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20 agosto 2024

Sobre as utopias

No dia 9 de Gutenberg de 170 (20.8.2024) realizamos nossa prédica positiva, dando continuidade à leitura comentada do Catecismo positivista, em sua duodécima conferência, dedicada à evolução histórica do desenvolvimento humano, ou seja, da religião (em particular, do fetichismo e do politeísmo).

No sermão abordamos as utopias.

A prédica foi transmitida nos canais Positivismo (aqui: https://encr.pw/CtK0V) e Igreja Positivista Virtual (aqui: https://acesse.one/pGUqa).

Os tempos da prédica foram os seguintes:

00 min 00 s - abertura da prédica

07 min 21 s - exortações iniciais

16 min 16 s - efeméride

20 min 02 s - leitura comentada do Catecismo positivista

1 h 10 min 58 s - início do sermão

2 h 26 min 28 s - encerramento da prédica

As anotações que serviram de base para a exposição oral encontram-se reproduzidas abaixo.

*   *   *

Sobre as utopias

(9 de Arquimedes de 170/20.8.2024) 

1.       Abertura

2.       Exortações iniciais

2.1.    Sejamos altruístas!

2.2.    Façamos orações!

2.3.    Façam o Pix da Positividade! (Chave pix: ApostoladoPositivista@gmail.com)

3.       Efeméride:

3.1.    14 de Gutenberg: nascimento de Luís Hildebrando Horta Barbosa (1900)

4.       Leitura comentada do Catecismo positivista

4.1.    Continuação da duodécima conferência, sobre a evolução histórica do desenvolvimento humano, isto é, da religião, abordando em particular o fetichismo e o politeísmo

5.       Sermão: sobre as utopias

5.1.    O tema de hoje é algo recorrente nas reflexões políticas: as utopias

5.1.1. À primeira vista, ou melhor, a partir de vários preconceitos (entre os quais, em particular, os marxistas), o Positivismo não teria utopias e/ou seria contrário a elas

5.1.2. Todavia, para quem assiste às prédicas positivas e/ou para quem conhece o mínimo da obra de Augusto Comte, é bastante claro que as utopias integram plenamente o Positivismo

5.2.    Comecemos esclarecendo alguns conceitos gerais e limpando o terreno

5.2.1. A palavra utopia foi criada em 1516 pelo pensador e político inglês Tomás Morus, em uma obra chamada precisamente Utopia (na verdade, o título completo é este: “Um pequeno livro verdadeiramente dourado, não menos benéfico que entretedor, do melhor estado de uma república e da nova ilha Utopia”)

5.2.1.1.             O sentido da palavra “utopia” é o de “lugar nenhum”, ou melhor, de “lugar não existente”: seria, então, uma pura idealização

5.2.1.2.             O sentido da obra foi apresentar um ideal político, uma sociedade perfeita, e, a partir disso, avaliar e criticar a sociedade de seu tempo, em particular a Inglaterra absolutista de Henrique VIII

5.2.2. As utopias, portanto, aproximam-se da noção de “idealismo político”, desde que esta última expressão seja entendida como a concepção geral de uma sociedade ideal (e não no sentido da metafísica idealista)

5.2.3. Como vimos, a noção de utopia foi proposta no início do século XVI; essa concepção afirma-se no âmbito do humanismo e das concepções secularizantes posteriores à Idade Média

5.2.3.1.             A referência à Idade Média é importante porque, bem vistas as coisas, as concepções utópicas medievais baseavam-se na teologia: a Utopia de Tomás Morus já não é mais teológica; ela foi seguida por vários outros livros semelhantes, como A cidade do Sol, do frade dominicano Tomás de Campanella (1602), que, embora escrita por um frade, também era secularizada

5.2.4. A Utopia de Tomás Morus inaugura uma linha de reflexão social, política e moral que terá ampla descendência ao longo dos séculos, passando de comentários mais literários no início para propostas mais sociológicas e positivas no século XIX

5.2.4.1.             No século XIX vários pensadores (Roberto Owen, Pedro-José Proudhon, Carlos Fourier e mesmo Pedro Saint-Simon) propuseram seus esquemas sociais utópicos; em 1848 esses esquemas foram criticados em bloco por Carlos Marx, no Manifesto do Partido Comunista, e a expressão “socialismo utópico” foi contraposta a “socialismo científico”, criando-se uma clivagem dura entre as “utopias”, entendidas como puramente fantasiosas, e a cientificidade, entendida como não artística (e não literária) e verdadeiramente realista e exeqüível

5.2.5. Já no século XX, em parte devido aos desastres da II Guerra dos 30 Anos (1914-1945) e da Guerra Fria (1947-1989), mas em parte importante devido à mudança, ou melhor, à degradação da sensibilidade política e artística, a noção de utopia foi substituída pela noção de “distopia”

5.2.5.1.             Enquanto a utopia é um ideal desejável de uma sociedade (mais) perfeita, a distopia é um ideal indesejável, de uma sociedade decadente e/ou fracassada e/ou em colapso

5.2.5.2.             Como notamos quando tratamos das “ficções científicas”, pelo menos desde o final dos anos 1960 a imaginação social do Ocidente está cada vez mais marcada pelas distopias, com filmes mais ou menos decadentistas ou degradantes como Laranja mecânica (1972), Blade Runner (1982), O exterminador do futuro (1984), além das mais recentes tolices de “zumbis”

5.2.5.3.             Em face da importância social (no caso, política e artística) que as distopias apresentam no Ocidente, vale a pena insistir: não precisamos de distopias, mas, sim, de utopias

5.3.    Passemos então ao conceito de utopia no Positivismo

5.4.    Há várias maneiras de começarmos a abordar essa questão; começarei indicando dois aspectos complementares do Positivismo: por um lado, a importância da realidade com a utilidade; por outro lado, a importância da subjetividade

5.4.1. Como sabemos, o Positivismo afirma desde o início a importância do conhecimento da realidade em geral para disciplinar e orientar nossas vidas; de maneira correlata, nossas concepções têm que ser reais

5.4.2. Mas a mera realidade não basta: ela tem que complementada e orientada pela utilidade: assim, por um lado a utilidade restringe o âmbito das investigações reais (o que em particular evita o absolutismo) e, por outro lado, a utilidade estimula concepções que, sem negarem a realidade, estimulem a simpatia, a síntese e a sinergia

5.4.3. A utilidade, então, conduz-nos com facilidade para a importância da subjetividade – que, por si só, como sabemos, é algo de enorme importância no Positivismo, como âmbito da afetividade e também, em termos de concepções intelectuais, da imaginação

5.4.4. Esses aspectos que citamos até agora podem ser entendidos, do ponto de vista teórico, a partir da união dos sentidos da palavra “positivo” com a lei-mãe da Filosofia Primeira (que, no caso, é a primeira lei):

5.4.4.1.             Sentidos da palavra positivo (Apelo aos conservadores, p. 25): real, útil, certo, preciso, relativo, orgânico e simpático

5.4.4.2.             Lei-mãe da Filosofia Primeira: “Formar a hipótese mais simples e mais simpática que comporta o conjunto dos dados a representar”

5.4.5. Três observações específicas, antes de passarmos adiante:

5.4.5.1.             Certamente que a realidade deve ser limitada e reorientada pela utilidade; mas é necessário ter clareza de que a realidade é de fato um critério fundamental; nesse sentido, Augusto Comte distingue o “utópico” do “quimérico”, isto é, o ideal longínquo mas realizável da proposta puramente irrealizável (e, portanto, não positiva, que é apenas perda de tempo, energia e recursos em geral)

5.4.5.2.             Todas as nossas concepções devem corresponder à realidade; mas seja porque nossos recursos mentais são limitados, seja porque nossas concepções abstratas não abarcam toda a realidade, seja enfim porque a utilidade autoriza-nos a elaborar as ficções científicas, há sempre um espaço (maior ou menor) para elaborarmos diferentes enunciados ou formas de apresentar nossas concepções; nesse sentido muito específico, podemos sempre “manipular” nossas concepções, em particular no importante sentido de dotá-las de formas artísticas e altruísticas

5.4.5.3.             As utopias baseiam-se nas leis naturais; elas correspondem, então, em por um lado, às previsões científicas (especialmente as morais, sociológicas e biológicas) e, por outro lado, à extrapolação artística dessas previsões com objetivos práticos e morais[1]

5.5.    Além dos íntimos aspectos intelectuais e afetivos, que citamos até agora, devemos notar que a conduta cotidiana, isto é, a atividade prática precisa sempre de orientação geral, a fim de não nos perdermos nas preocupações cotidianas, no sem-número de questiúnculas, de mesquinharias, de egoísmos e de vistas particulares que nos desviam do altruísmo, do bem-estar coletivo e das vistas gerais

5.5.1. Clotilde resumiu exemplarmente bem essa necessidade ao afirmar: “Compreendi, melhor do que ninguém, a fraqueza de nossa natureza quando não é dirigida para um alvo elevado que seja inacessível às paixões” (3ª da suas máximas)

5.5.2. Aí entra o papel das utopias no Positivismo e na Religião da Humanidade

5.5.2.1.             Como deve estar ficando bastante claro, as utopias no Positivismo têm uma função prática, mas são profundamente orientadas por questões morais e intelectuais

5.5.2.2.             Em outras palavras, as utopias positivas são necessariamente religiosas, em vez de meramente políticas

5.5.2.2.1.                   Para evitar confusões, temos que lembrar: religião e teologia são coisas diferentes; a religião é a sistematização do conjunto da vida humana, em busca da unidade e da harmonia; a teologia é apenas uma das formas de entender o mundo que informou as religiões ao longo do tempo

5.6.    Assim, no v. IV da Política Positiva Augusto Comte afirmou a necessidade prática das utopias e, no caso do Positivismo, ele instituiu a utopia da virgem-mãe como supremo aperfeiçoamento humano, em que as mulheres poderiam conceber, sem a necessidade de intervenção masculina, ou seja, como um processo exclusivamente altruísta e puro

5.6.1. Faremos várias transcrições sobre esse tema, tomando por base as extensas citações de Teixeira Mendes em As últimas concepções de Augusto Comte (1898)

5.6.2. Sobre o papel das utopias:

“A fim de proceder melhor, convém primeiro explicar uma instituição religiosa, destinada especialmente a resumir o conjunto do nosso aperfeiçoamento, físico, intelectual e moral, concentrando-o em um progresso decisivo. Consiste ele em sistematizar a procriação humana, tornando-a exclusivamente feminina. Mas, antes de examinar esta utopia, indicada nos capítulos precedentes, devo caracterizar o seu destino, em virtude da necessidade de condensação peculiar a qualquer síntese, mesmo parcial, e sobretudo geral.

Tal concentração torna-se a conseqüência natural e o complemento necessário da divisão dos dois poderes, que é só o que a permite suscitando a sistematização, e a exige separando a teoria da prática. Não se pode desde então evitar ou reparar a dispersão dos sentimentos e dos pensamentos senão resumindo a síntese por uma instituição especial, para a qual convirjam as principais emoções e concepções. Mas essa necessidade comporta dois modos distintos de satisfação, os mistérios ou as utopias, conforme a religião é teológica ou positiva.

[...] Com efeito, a sistematização católica ficava essencialmente limitada ao sentimento, sem poder abraçar assaz a inteligência nem a atividade, cujas exigências soube iludir enquanto durou a transição afetiva. Pelo contrário, a plenitude necessária da síntese positiva obriga a instituição que deve resumi-la a representar simultaneamente os três elementos da natureza humana, segundo a verdadeira subordinação deles. É preciso, em uma palavra, que a sua conclusão sintética concilie a ordem e o progresso, instituindo um progresso que desenvolva o conjunto da ordem. Ora, tal é a aptidão das utopias convenientemente construídas, cujo surto crescente indicou, sem a satisfazer, a necessidade da unidade surgida da anarquia moderna” (Augusto Comte, Política positiva, p. 273-274, apud R. Teixeira Mendes, As últimas concepções de Augusto Comte, p. 452-454)

“Necessariamente conforme com a marcha da positividade, essas construções sintéticas foram até aqui limitadas à ordem exterior, sobretudo material, mas também vital. A mais bem elaborada e a mais eficaz surgiu, na Idade Média, com a química[2]. Durante a maior parte da revolução ocidental, a transmutação dos metais forneceu um admirável congraçamento a todos os esforços, teóricos e práticos, destinados a aperfeiçoar o nosso meio. O seu império prolongou-se até a aproximação da crise final[3], que veio enobrecer o surto utópico proporcionando-lhes sobretudo uma destinação social, anunciada, havia três séculos, por tentativas malogradas. Mas esse domínio final da positividade, tanto ideal como real, exigia uma doutrina universal, sem a qual a utopia, que deve constituir um resumo, pode somente tornar-se um apanhado, mais perturbador do que fecundo. Ora, essa condição fundamental acha-se suficientemente preenchida desde o advento decisivo da sociologia, donde resulta a irrevogável convergência da revolução ocidental para o estabelecimento da religião positiva. Este desenlace normal vem ao mesmo tempo eliminar as utopias perturbatrizes e substituí-las pelo congraçamento sintético de todas as dignas aspirações em torno de um progresso característico que representa a universal preponderância da moral.

Desde 1838, o terceiro volume da minha obra fundamental[4] anunciou espontaneamente semelhante tendência, propondo a introdução sistemática dos organismos fictícios para aperfeiçoar o conjunto da biologia. Mas essa primeira inspiração não tendo senão uma destinação intelectual, não se podia achar nela um tipo das utopias positivas, que devem ser tanto práticas como teóricas. Todavia, comparada com a transmutação dos metais, ela melhorava o surto utópico, estendendo-o da ordem material à ordem vital. Esse progresso foi melhor realizado na indicação inicial do presente tratado sobre a transformação dos herbívoros em carniceiros, encarada como o limite do aperfeiçoamento animal. Abrindo um vasto campo à ciência, tal utopia interessa igualmente à arte, não quanto aos laboratórios da nossa nutrição, nos quais o excesso de animalização seria nocivo, mas para os nossos companheiros de trabalho, que assim se tornariam mais ativos e mais inteligentes. Todavia, esse passo permanece insuficiente, pois que ele se limita ao domínio profano[5], sem levar a idealização positiva até a ordem humana, que constitui a sua principal destinação, como sendo ao mesmo tempo mais importante e mais modificável. Para instituir o surto utópico, que deve resumir a síntese final, é preciso pois estendê-lo ao domínio sagrado, que é o único capaz de condensar o progresso por meio da ordem, combinando os três modos ou graus do aperfeiçoamento, físico, intelectual e moral.

Tal é a teoria, ao mesmo tempo histórica e dogmática, das utopias positivas, nas quais a poesia e a filosofia devem concorrer melhor do que nas utopias teológicas e metafísicas, pois que o relativo aí sucede ao absoluto. Esta teoria torna-se aqui o complemento da da religião, resumindo a unidade real por um limite ideal, para o qual vêm especialmente convergir os votos, os projetos e as tentativas peculiares ao aperfeiçoamento contínuo da nossa tríplice natureza. Para melhor instituir esse congraçamento, é preciso especificar-lhe um só fito, salvo o renová-lo quando achar-se atingido; o que será sempre possível, atento o imenso domínio da providência humana, apenas esboçado até hoje, mesmo quanto ao meio.

Eis como sou conduzido a representar a utopia da Virgem-Mãe como o resumo sintético da religião positiva, cujos aspectos são todos combinados nela. A sua apreciação especial pertence ao tratado que prometi, para 1859, sobre a moral teórica e prática. Só posso aqui coordenar as principais indicações a esse respeito” (Augusto Comte, Política positiva, p. 274-276, apud R. Teixeira Mendes, As últimas concepções de Augusto Comte, p. 457-459)

5.6.3. Sobre a utopia da Virgem-Mãe:

“[...] A utopia da Virgem-Mãe tornar-se-á, para as mais puras e as mais eminentes, um limite ideal, diretamente apropriado a resumir o aperfeiçoamento humano, assim impelido a sistematizar a procriação nobilitando-a. Essa aptidão permanecerá sempre independente da solução real de tal problema, contanto que ele seja considerado como acessível, em vista do império, apenas esboçado até hoje, que a espécie mais modificável deve exercer sobre a sua própria constituição, mesmo física” (Augusto Comte, Política positiva, p. 240, apud R. Teixeira Mendes, As últimas concepções de Augusto Comte, p. 451)

5.7.    Alguns comentários adicionais:

5.7.1. O ideal da utopia da Virgem-Mãe foi proposto como sinal de desenvolvimento humano geral e não com o sentido exclusivista, discriminador e brutal do ultrapoliticismo feminista

5.7.2. De maneira mais concreta, no que se refere aos aspectos técnicos, devido aos avanços da medicina e da engenharia genética, a utopia da virgem-mãe realizou-se

5.7.2.1.             É necessário afirmar e reafirmar: essa realização dá-se apenas em termos técnicos; os necessários avanços morais, sociais e intelectuais estão muito atrás e, portanto, longe de terem sido realizados

5.7.2.2.             A respeito das novas utopias, Augusto Comte (Política positiva, p. 279, apud R. Teixeira Mendes, As últimas concepções de Augusto Comte, p. 464) recomenda que elas devem referir-se ao corpo humano, devido à íntima vinculação entre o progresso material e o aperfeiçoamento moral

5.7.3. Nas citações acima Augusto Comte observa que as utopias, além de serem um resumo sintético (ou melhor, religioso), são também um limite: a noção matemática de “assíntota” é sempre muito útil nesse caso

5.7.3.1.             A assíntota é uma função que tende no limite para um determinado valor (ainda que nunca chegue efetivamente a esse limite)

5.8.    A respeito das utopias meramente políticas:

5.8.1. Com base nas observações acima, torna-se bastante claro que e porquê de modo geral elas são falhas: ao não terem um aspecto sintético, ou religioso, elas não abarcam o conjunto da vida humana e, daí, sempre omitem ou sacrificam um ou outro aspecto

5.8.2. A partir de caminhos oblíquos, de modo geral se pensa no marxismo ou no socialismo ao falar-se atualmente em “utopias”; mas é claro que também devem entrar nesse título as utopias liberais (do livre mercado) e até mesmo as desgraças nazifascistas

5.8.2.1.             Na verdade, sendo mais correto, deve-se chamar os ideais marxistas, liberais e nazifascistas de “quimeras”, não de utopias

5.8.3. No que se refere ao Positivismo, com freqüência se afirma que a sociocracia é o nosso ideal político: evidentemente, isso é verdade; mas, a partir das observações acima, logo se vê que a sociocracia não é verdadeiramente a nossa “utopia”

6.       Encerramento



[1] Esse aspecto foi-me indicado, com o brilho e a generosidade habituais, por meu amigo Hernani Gomes da Costa.

[2] No caso, a referência é à alquimia e à busca da pedra filosofal ou, de maneira um pouco menos fantástica, à transformação de metais grosseiros (ferro e chumbo em particular) em ouro.

[3] Ou seja, da Revolução Francesa.

[4] Referência ao Sistema de filosofia positiva (1830-1842).

[5] Ou seja, às ciências inferiores (da Matemática à Biologia).

13 junho 2022

Curso livre de política positiva: vídeo da 14ª sessão

No dia 7 de junho ocorreu a décima quarta sessão do Curso livre de política positiva, com transmissão ao vivo no canal do Facebook Apostolado Positivista.

Nessa seção, continuei a exposição sobre a Sociologia Dinâmica, em particular o relato histórico feito por Augusto Comte; nesse sentido, tratei da astrolatria, das teocracias iniciais e da tríplice transição ocidental (Grécia, Roma, Idade Média); avancei até o duplo movimento moderno e cheguei à Revolução Francesa.

O vídeo pode ser visto no canal Positivismo (disponível aqui: https://www.youtube.com/watch?v=cPzBRkK7p2s) ou no próprio canal Apostolado Positivista (disponível aqui: https://www.facebook.com/watch/live/?ref=watch_permalink&v=430996588532035). 

A programação completa do Curso pode ser vista aqui. 

25 julho 2016

Turquia caminha com rapidez para a teocracia

Aquela que é possivelmente a única república laica do Oriente Médio caminha para ser mais uma das inúmeras "repúblicas" teocráticas. Nesse sentido, reverte a progressista ação desenvolvida desde a década de 1920, a partir da obra de Kemal Ataturk (o "pai da pátria turca") e garantida, sim, pelos militares turcos contra os clérigos.

Fonte: https://global.britannica.com/biography/Kemal-Ataturk

Dois comentários preliminares, de menor envergadura: 
(1) ao contrário do que o autor usa logo no início do artigo, no Brasil, corretamente, não se fala "NATO", mas "OTAN" (Organização do Tratado do Atlântico Norte); 
(2) o regime que se desenha na Turquia não é "inspirado na teocracia", mas é uma teocracia que se implanta aos poucos e cada vez mais.
O original do texto encontra-se disponível aqui.

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CONTRAGOLPE DE ESTADO

Governo da Turquia pode criar regime inspirado na teocracia

A Turquia foi o primeiro país com “democracia islâmica” a ingressar na Nato, a aliança militar europeia. Mas democracia, mesmo que islâmica, nunca foi o sonho do presidente da Turquia Recep Tayyip Erdogan, que já declarou: “Democracia é um trem do qual você desce quando chega ao destino”. Aparentemente, Erdogan viu na tentativa frustrada de golpe na Turquia o ponto final da democracia.
A pergunta que se faz em todo o mundo, neste momento, é o que Erdogan quer colocar no lugar da “democracia islâmica”. O professor da Universidade de Zaytouneh, Ibraim Alloush, disse à publicação americanaRT que “a intenção de Erdogan é implantar no país uma teocracia islâmica — mesmo que finamente velada”.
Nisso o presidente tem o apoio de seu governo e de seu partido, o AKP, cuja sigla significa Partido da Justiça e do Desenvolvimento. O AKP, com maioria no Congresso turco e que vem ganhando todas as eleições desde 2002, segundo o The Economist, há tempos concede um poder quase autocrático ao chefe do partido, o presidente Erdogan.
“Erdogan e todos os seus aliados no governo e no congresso compõem uma ramificação da Irmandade Muçulmana, uma organização islâmica que se disseminou em todo o mundo árabe depois de ser fundada no Egito. A plataforma dos partidários de Erdogan não é apenas recriar um estado religioso, mas reencarnar o Império Otomano. Assim, ele está usando a tentativa de golpe para executar o golpe real”, ele disse.
A vontade de Erdogan, particularmente, seria instalar no país uma autocracia islâmica, em vez de uma teocracia. Como uma autocracia, ele já concentraria todo o poder em suas mãos, sem correr o risco de que a teocracia islâmica colocasse o poder nas mãos de uma divindade (e de seus sacerdotes), sob a égide do Alcorão ou de tornar a Xaria a lei oficial do país, diz o site Al Monitor.
Porém, é mais fácil se tornar um governo autocrático com uma base de sustentação religiosa, porque o apoio popular brota naturalmente. Assim, para ter apoio popular, ele precisa usar a religião. Porém, só pode fazer isso até um certo ponto, porque, embora o simbolismo religioso exerça uma forte atração no povo turco, a criação de um estado islâmico, baseado no Alcorão, não tem a mesma força.
Uma pesquisa do Pew Research Center, em 2013, para apurar as inclinações políticas do povo turco, revelou que apenas 21% da população gostaria de tornar a Xaria a lei oficial do país. Em contraste, 84% dos paquistaneses e 74% dos egípcios apoiavam a ideia.
A ideia foi testada em abril, quando o presidente do Congresso turco, Ismail Kahraman, declarou que a nova Constituição da Turquia deveria abster-se de mencionar o “secularismo”, um dos princípios em que se sustenta a separação igreja-Estado. E adotar uma “constituição religiosa”, que fizesse referência a Deus.
A declaração gerou controvérsias, protestos em algumas cidades turcas e pedidos para Kahraman renunciar. Uma das críticas foi a de que o AKP finalmente estava mostrando sua “verdadeira cara” e sua “verdadeira intenção”, que seria a de instalar uma teocracia islâmica no país. Como Kahramn é um dos principais aliados do presidente Erdogan, levantou-se suspeitas de que a proposta era parte de um esquema orquestrado pelo governo.
Enquanto maquina o ponto final da democracia e, finalmente, o advento do poder absoluto, Erdogan precisa eliminar alguns entraves. Um dos maiores entraves seria, certamente, o Judiciário, que precisaria ser enfraquecido — e tornar subserviente o que restar dele. Afinal, o Estado de Direito, preservado pelo Judiciário, não combina com qualquer regime autocrático.
Na quarta-feira (20/7), o número de juízes e promotores afastados chegou a 2.745 e mais de cem membros da Corte Constitucional da Turquia (que equivale ao Supremo Tribunal do Brasil) — entre eles dois ministros que tomaram decisões que desagradaram o governo também foram afastados. Além deles, foram suspensos 262 juízes e promotores da Justiça Militar da Turquia.
Com o Executivo e o Legislativo nas mãos e, quem sabe, o Judiciário e com a oposição no mundo acadêmico sendo devastada por afastamentos, o governo turco poderá instalar um regime que se inspira na autocracia, na teocracia ou no islamismo, mas não é nenhum deles. Seria um “erdoganismo” diz o site Al Monitor.
Nesse suposto regime, o islamismo exerceria papéis importantes, como o de angariar apoio popular e facilitar a imposição de “leis” convenientes, mas não seria o elemento preponderante. Se fosse, colocaria a Turquia no mesmo caminho do Irã, da Arábia Saudita e outras organizações do mundo árabe.
O “erdoganismo” se ergueria a exemplo do “putinismo”, diz o site. O jornalista Fareed Zakaria observou que o “putinismo” consiste de cinco fundamentos: religião, nacionalismo, conservadorismo social, capitalismo estatal e controle da mídia governamental. Está na agenda do “putinismo”, sustentado na Igreja Ortodoxa, “proteger cristãos perseguidos em todo o mundo”. A agenda do “erdoganismo”, sustentado no islamismo, seria “proteger muçulmanos perseguidos em todo o mundo”.
 é correspondente da revista Consultor Jurídico nos Estados Unidos.
Revista Consultor Jurídico, 22 de julho de 2016, 18h35

10 novembro 2011

Laicidade como arma contra as pretensões políticas das religiões

Reproduzo abaixo entrevista com Catherine Kintzler.

* * *


« Le régime de laïcité est le mieux armé face aux prétentions politiques des religions… »

entretien avec Catherine Kintzler

Catherine Kintzler est philosophe. Elle est notamment l'auteur de
Qu'est ce que la laicité ? Vrin, 2007. Elle anime le site Mezetulle

Coralie Delaume. L’étude récemment conduite par Gilles Kepel sur les « banlieues de la République » a remis sur le devant de la scène la question de la place de l’islam en France. Cette enquête montre que dans certains « quartiers », l’appartenance religieuse a pris la place d’une promesse républicaine non tenue. En disant cela, ne suggère-t-on pas un peu vite que l’islam et la République sont deux systèmes concurrents, voire inconciliables ?
Catherine Kintzler. Il n'y a pas à choisir entre islam et République, car il n'y a pas à choisir entre religion et laïcité : la laïcité assure la liberté de conscience dont la liberté de culte fait partie. La loi républicaine ne demande que deux choses aux religions, c'est de renoncer à leur pouvoir civil et de renoncer à exercer un droit de regard sur de prétendues « communautés », sortes de « chasses gardées » dont elles pourraient contrôler les mœurs.

Même si dans une République comme la France, on ne « reconnaît » aucune communauté, on demeure obligé de les « connaître ». Force est de constater qu’elles existent de fait, et qu’elles génèrent des solidarités particulières.
Peut-être, mais l'adhésion à une communauté doit demeurer totalement libre, et cette liberté comprend sa réciproque : chacun doit aussi être libre de se soustraire à « sa » communauté.

Il semble qu’il y ait, dans la France d’aujourd’hui, une sorte de retour aux solidarités religieuses. Comment expliquez-vous ce phénomène ?
Il existe des tentatives, par les religions, de réaffirmer leur pouvoir civil. Cette perspective régressive est suscitée par une politique de démantèlement des services publics, elle-même oublieuse des principes fondamentaux d'une république laïque. Partout où la solidarité civile s'efface, un boulevard s'ouvre devant la marchandisation et devant l'action d'associations qui s'engouffrent dans la brèche et qui pratiquent le clientélisme. Il n'y a pas de politique laïque sans une politique ferme et homogène de bons services publics, c'est pourquoi le combat laïc est inséparable du combat social.

Au mois septembre, l’interdiction formelle de prier dans les rues est entrée en vigueur. Pour que cette interdiction soit respectée, l’Etat ne sera-t-il pas contraint, à terme, de financer des lieux de culte au profit des religions les plus récemment implantées ?
A ma connaissance il n'y a pas d'interdiction visant l'acte de prier dans la rue. Ce qui est interdit, ce sont les rassemblements et les manifestations qui entravent la liberté d'autrui ou qui troublent l'ordre public : si vous priez en vociférant et en apostrophant les passants, si vous organisez un sit-in envahissant un hall de gare ou obstruant la voie publique, vous tombez sous le coup de l'interdit. Il faut au moins qu'un rassemblement ou une manifestation susceptible d'entraver la voie publique soit temporaire et déclaré aux autorités chargées de faire respecter l'ordre public. On n'interdit donc pas les prières de rue parce que ce sont des prières, mais on interdit des rassemblements non déclarés qui portent atteinte au droit d'autrui – par exemple le droit d'aller et venir librement.

La mise en œuvre de cette interdiction aurait donc pu intervenir depuis longtemps !
Il me semble en effet. La publicité faite autour de cette prétendue nouveauté relève d'une opération de communication dans laquelle, en l'occurrence, le Ministre de l'Intérieur et les intégristes islamistes sont en miroir. L'un pour dire « voyez comme je suis ferme et innovant », les autres pour se présenter faussement en victimes d'une répression discriminatoire et pour réclamer à l'Etat des moyens matériels.
Apparaît alors l'idée que le financement des lieux de culte serait une mesure nécessaire pour la liberté des cultes et l'égalité entre les cultes. Cette position confond les « droits-liberté » et les « droits-créance » et fait comme si la liberté de culte était un « droit-créance».
La puissance publique garantit la liberté de culte : par exemple si des fidèles veulent ériger une église, une mosquée, un temple dans le respect du droit, elle doit faire respecter leur liberté contre ceux qui entendent s'y opposer. Mais cela ne veut pas dire qu'elle doive, en plus, assurer les moyens des cultes.

La liberté de culte n’est pas un service public, en quelque sorte…
C’est cela. La liberté des cultes n'est comparable, ni au droit à l'instruction, ni au droit à la santé, ni à aucune prestation sociale, ni au droit au logement ou au travail, qui sont des « droits-créance ».
On peut en revanche comparer la liberté des cultes au droit de propriété : j'ai le droit de m'acheter une voiture de luxe, et si je n'en ai pas les moyens, il n'appartient pas à l'Etat de m'y aider. Il s'agit d'un « droit-liberté ». On en juge aisément par la proposition réciproque : un « droit-liberté » inclut sa négative. Le droit d'être propriétaire inclut le droit de refuser de l'être. De même, ne pas avoir de culte est une liberté, un droit.
J'ajoute à cela trois remarques :
- lorsqu'une association manque de locaux, elle se tourne vers ses adhérents et leur demande une participation financière,
- s'agissant d'offices religieux, il n'est pas exclu d'envisager d'organiser plusieurs services successifs en cas d'affluence,
- la proposition de financement public fait comme si l'exercice d'un culte était une norme sociale et la transforme en norme politique. Or même s'il n'y avait qu'un seul incroyant, il aurait le droit d'objecter que la mesure est injuste et de récupérer son argent.

Quant à l'argument de l'égalité entre les cultes, il s'appuie sur le caractère historique de la loi de 1905 : les collectivités publiques sont propriétaires des lieux de culte principalement catholiques et se chargent de leur entretien. Mais d'autres cultes ne bénéficient pas de cette disposition... donc il faudrait rétablir l'égalité en injectant de l'argent public dans la construction de nouveaux locaux. Une telle disposition, si elle était valide, devrait valoir pour toutes les religions présentes et futures, et prendre en compte rétroactivement tous les édifices cultuels construits entre 1906 et aujourd'hui...

Ce qui est insensé, sauf à « démocratiser l’histoire afin que chacun en ait une part égale », comme plaisantait un jour Elisabeth Lévy…
C’est impossible en effet. On prétend qu'il y aurait un problème parce que l'islam s'est développé en France après la loi de 1905, et serait donc pénalisé par une histoire dans laquelle il n'a pas été présent. Mais la loi de 1905, comme toutes les lois, a été faite pour après sa promulgation ! Toute disposition juridique importante doit affronter la temporalité : « liquider » une situation antérieure, prendre des dispositions transitoires et fixer des délais à partir desquels elle s'applique pleinement. Cela a été fait clairement par la loi de 1905.

Dans un récent entretien au Monde des religions, Elisabeth Badinter affirmait : « en dehors de Marine Le Pen, plus personne ne défend la laïcité ». Au-delà du procès en sorcellerie qui s’ensuivit, la philosophe ne déplorait-elle pas simplement l’abandon progressif, par la droite comme par la gauche, de l’idéal laïc au profit de la simple « tolérance » présentée comme plus généreuse car “ouverte” ?

Le transfert du vocable « laïcité » dans l'escarcelle du Front national n'est pas tellement étonnant pour qui a observé la vie politique depuis une trentaine d'années. Le président de la République et son gouvernement y ont certes bien travaillé en faisant un grand écart, du discours de Latran aux déclarations de Claude Guéant. Mais la voie a été ouverte de longue date par bien des « forces de gauche » traditionnelles.
Deux dérives symétriques et complices permettent d'expliquer ces mouvements.La première dérive, je l'appelle la « laïcité adjectivée » (plurielle, ouverte, positive, etc.). Elle consiste à vouloir étendre au domaine de l'autorité publique - où s'applique rigoureusement le principe de neutralité - le régime de la société civile où doit régner le libre affichage des opinions dans le respect du droit commun. Cette dérive récuse le caractère neutre et minimaliste de la puissance publique républicaine, et peut autoriser les propos religieux au sein de l'Etat lui-même.
La seconde dérive, une forme « d'extrémisme laïc », consiste symétriquement et inversement à vouloir durcir l'espace civil en exigeant qu'il se soumette à l'abstention qui devrait régner dans le seul domaine de l'autorité publique. On a vu se former des groupes favorables à l'effacement dans l'espace civil de tout signe religieux, et qui ont diffusé récemment des thèmes non pas antireligieux (comme cela serait cohérent avec leur principe) mais plus particulièrement anti-musulmans.

Ces deux courants (laïcité adjectivée et extrémisme laïque) auraient donc, selon vous, favorisé l’appropriation des thématiques laïques par Marine Le Pen ?
Oui. L'un en désertant le terrain du combat laïque pendant de longues décennies, l'autre en l'investissant avec des propositions durcies et réactives, les deux en épousant le fonds de commerce des politiques d'extrême-droite, à savoir la constitution fantasmatique de « communautés » (en l'occurrence « les musulmans ») que les premiers révèrent en criant à la « stigmatisation » et que les seconds détestent.
Le mécanisme de balancier est alors facile à décrire. A force d'amollir la laïcité, d'en nier l'essence au point d'introduire le discours religieux comme légitime dans le domaine de l'autorité publique, à force de consacrer le fractionnement du corps social en reconnaissance politique d'appartenances particulières, à force de dissoudre l'idée républicaine, on finit par réveiller ou par produire un mouvement réactif et rigide. Ce mouvement réclame le « nettoyage » de toute présence du religieux dans l'ensemble de la vie civile et sa restriction à la seule vie intime - autant dire qu'il réclame l'abolition de la liberté d'opinion. Comment s'étonner que l'extrême-droite, criant à l'abandon de la laïcité, n'ait plus qu'à s'emparer d'un extrémisme (baptisé « laïcité ») aux ordres du nettoyage anti-religieux (que l'on réduit opportunément au nettoyage anti-musulman) ?

Poursuivons un instant sur le sujet de l’islam… Deux femmes portant le voile intégral ont été dernièrement verbalisées à Meaux, sanction qu’elles ont jugé contraire aux droits de l’homme.
Il faut distinguer d'une part la question du port du voile, qui n'est visé par aucune interdiction dans l'espace civil (le port de signes religieux et pas seulement celui du voile est prohibé uniquement dans les espaces participant de l'autorité publique (école publique incluse), et d'autre part celle de la dissimulation complète du visage visée par la loi de 2010. La verbalisation ne pouvait donc porter que sur la dissimulation du visage, et non sur le caractère religieux de tel ou tel vêtement. Si la loi de 2010 était contraire aux droits de l'homme, il me semble qu'elle aurait été « retoquée » par le Conseil constitutionnel.

Mais comment comprendre le comportement de femmes, qui défendent ainsi à grand bruit leur…droit à la soumission ?
Je ne m'interroge pas, à vrai dire, sur le bien-fondé de tel ou tel comportement, pourvu qu'il ne porte atteinte à aucun droit. On est libre dans la France républicaine de revendiquer ce qu'on veut, pourvu que cela ne contrarie le droit de personne. Si quelqu'un revendique comme une liberté ce que je juge être une soumission, je ne vois pas comment je pourrais le lui interdire, même si ça ne me plaît pas et que je ne me prive pas de le dire et de dire pourquoi. Mais si quelqu'un entend imposer une manière de vivre à autrui, j'ai le droit et le devoir de m'en inquiéter.

Avez-vous entendu parler de Kenza Drider, cette avignonnaise pro-niqab, ayant annoncé vouloir se présenter à l’élection présidentielle en 2012 ?
Franchement cela me semble une pure opération de propagande. Il lui faudrait d'abord obtenir les signatures d'élus pour se présenter. Et que veut-on prouver au juste ? Que le port du voile est interdit en France ? C'est faux. Seule la dissimulation du visage l’est.

Un film réalisé par Nadia El Fani, Laïcité Inch Allah, montre combien fut forte, dans les premiers jours du « printemps » tunisien, la demande de laïcité. Cependant, on a assisté lors des premières élections libres en Tunisie, à une forte percée du parti « islamo-conservateur » Ennahda. Les espoirs nés de la « révolution » tunisienne ne seraient-ils pas trahis, s’il advenait que l’islam soit reconnu comme religion d’Etat ?
Nous sommes entourés de pays où existe une religion d'Etat, et où cependant la liberté de pensée s'exerce, par exemple le Royaume-Uni. En Grèce la religion orthodoxe a le statut de « religion dominante » et est largement subventionnée. En Norvège, plus de la moitié des ministres doivent professer la religion d'Etat évangélique luthérienne. Un régime de religion d'Etat devient contraire à la liberté de pensée et d'expression lorsque cette religion est imposée à tous et qu'elle dicte la loi – il en va de même pour un athéisme d'Etat.

Mais n’y a-t-il pas contradiction entre l’existence d’une religion d’Etat - qui implique un statut d’infériorité pour les fidèles d’autres religions et pour les incroyants - et l’idée de démocratie qui implique quant à elle l’égalité de tous citoyens ?
Il y a de grandes différences entre un régime laïc et un régime de religion d'Etat tolérant. En régime laïc, la référence religieuse est superflue, inutile pour construire la cité : le lien religieux et le lien politique sont entièrement disjoints. La liberté des cultes s'inscrit dans le cadre de la liberté de conscience qui est beaucoup plus large. Autrement dit, le régime laïc est indifférent à la question de la religion et de l'athéisme, il est minimaliste.
Il s'ensuit une différence au niveau de la considération des personnes : dans un régime de simple tolérance comme ceux que j'ai cités, le fait d'avoir une religion est une norme sociale couramment admise – les incroyants sont tolérés, mais leur statut moral est déprécié. Le cœur politique de la différence entre le régime de la tolérance et le régime de laïcité, c'est l’accès des communautés en tant que tellesà l’autorité politique. Le régime de laïcité accorde des droits étendus à toutes les communautés, dans le cadre du droit commun. Mais ces droits sont civils : aucune communauté en tant que telle ne peut se voir reconnaître un statut politique. La souveraineté réside dans les citoyens et leurs représentants élus, et les droits sont les mêmes pour tous.

Il demeure pourtant possible à chacun de renoncer à sa prétendue « communauté » d’origine.
Cela est beaucoup plus facile en régime laïc qu'en régime de simple tolérance. La tolérance avec religion officielle ne fonctionne bien qu’à la condition qu’existe un consensus dans lequel les communautés acceptent de ne pas imposer leur loi comme exclusive et de laisser leurs prétendus membres libres de dire et de faire ce qui est réprouvé par la communauté mais permis par la loi, et acceptent que la critique puisse se déployer. Mais un dogmatisme intégriste n’est pas soluble dans la tolérance et s'il devient religion d'Etat, il installe une tyrannie.
Je pense qu'un régime de laïcité est plus clair et plus simple ; il peut s'appliquer à des pays où les différences culturelles et religieuses sont fortes car il construit un espace critique commun par la référence à la liberté de conscience, où s'inscrit la liberté des cultes. En régime laïc, une législation sur le blasphème ou qui placerait les religions au-dessus de toute critique est impensable.

En somme, plus il existe de « communautés » cohabitant dans un même pays, plus la laïcité, qui leur offre un espace commun, devient souhaitable…
Certainement. Le régime de laïcité est mieux armé face à aux prétentions politiques de la part d'une religion hégémonique parce qu’il monte la défense un cran plus haut : il ne propose à aucun groupe particulier un accès ès qualités à l'autorité politique, il n’en sacralise aucun.
Toutefois, l'existence d'une religion d'Etat peut se décliner sous régime de tolérance et n'est pas nécessairement contraire à la démocratie et aux libertés – c'est ce qui a été exposé par Locke au XVIIe siècle. Un tel régime repose sur un consensus culturel et religieux large ; mais son fonctionnement suppose aussi un consensus politique dans lequel la religion officielle renonce à s'imposer à tous, et renonce à s'ériger en pouvoir civil : qu'elle accepte de se présenter seulement comme une référence morale et spirituelle non contraignante. Cela suppose une législation indépendante du pouvoir et des dogmes religieux, et une vigilance des citoyens relative aux droits des individus.
A l’inverse si une religion dominante veut s'imposer comme hégémonique, et sortir du domaine de la référence « spirituelle », alors la tolérance ne suffit pas : la laïcité est beaucoup mieux armée pour la contenir. La France a longtemps connu une telle situation de religion hégémonique, et l'invention de la laïcité lui est historiquement liée.