No dia 17 de São Paulo de 169 (6.6.2023) realizamos a nossa prédica positiva, dando continuidade à leitura comentada do Catecismo positivista, em particular em sua sétima conferência, dedicada ao que podemos chamar de "filosofia das ciências naturais".
Após a leitura comentada, no sermão expusemos algumas considerações sobre as celebrações sociais empíricas, especialmente as que têm sido propostas a partir do século XX. As anotações que elaboramos a exposição oral estão reproduzidas abaixo.
A prédica foi transmitida pelos canais Positivismo (aqui: https://l1nq.com/RmHP2) e Apostolado Positivista do Brasil (aqui: https://l1nk.dev/Zb6mq). A exposição sobre as celebrações empíricas pode ser vista a partir de 58'.
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Sobre as celebrações empíricas
- Toda sociedade celebra seus valores coletivos
o Como sabemos, a celebração dos valores integra o culto, na medida em que a “celebração dos valores” implica a mobilização e o estímulo dos sentimentos
- Quando falamos que “toda sociedade celebra seus valores”, temos que ter clareza que a expressão “sociedade” não é unívoca
o Embora no dia-a-dia ela denote “sociedade nacional”, isto é, a pátria, o fato é que a ela corresponde vários níveis sucessivos e complementares entre si
o Augusto Comte distingue de maneira elementar três níveis, de acordo com seus fundamentos e sua amplidão: a família, a pátria e a Humanidade (embora haja evidentemente graus intermediários, como, por exemplo, o que chamamos atualmente de “civilização”)
§ Cada um desses níveis celebra seus valores coletivos, das mais variadas maneiras:
· As famílias realizam encontros gastronômicos, festas de aniversário, celebrações civil-religiosas etc.
· As pátrias realizam festas populares (feiras, quermesses, carnaval), comícios políticos, eventos esportivos etc. – e a decretação de dias especiais e feriados
· A Humanidade de modo geral emprega os mesmos meios usados pelas pátrias, embora em geral com diferenças na forma de sua implantação: festas populares (feiras), comícios políticos, eventos esportivos etc. – e a decretação de dias especiais
- Nas sociedades ocidentais, o aspecto cultual das celebrações coletivas torna-se cada vez menos evidente, embora nem por isso ele deixe de existir e de ser verdadeiro
o Vale notar, de passagem, que a disciplina acadêmica chamada Antropologia estuda esses ritos em todas as sociedades e que, assim como o Positivismo, tem clareza de que mesmo as sociedades ocidentais possuem tais celebrações
- É necessário termos clareza de que essas celebrações têm algumas particularidades:
o Na medida em que, de diferentes maneiras, elas celebram efetivamente valores coletivos, elas mais ou menos sempre correspondem aos valores gerais da civilização em questão
o Por outro lado, com freqüência, mas não sempre e não necessariamente, elas têm origem popular
o Mas, correspondendo aos valores da civilização e tendo origem popular ou não, o fato é que é sempre o sacerdócio que sistematiza e sanciona tais celebrações
o Mesmo que o poder Temporal referende tais celebrações, o fato é que elas integram plenamente o âmbito do poder Espiritual; prova disso é que não basta um governo estabelecer uma data comemorativa qualquer e/ou instituí-la como feriado: se não houver sentimentos populares e a sistematização sacerdotal, as datas serão apenas formalidades e/ou dias meramente caracterizados pelo ponto facultativo
o Vale lembrar que os calendários têm uma dupla função, a que o sacerdócio está intimamente vinculado:
§ Por um lado eles regulam a passagem do tempo, em unidades maiores ou menores, de acordo com progressões cíclicas ou “lineares”: horas, minutos, segundos; dias, meses, anos, séculos etc.
§ Por outro lado, essa passagem do tempo, ou melhor, a contagem do tempo é sacramentada pelo sacerdócio:
· Cada civilização tem sua contagem própria de anos, cujo início é (ou foi) estabelecido pelo sacerdócio
· Os dias da semana, os meses e até os anos são dedicados a diferentes aspectos da vida coletiva: lunedia, martedia, mercuridia, jovedia, venerdia, sábado, domingo, segunda-feira, terça-feira etc.; ano do boi, do rato, do tigre, do dragão; mês do ramadã etc.
· Além disso, no Ocidente, a partir da sistematização católica dos sentimentos populares, cada dia é dedicado a um ou mais santos
o É devido a esses motivos que a Religião da Humanidade estabelece múltiplos e sistemáticos sistemas de comemoração: pessoais, familiares, nacionais e mundiais:
§ Cada mês do ano é dedicado a um aspecto abstrato da existência humana positiva (em número de 13) e a um aspecto histórico do desenvolvimento da Humanidade (também em número de 13)
§ Cada semana é dedicada a um aspecto abstrato específico (em número de quatro) e a um aspecto histórico específico (em número de quatro)
§ Cada dia é dedicado a uma figura histórica geral representativa da evolução humana (em número de sete) e também a uma ou mais figuras históricas específicas (em um total de cerca de 500)
o Fora isso, temos que lembrar que a Religião da Humanidade consagra diversas festas cívicas
§ No Brasil, essas festas foram acatadas pelo governo republicano provisório em 14 de janeiro de 1890, por meio do Decreto n. 155-B (mas, a partir de 1930, substituídas pelas comemorações clericalistas católicas)
- O declínio acentuado da teologia, como notamos acima, conduz o Ocidente a cada vez mais desconsiderar as festas sacramentadas pela teologia
o Isso se dá de duas maneiras:
§ Por um lado, o ritmo geral da vida deixa de ser religioso e teológico para ser cada vez mais pragmático-utilitário e humano
§ Em conseqüência do aspecto anterior, as festas e as celebrações teológicas perdem cada vez maior a relevância e são lembradas cada vez menos; inversamente, cada vez mais elas são lembradas por seus aspectos humanos (o que, infelizmente, com freqüência se reduz aos seus aspectos comerciais)
- Em face do evidente e necessário declínio da teologia no Ocidente, desde o final do século XVIII sistemas coletivos e mais ou menos sistemáticos de celebrações têm surgido:
o Antes de mais nada, devemos reafirmar a centralidade do culto público positivista, que já recordamos em traços muito breves acima
o Durante a Revolução Francesa, propuseram-se novas celebrações, algumas com caráter francamente metafísico (o culto ao Grande Ser), outras com um caráter mais positivo (a mudança de contagem do calendário e os novos nomes para os meses: Frutidor, Prairal, Brumário etc.)
o As celebrações propostas pelos movimentos proletários (anarquistas, “socialistas utópicos”, as primeiras internacionais socialistas) e as celebrações criadas após a Revolução Russa
- Entrando, enfim, no tema específico deste sermão: por outro lado, desde o início do século XX inúmeras celebrações empíricas têm surgido e são cada vez mais comuns
o Pela expressão “celebrações empíricas” eu penso principalmente nas celebrações públicas decretadas pelo governo, isto é, pelo poder Temporal, em homenagem às mais variadas questões
§ O poder Temporal, aqui, não se resume aos chefes políticos das pátrias (isto é, dos países), mas considera também as celebrações ditas “internacionais” ou “mundiais”, propostas pela Organização das Nações Unidas e suas instituições secundárias (Unesco, Unicef, OIT etc.)
o Essas celebrações são “empíricas” porque correspondem apenas aos valores julgados importantes nos momentos históricos em que são instituídas
§ São celebrações não sistemáticas e, antes, não sancionadas por nenhum poder Espiritual
§ Em outras palavras, elas são “empíricas” porque, embora mais ou menos correspondam aos sentimentos populares, elas são feitas às cegas
o O “empirismo” de tais celebrações e o seu caráter “às cegas” resulta em que há celebrações efetivamente importantes, assim como há muitas relevantes; mas há também celebrações de realidades humanas secundárias, quando não caricatas e, conforme o espírito do tempo em que são criadas, há muitas com maior ou menor particularismo
§ Duas belas datas são o 1º de janeiro (Dia Internacional da Fraternidade Universal) e o dia 5 de junho: “dia mundial do meio ambiente”
§ As celebrações que chamamos de “relevantes” são, por exemplo, as que homenageiam as profissões e as atividades práticas, além das que homenageiam os laços domésticos (mães, pais, avós etc.)
§ Uma data caricata é o dia 8 de junho: “dia do cunhado”
§ As datas particularistas são todas as propostas pelo clericalismo (católico ou evangélico) e/ou pelos identitarismos (de “raça”, de gênero)
o Os problemas com o empirismo dessas datas são os seguintes:
§ Por um lado, elas são sujeitas às conjunturas políticas de cada momento, de modo que podem perder o seu caráter de festa coletiva e tornar-se apenas uma intromissão do poder Temporal no domínio espiritual
§ Por outro lado, mesmo quando as celebrações estabelecidas correspondem efetivamente a aspectos positivos da realidade humana, elas carecem de profundidade moral (ao abordarem apenas um aspecto da existência humana, com freqüência a realidade prática) e também carecem de integração sistemática (ou, se desejar-se, integração “sistêmica”) com o conjunto da vida humana
· Em outras palavras, o empirismo dessas celebrações conduz a que lhes falta a amplitude e a profundidade que somente a concepção religiosa do Positivismo pode realizar
- Para retomar alguns argumentos e, assim, concluir:
o As atuais celebrações empíricas, em si mesmas, de modo geral são objeto de simpatia, na medida em que celebram aspectos da existência humana
o Entretanto, o seu empirismo precisa com urgência cada vez maior ser corrigido pela sistematização religiosa desenvolvida pelo sacerdócio positivo
o Tal sistematização corretora é necessária por vários motivos:
§ Muitas celebrações são estabelecidas apenas em função e como resultado das disputas políticas do momento
§ Muitas celebrações empíricas estimulam o egoísmo particularista, enquanto outras são meramente tolas
§ Além disso, mesmo no caso das celebrações corretas, elas são tanto superficiais quanto isoladas (quando não meramente presentistas), ou seja, elas falham quase totalmente em seus propósitos religiosos
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