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05 novembro 2025

Polícia militaresca vs. polícia cidadã - e a Operação Contenção

No dia 28 de Descartes de 171 (4.11.2025) realizamos nossa prédica positiva, dando continuidade à leitura comentada do Apelo aos conservadores (iniciando o segundo capítulo, intitulado "Segunda parte - conduta dos conservadores em relação aos retrógrados").

No sermão abordamos a bárbara Operação Contenção e expomos a concepção positivista da polícia.

A prédica foi transmitida nos canais Positivismo (https://youtube.com/live/0hNz_BVQCMA) e Igreja Positivista Virtual (https://www.facebook.com/IgrejaPositivistaVirtual/videos/1127453342930098/). 

As anotações que serviram de base para a exposição oral encontram-se reproduzidas abaixo.

*    *   *


Polícia militaresca ou cidadã

(28 de Descartes de 171/4.11.2025) 

1.      Abertura da prédica

2.      Datas e celebrações:

2.1.   Dia 27 de Descartes (3.11): transformação de J.-F. E. Robinet (1899 – 126 anos)

3.      Leitura comentada do Apelo aos conservadores

3.1.   Antes de mais nada, devemos recordar algumas considerações sobre o Apelo:

3.1.1.O Apelo é um manifesto político e dirige-se não a quaisquer pessoas ou grupos, mas a um grupo específico: são os líderes políticos e industriais que tendem para a defesa da ordem (e que tendem para a defesa da ordem até mesmo devido à sua atuação como líderes políticos e industriais), mas que, ao mesmo tempo, reconhecem a necessidade do progresso (a começar pela república): são esses os “conservadores” a que Augusto Comte apela

3.1.2.O Apelo, portanto, adota uma linguagem e um formato adequados ao público a que se dirige

3.1.3.Empregamos a expressão “líderes industriais” no lugar de “líderes econômicos”, por ser mais específica e mais adequada ao Positivismo: a “sociedade industrial” não se refere às manufaturas, mas à atividade pacífica, construtiva, colaborativa, oposta à guerra

3.2.   Outras observações:

3.2.1.Uma versão digitalizada da tradução brasileira desse livro, feita por Miguel Lemos e publicada em 1899, está disponível no Internet Archive: https://archive.org/details/augustocomteapeloaosconservadores

3.2.2.O capítulo em que estamos é a “Segunda Parte”, cujo subtítulo é “Conduta dos conservadores em relação aos retrógrados”

3.3.   Passemos, então, à leitura comentada do Apelo aos conservadores!

4.      Exortações

4.1.   Sejamos altruístas!

4.2.   Façamos orações!

4.3.   Como Igreja Positivista Virtual, ministramos os sacramentos positivos a quem tem interesse

4.4.   Para apoiar as atividades dos nossos canais e da Igreja Positivista Virtual: façam o Pix da Positividade! (Chave Pix: ApostoladoPositivista@gmail.com)

5.      Sermão: polícia militaresca ou cidadã?

5.1.   A motivação do tema de hoje é bastante evidente: a ocorrência da chamada “Operação Contenção”, que ocorreu na semana passada, no dia 21 de Descartes de 171 (28.10.2025), contando com a atividade das “tropas de elite” da polícia militar do estado do Rio de Janeiro contra narcotraficantes de algumas favelas e que resultou em mais de 120 mortos

5.1.1.Além da agressividade em si da operação, salta aos olhos – e deveria ser chocante para todos os seres humanos – o comentário imediato do Governador do Rio de Janeiro, Cláudio Castro, que afirmou que, “com exceção da morte de quatro policiais, a operação foi um sucesso”

5.1.1.1.           Ainda outro aspecto que chama a atenção é o grande apoio recebido por essa execução – 57% da população fluminense concorda com a avaliação do Governador Cláudio Castro

5.1.2.Essa Operação policial exige inúmeras reflexões e uma cuidadosa e urgente apreciação positivista

5.1.2.1.           No que se refere ao Positivismo, essa Operação enseja reflexões não apenas sobre ela mesma mas também sobre várias críticas que sofremos, injustamente, da parte da esquerda – críticas que, bem vistas as coisas, estão intimamente relacionadas ao apoio maciço que a extrema direita e essa chacina receberam da população fluminense

5.1.2.1.1.                De maneira específica, as críticas que a esquerda dirige contra o Positivismo e que temos em mente originam-se das áreas da Criminologia (ou da Sociologia do Crime) e dos tratamentos de pessoas com distúrbios (que resultam na discussão sobre manicômios): em ambos os casos, independentemente do que Augusto Comte e os positivistas dizem (ou melhor, contrariamente ao que dizemos), autores de esquerda, ao tratarem do Positivismo, sempre nos acusam de sermos de “higienistas”, “discriminadores”, “defensores do status quo” etc.

5.1.2.1.2.                Esses autores de esquerda, assim, estipulam que os positivistas somos culpados mesmo que se prove o contrário; com isso, em vez de terem-nos como aliados em uma causa que nos é comum, estabelecem que somos inimigos a serem combatidos – o que, além de moralmente errado, é politicamente idiota

5.2.   Comecemos examinando rapidamente a afirmação do Governador e o apoio que ela recebeu da população

5.2.1.Afirmar que 121 mortos (dos quais 117 eram civis) representa um “sucesso” é uma noção aberrante, grosseira e brutal; na verdade, ter que afirmar e reafirmar o quanto essa frase é escandalosa é algo por si só terrível; quando falamos em “extrema direita”, em “direita fascista”, é exatamente nesse culto à violência e ao emprego político da violência sistemática que pensamos

5.2.2.Já a proporção de apoiadores dessa frase é muito grande e tem que ser avaliada: 57% é gente demais apoiando a chacina

5.2.2.1.           Uma das bases eleitorais do fascismo brasileiro está no Rio de Janeiro, o que explica parte do apoio dado à chacina; mas, ainda que se mantenha em níveis altos, o apoio ao fascismo tem declinado e arrisco que deve estar atualmente na faixa de 25% da população: ora, há aí uns 30% que não são necessariamente fascistas mas que apoiaram a chacina

5.2.2.2.           Esses 30% extras de apoiadoras da chacina não me parecem que sejam “de direita” ou necessariamente truculentos (embora sejam sensíveis à retórica e às ações violentas); parece-me que eles apóiam a frase do Governador porque são pessoas que sofrem com o crime e desejam que esse grave problema seja solucionado

5.2.2.3.           O maciço apoio dado à atuação policial da extrema direita tem a contrapartida no cansaço, na desilusão e, em última análise, na rejeição de muitas das concepções mais comuns da esquerda sobre a segurança pública – concepções que são desastrosamente erradas, pois estimulam os problemas e impedem suas soluções:

5.2.2.3.1.                Negação da falta de segurança pública como um problema real

5.2.2.3.2.                Afirmação de que a falta de segurança pública é um problema menor e/ou totalmente derivado de outros (em particular, mas não necessariamente, em comparação com os problemas de renda e/ou identitários)

5.2.2.3.3.                Afirmação de que toda ação policial é autoritária e/ou fascista

5.2.2.3.4.                Afirmação de que toda ação do Estado é autoritária e/ou fascista e/ou defensora do capitalismo

5.2.2.3.5.                Consideração de que todos os criminosos são injustiçados, que são criminosos porque o sistema (capitalista) condu-los à delinqüência e que, portanto, não devem ser tratados como criminosos mas como “vítimas”

5.2.2.3.6.                Estímulo e defesa ativa do consumo de drogas, visto como “revolucionário”, “progressista”, “libertador”

5.2.3.Essas várias concepções referem-se de modo geral à noção de que a defesa da ordem social é sempre a defesa do status quo, ou seja, é sempre a defesa da opressão, da exploração, da injustiça; inversamente, essas concepções sugerem ou afirmam que toda ação que combata o status quo seria revolucionária e progressista

5.2.3.1.           Essas concepções, cuja origem marxista é bastante evidente, com freqüência são aplicadas também contra o Positivismo (que seria defensor da ordem, autoritário etc. etc.)

5.2.3.2.           É claro que a ação policial e/ou estatal pode, sim, ser autoritária, fascista, opressora e discriminadora; mas pura e simplesmente considerar que isso sempre ocorre somente porque o Estado combate criminosos não apenas não resolve nenhum problema como piora os já existentes

5.2.3.3.           É também verdade que a pobreza, a falta de perspectivas de vida, a ausência de estímulos, a opressão, a falta de respeito – tudo isso estimula a criminalidade e dificulta a superação dos problemas –; tudo isso tem que ser levado em conta; mas, ainda assim, os crimes são problemas reais, que têm que ser tratados e solucionados

5.2.4.No caso da “Operação Contenção”, ao contrário do que enganosamente o seu nome sugere, o seu objetivo não era “conter” nada nem ninguém; embora ela tenha sido deflagrada para prender criminosos e tirar de circulação armamentos, dinheiro, drogas e produtos variados, a celebração do Governador Cláudio Castro evidenciou seu real objetivo: matar pobres e favelados na maior quantidade possível e apresentar a chacina como uma “vitória contra o narcotráfico”

5.2.4.1.           Aparentemente, muitos dos executados eram realmente criminosos; mas (1) não apenas muitos dos mortos não eram criminosos como, mais importante, (2) a solução da criminalidade passa pelo sistema de justiça, ou seja, pelo devido processo legal, com presunção de inocência, ampla defesa e contraditório, julgamento e, se for o caso, encarceramento

5.2.4.2.           A Operação Contenção ocorreu em área dominada pela milícia – ou seja, por policiais corruptos – que estava sendo disputada pelo Comando Vermelho

5.2.4.3.           Os fascistas repetem com prazer sádico a frase de Guilherme Godinho Ferreira (Deputado Sivuca), segundo a qual “bandido bom é bandido morto” – mas apenas se os bandidos forem pobres e favelados –; bandidos ricos, chefes políticos, especuladores financeiros, grandes empresários e grandes fazendeiros não são bandidos, não podem ser julgados e por definição não podem ser presos

5.3.   Agora que vimos rapidamente alguns dos principais motivos que levaram a maioria da população fluminense a apoiar a bárbara chacina, podemos passar à exposição de como o Positivismo encara todo esse problema

5.3.1.Há muitos aspectos a considerar nessa questão; talvez possamos começar indicando que Augusto Comte não tratou explicitamente do problema da criminalidade: em sua obra não há reflexões sobre o que se chama atualmente de “criminologia”

5.3.1.1.           Devido à extensão deste sermão, infelizmente não poderei tratar mais diretamente desse tema

5.3.2.Dizer que não há considerações sobre os crimes não é o mesmo que dizer que não há referências aos problemas sociais: mas, de maneira muito característica, os problemas considerados por nosso mestre eram os grandes problemas decorrentes da estrutura social: opressão, violência política, intolerância, perseguições políticas e religiosas, censura etc.

5.3.2.1.           Para Augusto Comte, não existe organização social perfeita, apenas as melhor (ou as menos pior) organizadas, considerando o conjunto da natureza humana e o estágio de desenvolvimento histórico

5.3.2.2.           Nesse conjunto, devemos ter a organização social que melhor satisfaça o ser humano (em termos coletivos e individuais) e que nos prejudique menos

5.4.   Devemos considerar alguns elementos da Sociologia Estática:

5.4.1.A primeira noção estática é a de “ordem”

5.4.1.1.           É importante tratarmos dessa noção, mesmo que brevemente, porque (1) o problema da segurança pública refere-se, precisamente, à ordem social e (2) as críticas que nos são dirigidas opõem de maneira dura e intransponível a ordem ao progresso

5.4.1.2.           As considerações de Augusto Comte sobre a ordem social são extensas e, ao longo de sua carreira, cada vez mais aprofundadas

5.4.1.3.           A partir do estudo do conjunto da obra de Augusto Comte, podemos identificar três grandes conceitos de ordem social:

5.4.1.3.1.                Um sentido bem geral, que é o que está subentendido no título do Sistema de política positiva, é a ordem social como organização geral da sociedade (no sentido que os ingleses dão à palavra polity)

5.4.1.3.2.                Em segundo lugar, a ordem é o conjunto de elementos que toda sociedade apresenta, próprios à estática social; no v. II da Política positiva nosso mestre identifica cinco desses elementos: religião, família, linguagem, governo (temporal e espiritual) e propriedade (ou capital)

5.4.1.3.3.                Por fim, a ordem significa a ordem social concreta de cada sociedade, que deve ser mantida pelo poder Temporal (ou seja, pelo Estado)

5.4.1.4.           Dito isso, devemos notar que as reflexões de nosso mestre sobre a ordem social são sempre – sempre! – feitas com as indicações de que a ordem social não é estática (embora abstratamente a noção de ordem exija uma abstração que a conduz a uma perspectiva estática), de que a ordem social deve orientar-se (ou considerar e abrir-se) para o progresso e, por fim, que a realização da verdadeira ordem é, por si só, necessariamente o progresso

5.4.1.5.           Além disso, basta ler-se diretamente nosso mestre – como, por exemplo, o Apelo aos conservadores – para perceber-se que a noção de ordem é sempre e necessariamente indicada em conjunto com outras noções: a íntima e necessária vinculação com o progresso, o respeito à dignidade humana, o respeito à liberdade, a autonomia relativa da moral

5.4.2.No âmbito da Sociologia Estática, passemos para a atuação do poder Temporal:

5.4.2.1.           Devemos lembrar que o poder Temporal é o poder que modifica a conduta humana de maneira objetiva, a partir da força física, modificando o comportamento dos corpos; o poder Temporal contrapõe-se ao poder Espiritual, que modifica a conduta humana de maneira subjetiva, a partir da educação e do aconselhamento, modificando as vontades, as idéias e as consciências

5.4.2.2.           Cabe ao poder Temporal, de maneira precípua, a manutenção da ordem social; ora, essa manutenção pode ser mais ou menos dura, mais ou menos violenta – ou, inversamente, mais ou menos pacífica, mais ou menos fraterna

5.4.2.2.1.                Quanto mais fraterna uma sociedade, ou seja, quanto mais uma sociedade leva a sério a fraternidade, o altruísmo, o respeito mútuo, a confiança e a responsabilidade mútuas, mais simples será a atividade do poder Temporal em termos de manutenção da ordem; países pequenos facilitam e melhoram essas condições

5.4.2.2.2.                Inversamente, quanto menos fraterna for uma sociedade, menos confiança e responsabilidade mútua haverá; assim, a atuação do Estado será mais dura e mais agressiva

5.5.   Passemos para alguns elementos históricos, ou seja, da Sociologia Dinâmica:

5.5.1.Em suas reflexões históricas, uma das grandes oposições esboçadas por nosso mestre consiste no contraste entre a sociabilidade antiga e a sociabilidade moderna

5.5.1.1.           Todas as críticas que podemos e devemos fazer em relação à truculência da Operação Contenção baseiam-se, em última análise, na oposição entre as duas formas de sociabilidade e, em particular, na valorização da sociabilidade moderna

5.5.1.2.           A “sociabilidade” refere-se às formas como as pessoas relacionam-se entre si e aos objetivos gerais das sociedades

5.5.1.3.           Os “antigos” são principalmente os antigos gregos e os antigos romanos, além de outros povos em situações sociológicas semelhantes; os “modernos” somos inicialmente os ocidentais e, a partir disso, os povos que são influenciados pelos hábitos e procedimentos que se desenvolveram depois da Idade Média

5.5.2.As características das duas sociabilidades foram indicadas por nosso mestre já tendo em vista a contraposição entre elas; essa contraposição é muito clara, direta e reveladora:

5.5.2.1.           A sociabilidade antiga baseava-se na guerra, ou seja, na violência sistemática, especialmente nas sociedades do politeísmo progressivo e do monoteísmo; os critérios de distinção social em tais sociedades eram militares (honra, coragem, força física); a conquista política e territorial tinha primazia sobre a produção econômica sistemática, que, não por acaso, era considerada como atividade subalterna e/ou degradante; a simplicidade das atividades militares tornava muito fácil a avaliação dos méritos individuais; o caráter militar dessa sociabilidade implica sempre que uma pátria dominará as demais, seja por meio de dominação direta, seja por meio de hegemonia (e hegemonia militar, em particular)

5.5.2.2.            A sociabilidade moderna é pacífica e industrial, baseada em relações fraternas, na liberdade e na dignidade humana; como as ações são complicadas, exigem a intermediação de inúmeros agentes e procedimentos, a avaliação dos méritos individuais é muito mais difícil; os méritos individuais e coletivos são mais variados mas também menos definidos; a riqueza é produzida de maneira compartilhada, seja entre indivíduos e classes, seja entre países; isso implica responsabilidade e confiança mútuas, da mesma forma que exige pátrias pequenas

5.5.2.3.           Na passagem da sociabilidade antiga para a moderna, a atuação do poder Espiritual aumentou cada vez mais – e essa aumento não é apenas um acidente histórico (que poderia ou não ocorrer), mas consiste em um traço necessário

5.5.2.3.1.                Em outras palavras, a política moderna deve consistir, necessariamente, em uma atuação maior e crescente do poder Espiritual em relação ao poder Temporal

5.5.3.Temos que ter clareza de que não adianta argumentar-se que a descrição fornecida por Augusto Comte da sociabilidade moderna é bastante idealizada: afinal, (1) a idealização é sempre necessária (tanto para o pensamento abstrato quanto para atividade política prática) e (2) as idealizações propostas por Augusto Comte estão, uma a uma, comprovando-se corretas e verdadeiras

5.6.   Aplicando os itens anteriores (noção de ordem, papel do poder Temporal, tipos de sociabilidade) à atuação da polícia, temos os seguintes resultados:

5.6.1.A política moderna deve caracterizar-se pela substituição dos exércitos pelas polícias, como conseqüência da substituição da atividade violenta e conquistadora pela atividade pacífica e industrial (ou seja, fraterna e produtiva)

5.6.1.1.           Até a modernidade, a ordem civil era mantida pelos exércitos, que, assim, tinham uma atuação dupla (interna e externa); mas como os exércitos servem para matar e destruir, sua atividade interna era (como é) sempre violenta

5.6.1.2.           A polícia é uma instituição moderna, dedicada à manutenção da ordem civil; em clara contraposição aos exércitos, a polícia não emprega prioritariamente a violência em suas atividades

5.6.1.2.1.                De maneira ideal e sintomática, a noção de polícia cidadã (e não violenta) foi proposta pelo Primeiro-Ministro inglês Robert Peel, em 1829, ao ele criar a Scotland Yard

5.6.2.Como conseqüência da mudança das sociabilidades, a atuação da polícia não pode ser militaresca, mas deve ser cidadã

5.6.2.1.           Para o Positivismo, explicitamente a noção de polícia cidadã inclui de maneira necessária o respeito à dignidade humana, o respeito às liberdades, a preservação da vida e do patrimônio

5.6.2.2.           Além disso, seguindo o caráter social de toda a sociocracia, as atividades da polícia cidadã devem zelar, proteger e buscar a prosperidade em particular do proletariado

5.6.2.3.           Evidentemente, o caráter cidadão da polícia implica que as ações violentas devem ser substituídas pelas chamadas “ações de inteligência”, ou seja, de investigação, sendo que as penalidades devem concentrar-se em aspectos educativos e com atuação temporal (ou seja, material)

5.6.3.Ora, ações como a Operação Contenção são percebidas como bárbaras porque, não por acaso, elas são retrógradas, porque elas implicam a aplicação atual de parâmetros velhos, arcaicos, que devem permanecer na lata do lixo ou no museu da história

5.6.3.1.           Os antigos (na verdade, até a Idade Média e até períodos posteriores) consideravam que chacinas eram desastres e terríveis mas que, apesar de tudo, no final das contas, eram fatos da vida: acontecimentos a chorar e lamentar, mas inescapáveis e a aceitar

5.6.3.2.           Exatamente porque a sociabilidade moderna desenvolveu-se e aprofundou-se é que consideramos que as chacinas são bárbaras e totalmente inaceitáveis

5.6.3.3.           A celebração da chacina da Operação Contenção, da parte do Governador Cláudio Castro e de muitos outros políticos, evidencia o quanto eles e os fascistas são retrógrados e totalmente contrários aos verdadeiros hábitos modernos

5.6.4.Celebrando a sociabilidade moderna, Augusto Comte afirmava a importância de realizarmos festas de três instituições caracteristicamente modernas: são as festas da imprensa, dos correios e da polícia (em um raro uso de aliteração: presse, poste e police) (Política positiva, v. IV, p. 477)

5.7.   Em suma:

5.7.1.O objetivo deste sermão foi duplo: apreciar o massacre da Operação Contenção e expor como o Positivismo encara a atuação da polícia

5.7.2.A Operação Contenção foi uma ação selvagem e injustificada, que usou mandatos de busca e apreensão para realizar execução em massa de pobres e favelados

5.7.2.1.           Essa Operação corresponde à prática política fascista, que proclama de maneira sádica que “bandido bom é bandido morto” – o que não acaba com o crime que diz combater, ao mesmo tempo em que mantém e estimula a violência e degrada as relações sociais

5.7.3. O Positivismo é radicalmente contrário a práticas desse tipo, na medida em que são totalmente contrárias à sociabilidade moderna – pacífica, fraterna, cooperativa, responsável

5.7.4.O poder Temporal tem um amplo e legítimo espaço de atuação, que inclui por definição a manutenção da ordem social; mas essa manutenção tem que se pautar pelos parâmetros da sociabilidade moderna – em outras palavras, da sociocracia

5.7.4.1.           O combate ao crime tem que ocorrer pela atuação da polícia, mas essa polícia tem que ser cidadã, não militaresca

6.      Término da prédica

 

Referências

- Augusto Comte (franc.), Sistema de filosofia positiva (Paris, Société Positiviste, 5e ed., 1893).

- Augusto Comte (port.), Apelo aos conservadores (Rio de Janeiro, Igreja Positivista do Brasil, 1898): https://archive.org/details/augustocomteapeloaosconservadores.

- Augusto Comte (port.), Catecismo positivista (Rio de Janeiro, Igreja Positivista do Brasil, 4ª ed., 1934).

- Gustavo Biscaia de Lacerda (port.) Prédica positiva “Sobre o militarismo” (Curitiba, Igreja Positivista Virtual, 17.Descartes.169/24.10.2023): https://filosofiasocialepositivismo.blogspot.com/2023/10/sobre-o-militarismo.html.

- Luís Lagarrigue (esp.), A poesia positivista (Santiago do Chile, 1890): https://archive.org/details/luis-lagarrigue-a-poesia-positivista-1890_202509.

- Raimundo Teixeira Mendes (port.), As últimas concepções de Augusto Comte (Rio de Janeiro, Igreja Positivista do Brasil, 1898): https://archive.org/details/raimundo-teixeira-mendes-ultimas-concepcoes-de-augusto-comte-i e https://archive.org/details/raimundo-teixeira-mendes-ultimas-concepcoes-de-augusto-comte-ii.

- Raimundo Teixeira Mendes (port.), O ano sem par (Rio de Janeiro, Igreja Positivista do Brasil, 1900): https://archive.org/details/raimundo-teixeira-mendes-o-ano-sem-par-portug._202312/page/n7/mode/2up