O Brasil passou por um momento de diversificação das relações exteriores. Contudo, isso não significou romper com os estadunidenses, mas ampliar o leque de opções com parceiros estratégicos tendo em vista os propósitos do desenvolvimento. As relações com os Estados Unidos constituem, portanto, um dos temas perenes da política externa brasileira, inclusive neste início de século XXI. Por isso, ao destacar essas relações como objeto de análise privilegiado, o livro de Gustavo Biscaia de Lacerda apresenta uma importante contribuição para os estudos de políticas externas em perspectiva comparada ao oferecer aos seus leitores uma análise das perspectivas distintas alimentadas pelos dois países na cena internacional dos anos 1950 e 1960: a visão estadunidense sobre a América Latina e, particularmente, o Brasil; a visão brasileira sobre a funcionalidade das relações brasileiras com os Estados Unidos no contexto de enfrentamento de um dos principais gargalos do nosso desenvolvimento econômico: a ausência de capitais necessários para alavancar o processo substitutivo de importações inaugurado a partir dos anos 1930. A visão dos Estados Unidos emergiu na iniciativa intitulada “Aliança para o Progresso” de 1961, enquanto a visão brasileira apareceu, antes, na iniciativa da “Operação Pan-Americana”, de 1958, lançada pelo governo Juscelino Kubitschek (1956-1961). As duas iniciativas estão situadas no contexto da Guerra Fria, caracterizado pelo conflito entre a União Soviética e os Estados Unidos. Ambas tiveram como propósito pensar estratégias para o desenvolvimento da América Latina, afastando os países dessa região do comunismo e da influência soviética. São, portanto, duas iniciativas marcadas pelo contexto internacional da bipolaridade, mas que são apresentadas por países em posições muito distintas no sistema internacional: de um lado, a maior potência bélica e econômica do mundo; de outro lado, um país subdesenvolvido e orientado por uma estratégia de desenvolvimento, compreendida, por muitos intelectuais do ISEB (Instituto Superior de Estudos Brasileiros) nos anos 1950, como Álvaro Vieira Pinto e Roland Corbisier (para citar alguns deles) como o meio a partir do qual o Brasil ingressaria no seleto grupo das grandes potências em condição menos subalterna. As duas iniciativas, ainda, estão orientadas por objetivos distintos: os Estados Unidos visavam a manter sua influência na América Latina por intermédio do afastamento dos países da região da ameaça comunista; o Brasil, por sua vez, orientava e instrumentalizava sua política externa na direção do desenvolvimento, procurando jogar segundo as regras estabelecidas pelo conflito – que era, sobretudo, ideológico e político – entre as superpotências.
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