14 agosto 2024

"Só se destrói o que se substitui" e "conservar melhorando"

No dia 2 de Gutenberg de 170 (13.8.2024) fizemos nossa prédica positiva, dando continuidade à leitura comentada do Catecismo positivista (em sua duodécima conferência, dedicada à exposição histórica da evolução humana, isto é, da religião, em particular do fetichismo e do politeísmo).

No sermão abordamos as fórmulas "só se destrói o que se substitui" e "conservar melhorando".

A prédica foi transmitida no canal Igreja Positivista Virtual (aqui: https://l1nk.dev/o6uT4); devido a problemas técnicos, não foi possível transmiti-la no canal Positivismo. Ainda assim, a partir do Facebook, a prédica foi carregada no canal Positivismo (aqui: https://l1nq.com/uoBHN).

Os tempos da prédica são estes:

00 min 00 s - início da prédica

05 min 00 s - exortações

22 min 00 s - efemérides

26 min 00 s - início da leitura comentada do Catecismo positivista

1h 02 min 00 s - início do sermão

1h 58 min 00 s - término da prédica

As anotações que serviram de base para a exposição oral encontram-se reproduzidas abaixo.

*   *   *

Sobre as fórmulas “Só se destrói o que se substitui” e “conservar melhorando”

(2 de Gutenberg de 170/13.8.2024)

1.       Abertura da prédica

2.       Exortações

2.1.    Sejamos altruístas!

2.2.    Façamos orações!

2.3.    Façam o Pix da Positividade! (Chave pix: ApostoladoPositivista@gmail.com)

3.       Efemérides

3.1.    1 de Gutenberg de 170: 700 anos da transformação de Marco Polo

3.2.    3 de Gutenberg de 170: 500 anos da transformação de Vasco da Gama

4.       Leitura comentada do Catecismo positivista

4.1.     Duodécima conferência, sobre a evolução histórica da religião, em particular sobre o fetichismo e o politeísmo

5.       Sermão: sobre as fórmulas “Só se destrói o que se substitui” e “conservar melhorando”

5.1.    Essas duas fórmulas são características do Positivismo

5.1.1. Outras filosofias e correntes políticas por vezes até as usam, mas, não por acaso, isso é raro

5.2.    Essas duas fórmulas apresentam com clareza o espírito construtivo do Positivismo e sua tendência antidestruidora

5.2.1. Sendo muito claro, essas fórmulas indicam um claro e honroso conservadorismo positivista

5.2.2. Como veremos adiante, o nosso conservadorismo não implica reacionarismo, nem imobilismo, nem servidão

5.2.3. Além disso, ele implica, exige e evidencia que tenhamos clareza a respeito do que é a ordem, do que é o progresso e das relações entre ambos

5.2.3.1.             Além disso, ele também se refere ao republicanismo (embora não tratemos desse aspecto nesta prédica)

5.3.    Essas duas fórmulas eram conhecidas largamente no século XIX e foram empregadas por Augusto Comte pelo menos no Catecismo positivista (“só se destrói o que se substitui” – “on ne détruit que ce qu’on remplace”, p. 3) e no Apeloaos conservadores (“conservar melhorando” – “conserver en améliorant”, p. XIII)

5.3.1. O “só se destrói” foi tornado famoso por Luís Napoleão Bonaparte; mas, como indica Miguel Lemos nas notas do Catecismo positivista (p. 449), podemos com facilidade atribuí-la a alguém muito superior, ou seja, a Danton

5.3.2. É curioso notar, além disso, que essa frase também é atribuída a Nietzsche (atribuída a ele em 2014 por Olavo de Carvalho, o que já dá a medida de o quanto é suspeita essa referência)

5.4.    Como trataremos do conservadorismo e do conservar, vale a pena vermos o que Augusto Comte indicou a respeito do adjetivo “conservador”

5.4.1. Augusto Comte indica que a expressão “conservador” surgiu na França, como título de um jornal hebdomadário (semanal) mantido por Luís de Bonald e Francisco-Renato Chateaubriand, com o apoio de Lamennais, durante a segunda metade da década de 1810; reacionários, esses autores aceitavam todavia muito do programa da Revolução Francesa (mesmo o programa destruidor); caído no esquecimento, depois, na chamada Monarquia de Julho (de Luís Felipe, 1830-1848), o termo foi retomado por antigos revolucionários que se tornaram retrógrados

5.4.2. Em 1855, já sem o parlamentarismo na França, Augusto Comte observa que “Assim começou a fase final do título de Conservador que, adotado de hoje em diante por republicanos libertos da atitude revolucionária, pode indicar por toda parte a disposição de conservar melhorando” (Apelo, p. XIII)

5.5.    Essas duas frases têm sentidos bastante claros:

5.5.1. O “conservar melhorando” indica (1) que devemos adotar como comportamento geral a conservação das instituições; mas (2) que essa conservação (2.1) não pode ser estática (2.2) mas esse movimento não é qualquer movimento, (2.3) não pode ser retrógrado, ou seja, (2.4) tem que ser progressista

5.5.2. No que se refere ao “só se destrói”: (1) a destruição, por si só, não tem valor; (2) a destruição deve subordinar-se a objetivos construtivos, construidores; (3) não é correto nem útil, dos pontos de vista moral e prático, destruir algo sem ter algum substituto para esse algo: sem o substituto, o ser humano fica à deriva (para Augusto Comte, tem-se então a anarquia)

5.5.3. O sentido de ambas as fórmulas é e tem que ser complementar; isso significa que tomadas isoladamente elas podem ser entendidas como contraditórias

5.5.3.1.             Na verdade, a complementaridade dessas fórmulas significa que elas têm sentidos que se sobrepõem, mas que há detalhes específicos de cada uma delas

5.5.4.  O sentido geral dessas frases, então, é que de modo geral temos que ser conservadores e procurar o melhoramento das instituições e das práticas; mas há situações em que a destruição tem que ocorrer

5.5.4.1.             A necessidade de destruição – ou de supressão, ou de mudanças mais pronunciadas – apresenta-se quando o progresso impõe-se

5.5.4.2.             Exemplos bastante claros: a substituição do absolutismo pelo relativismo, com as substituições correlatas das monarquias pelas repúblicas, da teologia pela positividade, da teocracia pela separação entre os dois poderes

5.6.    O sentido dessas frases tem um aspecto evidentemente político, mas esse aspecto pressupõe e implica sentidos filosóficos e morais

5.6.1. Assim é que essas fórmulas afirmam a positividade e levam em consideração a teologia e a metafísica

5.6.2. O aspecto construtivo dessas frases deixa claro que a metafísica é particularmente visada, devido ao caráter essencialmente crítico, ou seja, destruidor da metafísica

5.6.3. Inversamente, o aspecto orgânico e “conservador” (devido à dinâmica social e política vigente desde a Revolução Francesa, em que a teologia perdeu a liderança social) da teologia conduz a que se conceda a ela um certo respeito

5.6.4. Algumas observações específicas sobre a teologia e a metafísica antes de seguirmos adiante:

5.6.4.1.             A teologia e a metafísica são ambas absolutas: esse absolutismo tem inúmeras características e conseqüências, mas, aqui, podemos simplificar e entendê-lo como sendo a mentalidade do “tudo ou nada”

5.6.4.1.1.                   Além disso, como sabemos, a metafísica é a degradação da teologia (donde, aliás, o comum absolutismo de ambas), o que às vezes resulta em que a metafísica é uma teologia disfarçada e em outras ocasiões ela é a antiteologia

5.6.4.1.2.                   Em todo caso, enquanto a teologia muitas vezes – mas não sempre! – apresenta um caráter orgânico, a metafísica é sempre crítica, destruidora

5.6.4.2.             Dito isso, vale notar que o relativo respeito dado à teologia não implica que ela em si deva ser seguida e/ou que suas concepções sejam corretas: significa apenas que ela, com freqüência (mas não sempre), tornou-se “conservadora”, ou seja, não revolucionária, não destruidora

5.6.4.2.1.                   Esse respeito, então, não é ao conteúdo da teologia, mas a aspectos da sua prática social e política

5.6.4.3.             Por outro lado, devido à escandalosa e degradante importância social, política, moral e intelectual que a metafísica apresenta atualmente, é importante afirmar e reafirmar com clareza: recusar a metafísica e seu espírito destruidor não equivale, de maneira nenhuma, a “aceitar as coisas como elas estão” ou o “statu quo” ou, o que é equivalente para essa mentalidade, não equivale a aceitar e/ou a justificar injustiças

5.6.4.3.1.                   Assim, ao contrário do que o senso comum pressupõe e que a mentalidade metafísica afirma, criticar a metafísica não implica, de maneira nenhuma, ser a favor das injustiças nem ser a favor da retrogradação

5.6.4.3.2.                   A rejeição à metafísica e à criticidade metafísica consiste em recusar o espírito destruidor sistemático e a noção altamente equivocada e infantil de que o progresso consiste em destruir as coisas, buscando situações de terra arrasada

5.6.4.3.3.                   De maneira conexa, a rejeição à metafísica consiste em rejeitar o espírito forte e violentamente anti-histórico próprio à metafísica

5.6.4.3.4.                   O espírito destruidor e anti-histórico próprio à metafísica é fácil e exemplarmente visto no marxismo e no feminismo identitário: ambos rejeitam a história, adotam uma perspectiva “tudo ou nada”, criam entidades (o “capitalismo”, o “patriarcado”), não propõem de verdade nada de real etc.

5.6.4.4.             Inversamente, é central lembrar que a caracterização que Augusto Comte faz do Positivismo no Apelo aos conservadores, de 1855, como sendo conservador é complementar à caracterização feita em 1848-1851 no Discurso preliminar sobre o conjunto do Positivismo como o Positivismo sendo o “socialismo sistemático”

5.6.4.4.1.                   Evidentemente, essa necessária compatibilidade exige a rejeição dos absolutos filosóficos (e, daí, a harmonia da ordem com o progresso)

5.7.    O entendimento adequado – ou seja, o entendimento positivo: real, útil, certo, preciso, relativo, orgânico e simpático – do “conservar melhorando” e do “só se destrói” implica conjugar a ordem com o progresso

5.7.1. Isso, por sua vez, implica sabermos o que são a ordem e o progresso

5.7.1.1.             As concepções parciais da ordem e do progresso adotam perspectivas que opõem uma à outra e que, portanto, negam-se mutuamente

5.7.1.2.             É importante dizê-lo com clareza: apenas o Positivismo afirma a necessidade de compatibilizar a ordem e o progresso e, portanto, de ultrapassar as vistas e as práticas parciais próprias à ordem sem progresso e ao progresso sem ordem

5.7.2. A verdadeira concepção de ordem, que é a concepção apresentada apenas pelo Positivismo, não é o retorno à Idade Média, aos tempos bíblicos ou, mais recentemente, à violência político-militar do regime de 1964 (como querem os retrógrados/reacionários, ou a “direita”); a ordem também não é a aceitação das injustiças sociais ou a paz de cemitério (como querem os revolucionários, ou a “esquerda”)

5.7.3. A verdadeira concepção de progresso, que é a concepção apresentada apenas pelo Positivismo, não é a rejeição da ordem social, não é a anarquia institucionalizada, não é a ausência de parâmetros, não é a destruição sistemática e sistematizada, não é o espírito anti-histórico (como querem ao mesmo tempo os retrógrados/reacionários e os revolucionários)

5.7.4. A ordem é o respeito pelas instituições humanas fundamentais, respeito que contemple e permita ao mesmo tempo o desenvolvimento da natureza humana; inversamente, o progresso é esse desenvolvimento da natureza humana, que ao mesmo tempo modifica e consolida a ordem

5.7.5. Como definiu Augusto Comte: “a ordem é a consolidação do progresso; o progresso é o desenvolvimento da ordem”

5.7.5.1.             Em outras palavras, a ordem deve ser entendida como ordenamento, como arranjo, ao passo que o progresso deve ser entendido como desenvolvimento, como aperfeiçoamento

5.7.5.2.             Isso significa que toda ordem tem aspectos fundamentais que, com o passar do tempo, naturalmente se modificam e evoluem conforme as características próprias a essa ordem (ou a esse sistema); o progresso, que está implicado nessa concepção de ordem, consolida as instituições da ordem

5.7.6. Deveria ser evidente, mas cumpre afirmar e reafirmar, mesmo sob o risco de repetirmos algumas idéias que já expusemos aqui: essas concepções de ordem e de progresso estão muito, muito, muito distantes do que se tem vulgarmente por “ordem” e “progresso”, seja porque afirmamos com clareza a realidade e a correção de ambas as noções, seja porque nossos conceitos de ordem e progresso afastam-se radicalmente das concepções retrógradas/reacionárias e revolucionárias

5.8.    Em suma:

5.8.1. As fórmulas “só se destrói o que se substitui” e “conservar melhorando” são caraterísticas do Positivismo

5.8.2. Elas indicam a importância da conservação das instituições, das práticas, dos sentimentos

5.8.2.1.             Essa conservação tem um sentido contrário à destruição sistemática proposta pela metafísica política (ou seja, pelo espírito revolucionário)

5.8.2.2.             Inversamente, essa conservação não implica o reacionarismo, nem a retrogradação, nem a aceitação das injustiças, nem a paz de cemitério

5.8.3. Esse conservadorismo implica a união da ordem com o progresso, o que só é possível no e com o Positivismo

5.8.3.1.             “A ordem é a consolidação do progresso, o progresso é o desenvolvimento da ordem” – ou seja:

5.8.3.2.             A ordem deve ser entendida como arranjo, ou seja, como instituições fundamentais que evoluem com o passar do tempo

5.8.3.3.             O  progresso deve ser entendido como o desenvolvimento e o aperfeiçoamento das instituições, além da consolidação dessas instituições

6.       Término da prédica

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