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31 agosto 2025

Documentos positivistas disponíveis

Novos documentos e livros positivistas disponíveis no repositório eletrônico Internet Archive, tratando dos mais variados temas: integralismo e fascismo, psicanálise, Moral, teoria da arte, Geometria, Educação. 

Agradeço ao amigo e correligionário Gabriel de Henrique pelo fornecimento desses documentos.



- Henrique Batista da Silva Oliveira: “O pretenso Integralismo” (1936): https://archive.org/details/henrique-b.-s.-oliveira-o-pretenso-integralismo

- João Reis Carvalho: “A Psicanálise e a ciência positiva” (1911): https://archive.org/details/psicanalise-e-a-ciencia-positiva

- Luís Lagarrigue: “A poesia positivista” (1890): https://archive.org/details/luis-lagarrigue-a-poesia-positivista-1890

- Manuel de Almeida Cavalcanti: “A educação sob o ponto de vista religioso” (1921): https://archive.org/details/manuel-de-almeida-cavalcanti-educacao-sob-o-ponto-de-vista-religioso

- Miguel Lemos e Raimundo Teixeira Mendes: “A festa da Pátria” (1881/1935): https://archive.org/details/miguel-lemos-e-teixeira-mendes-a-festa-da-patria

- Pierre Laffitte: “Curso de Moral Prática”: https://archive.org/details/pierre-laffitte-curso-de-moral-pratica

- Pierre Laffitte: “Curso de Moral Teórica” (1906): https://archive.org/details/pierre-laffitte-curso-de-moral-teorica

- Raimundo Teixeira Mendes: “Geometria preliminar – 10ª lição” (1898): https://archive.org/details/raimundo-teixeira-mendes-ensino-positivista-geometria-preliminar-10a-licao


27 agosto 2025

Quadro cerebral e Filosofia Primeira

Abaixo estão imagens de dois quadros elaborados por Augusto Comte em sua fase madura (ou seja, em sua fase religiosa): as leis da Filosofia Primeira e o Quadro Cerebral.

As fontes dessas imagens são as seguintes:

- leis da Filosofia Primeira: Catecismo positivista (Rio de Janeiro, Igreja Positivista do Brasil, 4a. ed., 1936, p. 479)

- Quadro Cerebral: Apelo aos conservadores (Rio de Janeiro, Igreja Positivista do Brasil, 1899, p. 63)




O início do Positivismo: as três leis dos três estados

No dia 14 de Gutenberg de 171 (26.8.2025) fizemos nossa prédica positiva, dando continuidade à leitura comentada do Apelo aos conservadores (em sua Primeira Parte - "doutrina apropriada aos verdadeiros conservadores").

No sermão abordamos o início do Positivismo, ou seja, as três leis dos três estados.

Também fizemos referência à publicação, pela Revista Parajás, de uma longa entrevista que seus editores fizeram conosco, disponível aqui: https://filosofiasocialepositivismo.blogspot.com/2025/08/revista-parajas-entrevista-com-gustavo.html.

Da mesma forma, fizemos referência à defesa honesta, corajosa e simpática que o católico Deyvid Antônio fez do Positivismo, da Religião da Humanidade e também do Apelo aos conservadores, como se vê aqui: https://www.youtube.com/watch?v=mA0zUWgBcKM.

A prédica foi transmitida nos canais Positivismo (aqui: https://youtube.com/live/siZ2uP8TyD0) e Igreja Positivista Virtual (aqui: https://www.facebook.com/IgrejaPositivistaVirtual/videos/2562584607432845/).

As anotações que serviram de base para a exposição encontram-se disponíveis abaixo.

*   *   *

As três leis dos três estados

(14.Gutenberg.171/26.8.2025) 

1.      Invocação inicial

2.      Datas e celebrações:

2.1.   Nesta semana não temos nenhuma celebração especial

3.      Notícia sobre a publicação da entrevista à Revista Parajás

3.1.   O artigo “Entre o Positivismo, a academia e o poder Espiritual: uma entrevista com Gustavo Biscaia de Lacerda” foi publicado no v. 7, n. 2, p. 1-65 (Montes Claros, 2024)

3.2.   É uma longa entrevista – com 65 páginas! –, que aborda os mais variados aspectos da minha atuação: como pesquisador, como positivista, como cidadão, como ser humano

3.3.   Agradeço imensamente à equipe da Revista Parajás, em particular a Ricardo Cortez Lopes e a Renat Nureyev Mendes, pela possibilidade de conceder essa entrevista

3.4.   O texto está disponível aqui: https://revistaparajas.com.br/index.php/rv1/article/view/133/99.

4.      Leitura comentada do Apelo aos conservadores

4.1.   Antes de mais nada, devemos recordar algumas considerações sobre o Apelo:

4.1.1.     O Apelo é um manifesto político e dirige-se não a quaisquer pessoas ou grupos, mas a um grupo específico: são os líderes políticos e industriais que tendem para a defesa da ordem (e que tendem para a defesa da ordem até mesmo devido à sua atuação como líderes políticos e industriais), mas que, ao mesmo tempo, reconhecem a necessidade do progresso (a começar pela república): são esses os “conservadores” a que Augusto Comte apela

4.1.1.1.           O Apelo, portanto, adota uma linguagem e um formato adequados ao público a que se dirige

4.1.1.2.           Empregamos a expressão “líderes industriais” no lugar de “líderes econômicos”, por ser mais específica e mais adequada ao Positivismo: a “sociedade industrial” não se refere às manufaturas, mas à atividade pacífica, construtiva, colaborativa, oposta à guerra

4.2.   Outras observações:

4.2.1.     Uma versão digitalizada da tradução brasileira desse livro, feita por Miguel Lemos e publicada em 1899, está disponível no Internet Archive: https://archive.org/details/augustocomteapeloaosconservadores

4.2.2.     O capítulo em que estamos é a “Primeira Parte”, cujo subtítulo é “Doutrina apropriada aos verdadeiros conservadores”

4.3.   Passemos, então, à leitura comentada do Apelo aos conservadores!


Quadro da alma humana - Apelo aos conservadores, p. 63


5.      Exortações

5.1.   Sejamos altruístas!

5.2.   Façamos orações!

5.3.   Como Igreja Positivista Virtual, ministramos os sacramentos positivos a quem tem interesse

5.4.   Para apoiar as atividades dos nossos canais e da Igreja Positivista Virtual: façam o Pix da Positividade! (Chave Pix: ApostoladoPositivista@gmail.com)

6.      Sermão: as três leis dos três estados

6.1.   Tendo sido muito conhecido no século XIX e nas décadas iniciais do século XX, desde o período entre-guerras – ou seja, desde a ascensão das metafísicas do nazifascismo, do comunismo, do existencialismo e do irracionalismo de modo geral – o Positivismo tornou-se um desconhecido do grande público

6.1.1.     Esse desconhecimento, como já cansamos de indicar, anda junto com a eleição do Positivismo como o inimigo preferencial de todos os que querem indicar inimigos a combater, seja em termos intelectuais, seja em termos políticos; em outras palavras, o Positivismo é o bode expiatório preferencial, eleito para essa duvidosa posição por autoritários (comunistas, nazifascistas), democráticos e teológicos

6.1.2.     De qualquer maneira, enquanto era melhor conhecido, o Positivismo produzia seus efeitos mais importantes: afirmação da fraternidade, preocupações sociais, visão de conjunto, combate à violência, promoção da tolerância e da concórdia etc.; em suma, união da ordem e do progresso

6.1.3.     Além disso, de maneira correlata, para aplicação do Positivismo conheciam-se melhor, e mais adequadamente, as suas diversas concepções, entre as quais as leis dos três estados

6.2.   As leis dos três estados são a base e o início filosófico e científico do Positivismo

6.2.1.     Esse início é tanto do ponto de vista teórico quanto cronológico: a sistematização desenvolvida por Augusto Comte começa com a reflexão das leis dos três estados, que, por sua vez, realizou-se logo no início da carreira adulta de nosso mestre (em 1822)

6.2.1.1.           Vale notar que Augusto Comte jamais considerou que as leis dos três estados são concepções puramente abstratas postuladas a priori; bem ao contrário, elas são elaborações com base empírica, a partir da observação histórica; o seu próprio conteúdo indica a longa série de observações e passos necessários para o ser humano compreender o mundo em que vive e a si mesmo

6.2.1.2.           Não por acaso, o conjunto das condições mentais, sociais e afetivas necessário para a apreensão e o entendimento da realidade está consignado na “Filosofia Primeira”, em um total de 15 leis

6.2.1.2.1.                As três leis dos três estados estão no “Segundo grupo – essencialmente subjetivo”, na sua “primeira série – leis dinâmicas do entendimento”, da Filosofia Primeira, correspondendo às leis de números VII a IX


Leis da Filosofia Primeira - Catecismo positivista, 4a. ed., 1936, p. 479

6.2.2.     Estamos falando em leis, no plural, porque é exatamente disso que se trata: são três leis, uma para cada aspecto da natureza humana (afetivo, intelectual e prático)

6.2.2.1.           As três leis são estas:

6.2.2.1.1.                Lei intelectual: toda concepção passa por três estados sucessivos, teológico, metafísico e positivo, com uma velocidade proporcional à generalidade dos fenômenos correspondentes

6.2.2.1.2.                Lei prática: a atividade humana é sucessivamente militar conquistadora, depois militar defensiva e por fim pacífico-industrial

6.2.2.1.3.                Lei afetiva: a sociabilidade humana é sucessivamente doméstica, depois cívica e enfim universal, seguindo a natureza de cada um dos três instintos simpáticos [veneração, apego e bondade]

6.2.2.2.           A primeira lei a ser descoberta foi a lei intelectual; em seguida foi a prática; finalmente, foi a afetiva

6.2.2.3.           Associada à lei intelectual dos três estados há a lei da classificação das ciências

6.2.2.3.1.                A lei da classificação organiza as ciências fundamentais em número de sete, que vão da mais geral, mais simples, mais objetiva e mais abstrata à mais específica, mais subjetiva, mais complicada e mais concreta

6.2.2.3.2.                As ciências fundamentais são estas: Matemática, Astronomia, Física, Química, Biologia, Sociologia e Moral

6.2.2.3.3.                A lei da classificação (1) explica e exemplifica a lei dos três estados; (2) apresenta um painel da compreensão da realidade; (3) apresenta e aplica a regra de classificação

6.2.2.3.4.                Augusto Comte desenvolveu uma série de reflexões sobre a lei das classificações e sobre as ciências fundamentais, estabelecendo diferentes arranjos que apresentam, cada qual, diferentes propriedades lógicas, morais e práticas; o arranjo final, presente na Síntese subjetiva, estabelece três grandes ciências: Lógica (Matemática), Física (Astronomia, Física, Química) e Moral (Biologia, Sociologia, Moral)

6.3.   Antes de tratarmos de cada uma das três leis dos três estados, é necessário fazermos alguns comentários sobre a concepção de leis sociológicas, especialmente de algumas objeções a elas, a fim de limparmos o terreno

6.3.1.     É moda nas Ciências Sociais e na Filosofia, a partir de variadas concepções metafísicas, decretar que não existem leis nas ciências humanas, pois o ser humano seria “livre”:

6.3.1.1.           Segundo esses metafísicos, a afirmação de leis naturais próprias aos seres humanos negaria sua “liberdade”, ou melhor, nos termos caracteristicamente usados, as leis naturais humanas seriam “deterministas” e negariam o “livre arbítrio”

6.3.1.2.           Evidentemente, o Positivismo afirma a liberdade humana, bem como a dignidade; entretanto, os termos e os raciocínios metafísicos são profundamente equivocados e daninhos

6.3.2.     As críticas metafísicas baseiam-se em uma série de equívocos e erros, ainda que por vezes se baseiem em uma preocupação (mística) com a dignidade humana

6.3.2.1.           O primeiro erro é o de conceber que estar submetido a constrangimentos e obedecer a regularidades impede a liberdade humana: ora, seja como ausência de obstáculos, seja como possibilidade efetiva de escolhas, as leis naturais não “impedem” nossa liberdade, embora com certeza condicionem e limitem-na

6.3.2.2.           Na verdade, bem vistas as coisas, as vidas de todos nós apresentam obstáculos e limitações, alguns contornáveis, outros irremovíveis: nem por isso se fala, com propriedade, a sério, em “ausência de liberdade”

6.3.2.3.           As leis naturais não criam os fenômenos; elas descrevem os fenômenos que ocorrem

6.3.2.3.1.                Assim, por exemplo, a lei da gravidade não criou a gravidade; na medida do possível, a lei descreve e indica suas condições e possibilidades

6.3.2.4.           Ao contrário do que as críticas metafísicas decretam, são justamente as leis naturais (seja por meio de seu conhecimento, seja por meio das técnicas surgidas a partir desse conhecimento) que permitem que o ser humano realize e amplie sua liberdade – mas sempre conforme a elaboração de Francis Bacon: “dominamos a natureza submetendo-nos a ela

6.3.2.5.           A concepção de liberdade dos metafísicos é precisamente metafísica, ficando a meio caminho entre a teologia e a positividade: mantém os raciocínios teológicos, de maneira degradada, e, embora tenda à positividade, simplesmente não é positiva e não entende a positividade

6.3.2.6.           A concepção metafísica de liberdade postula o “livre arbítrio”, que é uma concepção tipicamente teológica, em que as divindades concedem ao ser humano a possibilidade de escolher cultuar ou não a própria divindade

6.3.2.7.           De maneira mais ampla, essa concepção metafísica espelha a liberdade atribuída às divindades, em particular as monoteístas, que podem fazer tudo o que desejarem, de maneira caprichosa, voluntariosa e sem quaisquer parâmetros (ou seja, de maneira absoluta): é claro que considerando uma concepção de liberdade como essa – concepção infantil, ou melhor, adolescente, pois ciosa e intensamente imatura – qualquer constrangimento ou restrição será inaceitável e inadmissível

6.3.2.8.           Como dizia Augusto Comte, a partir de Montesquieu e de uma enorme tradição filosófica anterior, a liberdade consiste em seguir as leis próprias a cada corpo e/ou a cada fenômeno: uma pedra que cai é livre em seu movimento de queda; evidentemente, essa concepção está muito distante do conceito (teológico-metafísico) de liberdade como irresponsabilidade ou capricho

6.3.3.     Do ponto de vista da positividade, essa concepção caprichosa erra em dois aspectos: (1) em termos da diferença entre abstração e concretude (ou entre a teoria e a prática) e (2) em termos de modificabilidade crescente dos fenômenos mais complexos

6.3.4.     Há uma diferença fundamental, que os críticos metafísicos fazem questão de ignorarem, entre os enunciados abstratos e as aplicações concretas das leis naturais: os enunciados abstratos referem-se a partes específicas da realidade, enfocando os fenômenos, deixando de lado tudo aquilo que não diz respeito ao problema em questão; os esquemas abstratos existem apenas na mente dos pensadores, não na realidade; ora, a realidade funciona com corpos concretos interagindo, sofrendo múltiplas influências simultâneas; cada uma dessas influências é estudada abstratamente como fenômenos, mas concretamente eles influenciando-se e alterando-se

6.3.4.1.           O ser humano é capaz de determinar as leis abstratas e de examinar os comportamentos concretos; as interações mútuas são complicadíssimas e exigem pesquisas e atenção empírica

6.3.4.2.           O resultado disso é que as leis abstratas permitem-nos previsões, que devem ser aplicadas na prática conscientemente, isto é, com acompanhamento permanente: logo, há uma clara divisão entre a teoria e a prática

6.3.4.3.           As leis abstratas, por si sós, não impedem a liberdade humana; mas, de qualquer maneira, as possibilidades de ação são amplas na aplicação prática, a começar, evidentemente, pelas decisões de aplicar ou não na prática os conhecimentos teóricos, de quando e de como fazer essa aplicação; é por isso que Augusto Comte dizia que “para completar as leis são necessárias vontades

6.3.5.     Além da separação geral e estática entre teoria e prática, há um aspecto dinâmico próprio às diversas leis naturais, no sentido de que quanto mais complexa uma ciência, isto é, quanto mais restrita objetivamente e mais próxima subjetivamente do ser humano, maior o grau de modificabilidade dos fenômenos considerados

6.3.5.1.           Os maiores graus de modificabilidade significam que, quanto mais superiores forem as ciências – máxime a Sociologia e a Moral –, maiores as quantidades de influências prévias a que elas estão sujeitas e, portanto, maiores as possibilidades de modificações que elas sofrem; isso também significa que a quantidade material de empírico necessário para elaborar as leis é maior, que as generalizações são mais difíceis e que essas generalizações são menos precisas

6.3.5.2.           Ora, dizer que o grau de modificabilidade é maior equivale a dizer que as possibilidades de manipulação são maiores – o que significa que o grau de liberdade é maior

6.3.6.     A combinação das noções de divisão entre teoria e prática (entre leis abstratas e aplicações concretas) e de aumento progressivo da modificabilidade resulta no que Augusto Comte chamava de “fatalidades modificáveis”

6.3.7.     Também é importante notar que o conhecimento das leis naturais não é um capricho filosófico, moral, intelectual; além de ser uma questão de economia mental (isto é, de redução de esforços), as leis naturais necessariamente têm que nos conduzir à previsão da realidade, de modo a sabermos o que ocorrerá para melhorarmos a realidade e/ou evitarmos problemas; em outras palavras, trata-se de aplicar de maneira decisiva o critério da utilidade à mera realidade, conforme a máxima “saber para prever a fim de prover

6.3.8.     Os decretos metafísicos contra as leis naturais humanas, tachando-as de “deterministas” e/ou de inúteis, fazem questão de ignorar o que é a liberdade humana, o que são as leis naturais em termos estáticos, o que são as leis naturais em termos dinâmicos e quais as utilidades das leis naturais

6.3.9.     Uma última observação preliminar sobre as leis naturais humanas: enquanto as ciências inferiores, da Matemática à Biologia, produzem tecnologias como aplicações práticas, as ciências superiores (a Sociologia e a Moral) produzem artes de aconselhamento, resultando na política, na pedagogia e na prática terapêutica

6.3.9.1.           As artes de aconselhamento das ciências superiores baseiam-se na separação entre os dois poderes, na dignidade humana, no altruísmo, na fraternidade, no resoluto pacifismo, na noção de deveres; em outras palavras, são aconselhamentos baseados na liberdade, no respeito ao ser humano, na rejeição da violência e na rejeição da tecnocracia

6.4.   Passando enfim a cada uma das leis dos três estados: a lei intelectual dos três estados estabelece que a compreensão dos fenômenos atravessa três fases: teológica, metafísica e positiva, com uma velocidade proporcional à generalidade dos fenômenos correspondentes

6.4.1.     Isso significa dizer que todas as concepções humanas começam teológicas e terminam positivas, passando por uma fase intermediária, que é meio teológica e meio positiva

6.4.2.     Uma outra forma de apresentar essa lei é afirmar que todas as concepções humanas começam absolutas e terminam relativas

6.4.3.     A velocidade da passagem da teologia para a positividade depende da generalidade da concepção estudada: concepções, ou fenômenos, mais gerais, mais amplos, tornam-se positivos mais rapidamente; fenômenos mais restritos, ou mais complicados, demoram mais

6.4.4.     Abordamos essa lei quando, em 23 de São Paulo de 170 (11.6.2024), fizermos a prédica sobre a generalidade filosófica como quarto estado; naquela ocasião, nosso amigo Hernani fez uma observação muito importante: Augusto Comte elaborou a lei intelectual dos três estados inicialmente como uma descrição histórica sumária; depois tratou de determinar seus mecanismos sociais e intelectuais internos, demonstrando e deduzindo suas diversas fases; finalmente, nosso mestre desenvolveu seus procedimentos subjetivos e seus resultados morais profundos

“Em sua primeira fase, mais objetiva, Augusto Comte havia formulado a lei dos três estados a partir das produções exteriores da Humanidade. Ela é então uma apresentação eminentemente histórica e empírica. A teologia, a metafísica e a ciência são aí oferecidas como sinais empíricos reveladores dessa passagem íntima.

Na segunda de suas fases, progressivamente subjetiva, a formulação de Augusto Comte enuncia a mesma lei considerando antes o caráter interno de cada estado, ou seja, o caráter lógico inerente de cada um deles. Então se tratou de revelar o caráter fictício das construções da teologia, o caráter abstrato das especulações metafísicas e o caráter positivo das leis da ciência.

A morte privou Augusto Comte de uma terceira formulação da lei da evolução intelectual, na qual o conjunto do Positivismo já pudesse ser apresentado como livre dos últimos vestígios do cientificismo, o que já havia ocorrido a partir do quarto volume da Política positiva, de 1854, com a teoria subjetiva dos números, com a incorporação do fetichismo etc.”

6.4.5.     Isso é importante de indicar porque Augusto Comte começou a elaborar a lei intelectual entendendo que a terceira fase seria “científica”, em vez de “positiva”; ora, a cientificidade é importante, mas por si só ela é insuficiente, é fragmentária, é parcial, é afetivamente pobre e tende com escandalosa facilidade para o absolutismo; além disso, a concepção cientificista rejeita a noção de “religião”, que se torna assim sinônima da teologia

6.4.6.     Foi em virtude desses inúmeros e graves problemas que, após concluir a redação da Filosofia positiva e já sob o santo influxo de Clotilde, Augusto Comte percebeu que seria necessário avançar a classificação das ciências, ampliar a lei dos três estados, mudar a concepção de religião e aprofundar o caráter filosófico e moral do Positivismo: todas esses avanços foram entrevistos a partir de 1846, embora tenham sido formalizados aos poucos desde então até a morte de nosso mestre (com promessas claras de desenvolvimentos posteriores ainda maiores)

6.4.7.     O resultado dessas mudanças todas foi a própria concepção de religião como sujeita à lei dos três estados, em que a teologia foi apenas uma forma, preliminar mas superada, de religião – e em que a religião é a disciplina geral da existência humana, com vistas à harmonia coletiva e individual

6.4.8.     É importante notar que a seqüência da lei intelectual dos três estados estabelece etapas sucessivas, isto é, fases que se sucedem e que não voltam: o relativismo sucede o absolutismo e deixa este para trás

6.4.9.     As fases superadas devem ser conhecidas, respeitadas e, na medida do possível, terem seus materiais positivados; mas não se deve empregá-los pura e simplesmente como eram empregados nas épocas de seus apogeus: essa aplicação acrítica é prejudicial, irracional e imoral

6.4.10. Também é importante indicar que a lei intelectual dos três estados é uma lei da subjetividade humana, considerando que se trata da evolução das formas de interpretação (subjetiva) da realidade

6.5.   A lei prática dos três estados estabelece que a atividade humana é primeiro militar conquistadora, depois militar defensiva e finalmente pacífica e industrial

6.5.1.     Essa fórmula considera a guerra conquistadora, não a guerra de extermínio

6.5.2.     A passagem das guerras de conquista para as de defesa ocorreu várias vezes ao longo da história; mas a transição final para a sociedade pacífica e industrial é mais difícil e exigiu a transição específica ao Ocidente

6.5.3.     A sociedade pacífica e industrial é aquela em que a violência é substituída pelas atividades pacíficas, seja como parâmetro de regulação geral, seja como procedimento para obtenção e geração de riquezas

6.5.4.     A sociedade pacífica e industrial baseia-se, então, na liberdade e na dignidade universal, especialmente dos trabalhadores, com pátrias – ou melhor, mátrias – pequenas, com responsabilidade individual e coletiva, confiança compartilhada e fraternidade universal

6.5.5.     Assim como no caso da lei intelectual, a lei prática dos três estados estabelece uma seqüência de fases sucessivas, ou seja, de fases que se sucedem e não voltam: a atividade militar defensiva sucede à fase militar conquistadora (ao ter sido preparada por esta); da mesma forma, a fase pacífica e industrial sucede à fase militar defensiva (tendo sido preparada por esta)

6.6.   A última lei dos três estados é a afetiva, referente aos âmbitos de sociabilidade: a sociabilidade é primeiro na família, depois nas pátrias e finalmente na Humanidade

6.6.1.     Essa lei também aceita uma interpretação puramente empírica e histórica e, em seguida, uma interpretação biológica e moral:

6.6.1.1.           Por um lado, de fato, as sociedades humanas cresceram ao longo dos milênios das associações familiares (e familistas) para as pátrias (cada vez maiores) e daí para a concepção e a prática da Humanidade

6.6.1.2.           Por outro lado, família, pátria e Humanidade são os três graus fundamentais da sociabilidade humana; eles baseiam-se nos três instintos altruístas (veneração, apego e bondade) e seus fundamentos referem-se às três partes da natureza humana (sentimentos, atividade prática e inteligência)

6.6.2.     Ao contrário das duas outras leis, a lei afetiva dos três estados apresenta um funcionamento interno diferente, pois ela permite e exige a acumulação de cada uma das três etapas: as mátrias não anulam as famílias, assim como a Humanidade não anula as mátrias; a Humanidade mantém e requer as mátrias, assim como estas mantêm e requerem as famílias

7.      Invocação final

 

Referências

- Augusto Comte (franc.), Sistema de filosofia positiva (Paris, Société Positiviste, 5e ed., 1893)

- Augusto Comte (franc.), Sistema de política positiva (Paris, L. Mathias, 1851-1854)

- Augusto Comte (port.), Apelo aos conservadores (Rio de Janeiro, Igreja Positivista do Brasil, 1898): https://archive.org/details/augustocomteapeloaosconservadores.

- Augusto Comte (port.), Catecismo positivista (Rio de Janeiro, Igreja Positivista do Brasil, 4ª ed., 1934)

- Gustavo Biscaia de Lacerda (port.): Prédica positiva “Síntese subjetiva e relativa como quarto estado” (Curitiba, Igreja Positivista Virtual, 11.6.2024): https://filosofiasocialepositivismo.blogspot.com/2024/06/sintese-subjetiva-e-relativa-como.html.

- Raimundo Teixeira Mendes (port.), As últimas concepções de Augusto Comte (Rio de Janeiro, Igreja Positivista do Brasil, 1898): https://archive.org/details/raimundo-teixeira-mendes-ultimas-concepcoes-de-augusto-comte-i e https://archive.org/details/raimundo-teixeira-mendes-ultimas-concepcoes-de-augusto-comte-ii.

- Raimundo Teixeira Mendes (port.), O ano sem par (Rio de Janeiro, Igreja Positivista do Brasil, 1900): https://archive.org/details/raimundo-teixeira-mendes-o-ano-sem-par-portug._202312/page/n7/mode/2up.