O vídeo da exposição abaixo encontra-se disponível aqui.
* * *
Roteiro da exposição sobre o primeiro mês
dos calendários positivistas
Parte I – Mês concreto: Moisés
- 1º mês do calendário positivista concreto
o Considerando o ano júlio-gregoriano de 2021, o mês de Moisés começa em 1º de janeiro e termina em 28 de janeiro
o O primeiro mês concreto representa a teocracia inicial
§ É o primeiro mês da Antigüidade
§ Representa a Antigüidade mais recuada no tempo, comum a todas as grandes civilizações
§ Os outros quatro meses da Antigüidade (Homero, Aristóteles, Arquimedes, César) indicam já a transição própria ao Ocidente e, na verdade, a desagregação e a reação às teocracias ocorridas especificamente no Ocidente (desagregação da arte, da filosofia e da ciência e, depois, reação guerreira aos sacerdotes)
- As características da teocracia inicial são as seguintes:
o é o regime próprio às grandes civilizações sedentárias
o são próprias ao politeísmo, a partir da sedentarização dos povos nômades e da conseqüente abstração dos fetiches em direção à concepção das divindades, passando pela astrolatria
§ há três importantes exceções nas teocracias em relação ao politeísmo: duas que vão para a frente (a teocracia monoteísta judaica, iniciada por Moisés, e, a partir dela, a teocracia islâmica) e outra que fica atrás (a civilização chinesa, que se baseia no fetichismo do culto ao Sol, à Lua, ao meio ambiente e aos antepassados)
o as teocracias são regimes que regulam o conjunto da existência humana, isto é, regulam ao mesmo tempo os sentimentos (via culto), a atividade prática (via regime) e a inteligência (via dogma)
§ os conhecimentos humanos são relativamente poucos aí, mas a necessidade de regular a existência humana já se impunha com grande clareza; para garantir essa regulação, os sacerdotes dominavam a sociedade e, em particular, os guerreiros
§ o trabalho era realizado por famílias especializadas, que transmitiam as funções e os conhecimentos para seus descendentes; a partir disso, constituíam-se as castas
§ ocorria um efetivo desenvolvimento técnico e do conhecimento, mas de maneira muito lenta; esses conhecimentos eram regulados pelos sacerdotes e, de qualquer maneira, eram objeto do mais cuidadoso segredo (reservado apenas aos iniciados)
§ assim, as teocracias eram conservadoras; a fim de evitar a ação progressista (e dissolvente) dos guerreiros, os sacerdotes ordenavam expedições militares distantes, com a fundação eventual de colônias autônomas (igualmente distantes)
§ ainda assim, as teocracias ruíam por fim, quando os guerreiros (autóctones ou estrangeiros) suplantavam os sacerdotes – mesmo que isso ocorresse ao cabo de milênios
§ Vale notar que as teocracias, ao regularem a vida humana, estabeleceram os calendários, estabelecendo o dia (rotação da Terra) como unidade de contagem e os anos (translação da Terra), com as semanas e os meses como unidades intermediárias
§ Tudo isso foi aceito como objetivo, embora seja largamente subjetivo; essa metafísica objetivista mantém-se até hoje, a despeito das observações de Augusto Comte
o Augusto Comte considera as várias teocracias existentes ao longo da história, como a do bramanismo, dos povos pré-colombianos, a persa, a cananeica etc.; no caso da marcha ocidental, ele observa que o Egito é a grande teocracia originária
§ as teocracias eram mantidas pelos sacerdócios, isto é, pelos colégios sacerdotais; isso dificulta a identificação de nomes particulares
§ ao mesmo tempo, a teocracia judaica, ainda que tenha tido uma importância secundária no conjunto da evolução ocidental, permite a identificação de vários nomes e, em particular, do seu fundador: Moisés
§ os dois motivos acima levaram Augusto Comte a selecionar um nome de um monoteísmo para caracterizar uma instituição que era essencialmente politeísta
- O mês e as semanas do mês de Moisés correspondem ao seguinte:
o Moisés – é o primeiro nome que consegue representar uma teocracia (embora ele mesmo tenha instituído uma teocracia monoteísta, contrária ao caráter geral das teocracias iniciais, próprias ao politeísmo)
o Numa – reúne tipos mitológicos e lendários que caracterizam as teocracias abortadas próprias à marcha ocidental, isto é, a regimes em que os guerreiros impediram o ascendente sacerdotal
o Buda – são os fundadores de religiões ou de teocracias orientais (com exceção da China e do Japão)
o Confúcio – são os sacerdotes das teocracias que se mantêm ou que se mantiveram até há (relativamente) pouco tempo (China, Japão, incas, Havaí) e que mantiveram características fortemente fetichistas
o Maomé – as teocracias monoteístas, em particular a judaica e a islâmica
Parte II – Mês abstrato: a Humanidade
- O primeiro mês do calendário positivista abstrato celebra a Humanidade, nosso Grão-Ser
o Devido à sua importância, evidentemente é o primeiro mês do ano
- A Humanidade, para ser adorada, tem que ser conhecida; mas a sua existência em si mesma não está em questão (como no caso da divindade teológica); assim, em termos de organização da Religião da Humanidade, a definição e as características do Grão-Ser positivo são apresentadas para que, logo em seguida, tenhamos a exposição do culto, do dogma e do regime
o Essa é a seqüência seguida por Augusto Comte no Catecismo positivista, embora nosso mestre tenha inicialmente seguido a ordem própria à teologia, ou seja, pondo o dogma antes de tudo (devido a um respeito então inconseqüente pelos antecedentes teológicos e também à preferência preliminar pela inteligência)
o É importante lembrar que a Humanidade tem que ser adorada, mas também que recebemos dela nossas idéias, nossas possibilidades de ação, nosso capital e, claro, nossos sentimentos
§ Em outras palavras, a Humanidade é objeto e instrumento de veneração, conhecimento e ação
§ Nós adoramos a Humanidade para melhor servi-la, aperfeiçoando-nos (p. 84 do Catecismo)
§ Augusto Comte observa que o serviço à Humanidade e a busca do aperfeiçoamento (pessoal e coletivo) são partes constituintes e importantes das relações que os seres humanos mantêm com o Grão-Ser; vale notar isso para evitar o misticismo causado pelo exclusivo culto dos sentimentos
§ A Humanidade é idealizada pelo culto, que liga o dogma ao regime
- A definição da Humanidade é importantíssima, portanto; no Catecismo positivista, Augusto Comte apresenta os traços dela em várias conferências, embora o grosso dos seus comentários concentre-se na primeira:
o Antes de mais nada, nosso Grão-Ser é real e é eterno (bem entendido: eterno enquanto durar o ser humano)
o A Humanidade é um ser composto, não é unitário: isso quer dizer que a Humanidade é formada pelo conjunto de seres humanos, em termos subjetivos e objetivos
§ Em contraposição, as divindades são sempre unitárias
§ A Humanidade é o conjunto dos seres convergentes passados, futuros e presentes à os seres passados e futuros são duas massas crescentes e subjetivas; os seres presentes são objetivos
§ A Humanidade recusa os parasitas (aqueles que, após a infância, somente consumem, sem nunca retribuir nada) e os puramente negativos, mas inclui os animais (por exemplo, os cachorros)
§ As massas subjetivas correspondem à continuidade humana (que é afirmada e regulada pelo sacerdócio), ao passo que a massa objetiva corresponde à solidariedade à é importante notar que a Humanidade é cada vez mais e sempre o conjunto subjetivo e, portanto, ela é muito mais a continuidade que a solidariedade à “os vivos são sempre e cada vez mais, necessariamente, governados pelos mortos”
§ A convergência na subjetividade, claramente, é muito mais fácil e muito superior que a da objetividade à cada um dos indivíduos vivos convergentes é um agente da Humanidade; sem eles não há Humanidade, seja porque são os vivos que mantêm e aumentam as riquezas, seja porque são os vivos que mantêm na memória os mortos e consideram os seres futuros
§ O Positivismo afirma a importância, a validade, a positividade dos mortos, que nos fornecem nossos valores, nossas idéias, nossas famílias, nossas riquezas à assim, o Positivismo rejeita como antissociológica e imoral a afirmação marxista de que as gerações passadas oprimem os vivos
o Os seres humanos vivos não têm nunca a certeza de que serão incorporados subjetivamente à Humanidade
§ Raríssimos são os seres humanos absolutamente indispensáveis e que em vida podem ser julgados como se incorporando à Humanidade
§ A incorporação subjetiva à Humanidade é uma esperança individual, que nos conduz ao mesmo tempo à convergência e à humildade
§ Tudo devemos à Humanidade e todas as nossas ações referem-se a ela (quer queiramos, quer não queiramos; quer saibamos, quer não saibamos)
o A Humanidade é semelhante ao homem, isto é, nosso Grão-Ser tem a mesma natureza que o ser humano
§ Ao contrário da teologia, na qual as divindades consideram os homens ínfimos e desnecessários, a Humanidade não considera os seres humanos nem desprezíveis nem inúteis: na medida em que somos (e podemos ser) convergentes, cada um de nós é necessário para o verdadeiro Grão-Ser (p. 77 do Catecismo)
o O culto, o dogma e o regime permitem que conceito de Humanidade resuma as ordens humana e exterior à ele afirma o amor (ordem humana) e consolida a fé (ordem exterior)
§ É fundamental lembrar que o amor, que é a base do Positivismo, é o único sentimento que permite de fato unir os indivíduos
- A Humanidade será sempre simbolizada por u’a mulher
o Essa mulher deve ter cerca de 30 anos, segurando em seu colo uma criança recém-nascida ou um bebê (o futuro)
o No culto privado reverenciamos as personificações mais próximas da Humanidade, que são as mulheres próximas a nós: mães, esposas, filhas, irmãs
- Por fim: a Humanidade substitui a divindade teológica, reconhecendo seus serviços (necessariamente passados)
- São quatro os laços inferiores à Humanidade celebrados nas semanas do mês:
o Do primeiro ao último, há uma diminuição da extensão territorial e um aumento da intimidade:
1) religioso – o único universal
2) histórico – relativo aos vínculos que já não existem mais
3) político (ou cívico) – é aquele em que cada um de nós vive e trabalha
4) comunal – são os vínculos mais próximos e acima da família
Parte III – Comemorações de aniversários e feriados cívicos
- Em termos de aniversários, comemoramos neste mês as seguintes figuras:
o Festa da Humanidade – 1º de Moisés (1º de janeiro)
o Augusto Comte (1798-1857) – nascimento (19.Moisés – 19 de janeiro)
o
Pierre
Laffitte (1823-1903) – morte (4.Moisés – 4.jan.)
o Raimundo Teixeira Mendes (1855-1927) – nascimento (5.Moisés – 5.jan.)
o
Frederic
Harrison (1831-1923) – morte (14.Moisés – 14.jan.)
o
Cândido
Rondon (1865-1958) – morte (19.Moisés – 19.jan.)
o
Benjamin
Constant (1836-1891) – morte (22.Moisés – 22.jan.)
o Rosália Boyer (1764-1837) – nascimento (28.Moisés – 28.jan.)
o Teófilo Braga (1843-1924) – morte (28.Moisés – 28.jan.)
Referências bibliográficas
Augusto Comte: Sistema de filosofia positiva, Sistema de política positiva, Catecismo positivista, Síntese subjetiva
Frederic Harrison: O novo calendário dos grandes homens
Raimundo Teixeira Mendes: As últimas concepções de Augusto Comte
Raimundo Teixeira Mendes: Calendário positivista – precedido de indicações sumárias sobre a teoria positiva do calendário (1899)
David Carneiro: História da Humanidade através dos seus grandes tipos, v. 1
Ângelo Torres: Calendário Filosófico
Comité des travaux historiques et scientifiques: Sociétés savantes de France
Nenhum comentário:
Postar um comentário