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14 maio 2017

Revista Época: "Justiça anula passaporte diplomático de RR Soares"


A matéria abaixo, publicada pela revista Época na véspera do aniversário da Abolição da Escravidão no Brasil, é extremamente alvissareira. Como se sabe, os passaportes especiais ("passaportes diplomáticos") concedidos pelo governo brasileiro a determinados cidadãos, tornou-se moeda de troca política e prebenda familiar nas últimas duas décadas: líderes religiosos e membros da família Lula da Silva, injustificadamente, receberam-nos. Apesar disso, aos poucos, esses passaportes estão sendo anulados, seja por decisões políticas, seja por decisões judiciais.

No caso em tela, um dos homens mais ricos do país, que amealha fortuna com isenção crescente de impostos, perdeu um de seus inaceitáveis privilégios, isto é, o direito de ter tratamento especial para sair do país. (Aliás, como indica a matéria, não foi apenas R. R. Soares que perdeu esse privilégio, mas também sua esposa.)

Em meio à degradação da vida pública que se constata no Brasil há algumas décadas, bem como da laicidade, a decisão da Justiça traz um alívio para todos os verdadeiros republicanos e para os defensores da laicidade do Estado.

O original pode ser lido aqui.

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Justiça anula passaporte diplomático de RR Soares
Na decisão, a magistrada refuta o argumento dos líderes religiosos de que eles possuiriam “relevância nacional necessária” e aponta que o Estado brasileiro é laico
MATEUS COUTINHO
12/05/2017 - 17h29 - Atualizado 13/05/2017 17h08

A Justiça Federal em São Paulo anulou a portaria do ex-ministro de Relações Exteriores José Serra (PSDB) que concedeu no ano passado passaporte diplomático ao pastor da Igreja Internacional da Graça de Deus, R. R. Soares.



A decisão desta quinta-feira (11) é mais uma derrota de líderes religiosos na Justiça que foram beneficiados com o documento que, na prática, permitia ao pastor e sua mulher, também beneficiada com o documento especial, a ter acesso à fila de entrada separada nos países e vistos gratuitos, quando necessários aos brasileiros.

No ano passado, a Justiça já havia determinado a suspensão e o recolhimento dos passaportes dos pastores. Agora, o juiz anulou o ato do Poder Executivo que concedeu o benefício. A rigor, o documento é concedido a autoridades que, entre outros motivos, viajam para representar os interesses do país.

“A Portaria de 28 de junho de 2016 do Ministério das Relações Exteriores deve ser anulada em razão de manifesta ilegalidade ocasionada tanto pela ausência de motivação idônea, como pelo desvio de sua finalidade, o que, em última análise, fere a moralidade administrativa”, assinala a juíza da 7ª Vara Federal Cível de São Paulo, Diana Brunstein, na decisão.

A sentença foi expedida na ação popular movida pelo advogado Ricardo Amin Abrahão Nacle questionando a concessão do benefício aos religiosos. A decisão é de primeira instância e ainda cabe recurso.

Apesar de citar uma portaria do então ministro José Serra, o tucano não é alvo da ação, pois a Justiça Federal entendeu que ele deveria ser excluído do processo e que a União Federal, por meio da Advocacia-Geral da União, deveria responder pelo caso.

Na decisão, a magistrada ainda refuta o argumento dos líderes religiosos de que eles possuiriam “relevância nacional necessária” e aponta que o Estado brasileiro é laico. “As viagens missionárias dos corréus são indubitavelmente constantes, porém, como dito na própria contestação, visam defender os interesses da Igreja, propagando a doutrina cristã e isto não representa os interesses do país, que como organização estatal é laico e, portanto, neutro em relação às mais diversas crenças e religiões, cabendo apenas garantir e zelar pela liberdade de consciência e de crença, assegurando livres manifestações religiosas, nos termos do artigo 5º, VI da Constituição Federal”, segue a sentença.

A juíza também analisou os argumentos de que a concessão do benefício buscava dar isonomia aos líderes religiosos, já que durante o Brasil Império líderes católicos receberam o passaporte. O magistrado lembrou que, durante o Império, o Estado não era laico e que, portanto, não caberia comparar a situação com a de outros líderes religiosos. “Modificado este princípio fundamental do Estado, a atenção à isonomia se dá com a não concessão do passaporte diplomático a qualquer líder religioso, inclusive os católicos, não a extensão desta prática reconhecidamente arcaica e inconstitucional, que ofende a isonomia entre líderes religiosos e os demais Cidadãos”, afirma a sentença.

O benefício a RR Soares e sua mulher não foi o primeiro concedido pelo governo federal. Em 2013, durante o governo Dilma Rousseff, o líder da Igreja Mundial do Poder de Deus, Valdemiro Santiago de Oliveira, e a mulher dele, Franciléia de Castro Gomes de Oliveira também receberam o benefício. Outros líderes de igrejas também já receberam o documento, que dá direito ao uso de uma fila especial nos aeroportos, mas não dá imunidade diplomática.

Com menos de uma semana no cargo, em maio deste ano, José Serra concedeu o mesmo benefício para o pastor Samuel Ferreira e a mulher Keila, também pastora, da Assembleia de Deus. Ferreira é investigado na Lava Jato suspeito de lavar dinheiro de propina para Eduardo Cunha (PMDB-RJ) por meio da igreja em Campinas. A assessoria de imprensa de Ferreira afirma que ele devolveu o passaporte em fevereiro.

O sistema de concessão de passaportes diplomáticos foi alterado em 2011, depois de revelado que os filhos e netos do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva tinham o documento mesmo depois da sua saída do governo e de não serem menores de idade, como determinava o decreto sobre o tema. Na época, a legislação dava ao ministro o poder de decidir quem poderia receber o passaporte em casos considerados de interesse nacional – o então ministro das Relações Exteriores, Celso Amorim, concedeu o documento aos filhos de Lula pouco antes do final de seu governo, em 2010.


O advogado Alexandre Henrique, que representa o pastor e sua mulher, diz que vai recorrer da decisão, que classificou de “muito fraca”. “Acredito que a decisão vai ser reformada. O desembargador do caso já negou a liminar que mandava recolher os passaportes no ano passado. Acreditamos que essa decisão também deve ser revista no Tribunal (Regional Federal da 3ª Região)”, disse.

29 julho 2016

Itamarati considera acabar com passaporte teológico

Ficam duas perguntas:

(1) Por que é que o Itamarati está apenas "pensando" em tomar essa medida, em vez de simplesmente a aplicar, respeitando a Constituição Federal, a República e a laicidade do Estado?

(2) Será que desde o Império a Igreja Católica beneficiou-se desse aberrante privilégio, nos últimos anos estendido às igrejas evangélicas neopentecostais? Em outras palavras, será que na I República não houve uma interrupção nisso?

De qualquer forma, é realmente uma ótima notícia essa "reflexão" do Itamarati, especialmente porque ele é liderado por José Serra - o mesmo político que, na campanha presidencial de 2010, fez questão de sabotar a laicidade do Estado, ao buscar desavergonhadamente o apoio político dos evangélicos.

O original da matéria encontra-se disponível aqui, publicado pela Folha de S. Paulo.

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Itamaraty estuda acabar com passaporte diplomático para religiosos
DE BRASÍLIA

29/07/2016  14h44

O Itamaraty deverá acabar em breve com a concessão de passaportes diplomáticos para líderes religiosos do país. A decisão ainda não foi oficializada mas deverá seguir o entendimento de que o Brasil é um Estado laico e, por isso, os religiosos não representam os interesses do país no exterior. A informação foi revelada pelo jornal "O Globo" nesta sexta-feira (29).

O ministério fez uma consulta à Advocacia-Geral da União sobre a prática, que é adotada desde o período do Império, no século 19, quando a religião oficial era o catolicismo. O órgão encaminhou um parecer pelo fim do benefício justamente porque o Estado brasileiro hoje é laico.

A decisão preocupa a cúpula do governo interino, que teme que a mudança possa melindrar aliados no Congresso em um momento em que Michel Temer precisa aprovar duras medidas econômicas e que o impeachment da presidente afastada, Dilma Rousseff, ainda não foi concluído.

Até meados dos anos 2000, apenas representantes da Igreja Católica tinham acesso ao benefício, mas a partir de 2006, o Itamaraty passou a conceder o documento para até dois representantes de cada religião, para seguir o princípio da isonomia.

O decreto que regula a concessão de passaportes diplomáticos não prevê o benefício para líderes religiosos, mas permite sua concessão para aqueles que "devam portá-lo em função do interesse do País."

A portaria que atualmente regula a emissão desses passaportes foi criada em janeiro de 2011 -duas semanas depois da revelação de que filhos e netos do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva haviam sido irregularmente contemplados com os documentos dois dias antes do fim de seu mandato.

O passaporte diplomático dá direito à isenção de visto de entrada em alguns países que têm acordo firmado com o Brasil, além de filas exclusivas em diversos aeroportos. Diferentemente do comum, ele é gratuito.

No início do mês, a Justiça Federal de São Paulo suspendeu por decisão liminar os passaportes diplomáticos que o Itamaraty havia concedido em junho ao pastor R.R. Soares, da Igreja Internacional da Graça de Deus, e a sua mulher, Maria Magdalena Bezerra Ribeiro Soares.


A decisão do juiz da 7ª Vara Federal Cível Tiago Bologna Dias foi uma resposta à ação popular movida pelo advogado Ricardo Amin Abrahão Nacle, que alegou desvio de finalidade na concessão do benefício.

20 maio 2016

Ação popular contra passaporte especial para pastor

A notícia abaixo indica que, se o governo tem que se dobrar à mesquinharia política e social de muitas igrejas evangélicas (não todas, é evidente), pelo menos a sociedade civil brasileira não aceita a permanência dessa prática que enxovalha a República e a laicidade do Estado.

O original da notícia abaixo encontra-se aqui.

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Ação popular pede cassação de passaporte diplomático a pastor evangélico

Um advogado de São Paulo foi à Justiça Federal pedir que seja suspensa a emissão de passaporte diplomático ao pastor da Assembleia de Deus Samuel Cássio Ferreira. A expedição do documento foi determinada na quarta-feira (18/5) por meio de portaria assinada pelo ministro das Relações Interiores, José Serra (PSDB-SP).
Em ação popular ajuizada nesta quinta-feira (19/5), o advogado Ricardo Amin Abrahão Nacle afirma que a concessão do passaporte diplomático a um pastor evangélico viola a legislação que regulamenta a questão, o Decreto 5.978/2006. Segundo a ação, Ferreira “não exerce função ou missão de interesse do país que possa justificar a concessão do passaporte diplomático e os benefícios dele decorrentes”.
Para conceder o benefício ao pastor, Serra se baseou no parágrafo 3º do artigo 6º do decreto. O artigo 6º faz um rol de autoridades que podem receber o passaporte, e o parágrafo 3º diz que o Itamaraty pode dar o passaporte a quem não estiver na lista “em função do interesse do país”.
A ação popular, no entanto, afirma não ver interesse do país em conceder o documento a um líder religioso, independentemente de qual religião. “Passaporte diplomático não é brinde cuja distribuição opera-se aleatoriamente, ou então, sob a justificativa da genérica e abstrata expressão ‘interesse do país’.”
Nacle, o signatário da ação, reclama ainda do fato de a portaria não ter sido motivada, ela apenas aponta o parágrafo 3º do artigo 6º do decreto, sem mais explicações. “Todos possuem o direito de saber qual razão está a evidenciar a emissão do passaporte diplomático na hipótese do ‘interesse do país’, pena de se abrir mais um campo voltado à transgressão do interesse público”, argumenta.
“A singela expressa ‘interesse do país’, com conteúdo semântico indeterminado, não serve para, sozinha, lastrear o ato administrativo, tampouco cumprir o dever inexorável da motivação”, diz a ação. “Exige-se que a invocação do ‘interesse do país’ ou ‘interesse público’ venha acompanhada das razões concretas capazes de evidenciá-las em cada caso específico.”
Cunha
Outro apontado problema da concessão do passaporte são as ligações do pastor Samuel Ferreira com o deputado Eduardo Cunha (PMDB-RJ), presidente afastado da Câmara dos Deputados. De acordo com denúncia contra Cunha feita pela Procuradoria-Geral da República, a Igreja Evangélica Assembleia de Deus foi usada para lavar propina paga ao deputado em 2012.
A denúncia diz que Samuel está no cadastro da Receita Federal como diretor da Igreja Evangélica Assembleia de Deus e é filho de Abner Ferreira, pastor da Assembleia de Deus Madureira, a que Cunha frequenta.
Segundo a PGR, a igreja está envolvida em um esquema montado pelo deputado para receber propina oriunda do superfaturamento de contratos de compra de sondas para exploração de petróleo na costa da África. Essa narrativa faz parte do dito envolvimento de Eduardo Cunha na operação “lava jato”.
A PGR afirma que, em 2012, Fernando Soares, o Baiano, apontado como lobista do PMDB, procurou o doleiro Julio Camargo para cobrar uma quantia que faltava ser paga a Cunha. Baiano, então, indicou a Camargo que transferisse a quantia à Assembleia de Deus, e que pessoas ligadas à igreja o procurariam para tratar do assunto.
Em agosto de 2012, diz a Procuradoria, a igreja recebeu R$ 125 mil de uma empresa, R$ 125 mil de outra e R$ 250 mil de outra, todas de propriedade de Julio Camargo. E sempre com a rubrica “pagamento a fornecedores”.
O CNPJ que recebeu essas quantias era o da Igreja Evangélica Assembleia de Deus, que está no nome do pastor Samuel Cassio Ferreira.
Clique aqui para ler a petição inicial da ação.
0011319-17.2016.4.03.6100