Em 17 de novembro de 2022 realizamos uma Live AOP intitulada "O Positivismo, a República e a bandeira no Brasil"; essa conferência consistiu em uma celebração pública da República no Brasil e, a partir daí, da atuação dos positivistas em prol da República, antes e depois do 15 de Novembro de 1889.
Abaixo reproduzimos as anotações que fizemos para guiar a exposição. Tendo cinco partes, as mais importantes são as partes 3, 4 e 5. No vídeo disponível no canal Positivismo, cada uma dessas partes pode ser vista a partir dos seguintes momentos:
- Parte 3 (concepções do Positivismo sobre a República): a partir de 7' 18" até 45' 28"
(Atenção: entre 7' 30" e 13' 31" houve uma falha no sinal de internet, de modo que a tela fica totalmente preta.)
- Parte 4 (atuação dos positivstas brasileiros em favor da República): a partir de 45' 29" até 1h 32' 19"
- Parte 5 (a bandeira nacional republicana): de 1h 32' 20" até 2h 16' 21"
A conferência pode ser vista no canal Positivismo; devido à interrupção do sinal que experimentamos logo no início da exposição, passamos a transmiti-la também no canal Apostolado Positivista, disponível aqui. (Os tempos indicados acima se referem ao vídeo do canal Positivismo, não ao do Apostolado Positivista.)
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O Positivismo, a República e a bandeira no
Brasil
Roteiro:
1. Explicação do objetivo da apresentação
2. Apresentação pessoal
3. Concepções do Positivismo sobre a república
4. Atuação dos positivistas brasileiros em favor da República
5. Sobre a bandeira nacional
1. Explicação do objetivo da apresentação
a. Inaugurar a Live AOP por um positivista
b. Apresentar alguns elementos teóricos e históricos do Positivismo sobre a República e a bandeira
c. Desfazer mitos sobre o Positivismo na República e sobre a bandeira nacional
2. Apresentação pessoal
a. Sociólogo da UFPR
b. Doutor em Sociologia Política (UFSC, 2010)
c. Autor de numerosos livros sobre o Positivismo
d. Positivista ortodoxo, dono do blogue Filosofia Social e Positivismo e dos canais Apostolado Positivista e The Positivism
3. Concepções do Positivismo sobre a República
a. O Positivismo considera que, com a positividade, no estado normal, o bem comum, o altruísmo deve ser o parâmetro fundamental das relações sociais
b. Em termos de regimes políticos e sociais, o Positivismo propõe duas concepções complementares: a sociocracia e a república
c. A sociocracia consiste na organização social mais ampla, ou seja, ela inclui os parâmetros de condutas individuais e coletivas, entre as classes, entre os grupos diversos, entre as famílias – e entre os cidadãos e o Estado
i. Pode-se dizer que a sociocracia são os valores que fundamentam e regem a vida coletiva, ou mesmo, em certo sentido, a “cultura política”
ii. A sociocracia afirma o bem comum, a busca do altruísmo, os deveres mútuos; é o governo da sociedade pela sociedade a partir de princípios e valores sociais
iii. É o regime positivo próprio ao estado normal, pois é altruísta, pacífico e relativo; é tolerante e baseado pelo bem comum e pelo primado da opinião pública
iv. Em contraposição, a chamada “democracia” é metafísica
1. A democracia é metafísica no sentido de Rousseau, pois esta consiste na secularização parcial do direito absoluto divino dos reis, que se torna direito absoluto do “povo”: cabe perfeitamente aqui a frase “A voz do povo é a voz de deus”
2. A democracia também é metafísica no sentido liberal, pois esta considera que a sociedade é a mera soma dos indivíduos, que o Estado é inimigo dos “indivíduos”, que a opinião pública pode ser reduzida à soma das vontades individuais (em particular por meio dos votos)
d. A república consiste no regime político propriamente dito
i. Augusto Comte reconhecia dois sentidos complementares para a república:
1. Sentido negativo: república como regime antimonárquico, ou seja, substituição do absoluto teológico pelo relativismo positivo como fundamento político
2. Sentido positivo: república como o regime do primado do interesse coletivo sobre o interesse individual
a. Além disso: caráter social da república, não meramente político; assim, preocupação central com a geração de empregos, combate ao desemprego, melhoria da qualidade de vida etc.
ii. A república é necessariamente presidencialista
1. O presidencialismo vincula-se às noções de deveres mútuos e de responsabilidade individual
2. O parlamentarismo é rejeitado por diversos motivos:
a. Acima de tudo, o parlamentarismo impede a indicação de responsabilidades
b. O parlamentarismo visa a enfraquecer o poder
c. A origem do parlamentarismo está no feudalismo inglês, com a reação da nobreza (depois burguesia) local contra o poder central e o comum do povo
iii. Augusto Comte estabelecia várias etapas na passagem da monarquia para a república normal:
1. Após a extinção da monarquia, dever-se-ia estabelecer o governo temporal puramente material e, portanto, unipessoal
2. Algumas fases intermediárias, caracterizadas pela difusão do Positivismo e, portanto, dos hábitos relativistas, altruístas, pacifistas etc.
3. Com a difusão do Positivismo, isto é, dos hábitos próprios à positividade e ao estado normal, o poder central passaria a ser dividido entre três governantes
4. Haveria uma câmara fiscal, isto é, orçamentária
e. Seja em relação à sociocracia em geral, seja em relação à república em particular, o regime positivo tem algumas características fundamentais; entre elas, podemos no mínimo citar ou reiterar:
i. Separação entre os dois poderes
ii. Isonomia
iii. Garantias jurídicas das liberdades
iv. Pacifismo externo (antimilitarismo, anti-imperialismo, fim dos exércitos) e interno (polícia cidadã, deveres mútuos, respeito às opiniões)
4. Atuação dos positivistas brasileiros em
favor da República
a. Antes de mais nada, é necessário afirmar que pelo menos desde o século XVIII o Brasil tem movimentos republicanos e que o republicanismo sempre foi muito difundido no país
i. Basta pensarmos na Inconfidência Mineira (1788-1789), na Confederação do Equador (1817), no período regencial (1831-1840) e na Revolução Farroupilha (1835-1845)
1. Além desses movimentos autóctones, havia os exemplos dos Estados Unidos e de toda a América espanhola, além da França
ii. Da mesma forma, quando José Bonifácio articulou a independência do Brasil em 1821-1822, ele entendeu a instalação da monarquia de maneira instrumental, ou seja, sem ligar à monarquia qualquer valor próprio às monarquias efetivas (castas, direito divino dos reis)
1. Em particular, José Bonifácio entendia que a monarquia era o único regime compatível com a escravidão
2. Além disso, José Bonifácio temia que a república ocasionasse a fragmentação do país
iii. A afirmação da república e do republicanismo no Brasil é importante porque os monarquistas (assumidos, envergonhados ou disfarçados) desde sempre difundem a idéia de que a república no Brasil seria uma concepção “estrangeira”, “importada”, “estranha” ou, em última análise, que se difundiu apenas a partir de 1870
iv. A república era extremamente valorizada na cultura popular, em canções, modinhas, sambas, sátiras à monarquia etc.
b. É necessário lembrar também que a monarquia brasileira não era muito respeitada e que instituía, mantinha e/ou baseava-se em uma série de problemas:
i. Escravidão à e, daí, degradação do trabalho, dos trabalhadores livres, dos escravos e dos libertos, além da produção do racismo
ii. Sociedade de castas
iii. Religião oficial
iv. Subdesenvolvimento econômico
v. Analfabetismo generalizado
vi. Filhotismo generalizado e burocracia não profissional à desprezo sistemático e ostensivo pelo mérito
vii. Violento imperialismo na região platina
viii. Fortíssima centralização política
c. Em 1870, com o término da Guerra contra o Paraguai (1864-1870), ocorreu o restabelecimento formal de um movimento republicano brasileiro, com a fundação de um novo Partido Republicano, em Itu (São Paulo)
d. Durante a Guerra contra o Paraguai, Benjamin Constant afirma-se positivista e republicano
e. Em 1881 Miguel Lemos e Teixeira Mendes ingressam no Centro Positivista Brasileiro, assumem a liderança da entidade e transformam-na na Igreja e Apostolado Positivista Brasileiro
i. A partir daí Miguel Lemos e Teixeira Mendes desenvolvem uma propaganda crescente e enérgica tanto do Positivismo como doutrina quanto de aplicações do Positivismo à realidade brasileira:
1. Fraternidade sul-americana (normalização das relações com o Paraguai, fim do imperialismo brasileiro na região platina)
2. Fim imediato da escravidão
3. Incorporação social do proletariado (incluindo os escravos e os libertos)
4. Proclamação da República
5. Promoção de uma cultura cívica positiva: Tiradentes, José Bonifácio
6. Etc. etc. etc. etc.
f. Miguel Lemos e Teixeira Mendes propunham a transformação orgânica da monarquia em república
i. Essa transformação dar-se-ia por ato de d. Pedro, que unilateralmente extinguiria a monarquia e todas as instituições a ela vinculadas
ii. Isso garantiria o caráter pacífico da transição: civil, não militar, não violento e não revolucionário
iii. A república a ser proclamada por d. Pedro – que passaria então a chamar-se apenas de “Pedro de Alcântara” – deveria ser, evidentemente, a república social e sociocrática
g. Ao longo das décadas de 1870 e 1880 acumularam-se as “questões” contra a monarquia:
i. A Questão Religiosa
ii. A Questão Militar
iii. A campanha abolicionista
h. Em 1887 fundou-se o Clube Militar, tendo como presidente Deodoro da Fonseca e vice-Presidente Benjamin Constant
i. Deodoro e Benjamin eram amigos pessoais, mas, muito além disso, simbolicamente essa presidência indicou a união das duas correntes do Exército de então – os doutores (Benjamin) e os tarimbeiros (Deodoro)
ii. Em 1887, o Clube Militar recusou-se a aceitar, para o Exército, o papel de capitão do mato à isso foi o golpe final e decisivo contra a escravidão (mantida ciosamente pela monarquia)
i. Após a abolição da escravatura, todos reconheciam que a monarquia estava com os dias contados
i. A dinastia Orleans e Bragança não era mais respeitada, não tinha mais o apoio das elites econômicas – que até então sustentavam a escravidão via monarquia – e todos também temiam o eventual governo clericalista e estrangeiro de Isabel e Conde d’Eu
ii. A nomeação de um ministério “progressista” em 1889 foi apenas u’a medida desesperada, com objetivos de propaganda, para tentar frear o republicanismo
j. Benjamin Constant lecionava na Escola Militar:
i. Era um professor extremamente respeitado e admirado
ii. Embora lecionasse em uma instituição militar, seu ensino era filosófico e civilista, ou seja, era antimilitarista
iii. À admiração por suas qualidades pessoais e docentes unia-se a empolgação pelo método e pelas doutrinas que ele esposava e empregava: no caso, as concepções de Augusto Comte
iv. Assim, Benjamin Constant reunia em si, objetiva e subjetivamente, qualidades pessoais e cívicas: a correção, o profissionalismo, o desprendimento, a devoção à causa pública – bem como o progresso, o desenvolvimento nacional, o abolicionismo, a república
v. Os alunos de Benjamin Constant eram a elite intelectual e profissional do Império e não estavam vinculados à degradação moral, social e política da monarquia
vi. Em virtude disso tudo, Benjamin Constant tornou-se o líder natural dos jovens e, por extensão, do republicanismo na Escola Militar
vii. Ao longo de 1889 a pressão pela república aumentou, fosse em grupos civis, fosse em militares; considerava-se que o apoio do Exército seria importante e, nesse sentido, Deodoro era figura central
viii. Benjamin entrou em acordo com Deodoro; com a participação de Rui Barbosa, marcaram o movimento de proclamação da República para o dia 20 de novembro
ix. Mas na madrugada de 14 para 15 de novembro correu um boato de que Deodoro e Benjamin seriam presos – e aí as coisas precipitaram-se: Deodoro reuniu suas tropas na Praça da República (antigamente Campo de Santana) e proclamou a República
1. Houve movimentações na Câmara dos Deputados; na Corte, considerava-se que era um movimento apenas para a mudança de ministério
x. Constituiu-se o governo provisório, com oito ou nove membros; Deodoro foi indicado Presidente e Benjamin, Ministro da Guerra; dali a alguns dias chegou Demétrio Ribeiro, representando os republicanos gaúchos, que assumiu a pasta da Agricultura
1) Chefe do Governo Provisório — Deodoro da Fonseca 2) Ministério da Justiça — Campos Sales 3) Ministério da Marinha — Eduardo Wandenkolk 4) Ministério da Guerra — Benjamin Constant, Floriano Peixoto e Antônio Nicolau Falcão da Frota 5) Ministério dos Negócios Estrangeiros — Quintino Bocaiúva 6) Ministério da Fazenda — Rui Barbosa e Tristão de Alencar Araripe 7) Ministério do Interior — Aristides Lobo Cesário Alvim e Tristão de Alencar Araripe 8) Ministério da Agricultura, Comércio e Obras Públicas — Demétrio Nunes Ribeiro, Francisco Glicério de Cerqueira Leite e Henrique Pereira de Lucena 9) Ministério da Instrução Pública, Correios e Telégrafos — Benjamin Constant |
xi. No dia 19 de novembro foi aprovada a nova bandeira nacional (Decreto n. 4); em 7 de janeiro de 1890 foi promulgado o Decreto n. 119-A, relativo à separação entre igreja e Estado; em 14 de janeiro foi editado o Decreto n. 155-B, com os feriados cívicos nacionais
xii. Devido às discussões internas ao governo provisório, Benjamin deixou em 12 de março a pasta da Guerra e, de maneira muito indicativa de seu caráter e seu temperamento (reflexivo, pacifista e civilista), assumiu a da Instrução Pública, Correios e Telégrafos; faleceu em 22 de janeiro de 1891
5. Sobre a bandeira nacional
a. A atual bandeira nacional republicana, de 19 de novembro de 1889, como se sabe, não foi a primeira; antes dela hasteou-se uma servil cópia verde e amarela da bandeira dos EUA, da autoria de Lopes Trovão
i. A bandeira atual foi elaborada por Raimundo Teixeira Mendes, pintada por Décio Vilares e auxiliada na parte astronômica por Manuel Pereira Reis; ela foi submetida a Benjamin Constant, que, na qualidade de membro do governo provisório, aceitou-a, ao mesmo tempo em que Deodoro já recusara o servil projeto de Lopes Trovão
ii. A totalidade da concepção da bandeira une a ordem ao progresso, a permanência do país ao progresso social e político:
1. Ordem: mantém o projeto de José Bonifácio, com o retângulo verde e o losango amarelo, que, por sua vez, representavam inicialmente as cores das casas monárquicas de Portugal e da Áustria e, depois, as riquezas naturais (vivas: o verde das matas; mortas: o amarelo do ouro)
2. Progresso: indica a mudança de regime, com a circunferência azul estrelada (idealizando o céu do Rio de Janeiro às 9h do 15 de novembro) e a faixa branca com letras maiúsculas verdes em que se lê “Ordem e Progresso”
iii. O “Ordem e Progresso” é uma divisa científica e política, indicando as duas formas fundamentais de analisar a sociedade (Sociologia Estática e Sociologia Dinâmica), que devem ser combinadas, e as duas tendências sociais que se deseja e que também devem ser combinadas em toda sociedade (a permanência social e o seu progresso)
b. Há um movimento atual que afirma que se deve inserir a palavra “Amor” antecedendo o “Ordem e Progresso”
i. Apesar da correção moral da ênfase no amor, esse movimento difunde de maneira coordenada um relato padronizado, genérico, errado do ponto de vista histórico e extremamente preconceituoso
1. Esse movimento justifica a inclusão do “amor” referindo-se – corretamente, é claro – à situação sociopolítica atual, caracterizada pela divisão social e pelo fascismo
ii. Mas: entre outras coisas discutíveis, esse movimento argumenta que “os homens que se reuniram para fazer a bandeira tiraram/rejeitaram/esconderam/desprezaram o amor”
1. Esse relato sugere então que a base do “Ordem e Progresso” seria a fórmula religiosa do Positivismo, “O amor por princípio...”, em vez de ser uma fórmula bastante por si só
2. Além disso, segundo esse relato, Teixeira Mendes teria sido mal, ou vil, ou egoísta, ou mesquinho, e teria tirado o “amor” para que a sociedade brasileira fosse baseada no ódio
a. Um exemplo recentíssimo desse relato é o de Denise Fraga, em 27.10.2022, em um evento em apoio à candidatura de Lula para Presidente da República
iii. Esse movimento também repete que “não há informações a respeito da elaboração da bandeira”
1. Eis um exemplo publicado há alguns dias, que apresenta esses diversos erros:
“Segundo o professor de História Djalma Augusto, a elite brasileira que instituiu a República foi muito influenciada pelo positivismo e pode ter suprimido a palavra amor na versão final da bandeira brasileira. Porém, o professor ressalta que não há uma consideração teórica ou uma referência muito clara sobre a supressão da palavra amor, o que torna a questão difícil de ser discutida” (Thaís Silveira, “‘Ordem e Progresso’: um país sem amor?”, 15.11.2022, Portal “Nós”). |
c. Entretanto, sistematicamente nós positivistas somos ignorados e desprezados no que se refere à bandeira – como, de resto, somos ignorados, desprezados, silenciados a respeito de qualquer coisa que nos diga respeito
i. Eu realizei inúmeros esforços para ser ouvido: em 2021 fui ouvido muito rapidamente e de má vontade pelo grupo “Amor na bandeira” – mas logo descartado e ignorado, como um intruso
d. Vale lembrar que está na moda político-intelectual um conceito dos identitários: trata-se da tese excludente e sectária do “lugar de fala”
i. O “lugar de fala” estabelece uma reserva de mercado, ou uma cota retórica, em que somente “nós” (os integrantes do grupo identitário) podemos falar sobre nós e os “outros” não podem, ou podem desde que sejam vigiados e supervisionados por “nós”
ii. Embora o “lugar de fala” seja largamente aplicado nos dias atuais, como não poderia deixar de ser aos positivistas é negada qualquer possibilidade de ter seu próprio “lugar de fala”
e. Os dados sobre a bandeira nacional estão disponíveis para quem quiser, na internet: seja no meu blogue, seja no portal Archive Internet, seja nos livros de Ivan Lins
i. Raimundo Teixeira Mendes e, depois, também Miguel Lemos publicaram uma série de artigos explicando e justificando a concepção da bandeira nacional; esses artigos começaram já em 24 de novembro de 1899, no Diário Oficial; eles foram reunidos em um livro intitulado A bandeira nacional, publicação n. 110 da série da Igreja Positivista do Brasil (cf. p. ex. p. 8-9 e 58-59)
ii. Há indicações na biografia de Benjamin Constant publicada por Teixeira Mendes logo após a morte do fundador da República, em julho de 1891
iii. Uma cópia digital da primeira edição da História do Positivismo do Brasil, de Ivan Lins, está disponível na internet
iv. Minhas publicações sobre a bandeira nacional estão disponíveis aqui
f. Entrando na reflexão substantiva sobre o “Ordem e Progresso”: ele é uma fórmula por si só, de caráter científico e político
i. Doutrinariamente, é evidente que o “Ordem e Progresso” pode ser deduzido do “Amor por princípio”; entretanto, ele é uma fórmula por si só e cronologicamente foi elaborado antes do “Amor por princípio” – na verdade, o “Ordem e Progresso” foi a base do “Amor por princípio”
g. As indicações de Augusto Comte a respeito das bandeiras são claras:
i. Na fase normal, deverá haver duas bandeiras, uma religiosa e universal (branca e verde, com a figura da Humanidade e o “Amor por princípio”, uma em cada lado) e uma política e nacional (branca e verde, com “Ordem e Progresso” e “Viver para outrem”, uma em cada lado, com bordas com as cores nacionais)
1. Nas bandeiras nacionais, de caráter político, a sugestão do “Amor” está presente no “Viver para outrem”
2. O “Ordem e Progresso” é uma divisa científica, política e masculina; o “Viver para outrem” é moral e feminina
3. Essas indicações estão presentes na Política positiva: volume I, página 387, e volume IV, página 422
h. Como Hernani Gomes da Costa observou há alguns, o conectivo “e” representa o amor, na medida em que a união da ordem com o progresso só se dá por meio do amor
i. Antes do segundo turno das eleições de 2022, divulgamos o abaixo-assinado intitulado “A bandeira nacional não é fascista”
A BANDEIRA NACIONAL REPUBLICANA NÃO É FASCISTA (Abaixo-assinado) Para: População brasileira Os abaixo-assinados – quer sejam positivistas, quer não sejam positivistas; reconhecendo e respeitando os valores e princípios subjacentes aos símbolos nacionais brasileiros, em particular a bandeira nacional republicana; reconhecendo a dramática situação política, social, intelectual e econômica vivida pelo Brasil no ano de 2022; considerando a apropriação cada vez mais reiterada dos símbolos nacionais por grupos sociais e políticos particularistas, violentos e intolerantes – têm a dizer o seguinte. 1. Os valores da bandeira nacional A bandeira republicana brasileira foi instituída como símbolo nacional em 19 de novembro de 1889, quatro dias após a Proclamação da República, em 15 de novembro de 1889. Ela foi elaborada por Raimundo Teixeira Mendes a partir das indicações precisas do fundador da Sociologia, do Positivismo e da Religião da Humanidade, Augusto Comte. Símbolo nacional maior por excelência, ela une de maneira simples, elegante e harmônica o desenvolvimento histórico e a continuidade social, ao manter o fundo verde e amarelo da bandeira monárquica e ao inserir a esfera estrelada azul e a divisa política “Ordem e Progresso”, próprias à evolução republicana do país. Assim, essa bandeira segue a inspiração de “preservar melhorando”, de acordo com as leis da sociologia dinâmica descobertas por Augusto Comte. A frase “Ordem e Progresso” representa o ideal de unir indissoluvelmente duas perspectivas políticas até então opostas, o respeito à ordem e a necessidade de progresso. Separadas, cada uma dessas perspectivas torna-se antagônica em relação à outra, de tal maneira que a ordem transforma-se em ordem retrógrada e opressiva e o progresso torna-se caótico e também opressivo. Apenas a união das duas perspectivas, em que ambas sejam simultaneamente respeitadas e valorizadas, torna possível que cada uma delas seja cumprida. A ordem consiste na consolidação do progresso, ao passo que o progresso é o desenvolvimento da ordem; o vínculo entre ambos é o amor, que, em termos políticos, deve ser entendido em termos de fraternidade, respeito mútuo e tolerância. Em particular, o respeito à ordem não equivale à submissão cega ou servil ao poder político; da mesma forma, a verdadeira relação entre o poder e os cidadãos não é a de um soldado que se submete ao seu comandante. Nada disso é liberdade ou cidadania, mas autoritarismo, militarismo e submissão abjeta. 2. A política positiva A bandeira nacional republicana, bem como a divisa “Ordem e Progresso”, inspiram-se e representam os conceitos da política positiva; estes, por sua vez, podem ser sumariados como seguem: - subordinação da política à moral: subordinação da política aos princípios e valores maiores da Humanidade, em que a família subordina-se à pátria e a pátria subordina-se à Humanidade; subordinação das perspectivas específicas e particulares às concepções gerais e mais amplas; primado da publicidade e da racionalidade na vida coletiva, em particular nas ações com resultados públicos; afirmação dos deveres sociais, em particular responsabilizando claramente os fortes, os poderosos e os ricos por suas ações e omissões; - separação entre os poderes Temporal e Espiritual: rejeição de todo e qualquer clericalismo (teológico, metafísico e científico); rejeição do uso do Estado para promoção ou repressão de crenças, exceto no caso em que elas estimulem e/ou provoquem a violência; rejeição da eleição ou da indicação de sacerdotes para cargos públicos; defesa das liberdades de pensamento, de expressão e de associação; - pacifismo: rejeição de toda e qualquer violência na política (seja do Estado contra os cidadãos, seja dos cidadãos entre si), em particular na forma das agressões de policiais contra cidadãos; rejeição da atuação de militares e policiais na política; possibilidade de manifestar livremente as idéias e as concepções pessoais sem correr nenhum risco (físico e/ou profissional) por isso; - relativismo: prática da tolerância para com as diferentes crenças e religiões; respeito e proteção às comunidades indígenas; condenação de toda prática violenta na vida social. 3. Os fascistas contra o Positivismo Desde pelo menos 2019, grupos fascistas e de extrema-direita têm manifestado a pretensão de tomar exclusivamente para si, de maneira sectária, a bandeira nacional republicana, incluindo aí o “Ordem e Progresso”. Diversas manifestações desses mesmos grupos evidenciam, entretanto, não somente que eles afastam-se dos ideais expressos na bandeira nacional republicana e no “Ordem e Progresso” como, ainda mais, são opostos e desprezam esses valores. Assim, por exemplo, o mote do atual governo federal, que resume o programa fascista, é “Brasil acima de tudo e deus acima de todos”. Essa única frase rejeita ao mesmo tempo os princípios (1) da subordinação de todas as pátrias aos supremos interesses da Humanidade e (2) da separação dos poderes Temporal e Espiritual; inversamente, ela (1) estabelece como parâmetro de conduta o nacionalismo mais estreito e (2) a imposição oficial de doutrina teológica. Se isso não bastasse, o verso “Brasil acima de tudo” não por acaso retoma a frase empregada pelo regime nazista, “Alemanha acima de tudo” (Deutschland über alles). Da mesma forma, não podemos esquecer as reiteradas manifestações de profundo ódio e preconceito político desses grupos contra o Positivismo, com o que mais uma vez evidenciam que desprezam os valores da bandeira nacional e o “Ordem e Progresso”: - “Os positivistas são lixo que necessitam ser expurgados” (Carlos Bolsonaro, 8/3/2020) - “Os positivistas são o pior câncer do Brasil” (Carla Zambelli, 5/7/2020) - “Enquanto a gente não resolver o positivismo, a gente não consegue desmontar o comunismo, socialismo, a esquerda no Brasil” (Abraham Weintraub, 27/6/2022). 4. Declaração final Os valores, os ideais, as concepções subjacentes à totalidade da bandeira nacional republicana, incluindo aí a divisa “Ordem e Progresso”, condensam os melhores e mais altos princípios da política moderna. Todos esses princípios são profundamente estranhos à filosofia e à prática do fascismo. Mais do que isso: como se sabe, o fascismo baseia-se no estímulo sistemático e no uso político da violência; na militarização e na “policialização” da sociedade; na imposição de crenças pelo Estado e na busca de supressão das crenças não oficiais; no nacionalismo extremado, na xenofobia, na intolerância. É em virtude de todos esses motivos que afirmamos sem medo de errar: A BANDEIRA NACIONAL REPUBLICANA NÃO É FASCISTA! |
6. Para concluir
a. Esta conferência teve dois ou três objetivos:
i. Celebrar a República
ii. Celebrar a atuação dos positivistas na República
iii. Esclarecer alguns aspectos supostamente controversos (mas baseados unicamente na ignorância interessada) sobre os positivistas
iv. Afirmar a perspectiva própria ao Positivismo, contra a censura promovida pela direita e pela esquerda, incluindo aí o movimento “Amor na bandeira”