09 novembro 2022

Anotações sobre a teoria positiva dos deveres

No dia 4 de Frederico de 168 (8.11.2022), como de hábito, fizemos uma prédica positiva; na parte da leitura comentada do Catecismo positivista, demos continuidade à teoria geral do culto, começando a abordar a oração positiva. Já na parte de sermão, abordamos aspectos da teoria positiva dos deveres.

Essa exposição da teoria dos deveres foi pensada como um complemento, ou melhor, como o antecedente lógico e moral da teoria da felicidade (que, por sua vez, foi exposta na prédica anterior).

Sem pretender esgotar a teoria positiva dos deveres - bem longe disso! - as anotações que serviram de base para a exposição estão disponíveis abaixo. A exposição oral está disponível aqui (no canal Positivismo do Youtube) e aqui (no canal Apostolado Positivista do Facebook), a partir de 48' 30".

*   *   *

Anotações sobre os deveres

 

-        O ser humano é um ser relacional: as suas relações constituem a sociedade e tornam humano o ser humano

o   Qualquer que seja o objetivo, o ser humano precisa sempre se relacionar para atingir as metas

o   Evidentemente, tanto o egoísmo como, principalmente, o altruísmo exige as relações

§  Como sabemos, por definição o altruísmo baseia-se nas relações humanas

o   Dessa forma, as relações sociais têm que ser afirmadas e estimuladas, quer seja para que o ser humano progrida materialmente, quer seja para que, em particular, progrida moralmente

o   De uma perspectiva moral e política, a afirmação das relações consiste nos deveres, que constituem precisamente as relações mútuas entre grupos e indivíduos

o   Uma outra forma de entender os deveres consiste nas obrigações que os grupos (e os indivíduos) mantêm entre si, no sentido de satisfazerem determinadas necessidades e responsabilidades

-        Como dizia Clotilde de Vaux, “para criar sentimentos são necessários deveres”

o   Isso significa que as obrigações entre grupos (e indivíduos) estimulam e desenvolvem os sentimentos correspondentes

o   De modo mais específico: a felicidade individual é uma conseqüência do comprimento dos deveres (e, de maneira mais precisa, dos deveres altruístas), não o seu pressuposto ou a sua meta

-        Enquanto a noção de deveres é a forma positiva de estimular e regular as relações sociais, a noção teológica e, principalmente, metafísica é a noção de “direitos”

o   Os direitos são obrigações unilaterais que um grupo (ou um indivíduo) têm para com outros grupos (ou indivíduos)

o   De maneira mais direta e mais clara, uma outra forma de entender os direitos consiste em que eles são privilégios que determinados grupos (e/ou indivíduos) possuem e que podem exigir, de maneira unilateral, dos demais grupos (e/ou indivíduos)

§  O caráter fundamentalmente antissocial da noção de direitos é bastante claro, portanto

o   A noção de direitos tem um aspecto teológico e também pode ter um aspecto metafísico

§  Essas origens revelam-se na forma dos “direitos divinos” e, depois, nos “direitos naturais”

§  O aspecto teológico da noção de direitos evidencia-se quando a divindade estabelece para alguns grupos (e/ou indivíduos) a possibilidade de exigir unilateralmente dos demais a prestação de bens e/ou serviços

§  Já o aspecto metafísico dos direitos evidencia-se no rompimento dos vínculos mútuos entre grupos (e/ou indivíduos): nesse caso, a metafísica manifesta-se no caráter dissolvente dos direitos e, de maneira mais ampla, no caráter dissolvente dos antigos laços sociais

§  Tendo origem teológica e estendendo-se para a metafísica, os direitos e seu unilateralismo são absolutos e anti-relativos (e, como já vimos, não por acaso são anti-relacionais)

o   A constituição de uma sociedade positiva, humana, fraterna e relativa exige necessariamente, portanto, a substituição dos direitos pelos deveres

-        Reiterando: os deveres são mútuos

o   Os deveres mútuos são obrigações e responsabilidades que um grupo (e/ou um indivíduo) deve para outro(s) grupo(s) e este(s), por sua vez, deve(m) para o primeiro grupo

§  Os deveres mútuos implicam, portanto, responsabilidades de parte a parte, quando não responsabilidades compartilhadas

o   As responsabilidades variam, portanto, de grupo para grupo, da mesma forma que o tamanho dessas responsabilidades

·         Exemplo: o patriciado e o proletariado têm responsabilidades pelo menos em termos de manutenção e geração de riquezas materiais, cada qual em sua posição social

·         Mas as responsabilidades do patriciado são maiores: não apenas em termos de manutenção e aumento das riquezas (que, grosseiramente, podemos considerar apenas como a realização do lucro), mas principalmente em termos de pagamento de salários dignos para os proletários

o   A fórmula que resume as obrigações mútuas é esta: devotamento dos fortes aos fracos e veneração dos fracos pelos fortes

§  Na Antigüidade a veneração dos fracos era enfatizada; na sociocracia, o devotamento dos fortes tem maior importância

-        Os deveres têm um caráter moral e não político

o   Os deveres devem ter um caráter moral e não político devido a pelo menos dois motivos:

§  O caráter político (isto é, obrigatório) dos deveres torná-los-ia opressivos

§  O caráter moral dos deveres evidencia seu caráter facultativo e, portanto, também o valor da adesão a eles

o   Vale notar que o caráter moral e não político dos deveres consiste em uma aplicação adicional do princípio da separação entre os poderes Temporal e Espiritual

-        No que se refere aos “direitos”, ainda é necessário indicar que a palavra “direito”, nas línguas neolatinas, resulta em uma confusão, entre o ordenamento jurídico (Law) e os direitos como antideveres ou como não-deveres (rights); mas há que se distinguir entre uma coisa e outra


Nenhum comentário:

Postar um comentário