No dia 23 de Dante de 170 (6.8.2024) retornamos das férias e retomamos as prédicas positivas, com a leitura comentada do Catecismo positivista, em sua duodécima conferência, dedicada à exposição da evolução histórica do desenvolvimento humano e das religiões (tratando em particular do fetichismo e do politeísmo).
Na parte do sermão abordamos a Revolução Francesa, especialmente a interpretação sociológica, intelectual e moral desse grande evento.
Antes do sermão indicamos as efemérides ocorridas durante as nossas férias, no mês de Dante.
A prédica foi transmitida nos canais Positivismo (aqui: https://l1nq.com/pOEvx) e Igreja Positivista Virtual (aqui: https://l1nk.dev/VmAjo).
As anotações que serviram de base para a exposição oral estão reproduzidas abaixo.
Os horários da prédica são os seguintes:
00 min 00 s - início da prédica
3 min 44 s - exortações iniciais
22 min 18 s - efemérides
32 min 28 s - leitura comentada do Catecismo positivista
57 min 43 s - sermão sobre a Revolução Francesa
2 h 13 min 43 s - término da prédica
* * *
Sobre a Revolução Francesa
(23.Dante.170/6.8.2024)
1. Início
2. Exortações
iniciais:
2.1.
Sejamos
altruístas!
2.2.
Façamos
orações!
2.3.
Façam
o Pix da Positividade!
2.3.1. Chave pix:
ApostoladoPositivista@gmail.com
3. Efemérides:
3.1. 8.Dante
(22.7): 201 anos de nascimento de Georges Audiffrent (1823)
3.2. 13.Dante
(27.7): 150 anos de nascimento de João David Pernetta (1874)
3.3. 15.Dante
(29.7): 800 anos de nascimento de Joinville (1224)
3.4. 16.Dante
(30.7): 500 anos de nascimento de Camões (1524)
3.5. 20.Dante
(3.8): 34 anos da transformação de David Antônio da Silva Carneiro (1990)
3.6. 26.Dante
(9.8): 300 anos de nascimento de Klopstock (1724)
3.7. 27.Dante
(10.8): 200 anos da transformação de Byron (1824)
3.8. 27.Dante
(10.8): 107 anos da transformação de Miguel Lemos (1917)
3.9. 28.Dante
(11.8): 51 anos da transformação de Luís Hildebrando de Horta Barbosa (1973)
3.10.
12 a 28 de Dante (26.7 a 11.8): Olimpíadas de
Paris
4. Leitura
comentada do Catecismo positivista:
duodécima conferência, dedicada à evolução histórica da religião, em particular
com o fetichismo e com o politeísmo
5. Sermão:
sobre a Revolução Francesa
5.1. Esse
tema foi sugerido por um novo adepto e também pelas Olimpíadas de 2024, que se
realizam atualmente em Paris e que apresentaram, em sua abertura, referências à
Revolução
5.1.1. A mascote
das Olimpíadas, nesse sentido, é o barrete frígio, chamado no evento de “Frige”
(“Phryge”), na versão comum e na
versão para-olímpica
5.1.2. O barrete
frígio tornou-se o símbolo tanto da Revolução Francesa quanto, por extensão,
dos revolucionários, dos jacobinos e dos republicanos
5.1.3. O barrete
frígio é um chapéu vermelho com abas na frente das orelhas e uma ponta acima da
cabeça; ele é “frígio” porque teve origem na Frígia, que é uma região no centro
da Turquia
5.1.3.1.
Desde o início da Revolução ele foi recuperado e
adotado pelos sans-culottes, isto é,
pelo comum do povo
5.2. Neste
sermão não nos ocuparemos das várias fases da Revolução nem das suas personagens
5.2.1. Isso não
se deve a que as fases e as personagens não sejam importantes – bem ao contrário
–, mas porque o que nos interessa aqui é o exame sociológico, político, filosófico
e moral da Revolução
5.2.2. Vale notar
que Augusto Comte e os positivistas sempre deram grande atenção à Revolução, às
suas fases e às suas personagens
5.2.2.1.
Augusto Comte dedicava grande atenção em particular
à fase da Convenção Nacional (1792-1795) e elogiava muito Danton e seu grupo
5.2.2.2.
Augusto Comte tratou longamente da Revolução:
5.2.2.2.1.
Nos opúsculos de juventude (por exemplo, na Sumária apreciação do conjunto do passado
moderno, de abril de 1820, e no Plano
dos trabalhos científicos necessários para reorganizar a sociedade, de
abril de 1822-1824)
5.2.2.2.2.
Nos capítulos históricos da Filosofia positiva (lição 55, do v. V, e lições 56 e, principalmente, 57, do v. VI) (1841 e
1842)
5.2.2.2.3.
No Discurso
preliminar sobre o conjunto do Positivismo (segunda e terceira partes) (1848,
1851)
5.2.2.2.4.
No v. III da Política
positiva (especialmente o cap. 7) (1853)
5.2.2.3.
Os positivistas, especialmente os franceses,
também trataram muito da Revolução:
5.2.2.3.1.
Pierre Laffitte: A Revolução Francesa
5.2.2.3.2.
Dr. Robinet: Dicionário
da Revolução Francesa, Memória sobre
a vida privada de Danton, Condorcet, Movimento religioso durante a Revolução, O processo dos dantonistas etc.
5.2.2.4.
Augusto Comte também incluiu na Biblioteca Positivista
a obra História da Revolução Francesa,
de François Mignet (1824)
5.3. No
âmbito do Positivismo, a Revolução Francesa é importante (1) como culminação de
um amplo processo histórico, (2) como um evento específico e, a partir dessas
referências, (3) como início de uma nova era
5.3.1. Além
disso, como indicaram alguns sociólogos, a Revolução Francesa é o evento que
(4) estimula a fundação da Sociologia e, nesse sentido, a fundação do
Positivismo
5.3.2. Vale notar
que a interpretação positivista é – como, aliás, de resto, todas as interpretações
positivistas – “multidimensional”, abarcando aspectos políticos, sociais,
intelectuais e morais
5.3.3. As concepções
positivistas sobre a Revolução Francesa – seja pela importância que a Revolução
tem para o Positivismo, seja pelos amplos desenvolvimentos teóricos (sociológicos,
políticos, morais), seja pelos amplos desenvolvimentos historiográficos – valem
por si sós, não devem nada a ninguém e podem e devem ser levadas extremamente a
sério
5.3.3.1.
Em contraposição à amplitude moral, intelectual
e prática das concepções positivistas sobre a Revolução, ao longo do século XX afirmaram-se
e tiveram fama outras perspectivas mais restritas e menos generosas:
5.3.3.1.1.
O marxismo, com uma interpretação ao mesmo tempo
economicista e centrada nas disputas políticas
5.3.3.1.1.1.
Apesar das evidentes e enormes limitações morais
e intelectuais próprias ao marxismo, ele tem o mérito de entender a Revolução
em um sentido histórico mais amplo, ultrapassando o estrito contextualismo
historiográfico liberal
5.3.3.1.1.2.
Muito da interpretação marxista do século XX
dedicou-se a entender a Revolução Francesa como um prenúncio – e, daí, como uma
justificativa – da Revolução Russa de 1917
5.3.3.1.2.
O liberalismo, com uma interpretação
estritamente política, ou melhor, politicista
5.3.3.1.2.1.
Um dos grandes nomes do revisionismo liberal, de
corte politicista, foi François Furet, para quem se deve entender a Revolução
estritamente em termos políticos e (ultra)contextualistas, ou seja, desprezando o entendimento sociológico mais
amplo
5.3.3.1.2.2.
Embora corretamente criticando a justificativa
da Revolução Russa, o fato é que esse revisionismo liberal empobrece e degrada
a interpretação histórica, sociológica, intelectual e moral mais ampla da Revolução
Francesa – chegando ao ponto de criticar a República e de justificar a
monarquia! (Por exemplo, a colega de Furet, a historiadora Mona Ozouf, em Varennes, a morte da realeza (Companhia
das Letras, 2009))
5.4. Como
indicamos acima, a Revolução Francesa é a culminação de um amplo processo
histórico; esse processo corresponde ao que Augusto Comte chamava de “duplo
movimento moderno”, que, por sua vez, é a etapa final da tripla transição
ocidental
5.4.1. A tripla
transição ocidental é o multimilenar processo de desenvolvimento das
características humanas realizado no Ocidente, em que, após o rompimento da
ordem estacionária e conservadora das teocracias, o Ocidente desenvolveu
sucessivamente os aspectos vinculados à inteligência (na Grécia), à atividade
prática (em Roma) e aos sentimentos (na Idade Média)
5.4.2. Após a
tríplice transição ocidental, com o desenvolvimento das características da
natureza humana, ocorrido sob a teologia, passa a ocorrer a transição do
absolutismo para o relativismo, com a decomposição do antigo regime (teológico,
militarista) e a constituição da nova sociabilidade (positiva, pacífica)
5.4.2.1.
Assim, embora a explosão revolucionária tenha
ocorrido especificamente na França, o amplo movimento social, político,
filosófico e moral de que ela foi ao mesmo tempo o clímax e uma etapa é um
movimento plenamente ocidental, ou seja, supranacional
5.4.2.2.
Além disso, devido aos seus fundamentos e às
suas implicações, não apenas é supranacional e, nesse sentido específico, é
civilizacional, como, de maneira mais ampla, é também um acontecimento
universal
5.4.2.3.
Da mesma forma, na medida em que o Positivismo é
a realização dos mais nobres ideais da Revolução – ideais que não puderam e que
não conseguiriam realizar-se durante a Revolução –, o Positivismo assume com
clareza uma significação universal, que se realiza clara, explícita e
conscientemente nas elaborações de Augusto Comte (daí resultando, aliás, muito
do ódio nutrido contra o Positivismo por seus adversários, como os reacionários
teológicos, como os reacionários metafísicos (idealistas e liberais), como os revolucionários
metafísicos (marxistas, por exemplo) e outros)
5.4.3. Nos termos
de Pierre Laffitte (A Revolução Francesa, p. 9), a Revolução Francesa foi uma “crise social”, no
sentido de que foi um esforço abortado,
pois, do lado negativo, destruiu o Antigo Regime, mas, do lado positivo, apenas
se propôs o problema e algumas bases, sem que a questão tenha sido de fato
resolvida
5.4.3.1.
O resultado disso foi que a Revolução Francesa,
por mais importante e gloriosa que tenha sido, também foi incompleta (Laffitte
afirma que seu desenvolvimento foi “vicioso”)
5.4.3.2.
Mas, de qualquer maneira, desde 1789 a crise era
tanto inevitável quanto indispensável:
5.4.3.2.1.
Por um lado, ela evidenciou a caducidade do
Antigo Regime, que mantinha instituições desacreditadas e que impedia o
desenvolvimento humano
5.4.3.2.2.
Por outro lado, ela também evidenciou os
elementos e as exigências do novo sistema
5.4.3.2.3.
Além disso, ela também evidenciou que e o quanto
os princípios críticos (metafísicos, isto é, voltairianos e rousseaunianos) são
incapazes e incompetentes para reorganizar a sociedade
5.4.3.3.
Augusto Comte (Política, I, p. 66 – Discurso
preliminar, segunda parte, “Destinação social do Positivismo”) indica que o
desenvolvimento efetivo da doutrina construtiva só foi possível a partir do
impulso revolucionário (o que, por outro lado, significa que a doutrina
construtiva teve que se basear na doutrina negativa)
5.4.4. No trecho
abaixo (Política, I, p. 85 – Discurso preliminar, segunda parte, “Destinação social do Positivismo”), Augusto
Comte resume o sentido da Revolução e – mais importante – indica que o programa revolucionário mantém-se: “É
assim que a extensão total da grande crise põe em plena evidência o verdadeiro
caráter geral já assinalado pelo exame direto de sua natureza central. Todas as
altas considerações sociais, tanto exteriores quanto interiores, concorrem
então para provar que a segunda parte da revolução deve sobretudo consistir em
reconstruir, em todo o Ocidente, os princípios e os hábitos, de modo a
constituir uma opinião pública cuja irresistível preponderância determina em
seguida a formação gradual das instituições políticas convenientes a cada
nacionalidade, sob a comum presidência do poder espiritual que terá dignamente
elaborado a doutrina fundamenta. O espírito geral dessa doutrina é
principalmente histórico, enquanto a parte negativa da revolução deveu fazer
prevalecer um espírito anti-histórico. Um ódio cego para com o passado era
então indispensável para sair energicamente do antigo regime. Doravante, ao
contrário, nossa inteira emancipação exige inicialmente que rendamos a todo o
passado uma completa justiça, que se tornará o tributo mais característico do
verdadeiro espírito positivo, único suscetível hoje de uma tal aptidão,
conforme sua natureza sempre relativa. O melhor sinal da verdadeira
superioridade consiste, sem dúvida, para as doutrinas como para as pessoas, em
bem apreciar todos os seus adversários”.
5.4.5. A
decomposição do antigo regime é espontânea nos séculos XIV e XV (com a
emancipação cada vez mais aguda da teologia e o desenvolvimento das atividades
pacíficas) e torna-se sistemática nos séculos XVI, XVII e XVIII (com o
protestantismo, as guerras de religião, o Iluminismo e a independência das
colônias)
5.4.5.1.
Durante a decomposição espontânea, o antigo
sistema foi atacado pelas bordas; na decomposição sistemática, ele passou a ser
atacado no seu conjunto e cada vez mais no seu âmago
5.4.6. A
constituição da nova sociabilidade é concomitante à decomposição do antigo
regime, pois os agentes são com freqüência os mesmos nos dois casos: as antigas
comunas livres tornam-se centros da atividade industrial (isto é, pacífica), a
ciência desenvolve-se cada vez mais, minando as bases filosóficas e morais das
antigas crenças, ao mesmo tempo que apóia e estimula as atividades pacíficas
5.4.7. Esses dois
processos intensificaram-se cada vez mais; no século XVIII a afirmação e a
proposição da nova sociabilidade ocorria com clareza
5.4.8. A França
era o centro da Europa ocidental, tanto em termos geográficos quanto,
principalmente, morais e filosóficos
5.4.8.1.
A essa centralidade francesa somava-se também o
fato de que a monarquia francesa era a mais centralizada e a que mais
concentrava as contradições do antigo regime (apoio às forças progressistas,
manutenção das forças conservadoras e retrógradas)
5.4.8.2.
As tensões sociais, políticas e filosóficas
aumentavam cada vez mais na França, resultantes de processos que vinham dos
séculos anteriores e que no século XVIII tornaram-se bastante agudas
5.4.8.3.
Dessa forma, a situação social, política,
filosófica, moral e até econômica da França conduzia-a cada vez mais para uma
crise, que irrompeu afinal em 1789 (ou melhor, em 1788)
5.4.8.4.
Como indicamos antes, o sentido da Revolução
Francesa, portanto, não foi apenas o de uma alteração de regime político; não
por acaso, ela terminou o “antigo regime”, ou seja, a ordem própria à Idade
Média, à ordem absoluta, teológico-militar (católico-feudal, de modo mais
específico), e inaugurou a ordem moderna, relativa, positivo-pacífica
5.4.8.4.1.
Em outras palavras, a Revolução Francesa tem um
significado amplamente histórico e não somente ocidental, mas verdadeiramente
universal
5.4.8.4.2.
Quem reduz a Revolução Francesa apenas aos seus
movimentos políticos e sociais, esvaziando seu conteúdo sociológico mais amplo,
na verdade tem uma percepção reduzida da história da Humanidade e não entende
os amplos processos sociais, políticos e filosóficos envolvidos
5.4.9. Esse é o
relato sumário da filosofia da história positivista, ou melhor, da Sociologia
Dinâmica; esse relato está exposto e desenvolvido cada vez mais, de maneira
clara, ao longo de toda a carreira de nosso mestre
5.4.10. É
a partir dessa interpretação que Augusto Comte observa que a república (e o
republicanismo), derivada política e logicamente da Revolução, tem duas partes
conexas:
5.4.10.1.
Por um lado, o aspecto negativo, que é o fim da monarquia
5.4.10.2.
Por outro lado, o aspecto positivo, que é a sociedade agindo em benefício do bem comum
5.5. Os
aspectos específicos, conjunturais, da Revolução Francesa são subordinados ao
seu desenvolvimento histórico mais amplo (essa é uma outra forma de dizer que o
relato historiográfico subordina-se à explicação sociológica)
5.5.1. Embora os
acontecimentos contextuais subordinem-se aos constrangimentos sociológicos,
eles têm sua “autonomia”, na medida em que os agentes concretos atuam com e
pensam com suas próprias cabeças
5.5.2. Uma outra
forma de entender isso é que os agentes concretos, além de representarem e
implementarem (consciente e inconscientemente) escolas filosóficas e programas
políticos específicos, também tomam decisões conforme os diversos momentos a
partir de seus caracteres – o que pode conduzir as conjunturas para o sucesso,
para o fracasso ou para situações intermediárias
5.5.2.1.
Como indicamos antes, Augusto Comte recomendava
a História da Revolução Francesa, de
François Mignet, para conhecer-se os vários acontecimentos do período (esse
livro, que está na Biblioteca Positivista, foi traduzido e publicado por
positivistas paulistas em 1898)
5.5.2.2.
Também como indicamos antes, muitos positivistas
escreveram muito sobre a Revolução Francesa; por exemplo, Pierre Laffitte e,
ainda mais, o dr. Robinet
5.5.2.3.
Por outro lado, também vale notar que a
valorização da ação (ou da agência)
individual em contextos específicos criados pelos antecedentes sociológicos
revela-se nas avaliações feitas por nosso mestre da atuação de Danton, de Hoche
e de Napoleão
5.5.3. Augusto
Comte, no “Prefácio” ao v. III da Política
(p. XL) faz os seguintes comentários: “A história caracterizará sempre a
revolução francesa conforme o abalo radical de 1793, sem se deter no vago
prólogo de 1789, que aceitou então os diversos contra-revolucionários. Tornada
irrevogavelmente retrógrada desde a segunda metade do reinado de Luís XIV
[1661-1715], a realeza francesa sucumbiu definitivamente com Luís XVI, após um
século de putrefação crescente, que marcou um tal resultado. Jamais ela [a
monarquia] foi restabelecida depois, malgrado as diversas ilusões oficiais, em
que, tomando as palavras pelas coisas, esqueceu-se de que suas duas
características essenciais, a inviolabilidade e a hereditariedade, não
pertencem a nenhum de nossos ditadores sucessivos. Mas o empirismo universal
não sente suficientemente tal situação necessariamente republicana da França
senão depois da reversão da nossa última ficção monárquica [a chamada
“Monarquia de Julho”, 1830-1848]”.
5.5.4. Assim, conjunturalmente, a Revolução Francesa
eclodiu porque o Estado francês enfrentava grave crise financeira, decorrente
entre outros motivos do apoio francês à exitosa guerra de independência dos
Estados Unidos
5.5.5. Para fazer
frente às necessidades financeiras (e aumentar os impostos), o ministro das
finanças Necker foi obrigado em julho de 1788 a convocar os Estados Gerais, um
conselho geral da nação francesa; os Estados Gerais não eram convocados desde a
época de Richelieu, em 1614 (o que evidencia o despotismo); os Estados Gerais
eram organizados em três estados (ou três ordens): o clero; a nobreza; o
“terceiro estado” (os plebeus, ou seja, a burguesia e o proletariado urbano e
rural), todos presididos pelo rei
5.5.6. Devido à
pressão pública e à necessidade de legitimação, os Estados Gerais foram desde o
início abertos às demandas populares, o que tornou o evento explosivo; logo que
se iniciou a assembléia, as coisas saíram do controle do governo e assumiram
uma dinâmica própria
5.5.7. Esquematicamente,
as fases da Revolução são as seguintes: Assembléia Nacional Constituinte
(1788-1792); Convenção Nacional (1792-1795); Diretório (1795-1798)
5.5.7.1.
Na assembléia nacional o antigo regime foi
formalmente extinto e o rei foi submetido a um parlamento; na Convenção
Nacional a monarquia foi extinta, a República foi proclamada e os antigos
soberanos foram decapitados (por traição); no Diretório o ritmo revolucionário
diminuiu, a República manteve-se mas não se conseguiu manter o ímpeto nem ter
parâmetros para a reorganização social, resultando no golpe militar de
Napoleão, em 1798, com o consulado e, em 1802, com o Império
5.5.7.2.
O essencial da Revolução aconteceu, portanto, um
pouco na Assembléia Nacional e, principalmente,
na Convenção Nacional
5.5.8. Augusto
Comte determinou três grupos na
Revolução, dois deles mais metafísicos (destruidores) e um positivo (construtivo,
humano e positivo):
5.5.8.1.
Os voltairianos (a Gironda, da baixa burguesia,
liderada por Brissot), que destruíam o altar mas mantinham o trono;
5.5.8.2.
Os rousseaunianos (liderados por Robespierre),
que destruíam o trono mas mantinham o altar;
5.5.8.3.
Os dantonistas (herdeiros da Enciclopédia, ou
seja, de Diderot), que buscavam reorganizar a sociedade em bases positivas, sem
deus nem rei
5.5.8.4.
Os construtores foram precedidos por muitos
pensadores (Pierre Laffitte, A Revolução Francesa, p. 8):
5.5.8.4.1.
O grupo cosmológico:
Clairaut, D’Alembert, Monge, Lagrange, Laplace, Lavoisier, Guyton de Morveau,
Berthollet, Vicq-d’Azir, Buffon, Lamarck etc.
5.5.8.4.2.
O grupo sociólogo:
Montesquieu, Turgot, Condorcet, Quesnay, Gournay, Mirabeau pai etc.
5.5.8.4.3.
O grupo moral:
Diderot, D’Holbach, Georges Leroy, De Brosse etc.
5.5.8.4.4.
Além de, fora da França, Beccaria, Kant e, acima de todos, David Hume
5.5.8.5.
Enquanto os girondinos foram importantes durante
a assembléia nacional, os jacobinos (que combinavam os rousseaunianos e os
dantonistas) foram importantes durante a Convenção Nacional
5.5.8.6.
A Convenção Nacional foi a responsável pela
República; pelo fim das academias medievais; pela criação da Escola
Politécnica; pela defesa nacional e por muitos outros atos importantes
5.6. As
paixões, o ardor político popular, o choque entre grupos sociais, as mudanças
sociais, políticas, filosóficas – tudo isso abalou profundamente a Europa e
levou as gerações seguintes de pensadores a refletirem sobre a Revolução
Francesa
5.6.1. Exemplos
banais disso:
5.6.1.1.
A celebrização e a difusão da fórmula “Liberdade,
igualdade, fraternidade”
5.6.1.2.
A afirmação da “questão social”
5.6.1.3.
A extinção crescente da sociedade de castas (afirmada
e mantida pela monarquia e pela teologia)
5.6.1.4.
A difusão do republicanismo, seja como regime
político (formal), seja como princípio moral e político (de fundo)
5.6.1.5.
A criação e a difusão dos conceitos de “direita”
e “esquerda” (originários das divisões políticas e geográficas da assembléia
nacional)
5.6.1.6.
A constituição do pensamento político
conservador (Reflexões sobre a revolução
em França, de Edmund Burke) e reacionário (Do papa e Saraus de São
Petersburgo, de José de Maistre e Teoria
do poder político e religioso, de Luís de Bonald)
5.6.2. Assim, a
Revolução Francesa foi o acontecimento geral que exigiu a criação da
Sociologia; como argumentou corretamente nesse sentido Raymond Aron (As etapas do pensamento sociológico), a
Sociologia e o Positivismo foram a forma encontrada por Augusto Comte para
entender e explicar a Revolução Francesa e tirar lições e conseqüências dela
5.6.3. Uma
conseqüência muito clara, muito direta e muito frutífera que Augusto Comte
tirou da Revolução Francesa é, a partir dela, a dinâmica oscilante e oposta
entre os revolucionários e os retrógrados, ou entre a anarquia e a
retrogradação, ou entre a ordem e o progresso
6. Término da prédica