O dia 13 de maio é celebrado no Brasil como o da abolição da
escravidão. Por si só, sem dúvida alguma, isso deve ser celebrado e valorizado,
pois foi o momento em que no país finalmente se encerraram séculos da exploração
mais vil de seres humanos por outros seres humanos, em que uns eram propriedade
de outros. A escravidão no Brasil deu-se inicialmente contra os indígenas
autóctones e, depois, contra os africanos, que se tornaram imigrantes forçados.
Por outro lado, como também sabemos, a escravidão gerou
efeitos persistentes na sociedade brasileira, de que o racismo contra os negros
e a exclusão das populações descendentes dos antigos escravos são dois dos mais
graves. Isso se deve à própria escravidão mas, também, ao fato de que a sua
abolição, em 1888, não foi seguida por medidas públicas e privadas no sentido
de integrar os antigos escravos à sociedade nacional, com ensino público,
frentes de trabalho em condições dignas, moradias populares etc.
Ainda assim, é importante notar que a campanha abolicionista
desenvolveu-se ao longo da década de 1880 e envolveu os mais variados setores
da população brasileira, incluindo as elites, setores populares, ex-escravos,
membros da “nobreza” nacional.
Entre todos esses grupos, os positivistas tiveram papel destacado,
seguindo nesse sentido as orientações de Augusto Comte – fosse como favoráveis
à abolição imediata sem reparação para os donos de escravos, fosse como
favoráveis à incorporação social dos antigos escravos, fosse como cidadãos que
não admitiam entre suas fileiras donos de escravos: por exemplo, Miguel Lemos e
Teixeira Mendes, diretores da Igreja Positivista do Brasil, expulsaram de seu
grêmio donos de escravos que se recusavam a alforriar seus cativos.
Da mesma forma, o Positivismo celebra a independência do Haiti, na figura do "general de ébano", Toussaint de L'Ouverture.
Da mesma forma, o Positivismo celebra a independência do Haiti, na figura do "general de ébano", Toussaint de L'Ouverture.
Além disso, o também positivista Benjamin Constant Botelho
de Magalhães[1]
e Deodoro da Fonseca, respectivamente na qualidade de vice-Presidente e
Presidente do Clube Militar, recusaram em 1887, em nome da tropa, a usar o
Exército a perseguir os escravos fugitivos.
Em outras palavras, é indiscutível que a abolição por si só
foi um passo importantíssimo para o Brasil – mas, ainda assim, foi um passo
insuficiente, pois não foi seguido das necessárias medidas de valorização e de
integração social.
É exatamente como um esforço em favor da integração social
dos descendentes dos antigos escravos que os positivistas propuseram desde o
início da República a comemoração do dia 13 de maio. Na verdade, os positivistas
propuseram essa data como celebrando a integração não apenas dos negros, mas de
todos os elementos sociais e culturais da sociedade brasileira. Nessa utopia, não se contrapõem os "negros" contra os "brancos", mas eles unem-se e fundem-se, a fim de melhorar o Brasil, cada qual com suas características.
Assim, não deixa de ser motivo de profundo lamento que o dia
13 de maio não seja mais feriado nacional: essa perda de status dessa data
indica o quanto a integração e o universalismo não são mais valores nacionais,
cada vez mais substituídos pelos vários particularismos.
É claro que não
precisamos concordar com tais particularismos: é por isso que celebramos o
projeto de um país que respeite e valorize toda a sua população, com suas
particularidades entendidas como traços enriquecedores do patrimônio comum e
não como motivos para segregacionismos.
Cartaz gentilmente criado pelo amigo João Carlos Silva Cardoso. |
[1]
Que, alguns anos depois, foi o fundador da República Brasileira, no glorioso
movimento de 15 de novembro de 1889.