Hino ao Amor
(Raimundo Teixeira Mendes)
(Ensaio de uma paráfrase positiva do cap. V, livro 3º, da Imitação, de Tomás de Kempis, segundo a tradução em verso de Corneille.)
Ave! Cara Humanidade!
Virgem-Mãe! Nossa Senhora!
Fonte de toda bondade
Que nossa alma entesoura!
Terna e humilde Divindade
Que tudo no mundo adora!
Sempre os olhos compassivos
Postos em nós com brandura,
Nos transes mais aflitivos
Com que a dor nos amargura,
Nos trazes os lenitivos
Da tua infinita ternura.
Te sejam dadas mil graças,
Oh! Mãe de misericórdia,
Que nossas almas congraças,
Em tua eterna concórdia,
Serenando as ameaças
Do egoísmo em discórdia.
Ora e sempre os teus louvores
Não cessarão de arroubar-nos,
Rememorando os favores
Que nunca deixam de dar-nos
Teus carinhos, teus amores,
Para felizes tornar-nos.
Por ti se expande fervente
Da gratidão alma essência,
À Terra beneficente,
Cuja perene assistência
Forma a base providente
De tua excelsa existência.
A mesma santa homenagem
Nos recorda jubilosa
Do Sol a possante imagem,
Da Lua a face mimosa,
E a celeste linhagem
Da nossa Terra amorosa.
E nesse ditoso enleio
Do sentir alto e fecundo,
Também ao benigno Meio
Que te envolve e ao nosso Mundo
Se eleva do nosso seio
Um grato afeto profundo.
Vem! Oh! Vem! Deusa querida,
Virgem-Mãe! Nossa Senhora!
Exultar a nossa vida,
Alentando em cada hora
A nobre chama acendida
Nesse amor que te devora.
És tu só a nossa glória
E toda a nossa alegria!
Só arrimo da vitória
Nas lutas que a simpatia
Nesta vida tormentória
Tem de travar noite e dia.
Com a meiga solicitude
Socorre a fragilidade
Da nossa pobre virtude,
E com a doce potestade
O nosso amor tíbio e rude
Sustém na adversidade.
Visita freqüentemente
Nosso filial coração,
Pois és tu unicamente
Quem lhe traz consolação,
Quem lhe ensina eternamente
Os verbos da perfeição.
Das más paixões nos liberta
Com tua grata presença;
Ela só o amor desperta
Esvaindo a névoa densa
Que nossa mente acoberta,
Nos velando a santa crença.
Só assim serão sentidos
Enlevos do puro amor!
Santos gozos espargidos
Por teu sublime esplendor!
Almos prazeres hauridos
No teu contínuo labor!
Deusa de amor, nos abrasa
No teu afeto sublime;
Desse gelo que atenaza
Com teu fervor nos redime:
Dá que somente nos praza
Santo ardor que mal s’exprime.
Na tua alma extremosa
A nossa pobre incorpora;
E dilata caridosa
Um coração que te implora
Vastidão mais espaçosa
Para conter-te, Senhora.
Dá que encontremos suplícios
No que não for te adorar;
Que se abram só precipícios
Onde quer que se afastar
De teus bondosos auspícios
Nosso contínuo pensar.
Jamais seja o esforço falho
No teu bendito labor:
E, qual o fecundo orvalho
Que perfuma a grata flor,
Se torne o nosso trabalho
Num puro hino de amor!
E seja um concerto infindo
De perenal gratidão
Em tudo que produzindo
For da Terra a perfeição,
Em tudo que for surgindo
Do Espaço pela amplidão.
Dá, oh! Mãe estremecida,
Que tudo em ti adoremos;
Qu’em ti nossa alma embebida,
Mais a ti que a nós amemos;
Que só por ti redimida,
A própria vida prezemos.
Tal é o voto contín’o
Dum coração que se deu
Ao teu serviço divino,
Sem nada guardar de seu;
Que não tem outro destino
Senão o que tenhas por teu.
Bendita a Fé que só nos
dá de amar assim
Desde
o raiar da vida até da vida o fim.