No ano de 2022, em duas ocasiões (4 de abril e 10 de novembro) tive a honra de ser convidado por militantes do Partido Democrático Trabalhista (PDT) para apresentar alguns dos princípios e das propostas sociopolíticas do Positivismo, tendo especialmente em vista a influência que eles exerceram sobre o trabalhismo no Brasil. Na primeira oportunidade fui convidado pelo gaúcho Luciano B. Zini; na segunda ocasião, pelo cearense Samuelson Xavier: a ambos, o meu agradecimento!
Em ambas as ocasiões as conversas subsequentes duraram várias horas, abordando os mais variados temas, inclusive aspectos da história política e social brasileira, como a influência do Positivismo no Rio Grande do Sul e também sobre os militares. Assim, foram ocasiões excelentes para o esclarecimento e a correção de mitos há muito difundidos. Da mesma forma, essas conversas sugeriram-me novos temas para reflexão e pesquisa.
Reproduzo abaixo o roteiro das minhas exposições.
* * *
Roteiro:
o Apresentação pessoal
o Definição apofática
o “Ordem e Progresso”
o Primado da sociedade, ação individual
o Propostas políticas
o Propostas sócio-econômicas
- Apresentação pessoal
o Sociólogo da UFPR
o Doutor em Sociologia Política (UFSC)
o Positivista ortodoxo
o Dono dos canais Positivismo, Apostolado Positivista e Filosofia Social e Positivismo
- Definições apofáticas
o Que é o Positivismo?
§ O Positivismo é:
1)
“Positivismo”
significa, para mim, a obra de Augusto Comte
2) Uma religião secular, uma filosofia histórica, relativista e objetiva-subjetiva, uma prática humanista, pacifista, tolerante, universalista e includente
a. É um sistema de educação universal
3) “Real, útil, certo, preciso, relativo, orgânico, simpático”
4) Uma religião que afirma, regula e estimula o altruísmo inato (que, por sua vez, orienta e limita o egoísmo também inato)
5) Uma política humanista, altruísta, racional, histórica, sensível à opinião pública e baseada em evidências e nas liberdades
6) Uma afirmação da realidade humana e dos valores humanos
7) Uma afirmação da historicidade humana e, portanto, do relativismo
§ O Positivismo não é:
1) Não é ateísmo
2) Não é uma “teologia científica” (Religião da Humanidade)
3) Não é um cientificismo nem um academicismo
a. Não é reducionista (ele afirma a dignidade de cada ciência e, em particular, do ser humano e das Ciências Humanas)
4) Não é um “naturalismo” (não reduz as Ciências Humanas às Ciências Naturais)
a. Não é a favor da oposição “explicação” versus “compreensão”
5) Não é um “empiricismo”
6) Não é ideológico
a. Não é uma ideologia burguesa
7) Não é militarista
8) Não é uma afirmação do Estado totalitário nem da sociedade sufocante anti-indivíduo
9) Não é otimismo ingênuo (“pensamento positivo”)
10) Não é nem idealista nem materialista
11) Não é fatalista nem nega a liberdade humana
- “Ordem e Progresso”
o França posterior à Revolução Francesa
§ Busca de uma nova organização social e de novos princípios legitimadores, adequados a uma sociedade industrial e com a ciência
§ Oscilação entre a “ordem” (retrógrados, teológicos, absolutistas) e o “progresso” (revolucionários, metafísicos, absolutistas)
§ Necessidade de conciliação e superação entre a ordem e o progresso:
· Sociologia da ordem: fundada por José de Maistre
· Sociologia do progresso: fundada por Condorcet
· Contribuição de Augusto Comte: conjugação entre a ordem e o progresso (além do desenvolvimento da reflexão sobre as ciências, sobre o que é a cientificidade, sobre os métodos e o objeto da Sociologia, sobre a aplicabilidade da Sociologia etc.)
§ Busca de um novo poder espiritual: necessidade e oportunidade de fundação de uma ciência relativa à sociedade:
· necessidade de entender o que ocorria na Europa após a Revolução Francesa e de solucionar os problemas sociais e políticos
· disponibilidade de meios intelectuais para isso (o desenvolvimento do método científico e a conseqüente maturidade intelectual para a criação da Sociologia)
- Primado da sociedade, ação individual:
o A fundação da Sociologia evidencia que o ser humano é antes e acima de tudo um ser social e histórico
o Como a Sociologia parte do conjunto para as partes, não existem “indivíduos”, apenas seres humanos em sociedades
§ Antepor a análise dos indivíduos à das sociedades resulta em considerar os seres humanos como animais, não como seres humanos
§ As “células sociais”, isto é, as menores unidades de análise sociológica são as famílias
o Apesar disso, a sociedade possui agentes: são os indivíduos
§ Os “indivíduos” criticados por A. Comte são as elaborações próprias ao individualismo (que rejeita a sociedade e a vida coletiva, em uma busca da satisfação estritamente pessoal), que surgiram na Idade Média teológica e reafirmaram-se na Idade Moderna com a metafísica
o “Consagrar para regular”: indivíduo buscando a satisfação pelo altruísmo
§ A consagração dos indivíduos é necessária não somente porque são eles que concretamente agem como também porque é necessário afirmar a responsabilização social das condutas e das decisões individuais
- Propostas políticas:
o Governo
§ Conjugação dos princípios de Aristóteles e de Hobbes:
· Aristóteles: “a sociedade consiste na divisão do trabalho e na convergência dos esforços”
· Hobbes: todo governo baseia-se na força
§ “Não existe sociedade sem governo”
· Afirmação das vistas de conjunto da sociedade
· Preocupação em como se maneja o poder, não com quem o ocupa
· Dois pólos sociopolíticos: Estado e sociedade civil
§ Poderes:
· Temporal: manutenção da ordem civil (âmbito de aplicação das ciências inferiores)
· Espiritual: opiniões e crenças (âmbito de atuação das ciências superiores)
o Em termos gerais:
§ pacifismo, antimilitarismo, rejeição normal da violência
§ política humanista, altruísta, racional, histórica, sensível à opinião pública e baseada em evidências e nas liberdades
§ afirmação de deveres de todos para com todos
§ meritocracia com justiça social
§ afirmação da sociedade civil
o Governo:
§ republicanismo
§ separação dos dois poderes (“laicidade do Estado”)
§ desenvolvimento econômico e social
- Propostas sócio-econômicas:
o A teologia e a metafísica são incapazes de abarcar a realidade material da sociedade; portanto, são incapazes de solucionar seus problemas
o A propriedade enquanto tal sempre existe (privada ou coletiva)
o Manutenção e aumento dos tipos de capital
§ material, intelectual e moral
§ responsabilidade pessoal pela gestão dos recursos
§ “O capital é social em sua origem e deve sê-lo em sua destinação”
o Formas de transmissão do capital: guerra: conquista; paz: dádiva, troca, herança
o Emancipação paulatina dos trabalhadores (e das mulheres): escravos na Antigüidade, servos na Idade Média, trabalhadores livres na modernidade
o Necessidade de concurso entre o patriciado e o proletariado
§ Riqueza: força concentrada; trabalho: força dispersa
§ Caráter instrumental da luta de classes
o Justiça social:
§ incorporação social do proletariado
§ “funcionalismo público”
§ conjugação entre liberdades políticas e econômicas e atuação do governo (crítica ao liberalismo econômico)
§ caráter social da riqueza
§ responsabilidades individuais e coletivas
· noção de deveres: relações mútuas devidas entre indivíduos e grupos entre si
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