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09 setembro 2025

"Ordem e Progresso" em tempos de fascismo e identitarismo

No dia 8.9.2025 o jornal carioca Monitor Mercantil publicou o meu artigo "Ordem e Progresso" em tempos de fascismo e identitarismo.

O original está disponível aqui: https://monitormercantil.com.br/ordem-e-progresso-em-tempos-de-fascismo-e-identitarismo/.

Reproduzimos abaixo o texto.

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‘Ordem e Progresso’ em tempos de fascismo e identitarismo

Desmoralização da direita e da esquerda e fim dessa polarização Por Gustavo Biscaia de Lacerda


Bandeira do Brasil - Ordem e Progresso (foto de André Maceira, CC)

Com uma certa e triste frequência, a frase “Ordem e Progresso” é alvo de polêmica. Geralmente, essas polêmicas envolvem o sentido da ordem e sua importância para o progresso, resultando em oposição entre direita e esquerda.

Um exemplo disso é o artigo que Djamila Ribeiro publicou em 28 de agosto na Folha de S. Paulo, intitulado “Independência ou morte”. O subtítulo desse texto resume as ideias e o conhecimento que a autora tem do “Ordem e Progresso”: “Pensar de forma independente é recusar o mito da ordem e progresso”.

Em um artigo que se esmerou em citar autoras feministas, a autora referiu-se uma única vez ao “Ordem e Progresso”, foi incapaz de explicar o que significa essa frase e resumiu a “ordem” à “manutenção da desigualdade”.

À parte sua escandalosa superficialidade, a autora repetiu um procedimento que, infelizmente, é corrente na esquerda, ao resumir a “ordem” ao status quo, à sociedade capitalista, à paz de cemitério ou a uma combinação desses sentidos.


Embora a esquerda faça questão de degradar dessa forma a noção de ordem, a direita faz questão de não se sair melhor ao tratar do “Ordem e Progresso”, na medida em que, por seu turno, despreza o progresso.

Ora, os erros da direita e da esquerda sobre o “Ordem e Progresso” são mais que fruto de ignorância; eles são mais que fruto de preconceitos e revelam disposições morais e políticas profundas e altamente danosas para a sociedade brasileira e para a Humanidade.


2 erros simétricos da direita e da esquerda

Direita e esquerda cometem erros simétricos a respeito do “Ordem e Progresso”. Elas assumem que: (1) ordem e progresso podem e devem ser encarados separadamente; (2) a ordem deve vir antes do progresso. É claro que essas considerações podem ser feitas isoladamente, mas, no caso da frase “Ordem e Progresso”, presente na bandeira nacional, todas elas estão erradas.

É natural que direita e esquerda considerem a ordem separadamente do progresso; na verdade, suas respectivas perspectivas exigem tal separação e definem-se exatamente pela parcialidade de suas vistas. Enquanto a direita valoriza a ordem contra o progresso, a esquerda afirma o progresso contra a ordem.

Para a direita, a ordem é o valor social primordial, tomando como base a memória das relações sociais antigas; o progresso, que implica mudança, corresponde à alteração sistemática das relações sociais — o que, para eles, é ruim. Essa concepção é estática; não por acaso, na direita estão os “conservadores”, embora, no fundo, eles devam ser chamados de “retrógrados”.

Já a esquerda quer o progresso sistemático; sua concepção é dinâmica, mas, por outro lado, ela considera que o passado (quando não o presente) é uma constante e eterna injustiça, que, portanto, deve ser destruída. Embora deseje ser progressista, a esquerda busca ser revolucionária e, ainda mais, destruidora.

Direita e esquerda entendem de maneira oposta a ordem e o progresso. A direita sacrifica o progresso em nome de uma ordem estática que tende a ser retrógrada; a esquerda sacrifica a ordem em nome de um progresso que tende a ser destruidor. É evidente que essas duas perspectivas são inconciliáveis e insustentáveis. A única solução é unir, de maneira íntima, a ordem com o progresso, entendendo-os como dois aspectos de uma realidade única.


Nos termos de Comte, ordem e progresso não são opostos e excludentes

Ora, embora possa parecer banal e trivial, é necessário que ordem e progresso não sejam definidos de maneiras opostas e excludentes, mas complementares. Para que ordem e progresso sejam dois aspectos de uma realidade única, a ordem tem que ser vista como dinâmica, e o progresso tem que considerar a manutenção da sociedade.

Nos termos claros e precisos de Augusto Comte, “o progresso é o desenvolvimento da ordem” e “a ordem é a consolidação do progresso”: apenas dessa forma é possível superar a oposição sociológica, filosófica e política entre a ordem e o progresso.

Unir a ordem ao progresso e, inversamente, o progresso à ordem implica necessariamente que a ordem tem que deixar de ser retrógrada e o progresso tem que deixar de ser destruidor. A direita tem que reconhecer o movimento e a busca de melhorias; a esquerda tem que abandonar o espírito destruidor e a concepção de que a ordem é sempre estática. Ambas têm que deixar de lado as concepções de que o antigo é bom ou ruim e que o novo é ruim ou bom apenas porque o antigo é antigo e o novo é novo.

Direita e esquerda — ou melhor, ordem e progresso — definem-se um em relação ao outro. A oposição mútua entre eles tem vários resultados negativos. O primeiro deles é que, se um nega o outro, nenhum deles é realmente levado a sério e nenhum dos dois se mantém.

Em segundo lugar, a negação mútua da ordem e do progresso faz com que os traços negativos de cada um deles se acentuem: a ordem torna-se cada vez mais retrógrada e o progresso, cada vez mais revolucionário, tornando-se anárquico. Em consequência disso, o embate mútuo torna-se ao mesmo tempo retrógrado e anárquico.

Em terceiro lugar, esse embate descamba para uma oscilação social e política, com períodos de ordem (estática) e de progresso (revolucionário). Essa é a dinâmica ocidental (e, por extensão, mundial) desde a Revolução Francesa.

As narrativas liberais e marxistas reproduzem a oposição entre direita e esquerda, ou seja, entre ordem e progresso, e são incapazes de perceber e reconhecer a oscilação: o século 19 caracterizou-se por isso; o período da II Guerra dos 30 Anos (1914-1945) caracterizou-se pela mesma oscilação; e a Guerra Fria (1947-1991) transformou a oscilação em disputa geopolítica.

A afirmação atual entre, por um lado, os tradicionalismos e sua forma política mais extrema, o neofascismo, e, por outro, os identitarismos, é apenas a versão mais recente e agressiva da oposição entre ordem e progresso.


Superação da oposição entre ordem e progresso

A superação da oposição entre ordem e progresso não é uma política de “centro”; é uma política que é ao mesmo tempo progressista, sem ser revolucionária, e que busca manter as instituições sociais sem ser retrógrada.

Essa política não é de extrema esquerda, o que a torna suspeita para a esquerda; ela não é de extrema direita, o que a torna suspeita para a direita. Ela respeita a história, sem ser tradicionalista; ela afirma o progresso, sem ser destruidora. Essa política não apenas rejeita os graves e profundos erros da direita e da esquerda, como torna esses dois lados (e sua oposição mútua) irrelevantes.

Não é por acaso que essa política é alvo dos fascistas e dos identitários; não é por acaso que tanto os asseclas dos Bolsonaros quanto Djamila Ribeiro critiquem o “Ordem e Progresso”. Eles não o conhecem, não o entendem e rejeitam-no; mas, com certeza, intuem que o “Ordem e Progresso” corresponde à superação de suas perspectivas opostas, ou seja, da necessária desmoralização desses opostos irreconciliáveis e do urgente fim dessa polarização.

Gustavo Biscaia de Lacerda é doutor em Sociologia Política e sociólogo da UFPR.

20 agosto 2025

Leitura comentada do Apelo aos Conservadores

No dia 7 de Gutenberg de 171 (19.8.2025) realizamos nossa prédica positiva, dando continuidade à leitura comentada do Apelo aos Conservadores (em sua Primeira Parte - doutrina apropriada aos verdadeiros conservadores).

A prédica foi transmitida nos canais Positivismo (aqui: https://youtube.com/live/EWwS3SLYY2Y) e Igreja Positivista Virtual (aqui: https://www.facebook.com/IgrejaPositivistaVirtual/videos/632843339474394).

As anotações que serviram de base para a exposição oral encontram-se reproduzidas abaixo.

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Leitura comentada do Apelo aos conservadores

(7 de Gutenberg de 171/19.8.2025) 

1.      Invocação inicial

2.      Exortações iniciais

2.1.   Sejamos altruístas!

2.2.   Façamos orações!

2.3.   Como Igreja Positivista Virtual, ministramos os sacramentos positivos a quem tem interesse

2.4.   Para apoiar as atividades dos nossos canais e da Igreja Positivista Virtual: façam o Pix da Positividade! (Chave Pix: ApostoladoPositivista@gmail.com)

3.      Datas e celebrações:

3.1.   Dia 10 de Gutenberg (22.8): Live AOPcom Rafael Cardoso Sampaio

4.      Leitura comentada do Apelo aos conservadores

4.1.   Antes de mais nada, devemos recordar algumas considerações sobre o Apelo:

4.1.1.     O Apelo é um manifesto político e dirige-se não a quaisquer pessoas ou grupos, mas a um grupo específico: são os líderes políticos e industriais que tendem para a defesa da ordem (e que tendem para a defesa da ordem até mesmo devido à sua atuação como líderes políticos e industriais), mas que, ao mesmo tempo, reconhecem a necessidade do progresso (a começar pela república): são esses os “conservadores” a que Augusto Comte apela

4.1.1.1.           O Apelo, então, é um apelo aos conservadores, não aos reacionários

4.1.1.2.           O Apelo, portanto, adota uma linguagem e um formato adequados ao público a que se dirige

4.1.1.3.           Empregamos a expressão “líderes industriais” no lugar de “líderes econômicos”, por ser mais específica e mais adequada ao Positivismo: a “sociedade industrial” não se refere às manufaturas, mas à atividade pacífica, construtiva, colaborativa, oposta à guerra

4.2.   Outras observações:

4.2.1.     Uma versão digitalizada da tradução brasileira desse livro, feita por Miguel Lemos e publicada em 1899, está disponível no Internet Archive: https://archive.org/details/augustocomteapeloaosconservadores

4.2.2.     O capítulo em que estamos é a “Primeira Parte”, cujo subtítulo é “Doutrina apropriada aos verdadeiros conservadores”

4.3.   Passemos, então, à leitura comentada do Apelo aos conservadores!

5.      Exortações finais

5.1.   Sejamos altruístas!

5.2.   Façamos orações!

5.3.   Como Igreja Positivista Virtual, ministramos os sacramentos positivos a quem tem interesse

5.4.   Para apoiar as atividades dos nossos canais e da Igreja Positivista Virtual: façam o Pix da Positividade! (Chave Pix: ApostoladoPositivista@gmail.com)

6.      Invocação final

 

Referências

- Augusto Comte (franc.), Sistema de filosofia positiva (Paris, Société Positiviste, 5e ed., 1893)

- Augusto Comte (franc.), Sistema de política positiva (Paris, L. Mathias, 1851-1854)

- Augusto Comte (port.), Apelo aos conservadores (Rio de Janeiro, Igreja Positivista do Brasil, 1898): https://archive.org/details/augustocomteapeloaosconservadores.

- Augusto Comte (port.), Catecismo positivista (Rio de Janeiro, Igreja Positivista do Brasil, 4ª ed., 1934)

- Raimundo Teixeira Mendes (port.), As últimas concepções de Augusto Comte (Rio de Janeiro, Igreja Positivista do Brasil, 1898): https://archive.org/details/raimundo-teixeira-mendes-ultimas-concepcoes-de-augusto-comte-i e https://archive.org/details/raimundo-teixeira-mendes-ultimas-concepcoes-de-augusto-comte-ii.

- Raimundo Teixeira Mendes (port.), O ano sem par (Rio de Janeiro, Igreja Positivista do Brasil, 1900): https://archive.org/details/raimundo-teixeira-mendes-o-ano-sem-par-portug._202312/page/n7/mode/2up.

13 agosto 2025

A ortodoxia positivista, mais uma vez

No dia 28 de Dante de 171 (12.8.2025) realizamos nossa prédica positiva, dando continuidade à leitura comentada do Apelo aos conservadores (em sua Primeira Parte - Doutrina apropriada aos verdadeiros conservadores).

No sermão abordamos novamente a ortodoxia positivista e alguns dos problemas e das dificuldades enfrentadas quando se trata da ortodoxia.

Antes do sermão também se comentou a agressão que Donald Trump realiza contra o Brasil desde há alguns meses; esse comentário incluiu a leitura do artigo "Autonomia nacional, multilateralismo e prepotência fascista" (disponível aqui: https://filosofiasocialepositivismo.blogspot.com/2025/08/monitor-mercantil-autonomia-nacional.html).

A prédica foi transmitida nos canais Positivismo (aqui: https://youtube.com/live/JqqJo3DW23A) e Igreja Positivista Virtual (aqui: https://www.facebook.com/IgrejaPositivistaVirtual/videos/615064741679084).

As anotações que serviram de base para a exposição oral encontram-se reproduzidas abaixo.

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Mais uma vez a ortodoxia

(28.Dante.171/12.8.2025) 

1.      Invocação inicial

2.      Exortações iniciais

2.1.   Sejamos altruístas!

2.2.   Façamos orações!

2.3.   Como Igreja Positivista Virtual, ministramos os sacramentos positivos a quem tem interesse

2.4.   Para apoiar as atividades dos nossos canais e da Igreja Positivista Virtual: façam o Pix da Positividade! (Chave Pix: ApostoladoPositivista@gmail.com)

3.      Datas e celebrações:

3.1.   Dia 26 de Dante (10.8): transformação de Miguel Lemos (1917 – 108 anos)

3.2.   Dia 27 de Dante (11.8): transformação de Luís Hildebrando Horta Barbosa (1973 – 52 anos)

3.3.   Dia 10 de Gutenberg (22.8): Live AOP com Rafael Cardoso Sampaio

4.      Comentário sobre a agressão internacional fascista de Donald Trump contra o Brasil

4.1.   A Religião da Humanidade é um poder espiritual, o que significa que atua por meio do aconselhamento

4.1.1.     Entre suas atribuições está o de apreciar os acontecimentos do dia-a-dia, indicando sua legitimidade ou sua falta de legitimidade

4.1.2.     Assim, não podemos deixar em silêncio as agressões reiteradas – que tudo indica que continuarão e piorarão nos próximos meses – contra nossa pátria e em violação sistemática dos supremos interesses da Humanidade, a partir de motivações retrógradas e militaristas, da parte do atual governo dos Estados Unidos

4.2.   Para sintetizar muito brevemente nossas perspectivas, leremos um artigo que publicamos no jornal carioca Monitor Mercantil em 27 de Dante de 171 (11.8.2025), intitulado “Autonomia nacional, multilateralismo e prepotência fascista” (disponível aqui: https://filosofiasocialepositivismo.blogspot.com/2025/08/monitor-mercantil-autonomia-nacional.html)

5.      Leitura comentada do Apelo aos conservadores

5.1.   Antes de mais nada, devemos recordar algumas considerações sobre o Apelo:

5.1.1.     O Apelo é um manifesto político e dirige-se não a quaisquer pessoas ou grupos, mas a um grupo específico: são os líderes políticos e industriais que tendem para a defesa da ordem (e que tendem para a defesa da ordem até mesmo devido à sua atuação como líderes políticos e industriais), mas que, ao mesmo tempo, reconhecem a necessidade do progresso (a começar pela república): são esses os “conservadores” a que Augusto Comte apela

5.1.1.1.           O Apelo, então, é um apelo aos conservadores, não aos reacionários

5.1.1.2.           O Apelo, portanto, adota uma linguagem e um formato adequados ao público a que se dirige

5.1.1.3.           Empregamos a expressão “líderes industriais” no lugar de “líderes econômicos”, por ser mais específica e mais adequada ao Positivismo: a “sociedade industrial” não se refere às manufaturas, mas à atividade pacífica, construtiva, colaborativa, oposta à guerra

5.2.   Outras observações:

5.2.1.     Uma versão digitalizada da tradução brasileira desse livro, feita por Miguel Lemos e publicada em 1899, está disponível no Internet Archive: https://archive.org/details/augustocomteapeloaosconservadores

5.2.2.     O capítulo em que estamos é a “Primeira Parte”, cujo subtítulo é “Doutrina apropriada aos verdadeiros conservadores”

5.3.   Passemos, então, à leitura comentada do Apelo aos conservadores!

6.      Sermão: mais uma vez, a ortodoxia positivista

6.1.   Em várias ocasiões anteriores abordamos a ortodoxia positivista; mais uma vez é necessário abordarmo-la, agora de maneira direta

6.1.1.     A noção da “ortodoxia positivista” por vezes dá ensejo a interpretações errôneas, a equívocos, a manipulações; em virtude desses problemas, com que nos defrontamos com triste freqüência, impõe-se a necessidade de tratarmos dela

6.1.2.     Assim, o que nos interessa aqui é (1) entendermos o que significa a “ortodoxia positivista” e (2) abordarmos algumas interpretações problemáticas ou simplesmente erradas do que significa essa ortodoxia

6.2.   O que é a ortodoxia positivista?

6.2.1.     A noção da ortodoxia positivista foi elaborada diretamente por Augusto Comte; está presente em suas obras, como nos prefácios do Sistema de política positiva, nas suas circulares anuais e também na correspondência

6.2.2.     A ortodoxia positivista consiste na aceitação integral da obra de Augusto Comte; isso significa basicamente aceitar e praticar a Religião da Humanidade

6.2.2.1.           Aceitar e praticar a Religião da Humanidade consiste em pelo menos três coisas: (1) por um lado, em reconhecer que a obra de Augusto Comte é a síntese maior e que qualquer tentativa de “corrigi-la” ou alterá-la em seus traços fundamentais é contrária à ortodoxia; (2) por outro lado, em conhecer de fato a obra de Augusto Comte, ou seja, sua letra e seu espírito, bem como as diversas aplicações da doutrina ao longo da história; (3) por fim, consiste em reconhecer e praticar a supremacia dos sentimentos, o papel subordinado da inteligência e da ciência e o afastamento do cientificismo e do academicismo

6.2.2.2.           Os positivistas ortodoxos são também chamados de positivistas completos; os chamados positivistas heterodoxos não são propriamente positivistas, sendo incompletos; os heterodoxos em quase todas as vezes são cientificistas, aceitando o Positivismo como filosofia em geral e como da ciência em particular, mas rejeitando a Religião da Humanidade, ou seja, o sistema geral de regulação da vida humana

6.2.3.     A noção de ortodoxia positivista, portanto, não tem nada a ver com fanatismo, intolerância, rigidez mental, resistência às mudanças, retrogradação, reacionarismo, “conservadorismo” etc.

6.2.3.1.           Tomada em um sentido comum, a expressão “ortodoxia positivista” pode ser altamente enganosa

6.2.4.     O que garante que a ortodoxia positivista não é rígida ou fanática? De modo muito simples e direto, a aplicação do relativismo e da simpatia, bem como da realidade, da utilidade e dos demais atributos da palavra “positivo”

6.2.4.1.           O relativismo, como se sabe, opõe-se ao absolutismo, ou seja, às concepções tomadas como indiscutíveis, como impassíveis de compreensão racional e de fundamentação empírica, como externas ao ser humano

6.2.4.2.           A simpatia estabelece que devemos buscar a convergência e também realizarmos a empatia; dessa forma, estar certo – embora sem dúvida seja importante – não é exatamente prioritário

6.2.4.3.           É claro que o relativismo e a simpatia requerem antes a realidade – o que falamos e pensamos tem que corresponder à realidade ou, pelo menos, não infringir as leis naturais – e a utilidade – o que falamos e pensamos tem que ser útil, o que também apóia o relativismo e a simpatia

6.2.4.4.           A rejeição do fanatismo na ortodoxia positivista é ilustrada exemplarmente pela máxima “inflexível a princípio, conciliante de fato

6.3.   Trataremos agora, brevemente, de alguns problemas, defeitos e más interpretações sobre a ortodoxia positivista – em outras palavras, de alguns desafios que a exposição da Religião da Humanidade enfrenta cotidianamente

6.3.1.     O sofisma do “positivismo ilustrado”

6.3.1.1.           A idéia do “positivismo ilustrado” foi disseminada pelos liberais conservadores brasileiros – a respeito de quem é importante indicar que muitos deles foram apoiadores do golpe militar de 1964 e do fascismo subjacente a ele –, como Antônio Paim, Roque Spencer Maciel de Barros e Ricardo Velez Rodriguez

6.3.1.2.           A idéia do “positivismo ilustrado” consiste no seguinte:

6.3.1.2.1.                O “ilustrado” é uma referência à “Ilustração”, ou seja, ao Iluminismo; com isso, embora os autores que defendam essa idéia sejam retrógrados e reacionários, eles opõem a Ilustração à escuridão do dogmatismo teológico

6.3.1.2.2.                O “positivismo ilustrado” seriam os positivistas heterodoxos, ou seja, as pessoas que foram somente influenciadas pelo Positivismo e aqueles que aceitaram apenas a interpretação cientificista do Positivismo

6.3.1.2.3.                A expressão “positivismo ilustrado” faz uma crítica enviesada aos positivistas ortodoxos, ou seja, aos adeptos da Religião da Humanidade, em particular a Miguel Lemos, Teixeira Mendes e à Igreja Positivista do Brasil, encarada pelos liberais conservadores como obscurantista

6.3.1.2.4.                Para os liberais conservadores, os bons positivistas, os “positivistas ilustrados” seriam os mais próximos do liberalismo, ou seja, do Estado limitado, da política vista como disputa eterna entre partidos que se sucedem, das eleições como mecanismo supremo de decisão política, do elitismo oligárquico, do parlamentarismo como regime político supremo, da alienação popular na condução da vida política e social etc.

6.3.1.3.           É impressionante constatar que a esquerda aderiu em massa a essa interpretação de má fé, como se pode ver nas obras de Sérgio Buarque de Holanda e de outros professores da Universidade de São Paulo (como Lelita Benoit, Paulo Arantes e Marilena Chauí)

6.3.2.     Ortodoxia vs. críticas dos ignorantes que não querem e não conseguem conhecer o Positivismo

6.3.2.1.           Há pessoas, às vezes infelizmente no interior do próprio Positivismo, às vezes alegadamente positivistas religiosos, que se põem contra a ortodoxia para justificar interpretações erradas, distorcidas, tolas

6.3.2.2.           No caso em que temos em mente, essas críticas à ortodoxia são ao mesmo tempo o instrumento e a justificativa não de concepções diferentes do que deveria ser o Positivismo, mas simples e diretamente da ignorância: nesse caso, a crítica à ortodoxia é a desculpa para a própria ignorância, para a incapacidade de conhecer – e, daí, de entender – o Positivismo

6.3.2.3.           Evidentemente, é melhor, mais honesto, mais nobre assumir a ignorância e pôr-se humildemente em uma digna submissão que, de maneira arrogante, fingir que conhece o Positivismo e criticar o que não conhece

6.3.3.     Ortodoxia vs. farisaísmo

6.3.3.1.           Quem acompanha as nossas prédicas sabe que dificilmente emprego expressões teológicas e muito menos bíblicas; entretanto, no presente caso a expressão “farisaísmo” é adequada

6.3.3.2.           O farisaísmo corresponde à hipocrisia, à exigência feita para os outros seguirem a ortodoxia mas que a própria pessoa que a exige não cumpre

6.3.3.2.1.                Aqueles que adotam o farisaísmo não são apenas aqueles que exigem dos outros, mas não para si mesmos, a ortodoxia; são também aqueles que exigem dos outros a ortodoxia mas que, eles mesmos, seguem os ignorantes, os apóstatas e também os hipócritas

6.3.3.3.           O farisaísmo corresponde, então, a uma atitude consciente; se for uma atitude inconsciente, pode tratar-se apenas de incoerência, devido à imaturidade da pessoa: a diferença em cada um dos casos está na má ou na boa fé da pessoa (além, claro, da maturidade pessoal)

6.3.4.     Ortodoxia vs. heterodoxia que busca “atualizações” e que afirma que a ortodoxia é “ultrapassada”

6.3.4.1.           Em diversas ocasiões comentamos que jovens aderentes consideram que o Positivismo tem que ser “atualizado”, sem conhecerem o que é o Positivismo e sem saber nem entender o que seria a sua “atualização”

6.3.4.2.           Essas críticas, feitas por pessoas de boa vontade mas desconhecedores do Positivismo, dirigem-se a tudo o que foi feito antes e, portanto, atingem em particular a ortodoxia

6.3.4.2.1.                Em conseqüência da crítica à ortodoxia e a “tudo o que veio antes”, de maneira consciente ou inconsciente há nessa postura um estímulo da heterodoxia, seja na forma do cientificismo, seja na do academicismo, seja na rejeição do relativismo, seja no estímulo a variadas metafísicas

6.3.4.2.2.                A ânsia por mudanças com freqüência ignora – em linha com a ignorância do Positivismo – que os humildes e sinceros esforços de imitar os grandes e elevados exemplos (morais, intelectuais, práticos) são exercícios muitos mais difíceis do que pode parecer à primeira vista

6.3.4.2.3.                Da mesma forma, a ânsia por mudanças com freqüência ignora – novamente em linha com a ignorância do Positivismo – que a ausência de parâmetros enseja sentimentos, concepções e práticas freqüentemente medíocres, inconsistentes e/ou prejudiciais

6.3.4.2.4.                Por fim, as máximas positivistas “só se destrói o que se substitui” e “conservar melhorando” dão os parâmetros do aperfeiçoamento, em que se conjugam as mudanças e as inovações com o respeito à história e à ortodoxia

6.3.4.3.           Há nessas críticas a concepção ingênua de que o que é “novo”, por ser “novo”, é bom e que quem é “jovem” (e/ou “novo”) sabe o que é mais adequado

6.3.4.4.           Trata-se, portanto, de um misto de boas e más qualidades: boa vontade e entusiasmo por um lado, ignorância, arrogância e espírito destruidor, por outro lado

6.3.5.     Ortodoxia vs. excesso de defesa do Positivismo

6.3.5.1.           Nos casos anteriores falamos de situações postas contra a ortodoxia; mas há um caso em que o problema é a seu favor: trata-se igualmente de uma dificuldade de entendimento do que é a ortodoxia, em que se adota uma postura de defesa excessiva do Positivismo

6.3.5.2.           Na verdade, não se trata propriamente de defesa excessiva do Positivismo, mas de sua aplicação inadequada

6.3.5.2.1.                Logo, trata-se mesmo de compreensão inadequada do que é a ortodoxia

6.3.5.3.           Esse é o caso em que se atribui a concepções não positivas, ou a concepções incompleta ou imperfeitamente positivas, o título de “heresias”

6.3.5.3.1.                Grosso modo, uma heresia é uma concepção que distorce ou corrompe a doutrina (dito de outra forma, trata-se das “heterodoxias”): de qualquer forma, é uma concepção que está ou que surge no âmbito da própria doutrina, não fora dela

6.3.5.3.2.                A heresia consiste em uma elaboração teórica contrária aos fundamentos da doutrinas; não consiste, portanto, nem em meras preferências pessoais e/ou em comentários mais ou menos isolados

6.3.5.4.           Ora, concepções elaboradas fora do Positivismo não podem ser consideradas heréticas apenas porque eventualmente não correspondem ao Positivismo: isso é falta de relativismo e de simpatia

6.3.5.4.1.                Nesses casos, o que se pode e deve fazer é apreciar o grau de positividade das concepções consideradas (em termos dos sete atributos da palavra positivos e/ou em termos de simpatia, síntese e sinergia)

6.3.5.5.           Esse problema, sem dúvida ocorrido com boa fé, consiste em um excesso de entusiasmo combinado com imaturidade pessoal, intelectual e prática

6.3.6.     Ortodoxia vs. heresias (heterodoxias)

6.3.6.1.           No item anterior fizemos referência a heresias: se, por um lado, concepções externas ao Positivismo não podem ser chamadas de heresias, as concepções surgidas no âmbito do Positivismo que se afastam, ou melhor, que negam a ortodoxia são, por definição, heréticas

6.3.6.2.           As heresias não consistem nas “atualizações” do Positivismo, considerando desenvolvimentos históricos, teóricos, afetivos, organizacionais, cultuais etc.; as heresias são mudanças profundas, que alteram ou, pior, negam a estrutura, a letra e o espírito do Positivismo

6.3.6.3.           Mesmo que eventualmente realizadas com boa fé, as heresias são sempre ruins e prejudicais, pois degradam as condições morais, intelectuais e práticas da positividade e assim, portanto, dificultam a ação da Humanidade e o aperfeiçoamento do ser humano

6.4.   Em suma:

6.4.1.     A ortodoxia positivista corresponde à aceitação, ao conhecimento e à prática do conjunto da obra de Augusto Comte e, em particular, à Religião da Humanidade

6.4.2.     Ao contrário do que o senso comum pode supor e do que muitos – de maneira interessada – afirmam, a ortodoxia positivista não é intolerante, fanática, rígida, indisposta à conversa, às demonstrações, às mudanças e aos aperfeiçoamentos etc.

6.4.2.1.           A flexibilidade da ortodoxia positivista baseia-se no relativismo e na simpatia, bem como na realidade, na utilidade e nos demais atributos da palavra “positivo” e é expressa com clareza na máxima “inflexível a princípio, conciliante de fato”

6.4.3.     Podemos determinar algumas dificuldades, problemas e equívocos na compreensão e na aplicação da ortodoxia positivista:

6.4.3.1.           O sofisma do “positivismo ilustrado”

6.4.3.2.           A crítica dos ignorantes contra a ortodoxia como forma de justificar a própria ignorância

6.4.3.3.           O farisaísmo

6.4.3.4.           A concepção de que a ortodoxia, por definição, é “velha” e “ultrapassada”

6.4.3.5.           A defesa excessiva do Positivismo

6.4.3.6.           As heresias, ou seja, as heterodoxias

7.      Exortações finais

7.1.   Sejamos altruístas!

7.2.   Façamos orações!

7.3.   Como Igreja Positivista Virtual, ministramos os sacramentos positivos a quem tem interesse

7.4.   Para apoiar as atividades dos nossos canais e da Igreja Positivista Virtual: façam o Pix da Positividade! (Chave Pix: ApostoladoPositivista@gmail.com)

8.      Invocação final

 

Referências

- Augusto Comte (franc.), Sistema de filosofia positiva (Paris, Société Positiviste, 5e ed., 1893)

- Augusto Comte (franc.), Sistema de política positiva (Paris, L. Mathias, 1851-1854)

- Augusto Comte (port.), Apelo aos conservadores (Rio de Janeiro, Igreja Positivista do Brasil, 1898): https://archive.org/details/augustocomteapeloaosconservadores.

- Augusto Comte (port.), Catecismo positivista (Rio de Janeiro, Igreja Positivista do Brasil, 4ª ed., 1934)

- Gustavo Biscaia de Lacerda (port.), "Autonomia nacional, multilateralismo e prepotência fascista" (Monitor Mercantil, Rio de Janeiro, 11.8.2025): https://filosofiasocialepositivismo.blogspot.com/2025/08/monitor-mercantil-autonomia-nacional.html

- Gustavo Biscaia de Lacerda (port.), Prédica positiva “Sobre ‘comtismo’ e atualização do Positivismo” (Curitiba, 10.São Paulo.169/30.5.2023; disponível em: https://filosofiasocialepositivismo.blogspot.com/2023/05/sobre-comtismo-e-atualizacao-do.html)

- Raimundo Teixeira Mendes (port.), O ano sem par (Rio de Janeiro, Igreja Positivista do Brasil, 1900): https://archive.org/details/raimundo-teixeira-mendes-o-ano-sem-par-portug._202312/page/n7/mode/2up.