27 agosto 2025

O início do Positivismo: as três leis dos três estados

No dia 14 de Gutenberg de 171 (26.8.2025) fizemos nossa prédica positiva, dando continuidade à leitura comentada do Apelo aos conservadores (em sua Primeira Parte - "doutrina apropriada aos verdadeiros conservadores").

No sermão abordamos o início do Positivismo, ou seja, as três leis dos três estados.

Também fizemos referência à publicação, pela Revista Parajás, de uma longa entrevista que seus editores fizeram conosco, disponível aqui: https://filosofiasocialepositivismo.blogspot.com/2025/08/revista-parajas-entrevista-com-gustavo.html.

Da mesma forma, fizemos referência à defesa honesta, corajosa e simpática que o católico Deyvid Antônio fez do Positivismo, da Religião da Humanidade e também do Apelo aos conservadores, como se vê aqui: https://www.youtube.com/watch?v=mA0zUWgBcKM.

A prédica foi transmitida nos canais Positivismo (aqui: https://youtube.com/live/siZ2uP8TyD0) e Igreja Positivista Virtual (aqui: https://www.facebook.com/IgrejaPositivistaVirtual/videos/2562584607432845/).

As anotações que serviram de base para a exposição encontram-se disponíveis abaixo.

*   *   *

As três leis dos três estados

(14.Gutenberg.171/26.8.2025) 

1.      Invocação inicial

2.      Datas e celebrações:

2.1.   Nesta semana não temos nenhuma celebração especial

3.      Notícia sobre a publicação da entrevista à Revista Parajás

3.1.   O artigo “Entre o Positivismo, a academia e o poder Espiritual: uma entrevista com Gustavo Biscaia de Lacerda” foi publicado no v. 7, n. 2, p. 1-65 (Montes Claros, 2024)

3.2.   É uma longa entrevista – com 65 páginas! –, que aborda os mais variados aspectos da minha atuação: como pesquisador, como positivista, como cidadão, como ser humano

3.3.   Agradeço imensamente à equipe da Revista Parajás, em particular a Ricardo Cortez Lopes e a Renat Nureyev Mendes, pela possibilidade de conceder essa entrevista

3.4.   O texto está disponível aqui: https://revistaparajas.com.br/index.php/rv1/article/view/133/99.

4.      Leitura comentada do Apelo aos conservadores

4.1.   Antes de mais nada, devemos recordar algumas considerações sobre o Apelo:

4.1.1.     O Apelo é um manifesto político e dirige-se não a quaisquer pessoas ou grupos, mas a um grupo específico: são os líderes políticos e industriais que tendem para a defesa da ordem (e que tendem para a defesa da ordem até mesmo devido à sua atuação como líderes políticos e industriais), mas que, ao mesmo tempo, reconhecem a necessidade do progresso (a começar pela república): são esses os “conservadores” a que Augusto Comte apela

4.1.1.1.           O Apelo, portanto, adota uma linguagem e um formato adequados ao público a que se dirige

4.1.1.2.           Empregamos a expressão “líderes industriais” no lugar de “líderes econômicos”, por ser mais específica e mais adequada ao Positivismo: a “sociedade industrial” não se refere às manufaturas, mas à atividade pacífica, construtiva, colaborativa, oposta à guerra

4.2.   Outras observações:

4.2.1.     Uma versão digitalizada da tradução brasileira desse livro, feita por Miguel Lemos e publicada em 1899, está disponível no Internet Archive: https://archive.org/details/augustocomteapeloaosconservadores

4.2.2.     O capítulo em que estamos é a “Primeira Parte”, cujo subtítulo é “Doutrina apropriada aos verdadeiros conservadores”

4.3.   Passemos, então, à leitura comentada do Apelo aos conservadores!


Quadro da alma humana - Apelo aos conservadores, p. 63


5.      Exortações

5.1.   Sejamos altruístas!

5.2.   Façamos orações!

5.3.   Como Igreja Positivista Virtual, ministramos os sacramentos positivos a quem tem interesse

5.4.   Para apoiar as atividades dos nossos canais e da Igreja Positivista Virtual: façam o Pix da Positividade! (Chave Pix: ApostoladoPositivista@gmail.com)

6.      Sermão: as três leis dos três estados

6.1.   Tendo sido muito conhecido no século XIX e nas décadas iniciais do século XX, desde o período entre-guerras – ou seja, desde a ascensão das metafísicas do nazifascismo, do comunismo, do existencialismo e do irracionalismo de modo geral – o Positivismo tornou-se um desconhecido do grande público

6.1.1.     Esse desconhecimento, como já cansamos de indicar, anda junto com a eleição do Positivismo como o inimigo preferencial de todos os que querem indicar inimigos a combater, seja em termos intelectuais, seja em termos políticos; em outras palavras, o Positivismo é o bode expiatório preferencial, eleito para essa duvidosa posição por autoritários (comunistas, nazifascistas), democráticos e teológicos

6.1.2.     De qualquer maneira, enquanto era melhor conhecido, o Positivismo produzia seus efeitos mais importantes: afirmação da fraternidade, preocupações sociais, visão de conjunto, combate à violência, promoção da tolerância e da concórdia etc.; em suma, união da ordem e do progresso

6.1.3.     Além disso, de maneira correlata, para aplicação do Positivismo conheciam-se melhor, e mais adequadamente, as suas diversas concepções, entre as quais as leis dos três estados

6.2.   As leis dos três estados são a base e o início filosófico e científico do Positivismo

6.2.1.     Esse início é tanto do ponto de vista teórico quanto cronológico: a sistematização desenvolvida por Augusto Comte começa com a reflexão das leis dos três estados, que, por sua vez, realizou-se logo no início da carreira adulta de nosso mestre (em 1822)

6.2.1.1.           Vale notar que Augusto Comte jamais considerou que as leis dos três estados são concepções puramente abstratas postuladas a priori; bem ao contrário, elas são elaborações com base empírica, a partir da observação histórica; o seu próprio conteúdo indica a longa série de observações e passos necessários para o ser humano compreender o mundo em que vive e a si mesmo

6.2.1.2.           Não por acaso, o conjunto das condições mentais, sociais e afetivas necessário para a apreensão e o entendimento da realidade está consignado na “Filosofia Primeira”, em um total de 15 leis

6.2.1.2.1.                As três leis dos três estados estão no “Segundo grupo – essencialmente subjetivo”, na sua “primeira série – leis dinâmicas do entendimento”, da Filosofia Primeira, correspondendo às leis de números VII a IX


Leis da Filosofia Primeira - Catecismo positivista, 4a. ed., 1936, p. 479

6.2.2.     Estamos falando em leis, no plural, porque é exatamente disso que se trata: são três leis, uma para cada aspecto da natureza humana (afetivo, intelectual e prático)

6.2.2.1.           As três leis são estas:

6.2.2.1.1.                Lei intelectual: toda concepção passa por três estados sucessivos, teológico, metafísico e positivo, com uma velocidade proporcional à generalidade dos fenômenos correspondentes

6.2.2.1.2.                Lei prática: a atividade humana é sucessivamente militar conquistadora, depois militar defensiva e por fim pacífico-industrial

6.2.2.1.3.                Lei afetiva: a sociabilidade humana é sucessivamente doméstica, depois cívica e enfim universal, seguindo a natureza de cada um dos três instintos simpáticos [veneração, apego e bondade]

6.2.2.2.           A primeira lei a ser descoberta foi a lei intelectual; em seguida foi a prática; finalmente, foi a afetiva

6.2.2.3.           Associada à lei intelectual dos três estados há a lei da classificação das ciências

6.2.2.3.1.                A lei da classificação organiza as ciências fundamentais em número de sete, que vão da mais geral, mais simples, mais objetiva e mais abstrata à mais específica, mais subjetiva, mais complicada e mais concreta

6.2.2.3.2.                As ciências fundamentais são estas: Matemática, Astronomia, Física, Química, Biologia, Sociologia e Moral

6.2.2.3.3.                A lei da classificação (1) explica e exemplifica a lei dos três estados; (2) apresenta um painel da compreensão da realidade; (3) apresenta e aplica a regra de classificação

6.2.2.3.4.                Augusto Comte desenvolveu uma série de reflexões sobre a lei das classificações e sobre as ciências fundamentais, estabelecendo diferentes arranjos que apresentam, cada qual, diferentes propriedades lógicas, morais e práticas; o arranjo final, presente na Síntese subjetiva, estabelece três grandes ciências: Lógica (Matemática), Física (Astronomia, Física, Química) e Moral (Biologia, Sociologia, Moral)

6.3.   Antes de tratarmos de cada uma das três leis dos três estados, é necessário fazermos alguns comentários sobre a concepção de leis sociológicas, especialmente de algumas objeções a elas, a fim de limparmos o terreno

6.3.1.     É moda nas Ciências Sociais e na Filosofia, a partir de variadas concepções metafísicas, decretar que não existem leis nas ciências humanas, pois o ser humano seria “livre”:

6.3.1.1.           Segundo esses metafísicos, a afirmação de leis naturais próprias aos seres humanos negaria sua “liberdade”, ou melhor, nos termos caracteristicamente usados, as leis naturais humanas seriam “deterministas” e negariam o “livre arbítrio”

6.3.1.2.           Evidentemente, o Positivismo afirma a liberdade humana, bem como a dignidade; entretanto, os termos e os raciocínios metafísicos são profundamente equivocados e daninhos

6.3.2.     As críticas metafísicas baseiam-se em uma série de equívocos e erros, ainda que por vezes se baseiem em uma preocupação (mística) com a dignidade humana

6.3.2.1.           O primeiro erro é o de conceber que estar submetido a constrangimentos e obedecer a regularidades impede a liberdade humana: ora, seja como ausência de obstáculos, seja como possibilidade efetiva de escolhas, as leis naturais não “impedem” nossa liberdade, embora com certeza condicionem e limitem-na

6.3.2.2.           Na verdade, bem vistas as coisas, as vidas de todos nós apresentam obstáculos e limitações, alguns contornáveis, outros irremovíveis: nem por isso se fala, com propriedade, a sério, em “ausência de liberdade”

6.3.2.3.           As leis naturais não criam os fenômenos; elas descrevem os fenômenos que ocorrem

6.3.2.3.1.                Assim, por exemplo, a lei da gravidade não criou a gravidade; na medida do possível, a lei descreve e indica suas condições e possibilidades

6.3.2.4.           Ao contrário do que as críticas metafísicas decretam, são justamente as leis naturais (seja por meio de seu conhecimento, seja por meio das técnicas surgidas a partir desse conhecimento) que permitem que o ser humano realize e amplie sua liberdade – mas sempre conforme a elaboração de Francis Bacon: “dominamos a natureza submetendo-nos a ela

6.3.2.5.           A concepção de liberdade dos metafísicos é precisamente metafísica, ficando a meio caminho entre a teologia e a positividade: mantém os raciocínios teológicos, de maneira degradada, e, embora tenda à positividade, simplesmente não é positiva e não entende a positividade

6.3.2.6.           A concepção metafísica de liberdade postula o “livre arbítrio”, que é uma concepção tipicamente teológica, em que as divindades concedem ao ser humano a possibilidade de escolher cultuar ou não a própria divindade

6.3.2.7.           De maneira mais ampla, essa concepção metafísica espelha a liberdade atribuída às divindades, em particular as monoteístas, que podem fazer tudo o que desejarem, de maneira caprichosa, voluntariosa e sem quaisquer parâmetros (ou seja, de maneira absoluta): é claro que considerando uma concepção de liberdade como essa – concepção infantil, ou melhor, adolescente, pois ciosa e intensamente imatura – qualquer constrangimento ou restrição será inaceitável e inadmissível

6.3.2.8.           Como dizia Augusto Comte, a partir de Montesquieu e de uma enorme tradição filosófica anterior, a liberdade consiste em seguir as leis próprias a cada corpo e/ou a cada fenômeno: uma pedra que cai é livre em seu movimento de queda; evidentemente, essa concepção está muito distante do conceito (teológico-metafísico) de liberdade como irresponsabilidade ou capricho

6.3.3.     Do ponto de vista da positividade, essa concepção caprichosa erra em dois aspectos: (1) em termos da diferença entre abstração e concretude (ou entre a teoria e a prática) e (2) em termos de modificabilidade crescente dos fenômenos mais complexos

6.3.4.     Há uma diferença fundamental, que os críticos metafísicos fazem questão de ignorarem, entre os enunciados abstratos e as aplicações concretas das leis naturais: os enunciados abstratos referem-se a partes específicas da realidade, enfocando os fenômenos, deixando de lado tudo aquilo que não diz respeito ao problema em questão; os esquemas abstratos existem apenas na mente dos pensadores, não na realidade; ora, a realidade funciona com corpos concretos interagindo, sofrendo múltiplas influências simultâneas; cada uma dessas influências é estudada abstratamente como fenômenos, mas concretamente eles influenciando-se e alterando-se

6.3.4.1.           O ser humano é capaz de determinar as leis abstratas e de examinar os comportamentos concretos; as interações mútuas são complicadíssimas e exigem pesquisas e atenção empírica

6.3.4.2.           O resultado disso é que as leis abstratas permitem-nos previsões, que devem ser aplicadas na prática conscientemente, isto é, com acompanhamento permanente: logo, há uma clara divisão entre a teoria e a prática

6.3.4.3.           As leis abstratas, por si sós, não impedem a liberdade humana; mas, de qualquer maneira, as possibilidades de ação são amplas na aplicação prática, a começar, evidentemente, pelas decisões de aplicar ou não na prática os conhecimentos teóricos, de quando e de como fazer essa aplicação; é por isso que Augusto Comte dizia que “para completar as leis são necessárias vontades

6.3.5.     Além da separação geral e estática entre teoria e prática, há um aspecto dinâmico próprio às diversas leis naturais, no sentido de que quanto mais complexa uma ciência, isto é, quanto mais restrita objetivamente e mais próxima subjetivamente do ser humano, maior o grau de modificabilidade dos fenômenos considerados

6.3.5.1.           Os maiores graus de modificabilidade significam que, quanto mais superiores forem as ciências – máxime a Sociologia e a Moral –, maiores as quantidades de influências prévias a que elas estão sujeitas e, portanto, maiores as possibilidades de modificações que elas sofrem; isso também significa que a quantidade material de empírico necessário para elaborar as leis é maior, que as generalizações são mais difíceis e que essas generalizações são menos precisas

6.3.5.2.           Ora, dizer que o grau de modificabilidade é maior equivale a dizer que as possibilidades de manipulação são maiores – o que significa que o grau de liberdade é maior

6.3.6.     A combinação das noções de divisão entre teoria e prática (entre leis abstratas e aplicações concretas) e de aumento progressivo da modificabilidade resulta no que Augusto Comte chamava de “fatalidades modificáveis”

6.3.7.     Também é importante notar que o conhecimento das leis naturais não é um capricho filosófico, moral, intelectual; além de ser uma questão de economia mental (isto é, de redução de esforços), as leis naturais necessariamente têm que nos conduzir à previsão da realidade, de modo a sabermos o que ocorrerá para melhorarmos a realidade e/ou evitarmos problemas; em outras palavras, trata-se de aplicar de maneira decisiva o critério da utilidade à mera realidade, conforme a máxima “saber para prever a fim de prover

6.3.8.     Os decretos metafísicos contra as leis naturais humanas, tachando-as de “deterministas” e/ou de inúteis, fazem questão de ignorar o que é a liberdade humana, o que são as leis naturais em termos estáticos, o que são as leis naturais em termos dinâmicos e quais as utilidades das leis naturais

6.3.9.     Uma última observação preliminar sobre as leis naturais humanas: enquanto as ciências inferiores, da Matemática à Biologia, produzem tecnologias como aplicações práticas, as ciências superiores (a Sociologia e a Moral) produzem artes de aconselhamento, resultando na política, na pedagogia e na prática terapêutica

6.3.9.1.           As artes de aconselhamento das ciências superiores baseiam-se na separação entre os dois poderes, na dignidade humana, no altruísmo, na fraternidade, no resoluto pacifismo, na noção de deveres; em outras palavras, são aconselhamentos baseados na liberdade, no respeito ao ser humano, na rejeição da violência e na rejeição da tecnocracia

6.4.   Passando enfim a cada uma das leis dos três estados: a lei intelectual dos três estados estabelece que a compreensão dos fenômenos atravessa três fases: teológica, metafísica e positiva, com uma velocidade proporcional à generalidade dos fenômenos correspondentes

6.4.1.     Isso significa dizer que todas as concepções humanas começam teológicas e terminam positivas, passando por uma fase intermediária, que é meio teológica e meio positiva

6.4.2.     Uma outra forma de apresentar essa lei é afirmar que todas as concepções humanas começam absolutas e terminam relativas

6.4.3.     A velocidade da passagem da teologia para a positividade depende da generalidade da concepção estudada: concepções, ou fenômenos, mais gerais, mais amplos, tornam-se positivos mais rapidamente; fenômenos mais restritos, ou mais complicados, demoram mais

6.4.4.     Abordamos essa lei quando, em 23 de São Paulo de 170 (11.6.2024), fizermos a prédica sobre a generalidade filosófica como quarto estado; naquela ocasião, nosso amigo Hernani fez uma observação muito importante: Augusto Comte elaborou a lei intelectual dos três estados inicialmente como uma descrição histórica sumária; depois tratou de determinar seus mecanismos sociais e intelectuais internos, demonstrando e deduzindo suas diversas fases; finalmente, nosso mestre desenvolveu seus procedimentos subjetivos e seus resultados morais profundos

“Em sua primeira fase, mais objetiva, Augusto Comte havia formulado a lei dos três estados a partir das produções exteriores da Humanidade. Ela é então uma apresentação eminentemente histórica e empírica. A teologia, a metafísica e a ciência são aí oferecidas como sinais empíricos reveladores dessa passagem íntima.

Na segunda de suas fases, progressivamente subjetiva, a formulação de Augusto Comte enuncia a mesma lei considerando antes o caráter interno de cada estado, ou seja, o caráter lógico inerente de cada um deles. Então se tratou de revelar o caráter fictício das construções da teologia, o caráter abstrato das especulações metafísicas e o caráter positivo das leis da ciência.

A morte privou Augusto Comte de uma terceira formulação da lei da evolução intelectual, na qual o conjunto do Positivismo já pudesse ser apresentado como livre dos últimos vestígios do cientificismo, o que já havia ocorrido a partir do quarto volume da Política positiva, de 1854, com a teoria subjetiva dos números, com a incorporação do fetichismo etc.”

6.4.5.     Isso é importante de indicar porque Augusto Comte começou a elaborar a lei intelectual entendendo que a terceira fase seria “científica”, em vez de “positiva”; ora, a cientificidade é importante, mas por si só ela é insuficiente, é fragmentária, é parcial, é afetivamente pobre e tende com escandalosa facilidade para o absolutismo; além disso, a concepção cientificista rejeita a noção de “religião”, que se torna assim sinônima da teologia

6.4.6.     Foi em virtude desses inúmeros e graves problemas que, após concluir a redação da Filosofia positiva e já sob o santo influxo de Clotilde, Augusto Comte percebeu que seria necessário avançar a classificação das ciências, ampliar a lei dos três estados, mudar a concepção de religião e aprofundar o caráter filosófico e moral do Positivismo: todas esses avanços foram entrevistos a partir de 1846, embora tenham sido formalizados aos poucos desde então até a morte de nosso mestre (com promessas claras de desenvolvimentos posteriores ainda maiores)

6.4.7.     O resultado dessas mudanças todas foi a própria concepção de religião como sujeita à lei dos três estados, em que a teologia foi apenas uma forma, preliminar mas superada, de religião – e em que a religião é a disciplina geral da existência humana, com vistas à harmonia coletiva e individual

6.4.8.     É importante notar que a seqüência da lei intelectual dos três estados estabelece etapas sucessivas, isto é, fases que se sucedem e que não voltam: o relativismo sucede o absolutismo e deixa este para trás

6.4.9.     As fases superadas devem ser conhecidas, respeitadas e, na medida do possível, terem seus materiais positivados; mas não se deve empregá-los pura e simplesmente como eram empregados nas épocas de seus apogeus: essa aplicação acrítica é prejudicial, irracional e imoral

6.4.10. Também é importante indicar que a lei intelectual dos três estados é uma lei da subjetividade humana, considerando que se trata da evolução das formas de interpretação (subjetiva) da realidade

6.5.   A lei prática dos três estados estabelece que a atividade humana é primeiro militar conquistadora, depois militar defensiva e finalmente pacífica e industrial

6.5.1.     Essa fórmula considera a guerra conquistadora, não a guerra de extermínio

6.5.2.     A passagem das guerras de conquista para as de defesa ocorreu várias vezes ao longo da história; mas a transição final para a sociedade pacífica e industrial é mais difícil e exigiu a transição específica ao Ocidente

6.5.3.     A sociedade pacífica e industrial é aquela em que a violência é substituída pelas atividades pacíficas, seja como parâmetro de regulação geral, seja como procedimento para obtenção e geração de riquezas

6.5.4.     A sociedade pacífica e industrial baseia-se, então, na liberdade e na dignidade universal, especialmente dos trabalhadores, com pátrias – ou melhor, mátrias – pequenas, com responsabilidade individual e coletiva, confiança compartilhada e fraternidade universal

6.5.5.     Assim como no caso da lei intelectual, a lei prática dos três estados estabelece uma seqüência de fases sucessivas, ou seja, de fases que se sucedem e não voltam: a atividade militar defensiva sucede à fase militar conquistadora (ao ter sido preparada por esta); da mesma forma, a fase pacífica e industrial sucede à fase militar defensiva (tendo sido preparada por esta)

6.6.   A última lei dos três estados é a afetiva, referente aos âmbitos de sociabilidade: a sociabilidade é primeiro na família, depois nas pátrias e finalmente na Humanidade

6.6.1.     Essa lei também aceita uma interpretação puramente empírica e histórica e, em seguida, uma interpretação biológica e moral:

6.6.1.1.           Por um lado, de fato, as sociedades humanas cresceram ao longo dos milênios das associações familiares (e familistas) para as pátrias (cada vez maiores) e daí para a concepção e a prática da Humanidade

6.6.1.2.           Por outro lado, família, pátria e Humanidade são os três graus fundamentais da sociabilidade humana; eles baseiam-se nos três instintos altruístas (veneração, apego e bondade) e seus fundamentos referem-se às três partes da natureza humana (sentimentos, atividade prática e inteligência)

6.6.2.     Ao contrário das duas outras leis, a lei afetiva dos três estados apresenta um funcionamento interno diferente, pois ela permite e exige a acumulação de cada uma das três etapas: as mátrias não anulam as famílias, assim como a Humanidade não anula as mátrias; a Humanidade mantém e requer as mátrias, assim como estas mantêm e requerem as famílias

7.      Invocação final

 

Referências

- Augusto Comte (franc.), Sistema de filosofia positiva (Paris, Société Positiviste, 5e ed., 1893)

- Augusto Comte (franc.), Sistema de política positiva (Paris, L. Mathias, 1851-1854)

- Augusto Comte (port.), Apelo aos conservadores (Rio de Janeiro, Igreja Positivista do Brasil, 1898): https://archive.org/details/augustocomteapeloaosconservadores.

- Augusto Comte (port.), Catecismo positivista (Rio de Janeiro, Igreja Positivista do Brasil, 4ª ed., 1934)

- Gustavo Biscaia de Lacerda (port.): Prédica positiva “Síntese subjetiva e relativa como quarto estado” (Curitiba, Igreja Positivista Virtual, 11.6.2024): https://filosofiasocialepositivismo.blogspot.com/2024/06/sintese-subjetiva-e-relativa-como.html.

- Raimundo Teixeira Mendes (port.), As últimas concepções de Augusto Comte (Rio de Janeiro, Igreja Positivista do Brasil, 1898): https://archive.org/details/raimundo-teixeira-mendes-ultimas-concepcoes-de-augusto-comte-i e https://archive.org/details/raimundo-teixeira-mendes-ultimas-concepcoes-de-augusto-comte-ii.

- Raimundo Teixeira Mendes (port.), O ano sem par (Rio de Janeiro, Igreja Positivista do Brasil, 1900): https://archive.org/details/raimundo-teixeira-mendes-o-ano-sem-par-portug._202312/page/n7/mode/2up.

25 agosto 2025

Live AOP com Rafael Cardoso Sampaio: "IA - possibilidades e problemas"

No dia 22 de agosto de 2025 realizamos uma interessante e informativa Live AOP com o Prof. Dr. Rafael Cardoso Sampaio, da UFPR, em que ele tratou do tema "IA: possibilidades e problemas".

A Live foi transmitida no canal Positivismo, disponível aqui: https://www.youtube.com/watch?v=3wq7U9-XnzA.




21 agosto 2025

Teixeira Mendes: Exortação à Fraternidade





Igreja e Apostolado Positivista do Brasil

 

O Amor por princípio e a Ordem por base;

O Progresso por fim.

 

Viver para outrem.                              Viver às claras.

 

Exortação à Fraternidade

Aos pés de Augusto Comte, ajoelhado junto ao leito fúnebre de Clotilde

 

(Ensaio de uma paráfrase positivista do Capítulo XVI, Livro I, da Imitação de Tomás de Kempis, segundo a tradução em verso de Corneille: Como se deve sofrer os defeitos de outrem)

 

Conciliante de fato, inflexível em princípio.

Augusto Comte.       

Gradualmente expurgado por ti (Clotilde) de todo azedume, e espontaneamente confirmado, na minha regeneração, mediante o exemplo contínuo de tua imortal irmã (Sofia Bliaux)...

Augusto Comte – 11ª Santa Clotilde.

 

[Transcrição de trechos do opúsculo n. 316 da Igreja Positivista do Brasil – 5 de abril de 1911.]

 


Exortação à Fraternidade

Aos pés de Augusto Comte, ajoelhado junto ao leito fúnebre de Clotilde

 

(Ensaio de uma paráfrase positivista do Capítulo XVI, Livro I, da Imitação de Tomás de Kempis, segundo a tradução em verso de Corneille: Como se deve sofrer os defeitos de outrem)

 

Conciliante de fato, inflexível em princípio.

Augusto Comte.       

Gradualmente expurgado por ti (Clotilde) de todo azedume, e espontaneamente confirmado, na minha regeneração, mediante o exemplo contínuo de tua imortal irmã (Sofia Bliaux)...

Augusto Comte – 11ª Santa Clotilde.

 

I. Em todos e em ti mesmo, aceita com humildade

            Tudo o que não possas emendar;

Até que enfim o Espaço, a Terra, e a Humanidade,

Com as suas leis fatais e doce potestade,

            Hajam, acaso, um dia de o mudar.

 

Para provar-te a força inda melhor, derreia

            Por ventura teus ombros essa cruz;

Teu mérito assim melhor se patenteia;

            E, si, nas provações, teu ânimo fraqueia,

            Seu peso a quase nada se reduz.

 

À nossa humilde Deusa, orar, porém, fervente

            Deves, nesse tenaz impedimento;

A fim que o seu Amor o coração te isente

Das tuas aflições, de todo, ou te sustente,

            Tornando mais suave o sofrimento.

 

II. Se, por conselhos teus, uma alma esclarecida,

            Na sua resistência persevera,

Entrega à Providência endireitar-lhe a vida,

E não te obstines mais, em porfiada lida,

            Perseguindo-a, a mostrar-lhe a senda vera.

 

A santa evolução por nada se transvia:

            Apesar das erronias do Presente,

Que te punge ou surpreende a pobre fantasia,

O homem só se agita, e a Humanidade o guia,

            Do mal tirando o bem frequentemente.

 

Sofre sem murmurar dos outros mesmo extremos

            Defeitos com que possas deparar;

E cuida com que, também, de fato, todos temos

Os nossos que, a seu turno, a tolerar os vemos

            Inda com mais indômito pesar.

 

Se o Altruísmo teu encontra óbice tanto

            Sempre, em ti mesmo, ao seu melhor desvelo,

Como querer d’alguém o portentoso encanto

De agir a teu sabor, por tudo, e em tudo quanto

            Lhe haja d’exigir o teu anelo?

 

Não é trata-lo, pois, sem mínima equidade,

            Querer que outrem seja o mais perfeito,

E não quereres tu fugir de uma maldade,

A fim que o exemplo teu, com mais facilidade,

            Ajude-o a conseguir tamanho efeito?

 

III. Queremos cada qual sujeito à disciplina,

            Sofrendo a necessária correção;

Revolta-nos, porém, se alguém nos examina,

E à conduta nossa o seu valor assina,

            Realçando qualquer imperfeição.

 

Exprobramos aos mais o quanto d’indulgência

            Consigo têm e o que se dão de gozos;

E é ofensa atroz não ter-se a complacência

De nada recusar, com suma deferência,

            Aos nossos movimentos caprichosos.

 

Estatutos prendendo em rigoroso laço

            Severamente aos outros desejamos;

E, seja de quem for, o mais ligeiro traço,

Ao nosso bel-prazer, criando um embaraço

            D’império absoluto, a mal levamos.

 

Onde se esconde, pois, o férvido Altruísmo,

            Que Viver para outrem nos sugere?

E como então sentir que, ou seja no heroísmo,

Ou na dedicação comum, ou no ascetismo,

            Prazer algum não há que os seus supere.

 

No Mundo, a imperfeição por toda parte abunda,

            A jerarquia eterna acompanhando,

Que, sob a mais grosseira, a lei mais nobre funda;

Somente a paciência, em méritos fecunda

            Essa ordem fatal vai mitigando.

 

IV. É pois na sujeição qu’ensina a Humanidade

            O aperfeiçoamento basear-se;

Não há beleza inteira, ou íntegra bondade;

Assim é dever nosso e nossa felicidade

            Uns aos outros o fardo aliviar-se.

 

Ninguém é sem senão, ninguém é sem fraqueza;

            Ninguém sem precisar d’algum amparo;

Ninguém tem de ciência, em si, assaz riqueza;

Ninguém é forte assaz com a própria fortaleza.

            Para não sentir faltar-lhe apoio caro.

 

Urge pois entre-amar-se, urge pois entre-instruir-se

            Urge pois, em tudo, entre-auxiliar-se;

Urge entre-prestar-se o olhar a dirigir-se;

Urge entre-estender-se a mão conduzir-se;

            Urge um ao outro dar co quem curar-se.

 

Quanto maior a dor, mais fácil prova of’rece

            Até que ponto fora alguém perfeito;

E os golpes mais cruéis que uma alma então padece

Não são que a fazem fraca; apenas se conhece

            Assim o que ela vale com efeito.

 

R. Teixeira Mendes.

 

Rio, 11 de Arquimedes de 57/123 (5de Abril de 1911). 


Revista Parajás: entrevista com Gustavo Biscaia de Lacerda

A Revista Parajás publicou o artigo "Entre o Positivismo, a academia e o poder Espiritual: uma entrevista com Gustavo Biscaia de Lacerda" (Montes Claros, v. 7, n. 2, p. 1-65, 2024). É uma longa entrevista - com 65 páginas! -, que aborda os mais variados aspectos da minha atuação - como pesquisador, como positivista, como cidadão, como ser humano.

Agradeço imensamente à equipe da Revista Parajás, em particular a Ricardo Cortez Lopes e a Renat Nureyev Mendes, pela possibilidade de conceder essa entrevista.

O texto está disponível aqui: https://revistaparajas.com.br/index.php/rv1/article/view/133/99.




20 agosto 2025

Leitura comentada do Apelo aos Conservadores

No dia 7 de Gutenberg de 171 (19.8.2025) realizamos nossa prédica positiva, dando continuidade à leitura comentada do Apelo aos Conservadores (em sua Primeira Parte - doutrina apropriada aos verdadeiros conservadores).

A prédica foi transmitida nos canais Positivismo (aqui: https://youtube.com/live/EWwS3SLYY2Y) e Igreja Positivista Virtual (aqui: https://www.facebook.com/IgrejaPositivistaVirtual/videos/632843339474394).

As anotações que serviram de base para a exposição oral encontram-se reproduzidas abaixo.

*   *   *


Leitura comentada do Apelo aos conservadores

(7 de Gutenberg de 171/19.8.2025) 

1.      Invocação inicial

2.      Exortações iniciais

2.1.   Sejamos altruístas!

2.2.   Façamos orações!

2.3.   Como Igreja Positivista Virtual, ministramos os sacramentos positivos a quem tem interesse

2.4.   Para apoiar as atividades dos nossos canais e da Igreja Positivista Virtual: façam o Pix da Positividade! (Chave Pix: ApostoladoPositivista@gmail.com)

3.      Datas e celebrações:

3.1.   Dia 10 de Gutenberg (22.8): Live AOPcom Rafael Cardoso Sampaio

4.      Leitura comentada do Apelo aos conservadores

4.1.   Antes de mais nada, devemos recordar algumas considerações sobre o Apelo:

4.1.1.     O Apelo é um manifesto político e dirige-se não a quaisquer pessoas ou grupos, mas a um grupo específico: são os líderes políticos e industriais que tendem para a defesa da ordem (e que tendem para a defesa da ordem até mesmo devido à sua atuação como líderes políticos e industriais), mas que, ao mesmo tempo, reconhecem a necessidade do progresso (a começar pela república): são esses os “conservadores” a que Augusto Comte apela

4.1.1.1.           O Apelo, então, é um apelo aos conservadores, não aos reacionários

4.1.1.2.           O Apelo, portanto, adota uma linguagem e um formato adequados ao público a que se dirige

4.1.1.3.           Empregamos a expressão “líderes industriais” no lugar de “líderes econômicos”, por ser mais específica e mais adequada ao Positivismo: a “sociedade industrial” não se refere às manufaturas, mas à atividade pacífica, construtiva, colaborativa, oposta à guerra

4.2.   Outras observações:

4.2.1.     Uma versão digitalizada da tradução brasileira desse livro, feita por Miguel Lemos e publicada em 1899, está disponível no Internet Archive: https://archive.org/details/augustocomteapeloaosconservadores

4.2.2.     O capítulo em que estamos é a “Primeira Parte”, cujo subtítulo é “Doutrina apropriada aos verdadeiros conservadores”

4.3.   Passemos, então, à leitura comentada do Apelo aos conservadores!

5.      Exortações finais

5.1.   Sejamos altruístas!

5.2.   Façamos orações!

5.3.   Como Igreja Positivista Virtual, ministramos os sacramentos positivos a quem tem interesse

5.4.   Para apoiar as atividades dos nossos canais e da Igreja Positivista Virtual: façam o Pix da Positividade! (Chave Pix: ApostoladoPositivista@gmail.com)

6.      Invocação final

 

Referências

- Augusto Comte (franc.), Sistema de filosofia positiva (Paris, Société Positiviste, 5e ed., 1893)

- Augusto Comte (franc.), Sistema de política positiva (Paris, L. Mathias, 1851-1854)

- Augusto Comte (port.), Apelo aos conservadores (Rio de Janeiro, Igreja Positivista do Brasil, 1898): https://archive.org/details/augustocomteapeloaosconservadores.

- Augusto Comte (port.), Catecismo positivista (Rio de Janeiro, Igreja Positivista do Brasil, 4ª ed., 1934)

- Raimundo Teixeira Mendes (port.), As últimas concepções de Augusto Comte (Rio de Janeiro, Igreja Positivista do Brasil, 1898): https://archive.org/details/raimundo-teixeira-mendes-ultimas-concepcoes-de-augusto-comte-i e https://archive.org/details/raimundo-teixeira-mendes-ultimas-concepcoes-de-augusto-comte-ii.

- Raimundo Teixeira Mendes (port.), O ano sem par (Rio de Janeiro, Igreja Positivista do Brasil, 1900): https://archive.org/details/raimundo-teixeira-mendes-o-ano-sem-par-portug._202312/page/n7/mode/2up.

17 agosto 2025

Transformação de Miguel Lemos


 

Carta a um aspirante ao sacerdócio positivo

No dia 5 de Gutenberg de 171 (17.8.2025) realizamos uma prédica extraordinária, consistindo exclusivamente na leitura da apresentação pessoal realizada no final do mês de César deste ano. 

Com as devidas alterações, essa apresentação pode ser entendida como uma "carta a um aspirante ao sacerdócio positivo", cujo texto está reproduzido abaixo.

A prédica foi transmitida no canal Positivismo (aqui: https://www.youtube.com/live/BHdxB9CeVO0?si=uWvHXJ9D6S8fs386).

*    *   *


Apresentação pessoal; ou carta a um aspirante ao sacerdócio da Humanidade 

O documento abaixo foi inicialmente redigido para exposição em uma prédica positiva realizada em 28 de César de 171 (20.5.2025)[1]. Desde o início planejamos elaborar a partir delas uma separata, fosse para divulgação do texto em si, fosse como roteiro de um vídeo curto unicamente dedicado à nossa apresentação pessoal.

Entretanto, em uma conversa pessoal que mantivemos com nosso amigo Hernani Gomes da Costa logo após a prédica, ele sugeriu que tal separata fosse chamada de “Carta a um aspirante ao sacerdócio da Humanidade”, na medida em que, na generosa apreciação de Hernani, nossa exposição, para além da apresentação propriamente pessoal, reúne e resume alguns dos mais importantes elementos necessários à preparação e à atuação do sacerdócio da Humanidade.

Dessa forma, a exposição inicial foi adaptada para transformar-se neste documento. Esperamos que os comentários abaixo correspondam à gentil e simpática apreciação de nosso amigo e que possam efetivamente ser úteis a todos aqueles que desejam trilhar o importante, honroso e árduo caminho do sacerdócio da Humanidade.

___ 

Caras amigas, caros amigos, caras irmãs, caros irmãos na Humanidade:

Escrevo estas palavras com a esperança de que, a partir da minha experiência e considerando as exigências morais, intelectuais e práticas, seja mais fácil para vocês a orientação rumo ao sacerdócio da Humanidade.

Embora eu estude, defenda, divulgue e aplique o Positivismo há algumas décadas, faz somente alguns anos que realizo prédicas, em particular na internet; essas prédicas têm sido realizadas em diferentes modelos e creio ter um reconhecimento crescente de minhas atividades.

Desde o início eu parti do pressuposto de que, mais que por meio de títulos e pompas, a minha atuação deveria legitimar-se ao longo do tempo pela qualidade dessa atuação, na medida em que eu atuasse como um verdadeiro e efetivo poder Espiritual: assim, eu procuro realizar exposições claras, honestas, competentes, úteis, informativas, elaboradas com autonomia e responsabilidade, respeitando e valorizando o público.

Após alguns anos fazendo as prédicas, eu creio que convém agora fazer uma apresentação pessoal, para expor os parâmetros que eu adoto em minhas exposições. O objetivo, no fundo, é bem simples: é ganhar, ou reforçar, a confiança do público no sacerdócio, sendo que essa confiança tem que ser ao mesmo tempo no conjunto do sacerdócio e em cada um dos sacerdotes. Estes comentários assumem, portanto, ao mesmo tempo um aspecto de apresentação pessoal e também de prestação pública de contas, dentro do que nosso mestre advogava como sendo o “viver às claras”. De qualquer maneira, em termos de prestação de contas, esta exposição é complementar às “circulares anuais” que tenho elaborado para a Igreja Positivista Virtual, dando continuidade a uma prática iniciada por Augusto Comte e continuada pelos seguintes grandes sacerdotes e apóstolos da Humanidade, embora lamentavelmente interrompida nas últimas décadas pelos vários (supostos) órgãos do poder Espiritual positivo.

Antes de passar diretamente para a carta, uma última observação preliminar. Como é natural, nas prédicas eu costumo usar a primeira pessoa do plural (o “nós”), seja na forma do plural modéstico, seja na forma do plural majestático; mas, como esta carta consiste em uma apresentação e uma justificativa pessoais, nesta exposição eu usarei a primeira pessoa do singular (o “eu”).

Então, vamos lá. Eu sou Gustavo Biscaia de Lacerda; sou sacerdote da Religião da Humanidade e Diretor e fundador da Igreja Positivista Virtual. Sou sacerdote da Humanidade porque sou oficiante da Religião da Humanidade; além disso, sou apóstolo da Humanidade, pois sou difusor da Religião da Humanidade; nas duas situações, minha preocupação, minha pretensão é a de ser um órgão do poder Espiritual positivo.

Para cumprir essas atribuições, procuro seguir as orientações da Igreja e Apostolado Positivista do Brasil, conforme as disposições de 1881 (na época da fundação da IPB) e os Expedientes de 1917/1927 (estabelecidos nas transformações de Miguel Lemos e R. Teixeira Mendes), que, por sua vez, basearam-se nas orientações de Augusto Comte. Ainda assim, é claro que as disposições que adoto consideram a história do Positivismo, ou seja, as inúmeras experiências concretas do Positivismo, bem como a situação moral, social e intelectual em que vivemos atualmente.

Procuro filiar-me à tradição moral e prática estabelecida pela Igreja Positivista do Brasil: a tradição oral das práticas efetivas da IPB é importante, mas em última análise a mera repetição oral de tradições é insuficiente e tem que ser lastreada em documentos públicos, que assumem o aspecto de documentos escritos e publicados. Esses documentos, que realizam o “viver às claras”, garantem a realidade, a certeza e a clareza das informações e permitem que evitem e/ou resolvam ambiguidades, dificuldades, incertezas, além de oferecerem parâmetros para aplicação concreta do Positivismo.

Uma preocupação constante de minha atuação é com a “atualização” do Positivismo. Eu já dediquei algumas prédicas a esse tema; considero que atualizar o Positivismo consiste em adaptá-lo à realidade em que vivemos, utilizar os meios adequados e disponíveis à sua difusão e aplicá-lo à realidade concreta vivida pelos seres humanos. Há aspectos específicos da doutrina positivista que podem, e até devem, ser revistos, em face de desenvolvimentos posteriores às elaborações de Augusto Comte: entretanto, por um lado são aspectos muito pontuais (geralmente relativos a questões especificamente científicas) e, por outro lado e mais importante, o conjunto da obra de nosso mestre e a quase totalidade de suas concepções mantêm-se relativisticamente inalteradas, em particular em termos sociológico-morais, filosóficos, cultuais e de regime.

Em particular, eu rejeito a tendência, muito própria aos hábitos mentais contemporâneos – profundamente marcados pela metafísica e por sua criticidade destruidora –, segundo os quais a “atualização” do Positivismo na prática consistiria em “rever”, negar, desprezar a obra de Augusto Comte, sem nenhuma preocupação com relativismo, simpatia, organicidade e veneração. Esses hábitos mentais (mais uma vez: profundamente metafísicos) são particularmente ativos no jornalismo diário e nas academias, ambientes nos quais o novidadismo destruidor, antiorgânico e antissimpático apresenta-se como virtuoso e progressista; isso tudo com freqüência é esgrimido por pessoas que se aproximam do Positivismo mas desconhecem a doutrina e, em particular, não entendem seus sentimentos, suas idéias e suas preocupações práticas.

Voltando às diretrizes estabelecidas pela Igreja Positivista do Brasil e o respeito que tenho por elas. Eu tenho, por um lado, um respeito geral a essas diretrizes e um respeito à autoridade moral e espiritual – subjetiva – de Miguel Lemos e Teixeira Mendes; por outro lado, como órgão empírico da Religião da Humanidade, mantenho autonomia objetiva em minhas atividades e decisões. Dessa forma, em última análise, a responsabilidade por minhas ações é minha, sendo pessoal e intransferível. (O sacerdócio empírico é aquele que surge espontaneamente em algum lugar, a partir das necessidades sociais e das vocações individuais; o sacerdócio sistemático é aquele que se perpetua ao longo do tempo, que se constitui, prepara-se e legitima-se de acordo com os parâmetros positivos, especialmente os da hereditariedade sociocrática.)

A responsabilidade pessoal e intransferível pelas opiniões e ações do poder Espiritual é uma característica inerente a todos os servidores da Humanidade, quer sejam espirituais, quer sejam temporais; em qualquer caso, essa responsabilidade é condição e garantia da confiança depositada pelo público no servidor da Humanidade. Se isso é válido para qualquer servidor da Humanidade, é ainda mais válido para o sacerdócio positivo, cuja atuação baseia-se essencialmente na confiança depositada em si pelo público. Além disso, a responsabilidade pessoal e intransferível também se verifica na medida em que, conversando com outros positivistas, pedindo esclarecimentos e sugestões – em particular de nosso amigo de longa data, Hernani Gomes da Costa –, as opiniões expostas e as ações tomadas são sempre decididas e assumidas em última análise por mim. Isso não é personalismo, que seria incompatível com o altruísmo positivista, mas de responsabilização clara, consciente e pública do servidor da Humanidade por suas ações.

Nascido no ano 113 da era normal (1977), atualmente eu tenho 48 anos de idade e sou positivista desde os 16 anos; nasci e vivo em Curitiba, capital do Paraná; minha profissão é de sociólogo, que exerço na Universidade Federal do Paraná (UFPR). Olhando para trás, posso dizer que, desde que conheci o Positivismo e mesmo antes, sempre me orientei para o sacerdócio da Humanidade, valorizando o conhecimento do ser humano, valorizando a moral e a moralidade, assim como valorizando o conhecimento positivo de modo geral. Em termos de carreira acadêmica e profissional, fiz graduação em Ciências Sociais (na UFPR), mestrado em Sociologia (na UFPR) e doutorado em Sociologia Política (na Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC)); também fiz um pós-doutorado em Teoria Política (na UFSC) e um em Filosofia das Ciências (na Universidade Estadual do Rio de Janeiro (UERJ)); desde 2004 sou sociólogo profissional na UFPR.

Eu sou (1) positivista (2) religioso e (3) sacerdote da Humanidade. Para mim, cada um desses aspectos significa o seguinte.

Como positivista, entendo que a obra de Augusto Comte é uma única, embora evidentemente ela tenha passado por diferentes fases, que correspondem a um longo, importante e necessário processo de amadurecimento moral e intelectual. Esse processo teve um ponto de inflexão particularmente importante durante o belo “ano sem par”, quando nosso mestre conheceu e apaixonou-se pela angélica Clotilde de Vaux, mulher de qualidades superiores, à altura do amor e da missão de nosso mestre. Isso culminou na criação da Religião da Humanidade, que, por seu turno, teve precisa e necessariamente como primeiro sacerdote – mas não único sacerdote – Augusto Comte. Em face da Religião da Humanidade, procuro ser um positivista completo, também chamado de “ortodoxo” ou, mais corretamente, de “religioso”, ao mesmo tempo em que me distancio dos positivistas incompletos, ou heterodoxos, que são meramente cientificistas e com freqüência anticlericais e/ou ateus.

Como positivista completo, ou ortodoxo, e ainda mais como sacerdote e apóstolo, procuro conhecer a obra de Augusto Comte diretamente na fonte, além de conhecer a obra de outros positivistas. É claro que “conhecer a obra” inclui não somente conhecer os livros canônicos (a Política positiva, o Catecismo positivista, a Síntese subjetiva etc.), mas também as cartas e as ações concretas (conforme expostas em relatos de discípulos, parentes e amigos) de Augusto Comte. De modo central, além de conhecer, é claro que também me esforço para aplicar essas concepções.

Sendo um positivista religioso e tendo a pretensão de ser um sacerdote e um apóstolo da Humanidade, não apenas correspondo à exigência intelectual fundamental – conhecer a obra de Augusto Comte e ser capaz de expor e explicar com autonomia e responsabilidade pessoal o Catecismo positivista e as últimas concepções de nosso mestre –, como também procuro cumprir as exigências morais, sociais e práticas correspondentes, em particular no sentido da separação entre os dois poderes. Sou (1) um apóstolo porque difundo a Religião da Humanidade e tenho conhecimento da doutrina; sou (2) um sacerdote porque atuo (ou procuro atuar) como um representante do poder Espiritual positivo e, além disso, ministro os sacramentos da Religião da Humanidade; em ambos os casos, (3) cumpro os requisitos exigidos para cada uma dessas atuações.

A minha condição de apóstolo e, principalmente, de sacerdote vincula-se também à necessidade urgente de reconstituição dos quadros positivistas, especialmente em termos práticos. A esse respeito, é necessário afirmar que a concepção de que só houve um único sacerdote da Humanidade – Augusto Comte –, sem a possibilidade de haver nenhum outro, embora em si mesma seja generosa, é uma concepção radicalmente equivocada, baseada em uma devoção mal orientada, ignorante da doutrina e daninha para a prática religiosa.

A reconstituição atual dos quadros positivistas é um objetivo real e ocorre de fato por diferentes meios. Para nossa felicidade, podemos dizer com segurança que não apenas a Igreja Positivista Virtual é uma realidade concreta como também o Templo Positivista de Porto Alegre é atuante e, além disso, há alguns anos fundou-se o Apostolado Positivista da Itália. Saímos, portanto, das angustiantes situações, vividas até algumas décadas atrás, em que não havia mais núcleos positivistas atuantes ou em que havia somente um único.

Também é fundamental lembrar e afirmar que não basta alguém querer ser líder espiritual apenas devido a uma pretensão de ser líder espiritual; a mera pretensão, se for uma pretensão vazia, baseia-se em vaidade e resulta em prepotência, enganos e equívocos. Embora a vaidade e o orgulho sejam motivadores até importantes e embora eles impressionem bastante os ignorantes e os incautos, eles são insuficientes como fundamentos para a vida sacerdotal/apostólica e, ao longo do tempo, como já tivemos inúmeras ocasiões de comprová-lo (no Brasil e em outros países), são desastrosos para o Positivismo. Para a liderança espiritual, é necessário conhecer a doutrina, praticá-la, viver conforme seus parâmetros, difundi-la e ser um exemplo dela; em outras palavras, realmente é necessário cumprir inúmeros requisitos morais, intelectuais, práticos e sociais.

Seja por temperamento, seja devido ao Positivismo, entendo os títulos e a pompa como formas que a vaidade mais tola e mais superficial tem para justificar-se e impor-se, especialmente quando essa vaidade é ignorante e sem méritos verdadeiros, ou seja, quando ela é vazia. Lembro que os sacerdotes, assim como os integrantes do poder Espiritual de modo geral, têm que ter uma certa vaidade, na medida em que a vaidade é o instinto egoísta que busca a aprovação alheia; mas as atividades sacerdotais não podem resumir-se a satisfazer essa vaidade, pois isso no final das contas tem como resultado a degradação da doutrina e do sacerdócio, muito mais que a degradação do próprio vaidoso. Da mesma forma, embora a pompa estimulada pela vaidade impressione bastante o comum das pessoas, ela resulta em apoios equívocos e equivocados. Dessa forma, nossa missão como poder Espiritual positivo consiste também em, por um lado, rejeitar a pompa, a vaidade vazia, a ignorância e, por outro lado, em valorizar a visão de conjunto, a existência real de atributos morais, intelectuais e práticos, a atuação social e individual efetiva.

Em vez de perseguir a satisfação da vaidade e/ou do orgulho, o poder Espiritual deve manter uma relação de responsabilidade, seja para com a Humanidade em geral, seja para a sociedade particular em que vive, seja para com os membros de sua igreja. Em outras palavras, em vez de o apóstolo e/ou o sacerdote buscar uma satisfação infantil ao ser ouvido e/ou obedecido pelos demais, o parâmetro que deve guiar a sua atuação é a responsabilidade decorrente da confiança depositada nele, como representante sistemático ou empírico da Humanidade, e que em termos concretos consiste em que o público que ouve o sacerdote e/ou apóstolo confia em seus conselhos e leva-os a sério.

Mudando um pouco de âmbito, passando para o da separação entre os dois poderes: não sou filiado a nenhum partido político; nunca concorri a nenhum cargo público eletivo; não pratico o jornalismo como profissão; não uso o Estado para difundir a doutrina. Essas restrições não têm nada de excepcionais e são elementares para o sacerdócio da Humanidade. Na verdade, considerando as exigências próprias a cada um dos dois poderes fundamentais (o poder Espiritual, que esclarece e aconselha, e o poder Temporal, que manda), tenho clareza de que quem pretende ser apóstolo da Humanidade (ou sacerdote de qualquer doutrina) não pode nunca concorrer a cargos e, inversamente, quem concorre não pode nunca ser apóstolo e/ou sacerdote. Além disso, não promovo outras doutrinas nem outras associações que possam concorrer, direta ou indiretamente, com o Positivismo. Na verdade, explicitamente rejeito qualquer ambigüidade a esse respeito: quando eu manifesto-me, procuro sempre deixar claro que é com base no Positivismo, quer seja em termos estritamente pessoais, quer seja quando falo em termos mais gerais.

O sofrimento não é mérito, mas às vezes ele pode evidenciar compromissos íntimos, especialmente por meio do martírio. Nesse sentido, a minha vinculação, a minha identificação e a minha vida conforme o Positivismo são suficientemente grandes e são atestadas por dificuldades e exclusões que sofri ao longo dos anos exatamente porque sou positivista. Um exemplo claro é a censura sofrida em concurso público para professor de Ciência Política na UFSC, em 2011, quando a banca, presidida por um liberal católico, proibiu-me de lecionar lá porque sou positivista – embora, em contraposição, feministas, marxistas, liberais, anarquistas etc. etc. tenham permissão para lecionar nas universidades públicas e para usar essas instituições como púlpitos em vez de cátedras. Vale notar que o uso que se faz das universidades como púlpitos e não como cátedras (1) despreza a separação entre o poder Espiritual e o poder Temporal, (2) confunde e degrada o poder Espiritual, (3) atrapalha, dificulta e, no limite, impede a reorganização espiritual e (4) justifica, mais uma vez, muitas das críticas de Augusto Comte às instituições acadêmicas. Além disso, com freqüência comento nas prédicas que o ambiente metafísico atualmente reinante na sociedade (ocidental) e na universidade gera equívocos e u’a mentalidade contrária ao Positivismo, que nos impede de falar, ao mesmo tempo em que se mente a nosso respeito e difundem-se doutrinas e “ideologias” daninhas à sociedade e ao ser humano.

Como é natural, os caminhos que levam ao Positivismo são muito variados; há quem chegue a ele pela filosofia, há quem chegue pela política, há quem chegue pelo coração, ou seja, pela inteligência, pela atividade prática e/ou pelos sentimentos. Conforme eu entendo a Religião da Humanidade, ela satisfaz e deve satisfazer cada um desses caminhos, ou melhor, cada um desses aspectos, ao mesmo tempo em que a Religião da Humanidade evidencia que os outros aspectos da vida humana também devem ser, necessariamente, satisfeitos.

O meu caminho foi basicamente intelectual e moral: adolescente, eu procurava uma orientação na vida, mas também me preocupava com a política. Chegando ao Positivismo, obtive essa orientação moral, intelectual e prática de que precisava; mas, para mim muito mais importante que isso, eu descobri e reconheci cada vez mais a importância do coração, que no fundo é o aspecto principal da Religião da Humanidade. Além disso, outros aspectos fundamentais do Positivismo – a afirmação da visão de conjunto e da realidade da totalidade humana – são concepções que cada vez mais aplico no conjunto da minha vida.

Como sacerdote e como apóstolo da Humanidade, entendo o aspecto de aconselhador do poder Espiritual: isso implica não somente que devo rejeitar a imposição das minhas crenças pelo Estado – bem como de qualquer outra crença –, mas que também devo ser um bom conselheiro para quem precisa de conselhos. Ora, o aconselhamento próprio ao poder Espiritual é coletivo – em termos políticos, sociais e morais – e também individual – em termos igualmente políticos, sociais e morais.

O aconselhamento coletivo dá-se por meio da apreciação de temas de interesse público e realiza-se na leitura comentada das obras de Augusto Comte, nos sermões das prédicas e quando elaboramos “manifestos” políticos e sociais. Já o aconselhamento privado ocorre tanto por meio das prédicas em geral – que, afinal, são vistas e acompanhadas por indivíduos – quanto por meio de aconselhamentos especificamente pessoais.

Se é verdade que os indivíduos só existem como abstrações, também é verdade que a Humanidade é um ser composto, que existe em última análise pelos indivíduos; da mesma forma, a ação sacerdotal modifica a sociedade também pela modificação dos indivíduos: não podemos deixar de lado o aconselhamento, o apoio, a valorização dos membros individuais de nossa igreja e, de modo mais amplo, da Humanidade. É importante eu notar que, enquanto eu preparei-me de modo especial ao longo de minha carreira em particular para o aconselhamento coletivo, o sacerdócio da Humanidade não pode nunca descuidar do aconselhamento individual: por esses motivos, e por muitos outros ainda, tenho-me dedicado cada vez mais a conhecer como lidar e como auxiliar de fato os indivíduos que acorrem ao Positivismo. A preocupação com o aconselhamento individual tem-se desenvolvido ao longo das prédicas, como resultado das interações ocorridas nas prédicas e também como resultado do amadurecimento de minhas atividades como sacerdote e apóstolo.

O último aspecto que quero comentar é que as prédicas têm evoluído ao longo do tempo. Minha atuação na Igreja Positivista Virtual dá-se basicamente pelas prédicas, que realizo toda terça-feira a partir das 19h, nos canais Positivismo (Youtube.com/ThePositivism) e Igreja Positivista Virtual (Facebook.com/IgrejaPositivistaVirtual e Instagram.com/IgrejaPositivistaVirtual).

Quando eu iniciei as minhas prédicas à distância, já ocorriam nas manhãs de domingo as reuniões realizadas pelo Guardião do Templo Positivista de Porto Alegre, Érlon Jacques de Oliveira: com a especial e consciente preocupação de não o atrapalhar nem criar uma concorrência com ele – concorrência que seria desnecessária, desleal, contraproducente e antipositivista –, decidi realizar as minhas prédicas no meio da semana e à noite.

Sendo o progresso o desenvolvimento da ordem correspondente, creio que, aos poucos e cada vez mais, modifiquei e incrementei as prédicas, no sentido de torná-las mais sintéticas, mais orgânicas e mais simpáticas, ou seja, mais úteis, mais claras, mais interessantes, mais responsáveis e mais abertas ao diálogo. Esse progresso paulatino e incremental dá-se por meio de ajustes em meus procedimentos; no aumento de atividades; na diversificação das atividades; na mudanças de canais para transmissão; no estudo e no aperfeiçoamento das condições e das práticas de aconselhamento. O progresso paulatino e incremental também se dá, na medida de minhas possibilidades, por meio do estudo e da pesquisa sobre tudo quanto é dito e comentado nas prédicas, especialmente em termos de observações e dúvidas manifestadas pelo público; esse estudo é feito para que eu possa responder e comentar satisfatoriamente o que é dito pelo público e possa, portanto, aconselhar e orientar adequadamente.

Assim, sem pretender que o formato atual das prédicas seja excelente ou final, tenho certeza de que elas são hoje muito melhores do que eram no início – e isso não porque tenho agora maior desenvoltura na exposição, mas porque as prédicas estão melhor estruturadas, com mais elementos que indicam melhor o seu aspecto religioso e que satisfazem melhor as necessidades coletivas e as individuais.

Nesta carta eu comentei vários aspectos; a respeito de alguns eu aprofundei-me um pouco, a respeito de outros eu só fiz breves comentários; além disso, muitas outras questões não foram abordadas. O que eu abordei foi o que me pareceu – no momento em que redigi esta carta – mais relevante para apresentar as principais características e diretrizes da minha atuação como sacerdote e apóstolo da Religião da Humanidade. Alguns aspectos eu expus explicitamente, mas muitos outros eu deixo para que vocês, que têm interesse no sacerdócio positivo, procurem por si mesmos as indicações; é claro que as melhores exposições doutrinárias a respeito estão nas obras de Augusto Comte e de vários apóstolos da Humanidade (a começar pelos nossos Miguel Lemos e Raimundo Teixeira Mendes).

No final das contas, espero que esta carta tenha sido clara, útil e estimulante. 

Saúde e fraternidade, 

Gustavo Biscaia de Lacerda 

Curitiba, 5 de Gutenberg de 171 (17.8.2025).



[1] As anotações originais da prédica estão disponíveis aqui: https://filosofiasocialepositivismo.blogspot.com/2025/05/apresentacao-pessoal-formula-destinacao.html; já o vídeo dessa prédica pode ser visto aqui: https://www.youtube.com/live/wE5V1Z59bV8?si=Pn5x9RyN69sYKKCx. Acesso em 21.5.2025.