejeita o progresso e contrapõe a ele a noção de ordem, que, por sua vez, seria sempre estática

§  Para essas direitas, qualquer noção de progresso será sempre e necessariamente opressiva, exploradora e alienante

o   Por outro lado, a esquerda pós-moderna nega o progresso (assim como nega a racionalidade, a ciência, a objetividade etc.)

-        Apesar do que afirmam a direita e a esquerda, a noção de progresso não equivale à ampliação da noção de “igualdade”, nem mesmo, em rigor, à noção de liberdade

o   A noção de “igualdade” social é metafísica e tem um caráter destruidor; ela serve para destruir as instituições, as práticas e a ordem antiga, mas em si mesma é incapaz de criar qualquer coisa

§  Essa noção social de igualdade é de origem rousseauniana e foi retomada no século XIX pelo marxismo

o   As instituições, as práticas e as ordens supostamente criadas pela “igualdade” ou são instáveis (e autoritárias) ou, caso persistam e não sejam autoritárias, são inspiradas pela fraternidade e pelo altruísmo

§  As instituições criadas com o objetivo de estabelecer e manter a “igualdade” social e política resultam no autoritarismo, nas divisões e na ausência de “igualdade”

·         Para o Positivismo, a vinculação entre igualdade social e regimes liberticidas é necessária e não acidental

·         Além de liberticidas, os regimes que buscam criar e manter a igualdade social também, e não por acaso, buscam impor crenças oficiais (religião civil de Rousseau, marxismo nos países comunistas)

§  Apenas em duas situações é possível falar em “igualdade” no âmbito do Positivismo:

·         A igualdade perante a lei (a isonomia) e uma relativa igualdade de ensino são duas exceções à crítica positivista à igualdade

·         O disciplinamento social e moral da riqueza – com os aspectos correlatos de destinação social da riqueza; de responsabilidade individual e coletiva dos poderes sociais; de dignificação da pobreza – é algo que resulta no que se pode chamar, atualmente, de “eqüidade social”

o   A eqüidade social não se confunde, de maneira nenhuma, com a igualdade; mas, apesar disso, é esse o resultado concreto que se busca com as políticas públicas que, nominal, oficial e incoerentemente, afirmam realizar a “igualdade social”

·         Poderíamos atualmente acrescentar a essa lista as políticas sociais universalistas, como, no caso do Brasil, as políticas de seguridade social (saúde, desemprego, previdência social)

o   A liberdade em si mesma é a condição de realização do progresso; da mesma forma, ela é a condição da ordem

§  A liberdade tem que ser afirmada e respeitada, mas ela não pode ser entendida como um valor absoluto, pois, nesse caso, assumirá um caráter metafísico e meramente destrutivo ou de irresponsabilidade individual e coletiva (como no caso do liberalismo)

-        Para concluir, é importante reforçar e aplicar um aspecto: para o Positivismo, o progresso é o desenvolvimento da ordem:

o   Muitos dos aspectos julgados “progressistas” nos dias atuais deveriam ser encarados pura e simplesmente condições da ordem

§  Um ótimo exemplo de condições da ordem que, entretanto, são vistas como realização do progresso são os salários dignos

§  Essa confusão entre elementos da ordem e realização do progresso indica pelo menos duas coisas: (1) a confusão moral e intelectual prevalecente no mundo atual (em particular na direita e na esquerda) e (2) a degradação moral em que se encontra o mundo atual

o   O progresso que desrespeita a ordem não é progresso

§  Dois exemplos: (1) nos séculos XIX e XX os marxistas queriam, revolucionariamente, acabar com o Estado e a propriedade privada; (2) no século XXI, muitas propostas identitárias buscam desarticular a família

§  O “progresso” que desrespeita a ordem é sempre de caráter metafísico e, portanto, é destruidor e tem sempre em vista as instituições e as práticas absolutas de origem teológica

o   Como dizia Augusto Comte, mudanças rápidas (“revolucionárias”) nunca são profundas e, inversamente, mudanças profundas sempre são lentas

§  Forçar as mudanças sociais, especialmente no sentido de acelerá-las, com enorme freqüência torna essas mudanças instáveis e provoca reações sociais; para conter a instabilidade e as reações, o emprego da violência física (e, não raro, da censura) é necessário

§  Mudanças rápidas que se realizam sem grandes tensões e/ou sem grande instabilidade são mudanças que foram preparadas antes, com freqüência de maneira subterrânea