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Roteiro da exposição sobre o nono mês
dos calendários positivistas
Parte I – Mês concreto: Gutenberg
Gutenberg, em lâmina da Igreja Positivista do Brasil
Gutenberg, em lâmina da Igreja Positivista do Brasil |
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9º mês do calendário positivista concreto
o
O oitavo mês concreto representa a indústria moderna
§ É
o segundo mês da modernidade
·
Como já vimos, após os sete meses da Antigüidade
e da Idade Média, a modernidade é representada por seis meses (Dante,
Gutenberg, Shakespeare, Descartes, Frederico, Bichat)
o
Para entendermos a indústria moderna, é
necessário caracterizarmos as duas palavras, “indústria” e “moderna”
§ A
indústria, para Augusto Comte e no
presente contexto, não consiste nas fábricas, mas em uma forma de organizar a
produção material (ou seja, a “economia”)
·
O melhor a falar, então, seria em “sociedade
industrial”, que se opõe a “sociedade militar”; esta busca a conquista do ser
humano, ao passo que a primeira busca a conquista da natureza
·
Em termos de organização do trabalho, a sociedade
militar baseia-se não raro na escravidão e, de qualquer maneira, na
desvalorização do trabalho (“maldição divina”, impedimento do “ócio criativo” e
do ócio contemplativo)
·
Já a sociedade industrial baseia-se no trabalho
livre (e na correlata valorização do trabalho) e na divisão entre trabalhadores
e patrões
§ Por
outro lado, a indústria moderna tem
que ser distinguida da indústria antiga
·
A indústria antiga era organizada em pequena
escala, por vezes em caráter individual, em que não havia a divisão entre
patrões e empregados
·
Uma outra forma de organizar a indústria na
Antigüidade era por meio das castas, em que as profissões eram hereditárias e
características das famílias
·
A indústria moderna, então, baseia-se no
trabalho livre, em que a sociedade como
um todo organiza-se em uma atividade pacífica e de grandes proporções; em
virtude disso, ocorre a separação entre trabalhadores e patrões e os grandes
contingentes de trabalhadores organizam-se em sindicatos (igualmente livres) e
cada trabalhador pode escolher o ramo industrial em que deseja trabalhar
§ Uma
outra forma de entender o espírito da indústria moderna é por meio de uma
oposição elaborada em 1819 pelo suíço Benjamin Constant, entre a “liberdade dos
antigos” e a “liberdades dos modernos”
·
Esse Benjamin Constant não é o nosso fundador da República; o suíço viveu
entre 1767 e 1830, ao passo que o nosso deveu seu nome ao primeiro e viveu
entre 1836 e 1891
·
Na verdade, essa oposição elaborada por Benjamin
Constant também não é original; ela remonta à querela dos antigos contra os
modernos, que se desenvolveu após o Renascimento e que continuava viva no
século XIX, como se pode ver tanto pela obra de Benjamin Constant quanto pela
de Augusto Comte (bem como pela de outros pensadores)
·
Para Benjamin Constant, a liberdade dos antigos
caracterizava-se pela participação ativa nos negócios públicos, enquanto a
liberdade dos modernos caracteriza-se pela ausência de impedimentos estatais à
ação individual privada
·
Mas, para além do elogio do individualismo
burguês e do governo representativo, a oposição proposta pelo suíço Benjamin
Constant afirma que os antigos buscavam a glória
das conquistas, ao passo que os modernos buscam o conforto da produção material
§ O
mês da indústria moderna, portanto, valoriza a atividade pacífica e cooperativa
entre indivíduos, classes, países e civilizações
·
A segunda lei dos três estados, relativa à
atividade prática, sintetiza essa evolução histórica: “A atividade é primeiro
conquistadora, em seguida defensiva e enfim industrial” (oitava lei da
Filosofia Primeira)
o
A sociedade industrial deve organizar-se da
seguinte maneira, conforme o Positivismo:
§ Separação
entre patrões e empregados, com relativamente poucos patrões e muitos
empregados
§ Os
patrões têm a responsabilidade de organizar a produção material e de gerar
empregos e renda para os trabalhadores
§ Em
suas atividades, os patrões empregam de maneira altruísta alguns instintos
egoístas, como o de destruição, o de construção e o orgulho; assim, eles ficam
mais sujeitos aos desvios do egoísmo à portanto, sua situação
não é invejável e deve ser constantemente cobrado por seu comportamento e pelos
resultados de suas ações
§ Augusto
Comte era fortemente crítico da burguesia francesa de sua época, que ele
considerava frívola, mesquinha e egoísta à no lugar da burguesia
desprezível, ele propunha a renovação moral dos patrões, que se transformariam
em “patrícios”
§ Como
deve ocorrer a separação entre patrões e empregados e como a condição moral e
profissional dos patrões não é invejável, os trabalhadores devem constituir a
grande massa da sociedade e evitar buscar a sua transformação em patrões à
assim, em particular, ocorreria a extinção da “classe média”, que seria
decomposta em poucos patrões e muitos empregados
§ A
definição-recomendação de Augusto Comte para os empresários é esta: deve
ocorrer a concentração de capitais e de recursos de tal forma que seja possível
a um indivíduo controlá-los e dispô-los de maneira responsável
§ Assim,
o capital deve ser concentrado à mas, da mesma forma que o capital tem origem social,
ele deve ter necessariamente uma destinação social, mantendo-se privada a
propriedade
§ As
atividades industriais evidentemente não são iguais nem homogêneas; por isso,
ocorre uma hierarquia prática que se revela também uma hierarquia moral e
social, baseada na generalidade e na responsabilidade coletiva crescentes; a
hierarquia dos patrões origina uma correspondente hierarquia dos trabalhadores:
agricultura, indústria, comércio, bancos
o
O mês e as semanas correspondem ao seguinte:
§ Gutenberg
– criador do instrumento que permitiu a difusão do conhecimento e o aumento das
comunicações humanas (em termos estáticos e dinâmicos) e, assim, permitiu a
ação pacífico-industrial sobre o planeta Terra
§ Colombo
– corresponde aos exploradores do planeta Terra, que ampliaram o nosso
conhecimento sobre o Grande-Fetiche e estabeleceram as ligações entre os mais
diferentes povos, permitindo, assim, a constituição da Humanidade em termos
realmente universais (incluem-se aí os caminhos para as Índias, a ultrapassagem
do Cabo das Tormentas, a circum-navegação, a exploração da Oceania, a ligação
entre Ocidente e Oriente, entre Europa e África etc.)
§ Vaucanson
– corresponde aos inventores propriamente ditos, que buscam meios de aumentar o
rendimento do nosso trabalho (incluem-se aqui o tear mecânico, o telégrafo, o
cronômetro); também os artesãos de obras artísticas
§ Watt
– corresponde aos cientistas que, com suas pesquisas, permitiram a aplicação da
ciência à indústria, seja ampliando o rendimento de nossa ação, seja ampliando
as possibilidades de intervenções (incluem-se aqui o motor movido pela pressão
do vapor, as aplicações da termologia, da física dos gases e também a aplicação
da Química à vida humana)
§ Montgolfier
– corresponde às futuras e possíveis aplicações técnicas proveitosas para o ser
humano, como o domínio dos ares, a agricultura científica, a manipulação
genética e mesmo o embelezamento da indústria e da arte de viver
-
Há um aspecto no mês de Gutenberg que apresenta
uma importância à primeira vista inusitada, mas que, bem vistas as coisas,
acabaria sendo formulada cedo ou tarde
o
Trata-se da crítica feita pelos povos
colonizados do papel dos colonizadores, muitas vezes daninhos para os dominados
§ Esse
problema está não por acaso concentrado na semana de Colombo, que reúne os
exploradores (Colombo, Vasco da Gama, Fernão de Magalhães, James Cook)
§ A
grita atual consiste em criticar e mesmo desprezar os grandes exploradores, bem
como figuras acusadas (justa ou injustamente) de racismo; assim, estátuas estão
são destruídas tanto por grupos sociais quanto por governos, nomes de
instituições estão sendo modificados etc.: estátuas de Colombo e James Cook
(“chacinadores”) e de Churchill (“racista” e “imperialista”); a Escola de
Relações Internacionais da Universidade de Princeton retirou a referência a
Woodrow Wilson de seu nome (ele era racista)
§ Além
disso, tem sido estimulada uma postura de raiva e de negação do passado; no
caso dos descendentes de antigos donos de escravos e, de modo geral, no caso
dos “brancos”, estimula-se um forte sentimento de culpa e de responsabilidade
atual pelos crimes (efetivos ou imputados) aos antepassados
§ É
importante notar que, se por um lado o presente movimento (internacional)
justifica-se pouco, a sua origem imediata ensejou e enseja os mais vívidos e
corretos clamores por justiça: o assassinato de um desempregado por policiais
racistas nos EUA; esse desempregado chamava-se George Floyd e morreu em meados
de 2020 enquanto pedia para respirar mas tinha a garganta pressionada pelo
joelho de um policial insensível ao sufocamento do homem
o
É necessário aplicarmos o relativismo histórico:
§ Por
mais justas que sejam em parte as reclamações atuais de povos outrora
dominados, é importante notar que tais reclamações baseiam-se em valores que,
em grande medida, são nossos e são de
nossa época
§ Afirmar
a contemporaneidade dos nossos valores não tem como objetivo torná-los
“particulares”, “específicos” de nossa época e, portanto, não tem como objetivo
desvalorizá-los (como os pós-modernos, os ultra-relativistas e os
ultracontextualistas fazem); bem ao contrário, é necessário entender que os
valores de respeito mútuo, de respeito universal, de tolerância, de rejeição da
violência são valores nossos, ou melhor, são valores “novos” e recentes e que,
portanto, nossos antepassados desgraçadamente não os tinham
·
É claro que a novidade dos valores da
fraternidade universal, do pacifismo, da tolerância não é tão grande assim:
eles já tinham sido afirmados com clareza por Augusto Comte no século XIX –
que, a esse respeito, seguia e prosseguia uma tradição que vinha pelo menos do
século XVIII (com o Iluminismo)
·
Da mesma forma, os romanos, na fase final da
República (Júlio César) e já no Império (Trajano, Adriano e, de modo geral, a
sua dinastia nervo-antonina) afirmavam o primado da paz e do respeito mútuo
§ Também
é necessário notar que a atividade pacífica só surge como desenvolvimento da
atividade militar e em conseqüência dela; dito de outra forma, mesmo a paz e a
indústria exigiram antes delas a guerra e a violência
§ A violência praticada por exploradores contra
diferentes povos é lamentável, não há dúvida
·
Mesmo no período das colonizações, em meio às
violências, havia cobranças, reprimendas, perorações: o padre Bartolomeu de las
Casas na América espanhola é um exemplo
·
Embora a violência praticada pelos colonizadores
europeus seja, para nós, ocidentais atuais, motivo de vergonha e tristeza, é
necessário considerar se à época em que eles agiam o seu repertório de
comportamentos aceitáveis excluía a violência sistemática: de modo geral, a
resposta é negativa
§ Todavia,
convém distinguir a atuação de personagens como Colombo e Cook da de Pizarro e
dos ingleses na Austrália: os exploradores de modo geral foram apenas
exploradores, não conquistadores
§ Além
disso, no caso dos exploradores, é importante notar que a sua ação como
exploradores é por si só altamente meritória e digna de respeito e veneração
·
O respeito e a veneração devidos aos
exploradores deve-se à ampliação do conhecimento do planeta e ao
estabelecimento de relações entre todas as porções da Humanidade
·
Além disso, as epopéias de Colombo, Vasco da
Gama etc. demonstram uma coragem gigantesca, ao realizarem viagens que eram, na
melhor das hipóteses, meras apostas
·
De quebra, vale notar que os exploradores
comprovaram na prática, após as demonstrações gregas, que a Terra é um planeta
redondo
§ Um
outro aspecto do relativismo histórico consiste em notar que a ação de povos e
indivíduos não se resume a um único aspecto, de tal sorte que em suas vidas e
histórias podem apresentar – e, com efeito, apresentam de fato – comportamentos
positivos e negativos, altruístas e egoístas, construtivos e destrutivos
·
O relativismo, portanto, consiste em pesar,
contextualizadamente, aspectos positivos e negativos
o Apenas
em casos excepcionais – e, a bem da verdade, patológicos – é que se pode reduzir a carreira de um povo, ou de um
indivíduo, a um único traço
·
Os “contextos” em que se deve inserir a ação de
indivíduos e povos deve incluir não apenas as estruturas sociais, mas também as
idéias e os valores disponíveis em cada momento
§ Em
virtude das considerações acima, destruir (ou, de qualquer maneira, suprimir)
estátuas de Colombo e de Cook é um erro
·
Da mesma forma, embora Churchill fosse mesmo
imperialista, o que ele compartilhava da mentalidade do “white man’s burden” não o impediu, nunca, de buscar a fraternidade,
de buscar a tolerância, de ser razoável e, acima de tudo, não o impediram de
ser o brilhante e corajoso líder que manteve a Inglaterra como inimiga do
nazismo durante a II Guerra Mundial
·
No caso de Woodrow Wilson: ele era do Sul dos
Estados Unidos (Virgínia), o que estimulava o racismo, não há dúvida; ele
apoiava o movimento da eugenia, postulando em particular que a miscigenação
(especialmente entre brancos e não brancos) causava a delinqüência social, a
prostituição, o retardo mental etc.; ele apoiou essas idéias mesmo quando foi
Reitor de Princeton. Essas idéias são desprezíveis e são inaceitáveis sob
qualquer perspectiva; além disso, o anti-racismo já era uma causa antiga no
início do século XX, especialmente após a violenta Guerra da Secessão dos EUA.
Todavia, a despeito dessas idéias e dessas práticas, a atuação doméstica de
Wilson foi progressista (favorável aos direitos trabalhistas) e a atuação
internacional foi mais importante ainda: ele levou os EUA ao decisivo ingresso
na I Guerra Mundial junto dos Aliados (França e Inglaterra), ele promoveu o
chamado “idealismo” na política internacional, que consistiu na moralização da
política internacional; ele defendeu a autodeterminação dos povos e, se isso
tudo não fosse pouco, ele foi o responsável pela criação da Liga das Nações.
Assim, é no mínimo problemático e, bem vistas as coisas, é incoerente e mesmo
hipócrita desprezar a atuação de Woodrow Wilson (em particular suprimir o seu nome
da Escola de Relações Internacionais da Universidade de Princeton): não há
dúvida de que seu racismo travestido de uma ciência desprezível era odioso;
todavia, é necessário um esforço moral e político muito grande para negar,
desprezar e rejeitar a sua atuação política, principalmente na política
internacional
o
É importante insistir em uma idéia fundamental
do Positivismo e do culto positivo: o calendário histórico concreto foi
instituído não apenas para exibir (para o público ocidental) de maneira sintética
o conjunto da evolução ocidental, mas também, e talvez principalmente, para
estimular justamente o relativismo histórico
§ O
que o relativismo histórico recomenda é que respeitemos e valorizemos nossos
antepassados, sabendo pesar e avaliar suas limitações e seus defeitos
§ De
maneira correlata, o elogio histórico não é devido a qualquer indivíduo: a
incorporação na Humanidade exige que o indivíduo em questão seja merecedor e
que cumpra a definição de Humanidade (“conjunto de seres convergentes,
passados, futuros e presentes)
·
O elogio histórico, quando adequado e
justificado, exige a valorização dos aspectos positivos, mas não esconde, nem
camufla, os aspectos negativos
Parte II – Mês abstrato: monoteísmo
-
O nono mês do calendário positivista abstrato celebra o monoteísmo
o
O monoteísmo é a terceira e última fase das
fases sociológicas históricas (dinâmicas) preparatórias;
as anteriores são o fetichismo e o politeísmo
o
O monoteísmo consiste na concentração dos vários
deuses em uma única entidade, todo-poderosa e reinante sobre tudo
§ Alegadamente
o monoteísmo surgiu com Moisés; mas, na verdade, o deus mosaico não se afirmava
o único deus, mas o maior e superior a todos; apenas com o passar dos séculos e, em particular,
após o cativeiro na Babilônia é que o judaísmo converteu-se de fato em um
monoteísmo
§ De
um ponto de vista sociológico, o monoteísmo constituiu-se após o declínio moral
e social do politeísmo e, na verdade, em virtude desse mesmo declínio
§ Sugestões
para a constituição do monoteísmo vinham pelo menos desde o século IV aec, como
com Sócrates e, depois, como Aristóteles
·
Em particular Aristóteles defendia um deus único
que operasse como “motor inicial”, ou seja, como uma entidade que tivesse
criado tudo e posto o universo em movimento, mas depois disso se afastando
radicalmente de tudo
§ O
monoteísmo só vingou no início da era corrente quando as necessidades de
renovação moral ficaram bastante evidentes; a partir daí é que atuou São Paulo,
que criou o catolicismo mas que, em sua modéstia, em sua sabedoria e em sua
perspicácia, atribuiu a sua obra a outro, que lhe assumiu o nome da doutrina
§ As
necessidades de renovação moral só ficaram evidentes quando o Império Romano
dominou toda a bacia do Mediterrâneo (além da Península Ibérica, das Gálias,
dos Bálcãs e do Oriente Médio): essa dominação permitiu a imposição dos hábitos
da paz e a necessidade de reorientação das vidas individuais e dos destinos
coletivos dos povos envolvidos
·
Essas considerações histórico-sociológico-morais
têm algumas conseqüências: por um lado, o judaísmo, embora seja em si mesmo um
monoteísmo e tenha influenciado o catolicismo, para o que nos interessa, é
secundário e não foi determinante para a constituição do catolicismo; além
disso, a partir dessas considerações o surgimento do catolicismo deixa de ser
milagroso, como nos relatos tradicionais, e passa a ser explicado racionalmente
§ Os
monoteísmos considerados por Augusto Comte (catolicismo e islamismo) têm
algumas características (ou “propriedades”) importantes para nós:
·
Eles passaram a afirmar diretamente a
necessidade de moralidade na conduta humana; o politeísmo, embora regesse até
certo ponto a moralidade, servia mais para explicar o mundo e menos para
regrá-lo
o O
monoteísmo em última análise é imoral, pois a divindade é profundamente arbitrária;
mas, ainda assim, atribui-se a ela alguns motivos morais e, de qualquer
maneira, a partir dela estabelece-se um código moral de conduta
o A
moralidade monoteísta, além disso, em si mesma é profundamente imperfeita, pois
rejeita o caráter inato dos instintos altruístas e também estabelece móveis
egoístas para a conduta humana (a ambição do paraíso, o medo do inferno); mas,
enfim, era o possível na época e era o possível para regrar populações com
hábitos grosseiros
·
Embora em si mesmos exijam a adesão aos seus
dogmas – que, na época em que foram estabelecidos, eram radicalmente contrários
aos hábitos mentais, morais e sociais das populações (os romanos, por exemplo e
com justiça, repudiavam os dogmas católicos como imorais) –, os monoteísmos
permitem a constituição de religiões universais, pois que ultrapassam as
origens nacionais dos politeísmos
§ O
catolicismo surgiu no ambiente romano; no século VII surgiu o Islã, que, em sua
rápida expansão seguida da reação católica, acabou dividindo mais ou menos ao
meio os antigos territórios romanos: como se sabe, tomando-se como divisor a
linha que vai da Grécia ao Egito, os territórios a Leste ficaram sob o Islã, os
territórios a Oeste (o Ocidente) ficaram sob o catolicismo
·
O catolicismo e o islamismo são os monoteísmos
principalmente considerados por Augusto Comte justamente porque eles foram duas
formas que buscaram resolver a moralização da vida e da política, a partir do
Império Romano
·
O catolicismo é profundamente complicado, com
seu dogma da trindade, com a postulação da vida após a morte e a reencarnação
(ou ressurreição) etc.; o islamismo, em contraposição, embora mantenha a
promessa da vida eterna após a morte, simplifica o dogma, ao suprimir a
trindade e ao postular o caráter santo (mas não divino) do “filho” (reduzido à
condição de profeta anterior a Maomé)
·
A simplicidade islâmica evita os debates tão
próprios às populações submetidas ao Islã e garante que o chefe islâmico (o
califa e, em menor grau, o sultão, após o próprio Maomé) mantenha-se como chefe
temporal (isto é, como chefe militar) em vez de ser também um chefe espiritual
·
A complicação do dogma católico foi possível
também devido à separação (imperfeita, claro está) entre os dois poderes: o
chefe temporal governava, o chefe espiritual regia as discussões teológicas
·
Os defeitos morais e intelectuais próprios ao
catolicismo – que, como indicamos, já eram bastante claros para os romanos – foram
atenuados pela sabedoria prática do clero católico, especialmente por inúmeros
papas que reinaram até cerca de metade do ciclo das cruzadas (século XII)
§ O
catolicismo e o islamismo são incompatíveis, o que conduziu à disputa entre
ambos por hegemonia
·
No Ocidente, a reação feudal proposta e
coordenada pelo papado realizou, na última fase da Idade Média, a realização
final e plena do feudalismo, que consiste na combinação digna entre a
independência e o concurso entre as unidades políticas à isso deixa claro que o
feudalismo não se caracterizava por “anarquia”
·
A reação ocidental ao avanço muçulmano
consistiu, em um primeiro momento, em barrar o avanço na França, com Carlos
Martel, em Poitiers; depois, nas guerras de reconquista ocorridas ao longo de
vários séculos na Península Ibérica; a partir do século XI, esforços mais
sistemáticos, de grande envergadura e agrupando o conjunto dos povos ocidentais
ocorreram por instigação do papado, na forma das cruzadas
·
Os constantes choques entre catolicismo e
islamismo conduziram à sua neutralização mútua e às suas decadências, cujo
marco e símbolo foi a batalha de Lepanto (próximo a Corinto, na Grécia), em
1571, em que as armadas das duas religiões bateram-se; a batalha foi mais ou
menos vencida pelas forças cristãs, mas, de qualquer maneira, ela indicou o
empate entre Islã e catolicismo e, portanto, a aceitação mútua da incapacidade
de um dominar e destruir o outro à sinal desse reconhecimento foi os cristãos
abandonarem aos muçulmanos o suposto berço de Cristo (até 1948, bem entendido)
§ A
incapacidade dos dois monoteísmos e sua mútua neutralização deixam claro a
necessidade de uma fé demonstrável e plenamente universalizável, isto é, do
Positivismo
o
Um último aspecto dos monoteísmos é que eles
afirmam a síntese objetiva e absoluta
§ Após
a síntese subjetiva absoluta, própria
ao fetichismo, tanto o politeísmo quanto o monoteísmo consagraram a síntese objetiva absoluta: ora, a única síntese
verdadeira e durável tem que ser subjetiva
e relativa, que é a instituída pelo
Positivismo
§ Apesar
desse defeito intelectual do monoteísmo, é importante assinalar que ele foi a
última síntese que no Ocidente afirmou a lógica afetiva (ao mesmo tempo que
afirmava a importância da lógica dos sinais)
o
As quatro festas semanais comemorativas do
monoteísmo são as seguintes:
1) Monoteísmo
teocrático (Abraão, Moisés, Salomão)
2) Monoteísmo
católico (São Paulo; Carlos Magno;
Alfredo; Hildebrando; Godofredo; São Bernardo)
3) Monoteísmo
islâmico (Lepanto) (Maomé)
4) Monoteísmo
metafísico (Dante; Descartes;
Frederico)
Parte III – Comemorações de aniversários
-
Em termos de aniversários, comemoramos neste mês
as seguintes figuras:
o Em 15 de Gutenberg (26 de agosto):
§
Morte
de Stevin (1548-1620)
o Em 16 de Gutenberg (27 de agosto):
§ Nascimento
de Mariotte (1620-1684)
o Em 17 de Gutenberg (28 de agosto):
§ Nascimento de Agustín Aragón (1870-1954)
o Em 25 de Gutenberg (5 de setembro)
§ Morte
de Augusto Comte (1798-1857)
o Em 27 de Gutenberg (7 de setembro)
§ Independência
do Brasil (1822)
Possível rosto de Gutenberg |
Simon Stevin |
Edme Mariotte |
Agustín Aragón |
Túmulo de Agustín Aragón |
Monumento em homenagem a Augusto Comte, na Universidade Sorbonne (Paris) |
Reprodução de daguerreótipo de Augusto Comte |
Memento mori (foto do morto) de Augusto Comte |
Memento mori (foto do morto) de Augusto Comte |
Memento mori (foto do morto) de Augusto Comte |
Augusto Comte |
José Bonifácio retratado no quadro de Eduardo de Sá, "A pátria brasileira" |
Estátua de José Bonifácio em Washington (DC) |
José Bonifácio |
Referências bibliográficas
Ângelo Torres: Calendário Filosófico
Augusto Comte: Sistema
de filosofia positiva,
Sistema de política positiva, Catecismo positivista, Síntese subjetiva
David Carneiro: História da Humanidade através dos seus grandes tipos, v. 4-5
Frederic Harrison: O novo calendário dos grandes homens
Jean-François Eugène Robinet: Notice
sur l’oeuvre et la vie d’Auguste Comte
Joseph Lonchampt: Epítome da vida e dos escritos de Augusto
Comte
Raimundo Teixeira Mendes: As últimas concepções de Augusto Comte
Raimundo Teixeira Mendes: BenjaminConstant, esboço de uma apreciação sintética
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