Todos aqueles que afirmam que a fórmula "ordem e
progresso" busca limitar o progresso à ordem são incapazes de definir o
progresso, em particular para além da definição geral de Condorcet, para quem o
progresso é desenvolvimento contínuo, permanente e infinito. O "ordem e
progresso" estabelece, ao contrário, as condições e as possibilidades do
progresso, dizendo com clareza exatamente em que ele consiste. Em outras
palavras, o "ordem e progresso" tira a idéia de progresso da vagueza
e, portanto, da metafísica; ao contrário, quem rejeita essa fórmula em nome do
progresso indefinido é simplesmente incapaz de entender a ordem de outra
maneira que não como sendo "despotismo" ou "autoritarismo".
Há também a possibilidade de rejeitar-se o "ordem e
progresso" devido a uma rejeição do próprio progresso, seja porque há um
apego à ordem, seja porque se nega a idéia de progresso. Quem se apega à ordem
já foi retrógrado, atualmente é reacionário; bem vistas as coisas, nos dias de
hoje são relativamente poucos grupos que rejeitam qualquer progresso: por vezes
limitam as ambições de outros grupos em um ou outro aspecto e o mais das vezes
desejam limitar o desenvolvimento ao que já se obteve: esses poderiam ser
denominados de "reacionários" ou "conservadores". Os grupos
atuais que têm um caráter especificamente retrógrado são, não por acaso, os
teológicos, majoritariamente cristãos, muçulmanos e até judeus.
Já os que rejeitam a idéia de progresso não são necessariamente
retrógrados, no sentido de rejeitarem melhorias: antes, são irracionalistas, que
rejeitam a concepção de "leis sociológicas" e que consideram que a
história humana consiste apenas e tão-somente de "som e fúria", de
choques permanentes e infinitos entre os grupos humanos. Esse tipo de
raciocínio freqüentemente é metafísico e, não por acaso, também com freqüência
é possível determinar suas origens teológicas, tão próximas ao misticismo e à
metafísica alemã. Se a vida é apenas choque permanente, além de não ser
possível determinar sentido algum nesta vida, o máximo que se pode almejar em
termos coletivos é a vida política e, em particular, a política do poder – em
outras palavras, egoísmos coletivos, guerras e dominação de todos sobre todos.
(Reprodução permitida, desde que citada a fonte.)