14 janeiro 2024

Manifesto: "Pela república, a favor da sociocracia, contra o terrorismo fascista"

Igreja Positivista Virtual

 

O amor por princípio e a ordem por base; o progresso por fim

Ordem e progresso – Viver às claras – Viver para outrem

 

Pela república, a favor da sociocracia, contra o terrorismo fascista

 

1. Introdução

O presente documento foi redigido pela Igreja Positivista Virtual, no cumprimento de suas obrigações cívicas. Embora ele tenha sido escrito tendo em vista os atos de vandalismo terrorista perpetrados em 8 de Moisés de 169 (8 de janeiro de 2023), ele também pode, e deve, ser visto como um prolongamento e uma conseqüência natural do abaixo-assinado divulgado em 19 de Descartes de 168 (26 de outubro de 2022), intitulado “A bandeira nacional republicana não é fascista”[1].

2. A evolução política republicana do Brasil

A experiência histórica e a reflexão filosófica, com base no altruísmo e no relativismo, ensinam que as instituições não são eternas nem são imóveis. Ao contrário desses sonhos absolutos, em vez de buscarmos instituições “perfeitas”, temos que buscar instituições adequadas a cada fase histórica de cada sociedade e de cada povo. No caso das sociedades ocidentais, herdeiras da tríplice transição intelectual, prática e afetiva própria à Grécia, a Roma e à Idade Média, após a dupla transição moderna e a grande explosão da Revolução Francesa de 1789, as instituições mais adequadas são as sociocracias, ou seja, repúblicas sociais, caracterizadas pela separação entre os poderes temporal e espiritual, pelo ascendente da fraternidade universal e pela cooperação pacífica entre todos os servidores da Humanidade em busca do bem comum.

Esses ideais passaram a ser aplicados de maneira mais ou menos sistemática no Brasil desde os acontecimentos de 15 de novembro de 1889, quando se proclamou a República no país, seguidos da instituição da fórmula “Ordem e Progresso” na bandeira nacional, de um sistema cívico e universal de festas públicas e, acima de tudo, da separação entre igreja e Estado. Apesar de diversos problemas enfrentados pela república desde seu nascimento – entre os quais a lamentável, mas quase inevitável, participação dos militares na mudança do regime, além da participação da metafísica liberal na Constituição de 1891 –, graças à atuação de Benjamin Constant a partir de 1889 o Brasil retomou a trilha sonhada por Tiradentes e em seguida proposta por José Bonifácio.

O amadurecimento social, político e institucional iniciado em 1889 foi interrompido em 1930, que reverteu muitos dos avanços anteriores (a começar pela separação entre igreja e Estado) e permitiu o avanço de filosofias e movimentos estranhos aos valores sociocráticos, como o comunismo e, ainda mais, o fascismo. Desde então, os ideais sociocráticos conscientes foram feridos de morte, embora confusamente tenham sido retomados por outros movimentos. Em todo caso, a terrível oscilação própria ao Ocidente após a Revolução Francesa, entre os pólos opostos, contraditórios e complementares na oscilação, da anarquia e da revolução, verificou-se no Brasil. De maneira limitada, essa dinâmica só diminuiu após 1988, depois de várias décadas tumultuadas, quando uma nova constituição foi promulgada, estabelecendo alguns compromissos sociais amplos e criando instituições um pouco mais robustas.

3. A agitação retrógrada fascista no Brasil recente

Desde meados da década de 2010, muitos anos de agitação social, política e institucional tiveram por objetivo tão-somente a própria agitação por si só, resultando em um governo federal cujo mandato caracterizou-se pela contínua tentativa de destruir as instituições existentes. Entre os promotores dessa agitação encontravam-se indivíduos e grupos que sonhavam com uma destruição generalizada das instituições nacionais, de maneira supostamente “higiênica”; além disso, também havia indivíduos e grupos que desejavam criar confusão social, política e moral para usarem a anarquia resultante como desculpa e como instrumento para obterem o poder – sendo que o poder deveria ser obtido sem qualquer outro objetivo além da mera posse do poder, a ser usado como instrumento de ostentação, de enriquecimento pessoal e familiar e, acima de tudo, contra os adversários, transformados em inimigos a serem eliminados. Não por acaso, esses dois grupos caracterizam-se por um profundo clericalismo, o que já os dispõem ativamente contra qualquer concepção republicana, altruísta, pacifista e fraterna da política e a favor de concepções apocalípticas da política e das instituições. De diferentes origens sociais e morais, esses grupos encontraram-se no denominador comum do fascismo.

Após os anos de agitação social e moral e de destruição institucional, uma derrota eleitoral parcial mas decisiva em 2022 conduziu os grupos fascistas a realizarem uma última e enorme tentativa de implantar – necessariamente à força – o seu regime fascista no Brasil: daí os aviltantes atos de vandalismo terrorista que marcaram o domingo, dia 8 de janeiro de 2023, em Brasília, sob os olhares omissos e cúmplices de forças locais de segurança (incluindo das Forças Armadas) e os olhares atônitos do conjunto da nação. Felizmente o novo governo, então empossado havia apenas uma semana, retomou energicamente o controle da situação, por vias institucionais diversas das sonhadas pelos fascistas golpistas. É necessário termos clareza: esse perigo foi evitado na ocasião e diminuído ao longo de 2023 – mas não foi extinto.

Em face disso, é necessário dizermos com todas as letras: o fascismo deve ser combatido sem hesitações e sem tergiversações. Ele consiste em uma retrogradação violenta, clericalista, antifraterna, antialtruísta; em suma, o fascismo é antirrepublicano e antissociocrático. Da mesma forma, em momentos anteriores da vida nacional as anistias foram com freqüência instrumentos efetivos da reconciliação nacional; mas, no presente caso, a anistia ao vandalismo terrorista de 8 de janeiro de 2023 implicará necessariamente impunidade, cumplicidade e legitimação implícita do fascismo.

4. Os vícios da democracia e seus remédios empíricos no Brasil

Nós, positivistas, temos plena clareza de que a chamada “democracia” é intrinsecamente limitada e que representa mal a sociedade e os interesses coletivos. Por si só a democracia pode resultar em regimes autoritários e violentos, quando segue a confusa metafísica clericalista que combina os projetos de Rousseau com os de Montesquieu, que estimulam a corrupção com seu incoerente sistema eleitoral combinado com os “três poderes”.

Apesar desses problemas, é forçoso reconhecermos os seguintes aspectos próprios à vida política e social brasileira.

1)     Por um lado, a confusa proposta ativamente promovida por líderes políticos e sociais, civis e militares em meio à anarquia, como resultado necessário dessa anarquia, supostamente como solução da anarquia, é em todos os sentidos inferior à realidade social, política e institucional desenvolvida no Brasil ao longo dos últimos 35 anos, ou seja, desde 1988: conforme a experiência histórica internacional e nacional já demonstrou fartamente, o fascismo estimula e aumenta todos os defeitos e vícios da democracia, incluindo a corrupção política, social e moral, além de restringir as liberdades públicas e promover as retrogradações do clericalismo e da violência como instrumento de governo e de relacionamento social.

2)     Por outro lado, desde 1988 os limites morais e sociais próprios à democracia, na medida do possível, foram contornados e minorados pela sabedoria prática de muitos governantes ao longo do tempo, mesmo apesar das crenças pessoais desses governantes, que – contraditoriamente para si mesmos mas respeitando as exigências republicanas do país – promoveram a estabilização monetária como precondição para a estabilização institucional e para as seguintes, necessárias e urgentes ações de incorporação social do proletariado. Como se percebeu durante o triste quadriênio 2019-2022, o fascismo atuou ativamente para desestabilizar a moeda nacional, alienar o patrimônio nacional, corromper e destruir as instituições, dividir e opor violentamente entre si as metades do país, clericalizar a política, degradar o meio ambiente, estimular a violência internacional e reverter celeremente a incorporação social do proletariado.

3)     Em suma: desprezando a máxima republicana “só se destrói o que se substitui”, o fascismo basear-se-ia na anarquia por ele mesmo estimulada, aumentaria todos os vícios próprios à democracia e destruiria todas as conquistas republicanas.

5. Exortações finais

Em face dessas considerações todas, a Igreja Positivista Virtual vem por meio deste documento afirmar o repúdio ao vandalismo terrorista de 8 de janeiro de 2023 e a todos os seus perpetradores, que agiram como títeres de líderes civis e militares que desejam implantar no Brasil o fascismo – líderes que, um ano depois dessas ações execráveis, mantêm-se ainda livres, sem punição e apresentando todos os sofismas morais e políticos possíveis para justificar os atos que promoveram. Da mesma forma, a Igreja Positivista Virtual vem por meio deste documento associar-se às manifestações públicas que reafirmam a República brasileira e seu caráter sociocrático.

 

Gustavo Biscaia de Lacerda

Sacerdote diretor da IPV

 

Curitiba, 8 de Moisés de 170 (8 de janeiro de 2024).





[1] O texto pode ser consultado aqui: https://filosofiasocialepositivismo.blogspot.com/2022/10/a-bandeira-nacional-republicana-nao-e.html. O abaixo-assinado pode ser assinado aqui: https://peticaopublica.com.br/pview.aspx?pi=BR127657. 

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