Comemoração do Dia da Bandeira Nacional Brasileira – 19.11.2014
Gustavo Biscaia de
Lacerda
Bandeira nacional republicana brasileira. Fonte da imagem: wikipédia. |
O dia 19 de novembro marca o Dia
da Bandeira. Nessa data, no ano de 1889 a proposta feita por Raimundo Teixeira
Mendes e pintada por Décio Villares foi apresentada por Benjamin Constant e
aceita pelo governo provisório da nascente república brasileira (proclamada um
pouco antes, no dia 15 de novembro): assim, é impossível separar a comemoração
do Dia da Bandeira da própria Proclamação da República.
Raimundo Teixeira Mendes (1855-1927), vice-Diretor da Igreja Positivista do Brasil e autor da bandeira nacional republicana brasileira. Fonte da imagem: wikipédia. |
A bandeira republicana é ao
mesmo tempo bonita, simples e profundamente filosófica. Ela é agradável à vista
e em linhas gerais pode ser desenhada à mão por qualquer pessoa. Nesse sentido,
aliás, ao contrário do que monarquistas, católicos e supostos especialistas em bandeiras
afirmam, a bandeira nacional republicana não
é complicada: se, por um lado, ela não tem a simplicidade banal de outras
bandeiras que se limitam a justapor faixas coloridas, por outro lado ela não
apresenta as complexas filigranas que outros pendões ostentam.
Mas, deixando de lado os
aspectos estéticos da bandeira nacional, o mais importante é que ela contém em
si uma importante combinação de história, de filosofia e de política. O
quadrilátero verde e o losango amarelo eram elementos usados na bandeira
imperial, correspondendo respectivamente às cores das casas dinásticas de
Bragança e de Habsburgo; em versões mais recentes e bem mais populares, essas
duas figuras geométricas significariam as matas e as riquezas minerais do país:
o que importa notar, de qualquer maneira, é que a permanência dos elementos da
bandeira imperial (de 1822 a 1889) na então nova bandeira republicana indicava
a continuidade sociológica do Brasil, isto é, o fato simples e importante, mas
freqüentemente esquecido ou desprezado, de que a sociedade brasileira
continuava existindo ao longo do tempo, em meio aos seus desenvolvimentos e
também às mudanças de regimes políticos.
A circunferência azul com a
faixa branca contendo o "Ordem e Progresso" (em letras verdes) é
ainda mais direta e claramente filosófica. As estrelas no céu lembram-nos de
que todos os seres humanos submetem-se à ordem natural, cuja regularidade é
enorme e sem a qual nós não existiríamos: sem os contínuos calor e luz do Sol,
não haveria vida na Terra, da mesma forma que só é possível a vida neste nosso
valioso planeta em virtude de condições geológicas e astronômicas
especialíssimas. Mas, por outro lado, a observação das estrelas foi o início da
ciência e, de qualquer maneira, é fonte de curiosidade e estímulo permanente à
imaginação e à poesia.
O "Ordem e Progresso",
por sua vez, é a afirmação do ideal sociopolítico que norteia o Brasil, ao
buscar um regime político que permita ao mesmo tempo o progresso (político,
econômico, moral) e garanta a ordem social. Proposta pelo filósofo francês
Augusto Comte como devendo integrar todas as bandeiras do mundo, essa frase é passível
de aceitação por todos os grupos sociais e políticos.
A esse respeito, há um erro de
interpretação bastante comum. Ao contrário do que costumam afirmar variados esquerdistas – para quem o "Ordem e Progresso" quer dizer "progresso
apenas dentro da ordem", ou seja, para quem o progresso é e sempre será
anárquico –, no pensamento comtiano a "ordem" inclui o respeito às
liberdades públicas, o bem-estar material de toda a população (em particular a
mais pobre), a separação entre igreja e Estado, a fraternidade social e a paz
universal etc. Dessa forma, o "Ordem e Progresso" só faz sentido se
entendido como propunha originalmente Augusto Comte: na medida em que os
elementos da ordem são respeitados e desenvolvidos, há progresso social.
Por fim, desde há alguns anos
fala-se em incluir o "Amor" no "Ordem e Progresso".
Costuma-se dizer que, ao elaborar a bandeira, Raimundo Teixeira Mendes teria
desfigurado a fórmula original de Augusto Comte – que é "O Amor por
princípio e a Ordem por base; o Progresso por fim" –, ignorando a primeira
parte. Na verdade, Teixeira Mendes seguiu ao pé da letra as orientações de
Comte, que considerava que, enquanto não houver em cada sociedade e, depois, no
mundo inteiro, um consenso a respeito da necessidade de unir a ordem ao
progresso e de deixar para trás os grupos que querem a ordem de maneira retrógrada
e o progresso de maneira anárquica, não será possível incluir o amor como
elemento político. Nesse caso, não se trata de que as relações sociais não
devam ser mais fraternas, mais pacíficas, mais cuidadosas e respeitadoras do
"outro": o que ocorre é que, enquanto não há um consenso efetivo sobre
os valores sociais mínimos, o Estado tem que se limitar a manter a ordem social
e, dentro do possível, desenvolver as sociedades.
Assim, em seu conjunto, a
bandeira brasileira é mais que um símbolo de um país – um símbolo que, aliás,
comemora seus 125 anos em 2014 –: é a afirmação de um projeto social de longo
prazo, de paz, de respeito, de liberdades, de integração, de bem-estar; em
outras palavras, é um símbolo adequado da "república", da cidadania e
da realização do ser humano.
Tela "República" de Décio Villares (1851-1831), isto é, do mesmo artista que pintou a bandeira nacional republicana. Fonte da imagem: wikipédia. |
Tela "Pátria" de Pedro Bruno (1888-1949); costuma-se afirmar que a família que borda a bandeira é a de Benjamin Constant. Fonte da imagem: wikipédia. |
Augusto Comte (1798-1857), filósofo e sociólogo francês, fundador do Positivismo; suas idéias orientaram a elaboração da bandeira nacional republicana brasileira. Fonte da imagem: wikipédia. |
(Reprodução livre, desde que citada a fonte.)
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