18 setembro 2025

Comte sobre a sobrevivência do mais adaptado

Nosso amigo Samuelson Xavier traduziu recentemente um pequeno mas interessante artigo publicado na revista Nature, em 1873, em que se recupera a noção exposta por Augusto Comte da sobrevivência do mais adaptado (survival of the fittest).

Reproduzimos abaixo essa bela tradução. 

O artigo original, em inglês, pode ser lido aqui: https://www.nature.com/articles/008283a0.

A tradução foi originalmente postada aqui: https://substack.com/inbox/post/173672348?utm_source=share&utm_medium=android&r=5xmkx3&triedRedirect=true.

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COMTE SOBRE A SOBREVIVÊNCIA DO MAIS APTO - J. D. BELL, Nature, 07/08/1873. - Tradução de Samuelson Xavier.

Artigo de J. D. Bell publicado em 1873 na revista Nature que traz uma importante demonstração sobre o pioneirismo da ideia de evolução biológica e seleção natural na obra de Auguste Comte.


O Sr. Jevons chamou a atenção há algum tempo para a conveniência de preparar-se uma lista de pensadores e escritores do passado que, de maneira forte ou fraca, sustentaram doutrinas semelhantes às de Darwin e Spencer. O próprio Sr. Darwin citou alguns desses autores, e o Prof. Haeckel ampliou essa relação. Recentes comunicados na revista Nature mostram que a lista ainda está incompleta.

Ao ler o Curso de Filosofia Positiva de Comte, alguns anos atrás, fiquei impressionado com a similaridade geral entre certas doutrinas ali expostas e algumas das teorias de Darwin. Referindo-me, recentemente, a 42ª lição desse curso (vol. III) — Considerações Gerais sobre a Filosofia Biotáxica — , eu notei que Comte, ao revisar a controvérsia entre Lamarck e Cuvier, diz:

"Toda a célebre argumentação de Lamarck repousa finalmente sobre a combinação geral destes dois princípios incontestáveis, mas até então muito mal circunscritos: 1º) a aptidão essencial de um organismo qualquer, e sobretudo de um organismo animal, para se modificar conforme as circunstâncias exteriores onde está localizado, e que solicitam o exercício predominante de tal órgão especial, correspondente a tal faculdade tornada mais necessária; 2º) a tendência, não menos certa, de fixar nas raças, pela mera transmissão hereditária, as modificações primeiramente diretas e individuais, de modo a aumentá-las gradualmente a cada nova geração, se a ação do meio ambiente persevera identicamente. Concebemos sem dificuldade, em efeito, que, se essa dupla propriedade pudesse ser admitida de maneira rigorosamente indefinida, todos os organismos poderiam ser considerados como tendo sido, a longo prazo, sucessivamente produzidos uns pelos outros, ao menos se dispuséssemos da natureza, da intensidade e da duração das influências exteriores com aquela prodigalidade ilimitada que não custa nenhum esforço à ingênua imaginação de Lamarck." (Cours de Philosophie Positive, 1ª ed., vol. III, pp. 560-561.)

A modificação e a hereditariedade são aqui fortemente afirmadas, e as condições para uma transformação ilimitada são fortemente esboçadas. Em continuação ao mesmo argumento, Comte, na pág. 563, questiona a hipótese de Lamarck, a qual, ele tem em alta conta como um grande esforço lógico: —

"Que ela repousa, parece-me, sobre uma noção profundamente errônea da natureza geral do organismo vivo. Sem dúvida, cada organismo determinado está em relação necessária com um sistema igualmente determinado de circunstâncias exteriores, como estabeleci na 40ª lição. Mas disso não resulta, de maneira nenhuma, que a primeira dessas duas forças correlativas deva ter sido produzida pela segunda, assim como tampouco poderia tê-la produzido: trata-se apenas de um equilíbrio mútuo entre duas potências heterogêneas e independentes. Se concebermos que todos os organismos possíveis sejam sucessivamente localizados, durante um tempo conveniente, em todos os meios imagináveis, a maioria desses organismos findará, de qualquer necessidade, por desaparecer, deixando subsistir apenas aqueles que puderam satisfazer às leis gerais desse equilíbrio fundamental; é provavelmente após uma série de eliminações análogas que a harmonia biológica se estabeleceu pouco a pouco em nosso planeta, onde, aliás, ainda a vemos se modificar incessantemente de maneira semelhante. Ora, a noção de um tal equilíbrio geral tornar-se-ia ininteligível e mesmo contraditória, se o organismo fosse suposto modificável ao infinito sob a influência suprema do meio ambiente, sem ter nenhum impulso próprio e indestrutível."

A luta pela existência e a sobrevivência do mais apto ou seleção natural são aqui reconhecidas. Mais ainda, o fato que as eliminações devidas a inadaptação ao ambiente ou meio produziram e produzem a harmonia biológica é salientado. Não encontrei nenhuma passagem fora dos escritos da nova escola que sejam mais explícitas do que essas, embora disto não se deva entender que seu autor era um transformista. O prefácio do volume em que isso ocorre está datado de "Paris, 24 de fevereiro de 1838". Em seu quadro geral anexo ao sexto volume da obra, Comte diz que a Lição da qual esses trechos foram extraídos foi escrita entre 9 e 15 de agosto de 1836.

Nova York,

J. D. Bell.

(Tradução de Samuelson Xavier.)

Referência:

BELL, J. Comte on the Survival of the Fittest. Nature 8, 283 (1873). https://doi.org/10.1038/008283a0

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