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Em entrevista ao diário católico francês, La Croix, de 17 de
maio, o Papa Francisco acusou a França «de exagerar a laicidade».
Na mesma entrevista, defendeu que um Estado não deve ser
confessional, reconhecendo a laicidade, mas afirmando que «há um conflito
radical entre as sociedades governadas pela lei de Deus e as que se organizam
pela lei dos homens».
Pese embora o carácter dialogante do atual pontífice, que
tem a santidade por profissão e estado civil, revela uma animosidade mal
disfarçada, a assimilação genética do poder temporal que confunde com uma
sociedade organizada pela lei de Deus, lei que, por ser divina, é irrevogável e
alheia ao sufrágio. No fundo, a lei divina é a mais totalitária das leis. Nem o
próprio Deus a pode revogar nem os que lhe são sujeitos a podem contestar.
Em primeiro lugar, o Papa disfarçou mal a azia que a
laicidade lhe provoca, ao defini-la exagerada, como se a neutralidade pudesse
ter graus, como se pudesse haver abstenções violentas e abstenções suaves.
A laicidade nunca foi obtida sem a repressão política do
clero das diversas religiões e, sem ela, não há democracias, há teocracias, as
formas mais violentas de ditaduras que ficam à mercê dos funcionários de Deus.
É evidente a existência de «conflito entre as sociedades
governadas pela lei de Deus e as que se organizam pela lei dos homens». Basta
comparar a Arábia Saudita com a França ou o Vaticano com a Itália. Deus, criado
por homens e explorado por profissionais da fé, jamais fez prova de vida, mas
pretende que o poder dos homens, não o das mulheres, seja vitalício e, se
possível, hereditário.
É, alias, para submeter sociedades secularizadas à vontade
de Deus que a Jihad islâmica sacrifica jovens assassinos, que são premiados com
uma assoalhada no Paraíso e à razão de 72 virgens per capita.
Sem laicidade, voltaríamos à origem divina do poder e às
monarquias absolutas. O Papa católico tem o dever de recordar o passado da sua
Igreja e, se não quiser ver a sua, basta olhar para as outras que dominam os
aparelhos de Estado e se confundem com eles.
A laicidade não consente adjetivos e jamais será excessiva
ou escassa, é neutra. Sem ela não é possível que os Estados democráticos
respeitem todos os crentes, descrentes e anti crentes, com absoluta indiferença
sobre o que cada um pensa em matéria religiosa.
Felizmente, vivemos numa sociedade organizada pela lei dos
homens e é fácil imaginar o pesadelo de uma outra «governada pela lei de Deus»,
de que há sinistros exemplos.
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