18 novembro 2022

Live AOP: O Positivismo, a República e a bandeira no Brasil

Em 17 de novembro de 2022 realizamos uma Live AOP intitulada "O Positivismo, a República e a bandeira no Brasil"; essa conferência consistiu em uma celebração pública da República no Brasil e, a partir daí, da atuação dos positivistas em prol da República, antes e depois do 15 de Novembro de 1889.

Abaixo reproduzimos as anotações que fizemos para guiar a exposição. Tendo cinco partes, as mais importantes são as partes 3, 4 e 5. No vídeo disponível no canal Positivismo, cada uma dessas partes pode ser vista a partir dos seguintes momentos:

- Parte 3 (concepções do Positivismo sobre a República): a partir de 7' 18" até 45' 28"

(Atenção: entre 7' 30" e 13' 31" houve uma falha no sinal de internet, de modo que a tela fica totalmente preta.)

- Parte 4 (atuação dos positivstas brasileiros em favor da República): a partir de 45' 29" até 1h 32' 19"

- Parte 5 (a bandeira nacional republicana): de 1h 32' 20" até 2h 16' 21"

A conferência pode ser vista no canal Positivismo; devido à interrupção do sinal que experimentamos logo no início da exposição, passamos a transmiti-la também no canal Apostolado Positivista, disponível aqui. (Os tempos indicados acima se referem ao vídeo do canal Positivismo, não ao do Apostolado Positivista.)


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O Positivismo, a República e a bandeira no Brasil

 

Roteiro:

1.      Explicação do objetivo da apresentação

2.      Apresentação pessoal

3.      Concepções do Positivismo sobre a república

4.      Atuação dos positivistas brasileiros em favor da República

5.      Sobre a bandeira nacional

 

1.      Explicação do objetivo da apresentação

a.       Inaugurar a Live AOP por um positivista

b.      Apresentar alguns elementos teóricos e históricos do Positivismo sobre a República e a bandeira

c.       Desfazer mitos sobre o Positivismo na República e sobre a bandeira nacional

2.      Apresentação pessoal

a.       Sociólogo da UFPR

b.      Doutor em Sociologia Política (UFSC, 2010)

c.       Autor de numerosos livros sobre o Positivismo

d.      Positivista ortodoxo, dono do blogue Filosofia Social e Positivismo e dos canais Apostolado Positivista e The Positivism

3.      Concepções do Positivismo sobre a República

a.       O Positivismo considera que, com a positividade, no estado normal, o bem comum, o altruísmo deve ser o parâmetro fundamental das relações sociais

b.      Em termos de regimes políticos e sociais, o Positivismo propõe duas concepções complementares: a sociocracia e a república

c.       A sociocracia consiste na organização social mais ampla, ou seja, ela inclui os parâmetros de condutas individuais e coletivas, entre as classes, entre os grupos diversos, entre as famílias – e entre os cidadãos e o Estado

                                                                          i.      Pode-se dizer que a sociocracia são os valores que fundamentam e regem a vida coletiva, ou mesmo, em certo sentido, a “cultura política”

                                                                        ii.      A sociocracia afirma o bem comum, a busca do altruísmo, os deveres mútuos; é o governo da sociedade pela sociedade a partir de princípios e valores sociais

                                                                      iii.      É o regime positivo próprio ao estado normal, pois é altruísta, pacífico e relativo; é tolerante e baseado pelo bem comum e pelo primado da opinião pública

                                                                      iv.      Em contraposição, a chamada “democracia” é metafísica

1.      A democracia é metafísica no sentido de Rousseau, pois esta consiste na secularização parcial do direito absoluto divino dos reis, que se torna direito absoluto do “povo”: cabe perfeitamente aqui a frase “A voz do povo é a voz de deus”

2.      A democracia também é metafísica no sentido liberal, pois esta considera que a sociedade é a mera soma dos indivíduos, que o Estado é inimigo dos “indivíduos”, que a opinião pública pode ser reduzida à soma das vontades individuais (em particular por meio dos votos)

d.      A república consiste no regime político propriamente dito

                                                                          i.      Augusto Comte reconhecia dois sentidos complementares para a república:

1.      Sentido negativo: república como regime antimonárquico, ou seja, substituição do absoluto teológico pelo relativismo positivo como fundamento político

2.      Sentido positivo: república como o regime do primado do interesse coletivo sobre o interesse individual

a.       Além disso: caráter social da república, não meramente político; assim, preocupação central com a geração de empregos, combate ao desemprego, melhoria da qualidade de vida etc.

                                                                        ii.      A república é necessariamente presidencialista

1.      O presidencialismo vincula-se às noções de deveres mútuos e de responsabilidade individual

2.      O parlamentarismo é rejeitado por diversos motivos:

a.       Acima de tudo, o parlamentarismo impede a indicação de responsabilidades

b.      O parlamentarismo visa a enfraquecer o poder

c.       A origem do parlamentarismo está no feudalismo inglês, com a reação da nobreza (depois burguesia) local contra o poder central e o comum do povo

                                                                      iii.      Augusto Comte estabelecia várias etapas na passagem da monarquia para a república normal:

1.      Após a extinção da monarquia, dever-se-ia estabelecer o governo temporal puramente material e, portanto, unipessoal

2.      Algumas fases intermediárias, caracterizadas pela difusão do Positivismo e, portanto, dos hábitos relativistas, altruístas, pacifistas etc.

3.      Com a difusão do Positivismo, isto é, dos hábitos próprios à positividade e ao estado normal, o poder central passaria a ser dividido entre três governantes

4.      Haveria uma câmara fiscal, isto é, orçamentária

e.       Seja em relação à sociocracia em geral, seja em relação à república em particular, o regime positivo tem algumas características fundamentais; entre elas, podemos no mínimo citar ou reiterar:

                                                                          i.      Separação entre os dois poderes

                                                                        ii.      Isonomia

                                                                      iii.      Garantias jurídicas das liberdades

                                                                      iv.      Pacifismo externo (antimilitarismo, anti-imperialismo, fim dos exércitos) e interno (polícia cidadã, deveres mútuos, respeito às opiniões)

4.      Atuação dos positivistas brasileiros em favor da República

a.       Antes de mais nada, é necessário afirmar que pelo menos desde o século XVIII o Brasil tem movimentos republicanos e que o republicanismo sempre foi muito difundido no país

                                                                          i.      Basta pensarmos na Inconfidência Mineira (1788-1789), na Confederação do Equador (1817), no período regencial (1831-1840) e na Revolução Farroupilha (1835-1845)

1.      Além desses movimentos autóctones, havia os exemplos dos Estados Unidos e de toda a América espanhola, além da França

                                                                        ii.      Da mesma forma, quando José Bonifácio articulou a independência do Brasil em 1821-1822, ele entendeu a instalação da monarquia de maneira instrumental, ou seja, sem ligar à monarquia qualquer valor próprio às monarquias efetivas (castas, direito divino dos reis)

1.      Em particular, José Bonifácio entendia que a monarquia era o único regime compatível com a escravidão

2.      Além disso, José Bonifácio temia que a república ocasionasse a fragmentação do país

                                                                      iii.      A afirmação da república e do republicanismo no Brasil é importante porque os monarquistas (assumidos, envergonhados ou disfarçados) desde sempre difundem a idéia de que a república no Brasil seria uma concepção “estrangeira”, “importada”, “estranha” ou, em última análise, que se difundiu apenas a partir de 1870

                                                                      iv.      A república era extremamente valorizada na cultura popular, em canções, modinhas, sambas, sátiras à monarquia etc.

b.      É necessário lembrar também que a monarquia brasileira não era muito respeitada e que instituía, mantinha e/ou baseava-se em uma série de problemas:

                                                                          i.      Escravidão à e, daí, degradação do trabalho, dos trabalhadores livres, dos escravos e dos libertos, além da produção do racismo

                                                                        ii.      Sociedade de castas

                                                                      iii.      Religião oficial

                                                                      iv.      Subdesenvolvimento econômico

                                                                        v.      Analfabetismo generalizado

                                                                      vi.      Filhotismo generalizado e burocracia não profissional à desprezo sistemático e ostensivo pelo mérito

                                                                    vii.      Violento imperialismo na região platina

                                                                  viii.      Fortíssima centralização política

c.       Em 1870, com o término da Guerra contra o Paraguai (1864-1870), ocorreu o restabelecimento formal de um movimento republicano brasileiro, com a fundação de um novo Partido Republicano, em Itu (São Paulo)

d.      Durante a Guerra contra o Paraguai, Benjamin Constant afirma-se positivista e republicano

e.       Em 1881 Miguel Lemos e Teixeira Mendes ingressam no Centro Positivista Brasileiro, assumem a liderança da entidade e transformam-na na Igreja e Apostolado Positivista Brasileiro

                                                                          i.      A partir daí Miguel Lemos e Teixeira Mendes desenvolvem uma propaganda crescente e enérgica tanto do Positivismo como doutrina quanto de aplicações do Positivismo à realidade brasileira:

1.      Fraternidade sul-americana (normalização das relações com o Paraguai, fim do imperialismo brasileiro na região platina)

2.      Fim imediato da escravidão

3.      Incorporação social do proletariado (incluindo os escravos e os libertos)

4.      Proclamação da República

5.      Promoção de uma cultura cívica positiva: Tiradentes, José Bonifácio

6.      Etc. etc. etc. etc.

f.       Miguel Lemos e Teixeira Mendes propunham a transformação orgânica da monarquia em república

                                                                          i.      Essa transformação dar-se-ia por ato de d. Pedro, que unilateralmente extinguiria a monarquia e todas as instituições a ela vinculadas

                                                                        ii.      Isso garantiria o caráter pacífico da transição: civil, não militar, não violento e não revolucionário

                                                                      iii.      A república a ser proclamada por d. Pedro – que passaria então a chamar-se apenas de “Pedro de Alcântara” – deveria ser, evidentemente, a república social e sociocrática

g.       Ao longo das décadas de 1870 e 1880 acumularam-se as “questões” contra a monarquia:

                                                                          i.      A Questão Religiosa

                                                                        ii.      A Questão Militar

                                                                      iii.      A campanha abolicionista

h.      Em 1887 fundou-se o Clube Militar, tendo como presidente Deodoro da Fonseca e vice-Presidente Benjamin Constant

                                                                          i.      Deodoro e Benjamin eram amigos pessoais, mas, muito além disso, simbolicamente essa presidência indicou a união das duas correntes do Exército de então – os doutores (Benjamin) e os tarimbeiros (Deodoro)

                                                                        ii.      Em 1887, o Clube Militar recusou-se a aceitar, para o Exército, o papel de capitão do mato à isso foi o golpe final e decisivo contra a escravidão (mantida ciosamente pela monarquia)

i.        Após a abolição da escravatura, todos reconheciam que a monarquia estava com os dias contados

                                                                          i.      A dinastia Orleans e Bragança não era mais respeitada, não tinha mais o apoio das elites econômicas – que até então sustentavam a escravidão via monarquia – e todos também temiam o eventual governo clericalista e estrangeiro de Isabel e Conde d’Eu

                                                                        ii.      A nomeação de um ministério “progressista” em 1889 foi apenas u’a medida desesperada, com objetivos de propaganda, para tentar frear o republicanismo

j.        Benjamin Constant lecionava na Escola Militar:

                                                                          i.      Era um professor extremamente respeitado e admirado

                                                                        ii.      Embora lecionasse em uma instituição militar, seu ensino era filosófico e civilista, ou seja, era antimilitarista

                                                                      iii.      À admiração por suas qualidades pessoais e docentes unia-se a empolgação pelo método e pelas doutrinas que ele esposava e empregava: no caso, as concepções de Augusto Comte

                                                                      iv.      Assim, Benjamin Constant reunia em si, objetiva e subjetivamente, qualidades pessoais e cívicas: a correção, o profissionalismo, o desprendimento, a devoção à causa pública – bem como o progresso, o desenvolvimento nacional, o abolicionismo, a república

                                                                        v.      Os alunos de Benjamin Constant eram a elite intelectual e profissional do Império e não estavam vinculados à degradação moral, social e política da monarquia

                                                                      vi.      Em virtude disso tudo, Benjamin Constant tornou-se o líder natural dos jovens e, por extensão, do republicanismo na Escola Militar

                                                                    vii.      Ao longo de 1889 a pressão pela república aumentou, fosse em grupos civis, fosse em militares; considerava-se que o apoio do Exército seria importante e, nesse sentido, Deodoro era figura central

                                                                  viii.      Benjamin entrou em acordo com Deodoro; com a participação de Rui Barbosa, marcaram o movimento de proclamação da República para o dia 20 de novembro

                                                                      ix.      Mas na madrugada de 14 para 15 de novembro correu um boato de que Deodoro e Benjamin seriam presos – e aí as coisas precipitaram-se: Deodoro reuniu suas tropas na Praça da República (antigamente Campo de Santana) e proclamou a República

1.      Houve movimentações na Câmara dos Deputados; na Corte, considerava-se que era um movimento apenas para a mudança de ministério

                                                                        x.      Constituiu-se o governo provisório, com oito ou nove membros; Deodoro foi indicado Presidente e Benjamin, Ministro da Guerra; dali a alguns dias chegou Demétrio Ribeiro, representando os republicanos gaúchos, que assumiu a pasta da Agricultura

 

Governo provisório

1)      Chefe do Governo Provisório — Deodoro da Fonseca

2)      Ministério da Justiça — Campos Sales

3)      Ministério da Marinha — Eduardo Wandenkolk

4)      Ministério da Guerra — Benjamin Constant, Floriano Peixoto e Antônio Nicolau Falcão da Frota

5)      Ministério dos Negócios Estrangeiros — Quintino Bocaiúva

6)      Ministério da Fazenda — Rui Barbosa e Tristão de Alencar Araripe

7)      Ministério do Interior — Aristides Lobo Cesário Alvim e Tristão de Alencar Araripe

8)      Ministério da Agricultura, Comércio e Obras Públicas — Demétrio Nunes Ribeiro, Francisco Glicério de Cerqueira Leite e Henrique Pereira de Lucena

9)      Ministério da Instrução Pública, Correios e Telégrafos — Benjamin Constant

 

                                                                      xi.      No dia 19 de novembro foi aprovada a nova bandeira nacional (Decreto n. 4); em 7 de janeiro de 1890 foi promulgado o Decreto n. 119-A, relativo à separação entre igreja e Estado; em 14 de janeiro foi editado o Decreto n. 155-B, com os feriados cívicos nacionais

                                                                    xii.      Devido às discussões internas ao governo provisório, Benjamin deixou em 12 de março a pasta da Guerra e, de maneira muito indicativa de seu caráter e seu temperamento (reflexivo, pacifista e civilista), assumiu a da Instrução Pública, Correios e Telégrafos; faleceu em 22 de janeiro de 1891

5.      Sobre a bandeira nacional

a.       A atual bandeira nacional republicana, de 19 de novembro de 1889, como se sabe, não foi a primeira; antes dela hasteou-se uma servil cópia verde e amarela da bandeira dos EUA, da autoria de Lopes Trovão

                                                                          i.      A bandeira atual foi elaborada por Raimundo Teixeira Mendes, pintada por Décio Vilares e auxiliada na parte astronômica por Manuel Pereira Reis; ela foi submetida a Benjamin Constant, que, na qualidade de membro do governo provisório, aceitou-a, ao mesmo tempo em que Deodoro já recusara o servil projeto de Lopes Trovão

                                                                        ii.      A totalidade da concepção da bandeira une a ordem ao progresso, a permanência do país ao progresso social e político:

1.      Ordem: mantém o projeto de José Bonifácio, com o retângulo verde e o losango amarelo, que, por sua vez, representavam inicialmente as cores das casas monárquicas de Portugal e da Áustria e, depois, as riquezas naturais (vivas: o verde das matas; mortas: o amarelo do ouro)

2.      Progresso: indica a mudança de regime, com a circunferência azul estrelada (idealizando o céu do Rio de Janeiro às 9h do 15 de novembro) e a faixa branca com letras maiúsculas verdes em que se lê “Ordem e Progresso”

                                                                      iii.      O “Ordem e Progresso” é uma divisa científica e política, indicando as duas formas fundamentais de analisar a sociedade (Sociologia Estática e Sociologia Dinâmica), que devem ser combinadas, e as duas tendências sociais que se deseja e que também devem ser combinadas em toda sociedade (a permanência social e o seu progresso)

b.      Há um movimento atual que afirma que se deve inserir a palavra “Amor” antecedendo o “Ordem e Progresso”

                                                                          i.      Apesar da correção moral da ênfase no amor, esse movimento difunde de maneira coordenada um relato padronizado, genérico, errado do ponto de vista histórico e extremamente preconceituoso

1.      Esse movimento justifica a inclusão do “amor” referindo-se – corretamente, é claro – à situação sociopolítica atual, caracterizada pela divisão social e pelo fascismo

                                                                        ii.      Mas: entre outras coisas discutíveis, esse movimento argumenta que “os homens que se reuniram para fazer a bandeira tiraram/rejeitaram/esconderam/desprezaram o amor”

1.      Esse relato sugere então que a base do “Ordem e Progresso” seria a fórmula religiosa do Positivismo, “O amor por princípio...”, em vez de ser uma fórmula bastante por si só

2.      Além disso, segundo esse relato, Teixeira Mendes teria sido mal, ou vil, ou egoísta, ou mesquinho, e teria tirado o “amor” para que a sociedade brasileira fosse baseada no ódio

a.       Um exemplo recentíssimo desse relato é o de Denise Fraga, em 27.10.2022, em um evento em apoio à candidatura de Lula para Presidente da República

                                                                      iii.      Esse movimento também repete que “não há informações a respeito da elaboração da bandeira”

1.      Eis um exemplo publicado há alguns dias, que apresenta esses diversos erros:

 

“Segundo o professor de História Djalma Augusto, a elite brasileira que instituiu a República foi muito influenciada pelo positivismo e pode ter suprimido a palavra amor na versão final da bandeira brasileira. Porém, o professor ressalta que não há uma consideração teórica ou uma referência muito clara sobre a supressão da palavra amor, o que torna a questão difícil de ser discutida” (Thaís Silveira, “‘Ordem e Progresso’: um país sem amor?”, 15.11.2022, Portal “Nós”).

 

c.       Entretanto, sistematicamente nós positivistas somos ignorados e desprezados no que se refere à bandeira – como, de resto, somos ignorados, desprezados, silenciados a respeito de qualquer coisa que nos diga respeito

                                                                          i.      Eu realizei inúmeros esforços para ser ouvido: em 2021 fui ouvido muito rapidamente e de má vontade pelo grupo “Amor na bandeira” – mas logo descartado e ignorado, como um intruso

d.      Vale lembrar que está na moda político-intelectual um conceito dos identitários: trata-se da tese excludente e sectária do “lugar de fala”

                                                                          i.      O “lugar de fala” estabelece uma reserva de mercado, ou uma cota retórica, em que somente “nós” (os integrantes do grupo identitário) podemos falar sobre nós e os “outros” não podem, ou podem desde que sejam vigiados e supervisionados por “nós”

                                                                        ii.      Embora o “lugar de fala” seja largamente aplicado nos dias atuais, como não poderia deixar de ser aos positivistas é negada qualquer possibilidade de ter seu próprio “lugar de fala”

e.       Os dados sobre a bandeira nacional estão disponíveis para quem quiser, na internet: seja no meu blogue, seja no portal Archive Internet, seja nos livros de Ivan Lins

                                                                          i.      Raimundo Teixeira Mendes e, depois, também Miguel Lemos publicaram uma série de artigos explicando e justificando a concepção da bandeira nacional; esses artigos começaram já em 24 de novembro de 1899, no Diário Oficial; eles foram reunidos em um livro intitulado A bandeira nacional, publicação n. 110 da série da Igreja Positivista do Brasil (cf. p. ex. p. 8-9 e 58-59)

                                                                        ii.      Há indicações na biografia de Benjamin Constant publicada por Teixeira Mendes logo após a morte do fundador da República, em julho de 1891

                                                                      iii.      Uma cópia digital da primeira edição da História do Positivismo do Brasil, de Ivan Lins, está disponível na internet

                                                                      iv.      Minhas publicações sobre a bandeira nacional estão disponíveis aqui

f.       Entrando na reflexão substantiva sobre o “Ordem e Progresso”: ele é uma fórmula por si só, de caráter científico e político

                                                                          i.      Doutrinariamente, é evidente que o “Ordem e Progresso” pode ser deduzido do “Amor por princípio”; entretanto, ele é uma fórmula por si só e cronologicamente foi elaborado antes do “Amor por princípio” – na verdade, o “Ordem e Progresso” foi a base do “Amor por princípio”

g.       As indicações de Augusto Comte a respeito das bandeiras são claras:

                                                                          i.      Na fase normal, deverá haver duas bandeiras, uma religiosa e universal (branca e verde, com a figura da Humanidade e o “Amor por princípio”, uma em cada lado) e uma política e nacional (branca e verde, com “Ordem e Progresso” e “Viver para outrem”, uma em cada lado, com bordas com as cores nacionais)

1.      Nas bandeiras nacionais, de caráter político, a sugestão do “Amor” está presente no “Viver para outrem”

2.      O “Ordem e Progresso” é uma divisa científica, política e masculina; o “Viver para outrem” é moral e feminina

3.      Essas indicações estão presentes na Política positiva: volume I, página 387, e volume IV, página 422

h.      Como Hernani Gomes da Costa observou há alguns, o conectivo “e” representa o amor, na medida em que a união da ordem com o progresso só se dá por meio do amor

i.        Antes do segundo turno das eleições de 2022, divulgamos o abaixo-assinado intitulado “A bandeira nacional não é fascista”

 

A BANDEIRA NACIONAL REPUBLICANA NÃO É FASCISTA

(Abaixo-assinado)

Para: População brasileira

Os abaixo-assinados – quer sejam positivistas, quer não sejam positivistas; reconhecendo e respeitando os valores e princípios subjacentes aos símbolos nacionais brasileiros, em particular a bandeira nacional republicana; reconhecendo a dramática situação política, social, intelectual e econômica vivida pelo Brasil no ano de 2022; considerando a apropriação cada vez mais reiterada dos símbolos nacionais por grupos sociais e políticos particularistas, violentos e intolerantes – têm a dizer o seguinte.

1. Os valores da bandeira nacional

A bandeira republicana brasileira foi instituída como símbolo nacional em 19 de novembro de 1889, quatro dias após a Proclamação da República, em 15 de novembro de 1889. Ela foi elaborada por Raimundo Teixeira Mendes a partir das indicações precisas do fundador da Sociologia, do Positivismo e da Religião da Humanidade, Augusto Comte.

Símbolo nacional maior por excelência, ela une de maneira simples, elegante e harmônica o desenvolvimento histórico e a continuidade social, ao manter o fundo verde e amarelo da bandeira monárquica e ao inserir a esfera estrelada azul e a divisa política “Ordem e Progresso”, próprias à evolução republicana do país. Assim, essa bandeira segue a inspiração de “preservar melhorando”, de acordo com as leis da sociologia dinâmica descobertas por Augusto Comte.

A frase “Ordem e Progresso” representa o ideal de unir indissoluvelmente duas perspectivas políticas até então opostas, o respeito à ordem e a necessidade de progresso. Separadas, cada uma dessas perspectivas torna-se antagônica em relação à outra, de tal maneira que a ordem transforma-se em ordem retrógrada e opressiva e o progresso torna-se caótico e também opressivo. Apenas a união das duas perspectivas, em que ambas sejam simultaneamente respeitadas e valorizadas, torna possível que cada uma delas seja cumprida. A ordem consiste na consolidação do progresso, ao passo que o progresso é o desenvolvimento da ordem; o vínculo entre ambos é o amor, que, em termos políticos, deve ser entendido em termos de fraternidade, respeito mútuo e tolerância.

Em particular, o respeito à ordem não equivale à submissão cega ou servil ao poder político; da mesma forma, a verdadeira relação entre o poder e os cidadãos não é a de um soldado que se submete ao seu comandante. Nada disso é liberdade ou cidadania, mas autoritarismo, militarismo e submissão abjeta.

2. A política positiva

A bandeira nacional republicana, bem como a divisa “Ordem e Progresso”, inspiram-se e representam os conceitos da política positiva; estes, por sua vez, podem ser sumariados como seguem:

- subordinação da política à moral: subordinação da política aos princípios e valores maiores da Humanidade, em que a família subordina-se à pátria e a pátria subordina-se à Humanidade; subordinação das perspectivas específicas e particulares às concepções gerais e mais amplas; primado da publicidade e da racionalidade na vida coletiva, em particular nas ações com resultados públicos; afirmação dos deveres sociais, em particular responsabilizando claramente os fortes, os poderosos e os ricos por suas ações e omissões;

- separação entre os poderes Temporal e Espiritual: rejeição de todo e qualquer clericalismo (teológico, metafísico e científico); rejeição do uso do Estado para promoção ou repressão de crenças, exceto no caso em que elas estimulem e/ou provoquem a violência; rejeição da eleição ou da indicação de sacerdotes para cargos públicos; defesa das liberdades de pensamento, de expressão e de associação;

- pacifismo: rejeição de toda e qualquer violência na política (seja do Estado contra os cidadãos, seja dos cidadãos entre si), em particular na forma das agressões de policiais contra cidadãos; rejeição da atuação de militares e policiais na política; possibilidade de manifestar livremente as idéias e as concepções pessoais sem correr nenhum risco (físico e/ou profissional) por isso;

- relativismo: prática da tolerância para com as diferentes crenças e religiões; respeito e proteção às comunidades indígenas; condenação de toda prática violenta na vida social.

3. Os fascistas contra o Positivismo

Desde pelo menos 2019, grupos fascistas e de extrema-direita têm manifestado a pretensão de tomar exclusivamente para si, de maneira sectária, a bandeira nacional republicana, incluindo aí o “Ordem e Progresso”. Diversas manifestações desses mesmos grupos evidenciam, entretanto, não somente que eles afastam-se dos ideais expressos na bandeira nacional republicana e no “Ordem e Progresso” como, ainda mais, são opostos e desprezam esses valores.

Assim, por exemplo, o mote do atual governo federal, que resume o programa fascista, é “Brasil acima de tudo e deus acima de todos”. Essa única frase rejeita ao mesmo tempo os princípios (1) da subordinação de todas as pátrias aos supremos interesses da Humanidade e (2) da separação dos poderes Temporal e Espiritual; inversamente, ela (1) estabelece como parâmetro de conduta o nacionalismo mais estreito e (2) a imposição oficial de doutrina teológica. Se isso não bastasse, o verso “Brasil acima de tudo” não por acaso retoma a frase empregada pelo regime nazista, “Alemanha acima de tudo” (Deutschland über alles).

Da mesma forma, não podemos esquecer as reiteradas manifestações de profundo ódio e preconceito político desses grupos contra o Positivismo, com o que mais uma vez evidenciam que desprezam os valores da bandeira nacional e o “Ordem e Progresso”:

- “Os positivistas são lixo que necessitam ser expurgados” (Carlos Bolsonaro, 8/3/2020)

- “Os positivistas são o pior câncer do Brasil” (Carla Zambelli, 5/7/2020)

- “Enquanto a gente não resolver o positivismo, a gente não consegue desmontar o comunismo, socialismo, a esquerda no Brasil” (Abraham Weintraub, 27/6/2022).

4. Declaração final

Os valores, os ideais, as concepções subjacentes à totalidade da bandeira nacional republicana, incluindo aí a divisa “Ordem e Progresso”, condensam os melhores e mais altos princípios da política moderna. Todos esses princípios são profundamente estranhos à filosofia e à prática do fascismo. Mais do que isso: como se sabe, o fascismo baseia-se no estímulo sistemático e no uso político da violência; na militarização e na “policialização” da sociedade; na imposição de crenças pelo Estado e na busca de supressão das crenças não oficiais; no nacionalismo extremado, na xenofobia, na intolerância.

É em virtude de todos esses motivos que afirmamos sem medo de errar:

A BANDEIRA NACIONAL REPUBLICANA NÃO É FASCISTA!

 

6.      Para concluir

a.       Esta conferência teve dois ou três objetivos:

                                                                          i.      Celebrar a República

                                                                        ii.      Celebrar a atuação dos positivistas na República

                                                                      iii.      Esclarecer alguns aspectos supostamente controversos (mas baseados unicamente na ignorância interessada) sobre os positivistas

                                                                      iv.      Afirmar a perspectiva própria ao Positivismo, contra a censura promovida pela direita e pela esquerda, incluindo aí o movimento “Amor na bandeira”


Crítica à República e desistência de uma utopia libertária, inclusiva e progressista

A República foi proclamada em 1899, tendo amplo apoio popular e de intelectuais. Nos anos seguintes à proclamação, muitos desses intelectuais republicanos passaram a desiludir-se com o novo regime político, pois esperavam mudanças sociais, políticas, econômicas imediatas. As mudanças sociais, como sabemos, são lentas por si sós; a implantação da República teve suas próprias dificuldades e, por fim, de fato muitas mudanças necessárias e desejadas acabaram não sendo implantadas.

A partir de então, esses intelectuais desiludidos passaram a criticar os limites, as falhas e as promessas não cumpridas da República.

O problema é que nessas críticas esses intelectuais - antigos entusiastas do republicanismo - passaram a abandonar moral, intelectual e politicamente a República. Ou seja, em vez de persistirem no projeto, em vez de cobrarem a realização das promessas e das necessidades sociais, eles passaram a deixá-lo de lado. Nessa toada associaram-se aos críticos novos intelectuais, que, por sua vez, tinham cada vez menos compromisso com o republicanismo e, em particular, com a defesa das liberdades.

Assim, esse abandono do projeto republicano, da parte dos intelectuais antigos entusiastas da República (e mesmo da parte de alguns novos intelectuais), teve pelo três ou quatro resultados, não necessariamente mutuamente excludentes:

(1) abriram espaço para a irresponsabilidade social, política e econômica das elites brasileiras;

(2) abriram espaço para a posterior rejeição da República, que acabou realizando-se na forma da Revolução de 1930, e, em particular, para os autoritarismos "puros" e/ou os autoritarismos que tendiam para os totalitarismos, próprios ao Brasil entre 1935 e 1945;

(3) permitiram que a memória da monarquia - tão corretamente criticada nas décadas de 1870 e 1880 (escravidão, castas, degradação do trabalho, filhotismo, igreja oficial, centralização autoritária, imperialismo internacional etc.) - fosse reabilitada, como se os inúmeros e profundos defeitos morais, intelectuais, sociais e políticos da monarquia nunca tivessem ocorrido e como se república não tivesse sido de fato um progresso necessário, com ou sem promessas não cumpridas;

(4) a transmutação, explícita ou implícita, de alguns desses intelectuais republicanos em defensores da monarquia;

(5) uma combinação variada desses aspectos todos.

Ora, bem vistas as coisas, a desistência do projeto republicano da parte desses intelectuais foi um enorme erro. Até então e desde o século XVIII, na história do Brasil o republicanismo era um ideal em si mesmo, uma concepção densa a concentrar, estimular e orientar os esforços morais, intelectuais, políticos, sociais - em outras palavras, o republicanismo era própria e verdadeiramente uma utopia.

Desde então, o Brasil ficou órfão dessa utopia. A muito custo, o republicanismo foi substituído pela "democracia"; mas, como se sabe, tal substituição foi demorada; mas, como não se sabe, a democracia é um substituto muito, muito imperfeito e inadequado para o republicanismo, na medida em que ela (a democracia) é o governo do povo, o que pode ser entendido como "massas", quer sejam as massas que nunca erram ("a voz do povo é a voz de deus", como poderia ser subscrito por Rousseau), quer sejam as massas de indivíduos justapostos (como pode ser subscrito pelos liberais). Quando se estuda a "democracia" de um ponto de vista da teoria política, levando em consideração o republicanismo, torna-se bastante evidente que ela, a democracia, só se torna um regime de liberdades com conteúdo social quando na verdade ela é apenas um nome que corporifica de fato e no fundo a República.

Desde os anos 1930, essa desistência do republicanismo da parte dos intelectuais antigos republicanos é estudada na academia como "crítica à república" e/ou como "crítica ao liberalismo", não como desistência do republicanismo. Em outras palavras, o enfoque básico nesses estudos é o da crítica social e, curiosamente, de um forte mas implícito "evolucionismo", em que nada do que veio antes dos "estudiosos contemporâneos" presta (e, em particular, nada do que veio antes da "democracia", presta); com isso, a história política, social e intelectual está sempre, perpetuamente, recomeçando. Aliás, como já indicamos, além desse curioso evolucionismo anti-histórico, tabula rasa, uma outra consequência dessa perspectiva é a revalorização da monarquia - em que se passa água sanitária sobre todos os sérios, inúmeros e profundos problemas da monarquia e em que esta passa a ser vista como um modelo de virtudes intelectuais, morais, sociais, políticas e econômicas.

Um representante perfeito dessa mentalidade tabula rasa é o famoso (mas, como é fácil de perceber, exageradamente celebrado) sociólogo Florestan Fernandes; antes dele, o historiador Sérgio Buarque de Hollanda fez a mesma coisa (Sérgio Buarque tem o grave defeito adicional de repetir o preconceito anti-ibérico, ou antiportuguês, que considera que só os anglossaxões prestam e que os ibéricos são burros, preguiçosos, autoritários etc.).

Uma outra maneira de entender a perspectiva academicista básica para estudo dos intelectuais antigos republicanos é a seguinte: desiste-se do republicanismo e desiste-se da utopia republicana; mas, mais importante que isso, também se desiste de entender a desilusão dos intelectuais antigos republicanos como uma etapa de aprendizado intelectual, moral e político, em termos coletivos e históricos da realidade brasileira. Ou seja, desiste-se de entender que a desilusão desses intelectuais era correta e compreensível em um certo sentido; mas que eles erraram profundamente em passar da desilusão para a desistência do projeto republicano e, daí, que eles erraram em deixar o Brasil órfão da utopia republicana e de seu denso conteúdo social e libertário. (De passagem: na França e em Portugal não se cometeu esse erro; não por acaso, o republicanismo nesses países tem um conteúdo denso, ou seja, é uma utopia atual, verdadeira, pulsante.)

Em suma: lamentavelmente, apesar de si mesmos, os intelectuais antigos republicanos erraram - e nós insistimos em não aprender com esse erro.

Uma última observação. Muitos intelectuais antigos republicanos desiludiram-se com a república e acabaram desistindo do projeto republicano; essa perspectiva - a desilução-com-desistência - é a perspectiva-padrão das análises academicistas atuais: é o que argumentei até agora. Se a atuação dos intelectuais desiludidos-desistentes oferece a perspectiva atualmente celebrada e vista como correta, o resultado é que aqueles intelectuais que persistiram no republicanismo, que persistiram valorizando a República e sua utopia, passam a ser vistos como intelectuais alienados, tolos, idealistas, desconectados da realidade - ou, ainda pior, como defensores implícitos ou explícitos da exclusão social, do elitismo, das oligarquias etc. Ora, como os positivistas foram alguns, se não verdadeiramente os únicos, intelectuais organizados e públicos a defender a República e o republicanismo, naturalmente recaem sobre eles todos esses adjetivos negativos que acabamos de enumerar. Aí se evidencia um dos motivos do ridículo com que os academicistas gostam de apresentar os positivistas: não tem nada a ver com as propostas e os comportamentos efetivos dos positivistas, mas com preconceito, com recusa de aprender com a história e com a recusa em persistir em projetos sociais, libertários, inclusivos e progressistas.

16 novembro 2022

Augusto Comte: Cartas sobre a doença

No final de 2021 a Revista de Teoria da História, vinculada à Universidade Federal de Goiás, publicou uma tradução de cartas enviadas em 1857 por Augusto Comte a seu discípulo, o médico marselhês Georges Audiffrent. 

O artigo intitula-se "Cartas sobre a doença" (Revista de Teoria da História, Goiânia, v. 24, n. 2, p. 128-142) e pode ser lido aqui.

A tradução das cartas é precedida por uma introdução do tradutor, sr. Tiago Santos Almeida. É uma introdução ruim, em que o tradutor baseia-se em literatura de segunda mão (ou até de terceira mão!) para reiterar alguns dos mais tolos erros factuais e teóricos sobre Augusto Comte e o Positivismo. Na verdade, ao redigir essa "introdução", que deveria ter um caráter explicativo, o tradutor limitou-se a repetir e tornar seus vários preconceitos contra o Positivismo - sendo totalmente incapaz de tratar das várias questões filosóficas, políticas, morais e científicas tratadas nas cartas traduzidas.

No final das contas, embora o tradutor tenha-se empenhado em deixar claro que tem profundo apreço por preconceitos políticos e filosóficos e que considera a repetição de tolices uma prática intelectual aceitável (prática academicista, diga-se de passagem), é perfeitamente possível desconsiderar essa "introdução" e concentrar-nos no que realmente importa e interessa: as cartas que Augusto Comte enviou ao dr. Audiffrent, entre 1854 e 1857.

Luiz Hildebrando de Horta Barbosa: Introdução à filosofia das ciências

A Revista do Serviço Público, publicada desde 1939 pelo Departamento Administrativo do Serviço Público (o DASP) e atualmente a cargo da Escola Nacional de Administração Pública (ENAP, subordinada ao Ministério da Economia), trouxe a lume em 1950 um artigo da autoria do positivista ortodoxo brasileiro Luiz Hildebrando de Horta Barbosa. 

Luiz Hildebrando integrava a família Horta Barbosa, que teve inúmeros de seus membros integrantes da Igreja Positivista do Brasil. Engenheiro de formação, serviu na Universidade Federal do Rio de Janeiro e foi o responsável técnico pela criação da Ilha do Fundão e pela construção dos prédios originais que lá foram instalados. Além disso - muito além disso -, ele desenvolveu uma intensíssima atividade sacerdotal, no sentido positivista da expressão, ministrando dezenas de cursos populares de ciências, de filosofia, de história etc.

Por ocasião de seu falecimento, em 1973, alguns positivistas elaboraram o seu elogio fúnebre, que pode ser lido aqui. É desse elogio fúnebre que tiramos a foto reproduzida abaixo.

Voltando ao artigo publicado na Revista do Serviço Público: ele intitula-se "Introdução à filosofia das ciências" (Revista do Serviço Público, Rio de Janeiro, ano XIII, v. 1, n. 2, p. 13-18). Recuperado esse artigo, digitalizado e posto à disposição ao longo de 2022, o texto pode ser lido aqui.




Importância da visão de conjunto

No dia 11 de Frederico de 168 (15.11.2022) fizemos uma prédica positiva; na parte da leitura comentada do Catecismo positivista, concluímos a teoria geral do culto, tratando da influência intelectual do culto positivo. Já na parte de sermão, tratamos da importância da visão de conjunto para o ser humano, bem como da rejeição contemporânea da visão de conjunto pelo pós-modernismo e pela política identitária.

As anotações que serviram de base para a (longa) exposição sobre a importância da visão de conjunto estão disponíveis abaixo. A exposição oral está disponível aqui (no canal Positivismo do Youtube) e aqui (no canal Apostolado Positivista do Facebook), a partir de 53' 30".

*   *   *

Importância da visão de conjunto

 

-        A visão de conjunto permite que se entenda a realidade

o   A visão de conjunto tem conseqüências morais, intelectuais e sociais:

§  A visão de conjunto oferece sentido ao mundo e à vida

§  É somente por meio da visão de conjunto que se pode explicar a sociedade e os indivíduos, ao inseri-los em “contextos”

·         Ao entendermos a totalidade, sabemos onde fica cada coisa e, portanto, sabemos onde cada um de nós fica, está e como se relaciona com os demais

§  A verdadeira moralidade só é possível com base na visão de conjunto:

·         Somente a partir da visão de conjunto é possível definir o que é bom e o que é ruim, o que é justo e o que é injusto

o   Inversamente, a ausência de visão de conjunto, ou a negação da visão de conjunto, resulta em que a realidade torna-se incoerente e irracional e qualquer discussão sobre o que é certo e o que é justo torna-se impossível (quando não irrelevante)

§  A irracionalidade e a incoerência resultantes da ausência de síntese tem resultados muito claros: a perda do sentido da vida, a confusão mental, a perda de referências morais (em termos individuais e coletivos)

§  As consequências acima resultam, por sua vez, em aumento dos conflitos sociais e da violência social e política, em guerras (internacionais e/ou civis), no fanatismo e na intolerância, no adoecimento mental e físico

§  A rejeição da visão de conjunto, portanto, é ao mesmo tempo imoral, irracional e antissocial (e antipolítica)

-        Afirmar a possibilidade, a necessidade e até mesmo a indispensabilidade da visão de conjunto torna-se ainda mais urgente desde os anos 1960-1970 no Ocidente, com o desenvolvimento do pós-modernismo

o   O pós-modernismo foi elaborado na França mas logo foi importado pelos Estados Unidos; na França ele manteve-se como uma modinha academicista, mas nos EUA ele desenvolveu-se, aprofundou-se e derivou para a prática política, na forma da política identitária

o   O pós-modernismo nega, rejeita, despreza, impede as visões de conjunto, que ele chama de “visões totalizantes” ou de “grandes narrativas”

§  Os historiadores também desenvolveram suas próprias formas de desprezo pelas visões de conjunto

o   De acordo com esses pensadores, não há motivo para elaborar-se visões de conjunto, pois objetivamente elas seriam impossíveis e, além disso, elas seriam desnecessárias

o   Para eles, portanto, o bom é a fragmentação das idéias, a justaposição incoerente e irracional de concepções puramente subjetivas

§  A partir desse ultrassubjetivismo, o pós-modernismo afirma que não existe realidade objetiva, mas apenas “narrativas”

o   Essa é a própria definição e afirmação do que Augusto Comte chamava de “anarquia”, ou seja, a ausência de valores e concepções compartilhados

-        Ao longo de toda a história da Humanidade, o ser humano procurou elaborar visões de conjunto, ou sínteses

o   Essas sínteses foram chamadas inicialmente de “religiões” e, depois, também (ou apenas) de “filosofias”

o   Como se sabe, as metafísicas sempre atuaram como corrosivas das sínteses anteriores, mas, entre cada grande transição, a metafísica do momento já introduzia elementos da nova síntese

§  Com o início da mais recente grande fase de transição (após a Idade Média), a metafísica introduziu a sua corrosão, mas apresentando um caráter ambíguo: por um lado, auxiliando a ciência; por outro lado, desenvolvendo a pura corrosão

§  No século XVIII, algumas filosofias que tinham ainda um pé na metafísica afirmaram o espírito positivo e a visão de conjunto: foram os enciclopedistas, especialmente na França e na Escócia

§  Vale notar que mesmo algumas metafísicas modernas sem muito espírito positivo e/ou com forte espírito corrosivo (“crítico”) estimularam a visão de conjunto: Hegel e até Marx tiveram essa preocupação

o   Entretanto, algumas ciências – não por acaso, as ciências superiores – exigem a visão de conjunto

§  Essa exigência é inaugurada pela Biologia, seja em termos globais, com a Ecologia, seja em termos individuais, com o estudo da inserção dos órgãos no corpo

§  A Sociologia e a Moral também exigem a visão de conjunto

§  Vale lembrar, entretanto, que a ciência é ambígua: se por um lado há ciências que exigem a visão de conjunto, por outro lado a ciência entregue a si mesma tende ao absoluto e, como a ciência é pelo detalhe, por si mesma ela vai contra a visão de conjunto

-        A metafísica que rejeita a visão de conjunto, não por acaso, vincula-se à concepção individualista do ser humano: toda a tradição liberal é individualista e contrária à visão de conjunto

o   Para os liberais (progressistas ou conservadores; ingleses ou alemães ou estadunidenses ou austríacos), a visão de conjunto equivale sempre à opressão da sociedade sobre o indivíduo

§  O máximo de “sociedade” que os liberais concebem é a justaposição de indivíduos e dos seus respectivos egoísmos

o   O individualismo que descamba no liberalismo é o resultado da secularização da teologia: sai a divindade, mantém-se o egoísmo e rejeita-se a perspectiva social

o   O liberalismo é uma degradação do republicanismo, em particular na perda do sentido coletivo da vida humana

o   Mas é importante indicar que o liberalismo, apesar de seus defeitos intelectuais e morais, concebe ainda uma visão de conjunto em termos de leis válidas para todos (os indivíduos) – a isonomia

o   Da mesma forma, ainda que limitado pelo individualismo, o liberalismo reconhece a importância da ciência

-        O pós-modernismo (com sua conseqüência prática, a política identitária) é uma filosofia especificamente academicista e consiste no desenvolvimento sem freios da metafísica, isto é, do seu espírito corrosivo

o   O pós-modernismo e a política identitária aprofundam os aspectos críticos, isto é, corrosivos da metafísica (da mesma metafísica que resultou no liberalismo e, paradoxalmente, também no marxismo)

o   O pós-modernismo e a política identitária rejeitam (1) a ciência, (2) a visão de conjunto, (3) os valores compartilhados, (4) o universalismo nas políticas públicas

o   De maneira correlata, o pós-modernismo e a política identitária defendem (1) o particularismo, (2) o irracionalismo anticientífico, (3) o exclusivismo e a exclusão de quem não é do grupo identitário, (4) as “narrativas” identitárias exclusivas e excludentes

§  Ao longo da história já tivemos exemplos concretos de tais “narrativas” identitárias: foram a “ciência proletária” de Stálin e a “ciência ariana” de Hitler; atualmente há as “epistemologias negras”, “epistemologias queer”, “epistemologias feministas” etc. etc. etc. – tudo isso devidamente identitário, antiuniversalista, particularista, sectário

§  Duas aplicações práticas do sectarismo pós-moderno-identitário:

·         A defesa de discriminações “positivas”: “racismo inverso” (dos “negros” contra os “brancos”), “sexismo inverso” (das mulheres contra os homens) etc.

o   Uma consequência institucional das discriminações positivas são as cotas de vagas

·         A afirmação do “lugar de fala”, que consiste na defesa, no âmbito da retórica, de cotas exclusivas para os membros dos grupos identitários, de tal maneira que só podem falar sobre esses grupos os membros do próprio grupo, excluindo da possibilidade de falar desses grupos quem não os integrar

o   Versões mais suaves do “lugar de fala” até admitem que não-membros dos grupos identitários possam falar sobre os grupos identitários – mas sempre de maneira subordinada

-        É fundamental ter-se clareza de que não é necessário ser identitário para combater-se o racismo e promover a integração “racial”; para valorizar as mulheres e combater as discriminações e as violências contra elas; para valorizar os homossexuais e combater as discriminações e as violências contra eles etc.

o   A associação (interessada) entre determinadas pautas sociais e políticas e o identitarismo prejudica as próprias pautas

o   É possível e necessário encampar essas pautas sem recorrer ao identitarismo e aos seus profundos vícios morais, intelectuais e políticos

o   Ao reconhecermos a justiça das pautas defendidas pelo identitarismo mas recusarmos seus defeitos morais, intelectuais e políticos, cada uma das políticas identitárias em particular deve ser entendida como um "grito dos excluídos"

-        Insistimos: em contraposição à rejeição intelectual, moral e política da visão de conjunto realizada pelos pós-modernos, é necessário reafirmar a possibilidade e a necessidade das visões de conjunto, ou melhor, das sínteses

o   A visão de conjunto tem aspectos objetivos e subjetivos:

§  Ela é subjetiva na medida em que é o ser humano (o sujeito) quem elabora e a quem se direciona a síntese

§  Ela é objetiva na medida em que se baseia em elementos objetivos, sejam eles cósmicos, sejam eles humanos (históricos e morais)

§  Deixando de lado o escandaloso (mas “charmoso”!) elogio da irracionalidade feito pelos pós-modernos, é questão de perguntarmos com clareza e de respondermos com ainda maior clareza: qual o problema com que a síntese seja subjetiva? Ora, nenhum!

o   O Positivismo, a Religião da Humanidade afirma a visão de conjunto e a síntese:

§  A moralidade e a racionalidade estabelecidas por meio da subordinação progressiva de indivíduos e grupos a coletividades e perspectivas cada vez maiores: família, mátria, Humanidade atual (objetiva), Humanidade histórica (subjetiva)

o   Apenas por meio da visão de conjunto e da síntese propostas pela Religião da Humanidade é possível realizar com êxito a busca da harmonia individual, do bem-estar coletivo, do sentido da vida, da felicidade


15 novembro 2022

Propostas políticas e sociais do Positivismo em face do trabalhismo

No ano de 2022, em duas ocasiões (4 de abril e 10 de novembro) tive a honra de ser convidado por militantes do Partido Democrático Trabalhista (PDT) para apresentar alguns dos princípios e das propostas sociopolíticas do Positivismo, tendo especialmente em vista a influência que eles exerceram sobre o trabalhismo no Brasil. Na primeira oportunidade fui convidado pelo gaúcho Luciano B. Zini; na segunda ocasião, pelo cearense Samuelson Xavier: a ambos, o meu agradecimento!

Em ambas as ocasiões as conversas subsequentes duraram várias horas, abordando os mais variados temas, inclusive aspectos da história política e social brasileira, como a influência do Positivismo no Rio Grande do Sul e também sobre os militares. Assim, foram ocasiões excelentes para o esclarecimento e a correção de mitos há muito difundidos. Da mesma forma, essas conversas sugeriram-me novos temas para reflexão e pesquisa.

Reproduzo abaixo o roteiro das minhas exposições.

*   *   * 

Roteiro:

o   Apresentação pessoal

o   Definição apofática

o   “Ordem e Progresso”

o   Primado da sociedade, ação individual

o   Propostas políticas

o   Propostas sócio-econômicas

 

-        Apresentação pessoal

o   Sociólogo da UFPR

o   Doutor em Sociologia Política (UFSC)

o   Positivista ortodoxo

o   Dono dos canais Positivismo, Apostolado Positivista e Filosofia Social e Positivismo

-        Definições apofáticas

o   Que é o Positivismo?

§  O Positivismo é:

1)      “Positivismo” significa, para mim, a obra de Augusto Comte

2)      Uma religião secular, uma filosofia histórica, relativista e objetiva-subjetiva, uma prática humanista, pacifista, tolerante, universalista e includente

a.       É um sistema de educação universal

3)      “Real, útil, certo, preciso, relativo, orgânico, simpático”

4)      Uma religião que afirma, regula e estimula o altruísmo inato (que, por sua vez, orienta e limita o egoísmo também inato)

5)      Uma política humanista, altruísta, racional, histórica, sensível à opinião pública e baseada em evidências e nas liberdades

6)      Uma afirmação da realidade humana e dos valores humanos

7)      Uma afirmação da historicidade humana e, portanto, do relativismo

§  O Positivismo não é:

1)      Não é ateísmo

2)      Não é uma “teologia científica” (Religião da Humanidade)

3)      Não é um cientificismo nem um academicismo

a.       Não é reducionista (ele afirma a dignidade de cada ciência e, em particular, do ser humano e das Ciências Humanas)

4)      Não é um “naturalismo” (não reduz as Ciências Humanas às Ciências Naturais)

a.       Não é a favor da oposição “explicação” versus “compreensão”

5)      Não é um “empiricismo”

6)      Não é ideológico

a.       Não é uma ideologia burguesa

7)      Não é militarista

8)      Não é uma afirmação do Estado totalitário nem da sociedade sufocante anti-indivíduo

9)      Não é otimismo ingênuo (“pensamento positivo”)

10)  Não é nem idealista nem materialista

11)  Não é fatalista nem nega a liberdade humana

-        “Ordem e Progresso”

o   França posterior à Revolução Francesa

§  Busca de uma nova organização social e de novos princípios legitimadores, adequados a uma sociedade industrial e com a ciência

§  Oscilação entre a “ordem” (retrógrados, teológicos, absolutistas) e o “progresso” (revolucionários, metafísicos, absolutistas)

§  Necessidade de conciliação e superação entre a ordem e o progresso:

·         Sociologia da ordem: fundada por José de Maistre

·         Sociologia do progresso: fundada por Condorcet

·         Contribuição de Augusto Comte: conjugação entre a ordem e o progresso (além do desenvolvimento da reflexão sobre as ciências, sobre o que é a cientificidade, sobre os métodos e o objeto da Sociologia, sobre a aplicabilidade da Sociologia etc.)

§  Busca de um novo poder espiritual: necessidade e oportunidade de fundação de uma ciência relativa à sociedade:

·         necessidade de entender o que ocorria na Europa após a Revolução Francesa e de solucionar os problemas sociais e políticos

·         disponibilidade de meios intelectuais para isso (o desenvolvimento do método científico e a conseqüente maturidade intelectual para a criação da Sociologia)

-        Primado da sociedade, ação individual:

o   A fundação da Sociologia evidencia que o ser humano é antes e acima de tudo um ser social e histórico

o   Como a Sociologia parte do conjunto para as partes, não existem “indivíduos”, apenas seres humanos em sociedades

§  Antepor a análise dos indivíduos à das sociedades resulta em considerar os seres humanos como animais, não como seres humanos

§  As “células sociais”, isto é, as menores unidades de análise sociológica são as famílias

o   Apesar disso, a sociedade possui agentes: são os indivíduos

§  Os “indivíduos” criticados por A. Comte são as elaborações próprias ao individualismo (que rejeita a sociedade e a vida coletiva, em uma busca da satisfação estritamente pessoal), que surgiram na Idade Média teológica e reafirmaram-se na Idade Moderna com a metafísica

o   “Consagrar para regular”: indivíduo buscando a satisfação pelo altruísmo

§  A consagração dos indivíduos é necessária não somente porque são eles que concretamente agem como também porque é necessário afirmar a responsabilização social das condutas e das decisões individuais

-        Propostas políticas:

o   Governo

§  Conjugação dos princípios de Aristóteles e de Hobbes:

·         Aristóteles: “a sociedade consiste na divisão do trabalho e na convergência dos esforços”

·         Hobbes: todo governo baseia-se na força

§  “Não existe sociedade sem governo”

·         Afirmação das vistas de conjunto da sociedade

·         Preocupação em como se maneja o poder, não com quem o ocupa

·         Dois pólos sociopolíticos: Estado e sociedade civil

§  Poderes:

·         Temporal: manutenção da ordem civil (âmbito de aplicação das ciências inferiores)

·         Espiritual: opiniões e crenças (âmbito de atuação das ciências superiores)

o   Em termos gerais:

§  pacifismo, antimilitarismo, rejeição normal da violência

§  política humanista, altruísta, racional, histórica, sensível à opinião pública e baseada em evidências e nas liberdades

§  afirmação de deveres de todos para com todos

§  meritocracia com justiça social

§  afirmação da sociedade civil

o   Governo:

§  republicanismo

§  separação dos dois poderes (“laicidade do Estado”)

§  desenvolvimento econômico e social

-        Propostas sócio-econômicas:

o   A teologia e a metafísica são incapazes de abarcar a realidade material da sociedade; portanto, são incapazes de solucionar seus problemas

o   A propriedade enquanto tal sempre existe (privada ou coletiva)

o   Manutenção e aumento dos tipos de capital

§  material, intelectual e moral

§  responsabilidade pessoal pela gestão dos recursos

§  “O capital é social em sua origem e deve sê-lo em sua destinação”

o   Formas de transmissão do capital: guerra: conquista; paz: dádiva, troca, herança

o   Emancipação paulatina dos trabalhadores (e das mulheres): escravos na Antigüidade, servos na Idade Média, trabalhadores livres na modernidade

o   Necessidade de concurso entre o patriciado e o proletariado

§  Riqueza: força concentrada; trabalho: força dispersa

§  Caráter instrumental da luta de classes

o   Justiça social:

§  incorporação social do proletariado

§  “funcionalismo público”

§  conjugação entre liberdades políticas e econômicas e atuação do governo (crítica ao liberalismo econômico)

§  caráter social da riqueza

§  responsabilidades individuais e coletivas

·         noção de deveres: relações mútuas devidas entre indivíduos e grupos entre si