14 abril 2021

Roteiro da exposição sobre o quarto mês dos calendários positivistas (Arquimedes e Filiação)

O vídeo correspondente ao roteiro abaixo encontra-se disponível aqui.


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Roteiro da exposição sobre o quarto mês dos calendários positivistas

 

Parte I – Mês concreto: Arquimedes

 


 

-        4º mês do calendário positivista concreto

o   Considerando o ano júlio-gregoriano de 2021, o mês de Arquimedes começa em 26 de março e termina em 22 de abril

o   O quarto mês concreto representa a ciência antiga

§  É o quarto mês da Antigüidade

§  Ele é antecedido por Moisés (a teocracia inicial), Homero (a poesia antiga) e Aristóteles (a filosofia antiga) e seguido pelo derradeiro mês da Antigüidade (César)

-        A respeito do mês de Arquimedes é necessário retomarmos comentários feitos anteriormente, tanto no mês de Homero quanto, principalmente, no de Aristóteles

o   Além disso, no Catecismo há poucas referências a Arquimedes ou à ciência grega; de modo geral, elas estão associadas aos comentários sobre a filosofia grega

-        A ciência foi o terceiro e último ramo intelectual a separar-se da árvore teocrática, após a poesia e a filosofia

o   Os primeiros filósofos gregos têm suas elaborações ainda muito próximos da teologia, utilizando mitos antigos para refletir sobre o mundo, mas, ao mesmo tempo, tendendo à positividade; assim, há um caráter geral metafísico permeando essa filosofia:

§  “Nessa longa elaboração mental [grega], cumpre distinguir três fases desiguais fielmente caracterizadas no quadro concreto [isto é, no calendário positivista concreto]. O movimento começa pela arte de que Homero é o eterno representante. Forçoso era que a poesia, ao mesmo tempo mais independente e mais peada, fosse a primeira a desprender-se do tronco teocrático, de modo a começar a emancipação ocidental. Ela prepara o advento da filosofia que, em princípio esboçada por Tales e Pitágoras, personifica-se enfim no incomparável Aristóteles, por tal forma superior ao seu tempo que só pode ser apreciado na Idade Média. Sob a presidência de sua eterna elaboração, este segundo surto fica assaz caracterizado a ponto de fazer sentir em breve aos verdadeiros pensadores a impossibilidade de ultrapassá-lo sem um longo preâmbulo científico que pudesse desenvolver suficientemente sua primordial base positiva. Então a ciência real, admiravelmente representada por Arquimedes, tornou-se, por sua vez, o objeto principal do gênio grego, cuja aptidão estética e força filosófica se achavam irrevogavelmente exaustas” (Catecismo, p. 412-413)

o   A filosofia grega tem o caráter próprio à filosofia conforme Augusto Comte usa essa expressão, isto é, reflexão geral e sistemática sobre o mundo e o homem

§  Ao mesmo tempo em que os filósofos refletiam sobre o mundo, eles também refletiam sobre o homem, de sorte que eles pensavam em termos ao mesmo tempo cosmológicos e morais: Tales e, ainda mais, Pitágoras e sua escola são totalmente exemplares a esse respeito

§  Vale notar que Tales e Pitágoras, ao mesmo tempo em que eram filósofos, foram também cientistas, sistematizando e levando bastante adiante o conhecimento obtido da teocracia egípcia; deve-se a Tales a primeira lei natural – a lei da soma dos ângulos internos dos triângulos planos

o   A filosofia grega raciocina em termos estáticos, repelindo a dinâmica – desde a Matemática até a Moral –; isso pode ser visto com clareza tanto na filosofia quanto na ciência; assim, no máximo os gregos desenvolveram concepções de ordem, mas não de progresso (para o qual faltava também um longo registro histórico, que permitisse claramente a noção de sucessão)

-        Arquimedes é referido duas vezes nos calendários positivistas:

1)      Sendo o titular do quarto mês do calendário concreto;

2)      Sendo celebrado na primeira semana do oitavo mês do calendário abstrato, dedicada ao politeísmo intelectual (Catecismo, p. 477) à essa semana celebra a batalha de Salamina, isto é, a vitória do gênio grego sobre a teocracia persa, bem como diversos outros nomes além do de Arquimedes: Homero, Ésquilo, Fídias, Tales, Pitágoras, Aristóteles, Hipócrates, Arquimedes, Apolônio, Hiparco

-        O mês e as semanas do mês de Arquimedes correspondem ao seguinte:

o   Arquimedes – reúne o conjunto da ciência antiga, especialmente da Matemática, da Astronomia, da Biologia e de apontamentos históricos

o   Hipócrates – reúne pesquisadores biológicos, anatomistas e médicos (incluindo alguns muçulmanos)

o   Apolônio de Perga – reúne os grandes matemáticos gregos

o   Hiparco – reúne os grandes astrônomos e estudiosos da mecânica celeste (incluindo alguns muçulmanos), em que a Astronomia torna-se uma ciência e não mais meras coleções de cartas celestes

o   Plínio, o Velho – reúne pensadores e cronistas históricos, cujos materiais serão utilizados séculos depois (quando a Sociologia for, enfim, criada); também reúne investigadores (agricultura, arquitetura, geografia) cujas descobertas são passíveis de serem aplicados ao melhoramento da vida

 

Parte II – Mês abstrato: a filiação

-        O quarto mês do calendário positivista abstrato celebra a filiação

o   É o terceiro mês que celebra os laços fundamentais, em número de cinco: casamento, paternidade, filiação, fraternidade e domesticidade

-        A filiação corresponde ao laço que liga no âmbito doméstico os filhos aos pais e às mães, em que se desenvolve e sistematiza a subordinação dos mais novos, dos mais fracos e dos inferiores aos mais antigos, mais fortes e  superiores:

o   Assim, a filiação completa a relação inaugurada pela paternidade e que é sistematizada em termos morais, tanto no âmbito doméstico quanto no cívico, pela fórmula: “dedicação dos fortes pelos fracos, veneração dos fracos para com os fortes”

-        São quatro as modalidades determinadas por nosso mestre na filiação, com as respectivas festas semanais; elas vão das mais completas, fortes e íntimas para as mais incompletas e fracas:

1)      Natural – são os laços completos e por vezes involuntários que ligam os pais aos filhos, mas em todo caso sendo laços de origem biológica

2)      Artificial – os laços criados voluntariamente entre pais e filhos, por meio das adoções

3)      Espiritual – são os laços de apoio principalmente moral, mas também intelectual e artístico

4)      Temporal – são os laços de patrocínio material

 

Parte III – Comemorações de aniversários e feriados cívicos

-        Em termos de aniversários, comemoramos neste mês as seguintes figuras:

o   Clotilde de Vaux (1815-1846) – nascimento e morte (9.Arquimedes – 3.abr.; 11.Arquimedes – 5.abr.)

o   David Carneiro (1904-1990) – nascimento (4.Arquimedes – 29.mar.)

o   Eduardo de Sá (1866-1940) – nascimento (7.Arquimedes – 1º.abr.)

o   Antonin Dubost (1842-1921) – morte (22.Arquimedes – 16.abr.)

o   Dia do Índio (25.Arquimedes – 19.abr.)

o   Dia de Tiradentes (1791) (27.Arquimedes – 21.abr.)

o   Descobrimento do Brasil (1500) (28.Arquimedes – 22.abr.)











 

Referências bibliográficas

Augusto Comte: Sistema de filosofia positiva, Sistema de política positiva, Catecismo positivista, Síntese subjetiva

Frederic Harrison: O novo calendário dos grandes homens

Raimundo Teixeira Mendes: As últimas concepções de Augusto Comte

David Carneiro: História da Humanidade através dos seus grandes tipos

Ângelo Torres: Calendário Filosófico

Comité des travaux historiques et scientifiques: Sociétés savantes de France

Roteiro da exposição sobre o terceiro mês dos calendários positivistas (Aristóteles e Paternidade)

O vídeo correspondente ao roteiro abaixo encontra-se disponível aqui.


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Roteiro da exposição sobre o terceiro mês dos calendários positivistas

 

Parte I – Mês concreto: Aristóteles

 



-        3º mês do calendário positivista concreto

o   Considerando o ano júlio-gregoriano de 2021, o mês de Aristóteles começa em 26 de fevereiro e termina em 25 de março

o   O segundo mês concreto representa a filosofia antiga

§  É o terceiro mês da Antigüidade

§  Ele é antecedido por Moisés (a teocracia inicial) e Homero (a poesia antiga) e seguido pelos outros dois meses da Antigüidade (Arquimedes e César)

-        A filosofia foi o segundo ramo intelectual a separar-se da árvore teocrática, após a poesia e antes da ciência

o   Os primeiros filósofos gregos têm suas elaborações ainda muito próximos da teologia, utilizando mitos antigos para refletir sobre o mundo, mas, ao mesmo tempo, tendendo à positividade; assim, há um caráter geral metafísico permeando essa filosofia

o   A filosofia grega tem o caráter próprio à filosofia conforme Augusto Comte usa essa expressão, isto é, reflexão geral e sistemática sobre o mundo e o homem

§  Ao mesmo tempo em que os filósofos refletiam sobre o mundo, eles também refletiam sobre o homem, de sorte que eles pensavam em termos ao mesmo tempo cosmológicos e morais: Tales e, ainda mais, Pitágoras e sua escola são totalmente exemplares a esse respeito

o   A filosofia grega raciocina em termos estáticos, repelindo a dinâmica – desde a Matemática até a Moral –; isso pode ser visto com clareza tanto na filosofia quanto na ciência; assim, no máximo os gregos desenvolveram concepções de ordem, mas não de progresso (para o qual faltava também um longo registro histórico, que permitisse claramente a noção de sucessão)

o   Eis como nosso mestre resume a evolução intelectual grega:

§  “Nessa longa elaboração mental [grega], cumpre distinguir três fases desiguais fielmente caracterizadas no quadro concreto [isto é, no calendário positivista concreto]. O movimento começa pela arte de que Homero é o eterno representante. Forçoso era que a poesia, ao mesmo tempo mais independente e mais peada, fosse a primeira a desprender-se do tronco teocrático, de modo a começar a emancipação ocidental. Ela prepara o advento da filosofia que, em princípio esboçada por Tales e Pitágoras, personifica-se enfim no incomparável Aristóteles, por tal forma superior ao seu tempo que só pode ser apreciado na Idade Média. Sob a presidência de sua eterna elaboração, este segundo surto fica assaz caracterizado a ponto de fazer sentir em breve aos verdadeiros pensadores a impossibilidade de ultrapassá-lo sem um longo preâmbulo científico que pudesse desenvolver suficientemente sua primordial base positiva. Então a ciência real, admiravelmente representada por Arquimedes, tornou-se, por sua vez, o objeto principal do gênio grego, cuja aptidão estética e força filosófica se achavam irrevogavelmente exaustas” (Catecismo, p. 412-413)

-        Aristóteles em particular é um dos nomes mais importantes para Augusto Comte, sendo citado inúmeras vezes – sempre da maneira mais elogiosa possível – no Catecismo positivista

o   Antes de mais nada, importa notar que Aristóteles é definido por nosso mestre como um de seus antecessores – nomeadamente, Aristóteles é o grande nome da Antigüidade

§  Aristóteles é ligado em termos intelectuais à modernidade por meio de Tomás de Aquino, Rogério Bacon e Dante na Idade Média; os pensadores modernos que Augusto Comte identifica como seus antecessores são vários, em diversos âmbitos: o seu pai espiritual é Condorcet, integrando a escola filosófica do século XVIII (dos enciclopedistas) de Fontenelle, David Hume e Diderot; Kant é ligado a Hume e José de Maistre, a Condorcet; Bichat e Gall também são antecessores científicos: esses seis nomes (Hume e Kant, Condorcet e De Maistre, Bichat e Gall) ligam Augusto Comte aos três fundadores da verdadeira filosofia moderna (Descartes, Bacon e Galileu) (Catecismo, p. 5-6)

o   Além disso, nosso mestre considera que, se a primeira carreira de nosso mestre (com a redação do Sistema de filosofia positiva) fê-lo um Aristóteles moderno, a sua segunda carreira (do Sistema de política positiva) fê-lo um São Paulo moderno, a partir da inspiração de Clotilde de Vaux:

§  “Sem ela [sem Clotilde], nunca eu poderia podido fazer suceder ativamente a carreira de S. Paulo à de Aristóteles, fundando a religião universal sobre a sã filosofia, depois de ter tirado esta da ciência real” (Catecismo, p. 15)

o   Para Augusto Comte, caso o ambiente social em que Aristóteles surgiu fosse mais próprio à poesia, ele seria tão genial quanto Dante ou quanto foi em filosofia; inversamente, se, por exemplo, Dante tivesse nascido em um ambiente mais filosófico, teria sido tão genial quanto foi Aristóteles ou em poesia (Catecismo, p. 112)

-        Embora limitado às considerações estáticas, como todos na Grécia (ou melhor, como todos na Antigüidade), Aristóteles foi um pensador de âmbito universal e enciclopédico, tendo lançado bases fundamentais para o estudo estático das ciências superiores (Biologia, Sociologia e Moral)

o   na Biologia, ele propôs o esquema (necessariamente subjetivo) da classificação de seres vivos, fez observações importantes sobre a simetria dos animais superiores e, além de muitas outras observações, lançou as bases da Biologia, que só seria fundada de fato por Bichat, no século XIX (Catecismo, p. 233-234)

o   Na Sociologia, fez comparações sistemáticas sobre as cidades gregas e bárbaras, formulando no início da sua Política o fundamento da estática social, ou seja, a separação dos ofícios e a convergência dos esforços

o   Na Moral, especialmente na sua Ética Nicomaquéia, elaborou reflexões fundamentais sobre a felicidade, o dever, a responsabilidade; novamente na Política também afirmou a superioridade moral das mulheres: “a principal força da mulher consiste em superar a dificuldade de obedecer” (Catecismo, p. 349)

o   Em termos de Lógica, Aristóteles também foi fundamental, ao propor a lei estática fundamental do entendimento humano: “nada há no entendimento que não provenha primeiramente dos sentidos” (Catecismo, p. 174-175)

o   Em virtude dessas características todas, Aristóteles estava muito à frente de seu tempo e só foi avaliado plenamente, isto é, respeitado e levado em consideração, na Idade Média (a obra de Tomás de Aquino representa o reconhecimento católico dessa superioridade e a necessidade de, de alguma forma, o catolicismo incorporar o aristotelismo)

o   O poderoso gênio positivo de Aristóteles tinha que se limitar ao ambiente teológico-metafísico geral da Grécia em que viveu; em particular, ele concebia uma divindade monoteica

§  Vale lembrar que esse monoteísmo já era concebido pelo menos desde Sócrates e que, por meio de Platão, influenciará decisivamente a constituição do catolicismo; esse monoteísmo, além disso, é a via orgânica própria ao Ocidente na constituição do monoteísmo, que será elaborado plenamente por São Paulo, alguns séculos depois

§  O monoteísmo de Aristóteles não reconhecia o voluntarismo próprio ao politeísmo ou o presente no mosaísmo; o deus aristotélico limitava-se a criar o mundo e a pô-lo em movimento, afastando-se então da realidade

-        A importância de Aristóteles é tão grande que ele é celebrado pelo menos três vezes nos calendários positivistas:

1)      Sendo o titular do terceiro mês do calendário concreto;

2)      Sendo celebrado na primeira semana do oitavo mês do calendário abstrato, dedicada ao politeísmo intelectual (Catecismo, p. 477) à essa semana celebra a batalha de Salamina, isto é, a vitória do gênio grego sobre a teocracia persa, bem como diversos outros nomes além do de Aristóteles: Homero, Ésquilo, Fídias, Tales, Pitágoras, Aristóteles, Hipócrates, Arquimedes, Apolônio, Hiparco

3)      Sendo o titular da celebração dos dias das semanas (Catecismo, p. 155):

Lunedia: Homero

Martedia: Aristóteles

Mercuridia: César

Venerdia: São Paulo

Jovedia: Carlos Magno

Sábado: Dante

Domingo: Descartes

-        O mês e as semanas do mês de Aristóteles correspondem ao seguinte:

o   Aristóteles – é o conjunto da contribuição filosófica dos nossos antecedentes gregos

o   Tales – reúne os grandes pensadores iniciais da Grécia, que buscavam explicar o mundo com base em algum princípio geral; também inclui pensadores que buscavam desenvolver o que chamaríamos depois de ciência

o   Pitágoras – reúne os moralistas gregos preocupados com os destinos coletivos e também aqueles que procuraram usam a ciência como base da moralidade

o   Sócrates – reúne os pensadores morais em termos individuais; a presença de Zenão incorpora o estoicismo e, daí, a presença de pensadores romanos (Cícero; Plínio, o Jovem; Tácito)

o   Platão – reúne os pensadores metafísicos que constituirão, depois, o monoteísmo católico

 

Parte II – Mês abstrato: a paternidade

-        O terceiro mês do calendário positivista abstrato celebra a paternidade

o   É o segundo mês que celebra os laços fundamentais, em número de cinco: casamento, paternidade, filiação, fraternidade e domesticidade

-        A paternidade corresponde a pelo menos dois tipos de relações:

o   Por um lado, é a responsabilidade masculina de manter a ordem no âmbito doméstico e de prover as necessidades familiares, para isso sofrendo a influência moral, isto é, moderadora das mulheres;

o   Por outro lado, é a responsabilidade paterna de cuidar dos filhos, isto é, de desenvolver os sentimentos de bondade para com aqueles que são, ao mesmo tempo, mais fracos, inferiores e posteriores a si. Este aspecto é o que caracteriza propriamente a “paternidade”, mas é claro que ele tem o aspecto anterior como seu requisito sociológico e moral.

§  Assim, a paternidade estabelece a relação que é completada pela filiação e que é sistematizada em termos morais, tanto no âmbito doméstico quanto no cívico, pela fórmula: “dedicação dos fortes pelos fracos, veneração dos fracos para com os fortes”

-        São quatro as modalidades determinadas por nosso mestre na paternidade, com as respectivas festas semanais; elas vão das mais completas, fortes e íntimas para as mais incompletas e fracas:

1)      Natural – são os laços completos e por vezes involuntários que ligam os pais aos filhos, mas em todo caso sendo laços de origem biológica

2)      Artificial – os laços criados voluntariamente entre pais e filhos, por meio das adoções

3)      Espiritual – são os laços de apoio principalmente moral, mas também intelectual e artístico

4)      Temporal – são os laços de patrocínio material

 

Parte III – Comemorações de aniversários e feriados cívicos

-        Em termos de aniversários, comemoramos neste mês a seguinte figura:

o   Justin Dévot (1867-1921) – morte (2.Aristóteles – 27.fev.)

o   Início do outono (23.Aristóteles – 20.mar.)

 




 

Referências bibliográficas

Augusto Comte: Sistema de filosofia positiva, Sistema de política positiva, Catecismo positivista, Síntese subjetiva

Frederic Harrison: O novo calendário dos grandes homens

Raimundo Teixeira Mendes: As últimas concepções de Augusto Comte

David Carneiro: História da Humanidade através dos seus grandes tipos, v. 2

Ângelo Torres: Calendário Filosófico

Comité des travaux historiques et scientifiques: Sociétés savantes de France

09 abril 2021

Mais um capítulo sobre algo chamado "Auguste Comte"

A postagem abaixo é uma versão modificada de cartas (mensagens eletrônicas, na verdade) que enviei previamente às organizadoras do volume e à autora do capítulo que comento abaixo. Os problemas que indicam são sérios o suficiente para eu tornar públicas minhas observações; em última análise, o que está em jogo é a correção intelectual a respeito de Augusto Comte e do Positivismo.

 

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Comprei há alguns dias o volume Os sociólogos, publicado em 2018 pelas editoras Vozes e PUC-Rio e organizado pelas professoras da PUC-Rio Sarah Silva Telles e Solange L. Oliveira. A proposta do livro é bastante interessante, ao apresentar as idéias de vários sociólogos que escreveram desde a fundação da Sociologia por Augusto Comte, no século XIX, até os dias atuais; além disso, todos os capítulos seguem a mesma estrutura formal.

 

Na verdade, comprei o livro interessado no capítulo sobre Augusto Comte; li-o com atenção, mas, à medida que o fazia, ficava cada vez mais riste e estarrecido. A autora, a professora aposentada da Ufpel Maria Thereza Rosa Ribeiro, produziu um capítulo assustador, caracterizado pelo mais profundo espírito “crítico”, isto é, pelo mais profundo espírito destruidor e, em particular, em que “criticidade” equivale a falar mal.

 

Na verdade, as próprias referências bibliográficas que ela cita indicam esse desejo destruidor, baseado largamente em diversas versões do marxismo: T. Adorno e H. Marcuse, Florestan Fernandes e Anthony Giddens, W. Lepenies e Lelita Benoit, além de muitos livros da própria Profª Ribeiro. Apesar de a Profª Ribeiro afirmar que o Positivismo é “conservador” e até “mistificador”, os autores que indiquei acima é que mistificaram em inúmeras ocasiões alegre e violentamente o Positivismo, Comte e a compreensão que se tem dele. A Profª Ribeiro poderia, é claro, ter citado muitos outros autores, verdadeiramente conhecedores da obra de Comte, como Mike Gane, Laurent Fedi, Angèle Kremer-Marietti, Pierre Arnaud, Michel Bourdeau, Sérgio Tiski, Johan Heilbron, Frédéric Keck, Juliette Grange e até o Raymond Aron, além de mais obras de Annie Petit; ou, então, Miguel Lemos e Teixeira Mendes, fundadores da Igreja Positivista do Brasil e que têm, de cada um, apenas uma referência citada, embora eles tenham escrito mais de 500 títulos!

 

A escolha dos autores citados – que raramente eram especialistas em Comte – e a dos não citados – estes, sim, realmente “especialistas em Comte”[1] – evidencia o quanto foram infelizes as escolhas da Profª Ribeiro para tratar do fundador da Sociologia, da Sociologia das Ciências, do Positivismo e da Religião da Humanidade. Embora a Profª Ribeiro tenha repetido, no final do capítulo, a mistificação autocongratulatória de Giddens a respeito da “Sociologia reflexiva”[2], isto é, de uma Sociologia da Sociologia, eu devo admitir que esse capítulo é uma pequena pérola da “criticidade”, bem como profundamente reveladora dos hábitos intelectuais e institucionais que caracterizam as redes de sociólogos no Brasil.

 

As citações feitas de Comte em si mesmas são mais ou menos corretas, mas mais ou menos apenas repetem o mesmo que todos os manuais (re)publicados no Brasil citam dele há muito tempo, especialmente com a incorreta e indevida ênfase no Sistema de filosofia positiva (1830-1842), poucas referências ao Sistema de política positiva (1851-1854) e nenhuma citação da Síntese subjetiva (1856), além de muitas citações de obras menores (e mais “fáceis”) de Comte, em particular o Discurso sobre o espírito positivo (1847) e o Catecismo positivista (1853). Tanto nessas citações quanto nos comentários da Profª Ribeiro, o que importa de Comte, tanto para o próprio Comte quanto para a Sociologia, é desprezado; é claro que esse desprezo é motivado pela ideologia de quem escreve e porque é mais fácil repetir citações arquiconhecidas que explorar o extremamente denso pensamento comtiano. Devemos também levar em consideração que a ideologia dos autores realmente pesa muito aí; enquanto autores como – não por acaso – Marx são tratados com enorme respeito e suas mínimas letras são exploradas no esforço exegético, no caso de Comte essa generosidade e esse cuidado são rejeitados: como eu observei, isso está claro de maneira exemplar nos livros Adorno e Marcuse, nos de Florestan Fernandes e Giddens, chegando a cúmulos de veneno nos de Lepenies e Benoit. Dois pesos e duas medidas: “criticidade” demais contra Comte, respeito venerador a favor de Marx... sobra criticidade, falta “reflexividade”[3].

 

(Ainda assim, é notável o quanto o historiador marxista Mario Maestri elogia a atuação dos positivistas no Brasil... isso torna ainda mais estranhas as afirmações de que o Positivismo seria “conservador” e não “reflexivo”.)

 

Assim, embora eu mesmo tenha uma larga produção dedicada ao exame, à exposição e à aplicação das idéias comtianas e do Positivismo, tenho que me resignar com o fato de que não tenho uma série de predicados característicos da Profª Ribeiro, compartilhada por outros autores do livro em questão: não sou “crítico” (isto é, em particular, não sou marxista e ainda carrego – com orgulho, devo admitir – o que a academia brasileira considera um xingamento: sou “positivista”); não sou professor (sou apenas um sociólogo profissional da UFPR, com doutorado em Sociologia Política e meros dois pós-doutorados, em Teoria Política e Filosofia das Ciências); não iniciei minha carreira nos anos 1980 ou antes (comecei minha graduação em 1995 e terminei o doutorado em 2010).


Para concluir, três observações:

  1. Embora esteja na moda a Sociologia “decolonial”, no Brasil adotamos desde há uns 40 anos o infeliz hábito de não traduzir mais os nomes de línguas estrangeiras. Entretanto, Comte é chamado desde o século XIX de Augusto Comte, não Auguste Comte; os positivistas fomos alguns dos primeiros a devidamente aportuguesar o nome do fundador da Sociologia, em um uso que era corrente no país até pelo menos os anos 1960. É estranho ver que sociólogos “críticos” desprezam um hábito secular e revertem para uma prática contrária à nossa autonomia mental e política.
  2. Em um hábito que se iniciou igualmente já no século XIX, o adjetivo relativo a Comte é “comtiano”, não “comteano”, como empregado no capítulo que comentamos. Provavelmente o “comtiano” deve-se à pronúncia carioca dessa palavra, mas, enfim, não há problema nisso; já virou hábito consagrado e tornou-se o padrão.
  3. Já em 1848, no Discurso sobre o conjunto do Positivismo, Comte dizia que a obra anteriormente chamada de Curso de filosofia positiva deveria ser chamada doravante de Sistema de filosofia positiva: adotar “Sistema” e não “Curso” corresponde ao mesmo tempo a conhecer e a respeitar a obra do autor.



[1] Ponho entre aspas a expressão “especialistas em Comte” porque, como é evidente para qualquer conhecedor da obra do fundador da Sociologia, uma das principais funções da Sociologia é servir de fundamento para concepções gerais (e científicas) sobre a realidade, afastando-se portanto das especializações (acadêmicas) e dos particularismos (políticos). A idéia de “especialistas” no âmbito do Positivismo, portanto, apresenta uma ambiguidade (que de resto é proposital): por um lado eles são necessários para o avanço das pesquisas científicas, mas, por outro lado, devem necessariamente se submeter às vistas gerais – que se baseiam na Sociologia e que são ampliadas e sistematizadas precisamente pelo Positivismo, na forma de um novo poder Espiritual (humano, positivo, altruísta, histórico e relativo). Não por acaso, essa idéia não está presente no capítulo redigido pela Profª Ribeiro.

[2] O sociólogo inglês Anthony Giddens afirma desde há muitos anos que ele criou uma Sociologia “reflexiva”, claramente dando a entender que os sociólogos anteriores a ele e aqueles que não compartilham de suas reflexões não seriam “reflexivos”, isto é, não seriam capazes de refletir sobre a própria prática sociológica, suas origens, suas limitações, suas condições, suas possibilidades etc. Parece claro o quanto essa concepção de Giddens é extremamente arbitrária, histórica e teoricamente errada (e injusta!) e no fundo serve apenas para ele envaidecer-se bastante e ser mais citado.

Na verdade, como eu demonstrei em um artigo de 2009, a exposição que Giddens faz das idéias de Augusto Comte é extremamente preconceituosa, enviesada e errada; chega a ser assustador o quanto o que ele expõe da obra comtiana diverge radicalmente do que o próprio fundador da Sociologia escreveu.

[3] O problema não está na veneração a Marx nem no cuidado da exposição de seu pensamento, mas (1) no desrespeito sistemático e interessado contra Comte e (2) na prática hipócrita, cínica e desinformadora de aplicar-se dois pesos e duas medidas, conforme o gosto e a ideologia do autor de cada texto.

17 março 2021

Michel Bourdeau: vídeo sobre Augusto Comte

 Em 2018, Michel Bourdeau, professor do Instituto de História e Filosofia das Ciências e das Técnicas (IHPST), em Paris, gravou para o Canal-U um documentário sobre a obra filosófica, política, científica e religiosa de Augusto Comte, na própria casa de Augusto Comte.

Esse vídeo está disponível aqui ou aqui, com a possibilidade de baixar apenas o áudio aqui

O roteiro da gravação, que tem cerca de 58 minutos, é este:

1) Comte na história do pensamento: filosofia das ciências e filosofia política

2) As duas carreiras de Augusto Comte

3) A Lei dos 3 Estados e a classificação das ciências

4) A filosofia política e a Religião da Humanidade

5) Conclusão: Comte, Hayek e o liberalismo