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02 abril 2020

Ângelo Torres: publicação de "O léxico de Augusto Comte"

A Editora Poiesis publicou no dia 31.3 o livro O léxico de Augusto Comte - criptografia e filosofia, de autoria de Ângelo Torres. A obra corresponde à dissertação de mestrado do autor, defendida na Universidade Estadual do Rio de Janeiro (UERJ) em 1997; para essa publicação, manteve-se a formatação original do autor, que faleceu em janeiro de 2019, com quase 92 anos. 

Assim, a publicação contém um prefácio - que, por sua vez, inclui uma pequena autobiografia de Ângelo Torres - e notas de rodapé com a tradução das inúmeras citações em francês e inglês; além disso, o autor previa a inclusão de vários anexos, a maioria dos quais foi incluída (não todos, pois alguns eram extensos índices temáticos, remissivos e onomásticos, cuja publicação era impraticável).

O livro está disponível para venda na Amazon (aqui).

No livro Ângelo Torres dedica-se a examinar - e a explicar - várias características do altamente espefícico estilo de redação do fundador da Religião da Humanidade e do Positivismo, Augusto Comte (1798-1857). A partir disso, Torres examina vários aspectos da filosofia política de Comte, indicando como é que as dificuldades lexicais introduzem importantes camadas de incompreensão em uma filosofia que é profundamente libertária, humana e inclusiva.

Fonte: https://www.amazon.com.br/l%C3%A9xico-Augusto-Comte-criptografia-filosofia-ebook/dp/B08697GDF6/

15 novembro 2019

República: valorizar o ideal, reconhecer e resolver os problemas

Os brasileiros – e isso é algo específico do Brasil – têm um triste hábito: gostam de falar mal de si mesmos.

Por exemplo: hoje se comemora a gloriosa Proclamação da República, em seus 130 anos.

O evento em si mesmo foi um avanço; a República é um regime superior à monarquia. E, aliás, o 
presidencialismo também é superior ao parlamentarismo.

Além de ser um regime concreto, a República é um ideal sociopolítico de ordem e progresso, de inclusão e desenvolvimento, de justiça, respeito e tolerância.

Em vez de comemorarem-se esses valores todos, o que é que se faz no aniversário de 130 anos da República?

Afirma-se que ela é fracassada, que ela não presta, que ela traiu seus ideais... tudo isso dito de maneira “crítica” e “politizada”, supostamente com grande seriedade e profundidade.

Pelo jeito, é bonito falar mal da República. O problema é que o ideal que ela representa é simplesmente jogado fora com essa “criticidade” extremamente ácida. Ora, se a República não presta, não há porque a manter; se não há porque a manter, ela não será mantida.

Entre 1930 e 1937, críticas à República em tudo semelhantes às que se fazem (no dia de) hoje eram difundidas e repetidas. Qual foi o resultado? Revolução em 1930, guerra civil em 1932, golpe autoritário em 1937. A mesmíssima dinâmica entre 1961 e 1964, com os resultados que todos conhecemos. (Isto é, que deveríamos conhecer.)

Aliás, a mesma dinâmica ocorreu em outros países: França, Portugal, Espanha... nesses lugares, as críticas aos problemas concretos das repúblicas levaram ao envenenamento e à morte da República como ideal, resultando em regimes autoritários retrógrados, precedidos ou não por guerras civis. Em tais lugares, a muito, muito custo as liberdades foram reconquistadas, justamente no quadro de repúblicas (com a exceção da Espanha – mas lá a monarquia foi um presente do assassino e psicopata Francisco Franco ao seu pupilo, o futuro rei Juán Carlos II).

Em vez de os brasileiros alegre mas burramente repetirmos que a República é ruim, deveríamos fazer como os estadunidenses sempre fizeram: reconhecer os problemas e as deficiências, mas ao mesmo tempo reafirmar os valores e os ideais, para, a partir disso, buscar as soluções das dificuldades.

20 outubro 2019

Comemoração do nascimento de Benjamin Constant, o Fundador da República Brasileira

No dia 11 de Descartes de 48 (18 de outubro de 1836) - no dia de Vauvenargues - nascia em Niterói (então capital da província do Rio de Janeiro) Benjamin Constant Botelho de Magalhães. Seu nome foi uma homenagem que seu pai rendeu ao pensador liberal franco-suíço Benjamin Constant (1767-1830), falecido alguns anos antes e que produziu algumas reflexões políticas memoráveis, como a famosa conferência pronunciada no Athenée Royal em 1819, Da liberdade dos modernos comparada à dos antigos.


Benjamin Constant Botelho de Magalhães
Fonte: Wikipédia.

Como muitas pessoas de sua época, Benjamin Constant Botelho de Magalhães ingressou no Exército devido às difíceis condições econômicas de sua família, seguindo a carreira técnica como engenheiro e preferindo, acima de tudo, a docência. Participou da Guerra da Tríplice Aliança (a Guerra do Paraguai, 1865-1870) por um curto período de tempo - 1866-1867 -, voltando à Corte devido a problemas de saúde. Durante sua presença no campo de batalha redigiu cartas pessoais em que considerava de maneira bastante negativa a condução da guerra e a atuação do futuro Duque de Caxias.

Foi professor de Matemáticas em diversas escolas superiores, como a Escola Politécnica, onde teve inúmeros alunos ilustres, entre os quais os futuros Diretor e vice-Diretor da Igreja Positivista do Brasil, respectivamente Miguel Lemos (1854-1917) e Raimundo Teixeira Mendes (1855-1927), além do engenheiro e escritor Euclides da Cunha (1866-1909) e do engenheiro militar e indianista Cândido Mariano da Silva Rondon (1865-1958), o "Marechal da Paz".

Chegou a ser tutor dos netos de d. Pedro II. Inteligência brilhante e professor de altíssimas qualidades didáticas, foi aprovado em primeiro em três concursos para o magistério superior; nessas três ocasiões, a despeito de apresentar-se como "sábio", como "cultor das artes e das ciências", como "estadista", o Imperador nomeou para os cargos os candidatos que tinham ficado em segundo lugar, preterindo o mérito docente e intelectual de Benjamin Constant.

Desde cedo perfilhou o Positivismo e a Religião da Humanidade; em suas cartas escritas na frente paraguaia, Benjamin Constant refere-se ao Positivismo como sendo "a minha religião". A modernidade, a clareza, o altruísmo, o republicanismo pregados pelo Positivismo, somados ao caráter honesto e reto de Benjamin Constant levaram a ser altamente respeitado por seus alunos da Escola Militar. Além disso, perfilhava com o Positivismo o combate à escravidão, o que tornava toda sua atuação intelectual motivo de respeito e também de interesse político.

Docência, abolicionismo e republicanismo

Os sacrifícios que os soldados brasileiros fizeram durante a Guerra da Tríplice Aliança foram desprezados pelos governantes após 1870; ao mesmo tempo, o republicanismo e o abolicionismo tornaram-se temas da pauta pública a partir daquela data. O desrespeito do governo ao Exército configurava-se de diversas maneiras: a existência paralela da Guarda Nacional, de caráter civil e miliciano, embora de muito mais prestígio; a vedação à participação política franca dos militares, embora os oficiais fossem constantemente chamados a ocupar cargos públicos; os baixos salários, a falta de preparo e o baixíssimo prestígio do Exército.

Na década de 1880 houve sérios problemas políticos entre os civis e alguns militares que externavam opiniões políticas, no que foi chamado de "Questão Militar". O baixo prestígio geral de que a tropa gozava uniu-a corporativamente e levou os militares paulatinamente a oporem-se ao governo, senão à própria monarquia.

Em 1887 as duas grandes partes do Exército - os "troupiers", a gente sem formação teórica mas habituados à vida militar, e os "doutores", os militares formados nas escolas superiores - criaram em conjunto o Clube Militar, por meio da associação e da amizade pessoal dos dois grandes líderes de cada uma dessas partes: Deodoro da Fonseca, Presidente do Clube, e Benjamin Constant, vice-Presidente da associação. O Clube Militar tornou-se o órgão político do Exército; uma de suas primeiras medidas foi negar o apoio ao escravagismo da monarquia, ao recusar-se a caçar os escravos fugidos.

O papel de liderança intelectual, moral e política levou Benjamin Constant a tornar-se líder do movimento republicano, em especial pondo-se à frente dos cadetes da Escola Militar que ansiavam, justamente, um líder da modernidade, do esclarecimento, do republicanismo, da abolição da escravatura.

Assim, se na manhã de 15 de novembro de 1889 foi Deodoro da Fonseca quem fez a proclamação da República, foi Benjamin Constant quem articulou o movimento, quem convenceu Deodoro, quem evitou a violência.

Deposta a monarquia, Benjamin Constant integrou o governo provisório na pasta da Guerra (novembro de 1889 a março de 1890) e, em seguida, na recém-criada pasta da Instrução Pública (março de 1890 a janeiro de 1891).

Foi um dos principais responsáveis pela separação entre igreja e Estado no Brasil - estabelecida pelo Decreto n. 119-A, de 7 de janeiro de 1890 - e também pela nossa atual bandeira nacional (de autoria de Teixeira Mendes, com arte de Décio Villares) - estabelecida no dia 19 de novembro de 1889.

Morto em 22 de Moisés de 103 (22 de janeiro de 1891), recebeu o título de "Fundador da República Brasileira" pela Constituição de 24 de fevereiro de 1891. Como foi Diretor do Instituto de Meninos Cegos, essa instituição recebeu em 1891 o nome de Instituto Benjamin Constant. Além disso, a casa em que morava no bairro carioca de Santa Tereza virou o Museu Casa de Benjamin Constant. Em 1926 foi inaugurado na Praça da República um monumento em homenagem a Benjamin Constant, de autoria dos artistas positivistas Décio Villares e Eduardo de Sá.


Inauguração do monumento a Benjamin Constant na Praça da República, em 1926.
Fonte original: revista O Malho. Reproduzido de Inventário de Monumentos do Rio de Janeiro (http://inventariodosmonumentosrj.com.br/?iMENU=catalogo&iiCOD=66&iMONU=Benjamim%20Constant).


Importância histórica e legado de Benjamin Constant

Logo após sua morte, Raimundo Teixeira Mendes publicou uma alentada biografia em dois volumes, intitulada Benjamin Constant: esboço de uma apreciação sintetica da vida e da obra do fundador da República Brazileira (disponível aqui) - biografia que, aliás, permanece como a maior e melhor obra sobre a vida de Benjamin Constant até hoje

Observava Teixeira Mendes que Benjamin Constant não era um positivista completo nem seguia sempre as orientações de Augusto Comte, nem mesmo demonstrava a energia necessária em todos os momentos; mas, a despeito desses defeitos, ele mostrou-se à altura das necessidades do momento, em particular em 1889, além de sempre se ter afirmado positivista e adepto da Religião da Humanidade.

De nossa parte, queremos enfatizar que a atuação de Benjamin Constant era positiva e seguia o Positivismo em alguns aspectos centrais, que servem de exemplo até - e mesmo principalmente - nos dias de hoje:

1) afirmava a decadência social do militarismo;

2) afirmava a liberdade de pensamento e de expressão;

3) afirmava a preeminência social, intelectual e moral do pacifismo;

4) afirmava a necessidade da cultura afetiva juntamente com o conhecimento científico e a atividade produtiva.

Em outras palavras, embora devido às suas necessidades materiais fosse um militar de carreira, Benjamin Constant não era militarista e, entendendo o sentido histórico da civilização ocidental, compreendia que o pacifismo e as liberdades de pensamento e de expressão constituem os traços permanentes de nossas sociedades. 

Nesse sentido, por exemplo, propunha a doutrina do soldado-cidadão, em que o soldado deveria antes de mais nada ser um cidadão, um membro produtivo, pacífico e respeitador das leis - ao contrário do que, duas décadas depois, Olavo Bilac proporia, afirmando que os cidadãos deveriam ser soldados. Não é à toa que o ensino de Benjamin Constant tenha sido, depois, ao longo do século XX, combatido ativamente por militares que se revelariam fascistas, golpistas e autoritários - militares como Góes Monteiro, Eurico Gaspar Dutra, Olympio Mourão Filho, Cordeiro de Farias (entre muitos outros), vinculados à "Liga da Defesa Nacional", à revista A Defesa Nacional e, acima de tudo, às missões militares alemãs e francesas.

19 agosto 2019

Raimundo Teixeira Mendes: República pacífica, livre e convergente

Defendida pelos positivistas brasileiros e estrangeiros com clareza e desde sempre, a República é concebida pelo Positivismo como o regime ideal por excelência. Para os positivistas, o regime republicano não é somente, nem principalmente, o regime presidencialista em oposição à monarquia e ao parlamentarismo. Muito mais do que isso, a República é o regime das liberdades e da fraternidade em todos os âmbitos (doméstico, cívico, universal); é o regime que consagra o ser humano e a atividade pacífica, (portanto) convergente e esclarecido pela ciência.

Essas características tornam-se mais relevantes quando comparadas com os regimes militaristas e com as paixões demagógicas. Nesse sentido, o trecho abaixo é exemplar e instrutivo. Ao mesmo tempo ele serve para evidenciar que o Positivismo e os positivistas são e sempre foram pacifistas e que a República é o verdadeiro regime ideal da paz, da convergência e das liberdades.

Esse texto é um pequeno trecho de um opúsculo de 1908, de autoria de Raimundo Teixeira Mendes, vice-Diretor da Igreja Positivista do Brasil, em que ele opõe-se, com base no Positivismo, à lei de sorteio militar, considerando-a um instrumento disfarçado do militarismo e ao mesmo tempo contrária à República e à índole pacífica do povo brasileiro.

(Como o texto é originalmente de 1908, a grafia foi atualizada.)


*   *   *

"[...] Ninguém contesta que a índole do regime republicano reside no predomínio da fraternidade universal, em todas as relações sociais, quer domésticas, quer cívicas, quer planetárias. Esse predomínio conduz logo ao escrupuloso respeito pela liberdade dos homens, sem distinções de raças, de crenças, de fortunas ou de forças etc., a fim de que cada um se dedique, na função que preferir e no lugar que escolher, ao bem geral da Humanidade, servindo à Pátria que herdou dos seus pais ou adotou, graças à Família em cujo seio os seus pendores altruístas recebem o cultivo fundamental, imprescindível à existência social.

Assim, o verdadeiro regime republicano só pode realizar-se plenamente quando a inteligência se concentrar na investigação dos meios capazes de fazer prevalecer a sociabilidade sobre a personalidade e quando a atividade se consagrar exclusivamente à elaboração desses meios, já aperfeiçoando a nossa natureza, já aperfeiçoando a Terra. Em conclusão, o regime republicano supõe a livre preponderância final da poesia, da ciência e da indústria sobre o teologismo, a metafísica e a guerra, que formam a índole preparatória da Humanidade, e que a República aspira [a] substituir".

(Raimundo Teixeira Mendes, Ainda o militarismo perante a política moderna. A propósito da agitação a que está dando lugar a lei do sorteio, Rio de Janeiro, Igreja Positivista do Brasil, fevereiro de 1908, p. 7; série da Igreja Positivista do Brasil, n. 249.)



(Facsímile de Raimundo Teixeira Mendes, Ainda o militarismo perante a política moderna, Rio de Janeiro, Igreja Positivista do Brasil, 1908)


Raimundo Teixeira Mendes

17 março 2017

Dois erros sobre o Positivismo: "autoritarismo", "funcionalismo público"

Em 2008 escrevi um pequeno mas agudo artigo, tratando de dois mitos difundidos a propósito do Positivismo: as idéias de autoritarismo e, vinculada a ela, de "funcionalismo público". Esses mitos são difundidos há muitas décadas, por boa vontade ou com má-fé, por autores de direita e de esquerda, liberais, católicos ou marxistas: em qualquer caso, estão errados. O texto indica esses erros e mostra em que consistem os erros.

Quase dez anos depois de publicado, em termos de teoria política ele mantém-se atual. Mas é em termos dos debates públicos que ele revela-se e afirma-se importante; embora ele dedique-se a refutar erros teóricos, ele sugere concepções aptas a superar os graves problemas políticos por que passa o Brasil desde, pelo menos, o ano de 2013.

N. B.: tendo sido escrito há vários anos, procurei respeitar sua versão original, de modo que não fiz nenhuma atualização nele. O texto foi publicado na Revista Espaço Acadêmico, de Maringá, n. 87, de agosto de 2008.

N. B. 2: em 19.9.2023 realizei uma prédica positiva na Igreja Positivista Virtual, em que abordei novamente o conceito de "funcionários públicos". As anotações que serviram de base para a exposição oral e o vídeo da prédica podem ser vistos aqui: https://filosofiasocialepositivismo.blogspot.com/2023/09/sobre-expressao-funcionarios-publicos.html.

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Dois erros sobre a doutrina política comtiana: 
“autoritarismo” e “funcionalismo público”

Gustavo Biscaia de Lacerda[1]

Resumo: Este artigo comenta dois erros de interpretação bastante comuns a respeito da doutrina política de Augusto Comte: 1) a idéia de que seria ela autoritária e 2) o (mau) uso da expressão “funcionário público”. No primeiro caso, consideramos que não existe autoritarismo, na medida em que as liberdades públicas são resguardadas e incentivadas, dentro do quadro teórico da “liberdade republicana”. No segundo caso, afirmamos que em Comte o “público” não equivale a “estatal”, pois que isso negaria a autonomia da sociedade civil e, avant la lettre, justificaria estados totalitários. Concluímos fazendo algumas considerações a respeito das dificuldades teóricas e estilísticas que a obra comtiana apresenta.

Palavras-chave: Positivismo; Augusto Comte; interpretação; autoritarismo; público; estatal.

Não é nenhum segredo o fato de que o fundador do Positivismo, Augusto Comte, ser um autor pouco lido, a despeito de reputar-se-lhe o caráter de “clássico”. Apesar disso – ou, talvez, devido a isso – abundam as observações críticas a respeito de sua obra, isto é, comentários negativos em que se imputam a Comte as mais variadas opiniões e perspectivas, tão díspares, desencontradas e contraditórias entre si quanto em relação à letra e ao espírito comtianos.

No que se refere à sua doutrina política, dois erros em particular são bastante comuns mas, ao mesmo tempo, são pouco discutidos e problematizados: o Positivismo como “autoritário” e a afirmação de Comte de que, no estado normal, todos os cidadãos deverão ser considerados como “verdadeiros funcionários públicos”. Esses erros são tão mais dignos de exame quanto autores sérios e competentes na análise de outros aspectos da obra comtiana, como Bosi (2007) e Pickering (2007), cometem-nos. Assim, vejamos cada um deles.


I

Comecemos pela segunda questão, que é mais simples de ser analisada, e que se refere à afirmação, presente no livro Discurso sobre o conjunto do Positivismo (COMTE, 1957), segundo a qual no estado normal todos os cidadãos serão “verdadeiros funcionários públicos”.

Inicialmente, temos que determinar o sentido que Augusto Comte dá a essa expressão – e, para isso, é necessário fazer uma referência a alguns traços gerais de sua filosofia da história. Para ele, quando a sociedade ocidental encerrar sua fase de transição das épocas teológico-metafísicas, de caráter absoluto e militaristas, e passar para a positividade, de caráter relativo, pacífico e industrial, todos os cidadãos subordinarão o egoísmo ao altruísmo, buscando a melhoria das condições de vida uns dos outros, em termos materiais, intelectuais e principalmente morais: esse é o “estado normal”. A subordinação do egoísmo ao altruísmo e a dedicação de cada um aos demais não significa o fim do egoísmo, isto é, dos pendores e das preocupações de cada um consigo próprio, mas seu disciplinamento, de modo que cada qual busque servir ao conjunto da sociedade ao mesmo que satisfaz as próprias necessidades individuais. Dessa forma, na medida em que os cidadãos contribuirão para a satisfação de necessidades coletivas, serão como “funcionários públicos”.

“Público”, aí, não equivale a “estatal”; se não produzisse um círculo vicioso, poderíamos simplesmente dizer que “público”, no caso, equivale a... “público”, ou seja, aquilo que é comum a todos. Esse é um problema mais de interpretação que de tradução; para evitar mal-entendidos, talvez pudéssemos sugerir o “público” como sendo “social e democrático”.

Qual o problema com essa expressão? Tomar o “funcionário público” como “funcionário do Estado”. Esse erro tem sua origem lógica em uma interpretação especificamente jurídica da palavra “público”, na medida em que, no Direito, o que se opõe ao “privado” é o “público” cuja representação empírica é apenas e tão-somente o Estado. Assim, essa confusão à partida empobrece tremendamente a análise filosófica e social, pois retira toda verdadeira autonomia da chamada “sociedade civil” e supõe que apenas no Estado ou por meio dele é possível existir uma vida “pública”. Teorizado juridicamente por Hans Kelsen (apud LACERDA NETO, 2004, p. 244), o esquerdista Alfredo Bosi (2007, p. 218) cometeu esse erro, considerando que os “funcionários públicos da era normal” seriam uma justificativa para o aumento do aparelho estatal.

Mas as conseqüências de tal confusão não param aí, pois que dão azo à muito mais séria interpretação de que o Positivismo é a favor de alguma coisa como uma “estatolatria”, quando não simplesmente de um “Estado total”, ou seja, de um totalitarismo. Essa é a versão que o direitista Olavo de Carvalho dá à expressão “funcionário público” em Comte (apud LACERDA NETO, 2004, p. 243-245).

A doutrina comtiana favorece um governo – diríamos um “Estado” – forte, com capacidade de intervenção na sociedade. A esse respeito, o fundador do Positivismo adotava uma recomendação geral: o Estado deve ser o menor possível, de modo a não onerar a sociedade (ao menos, não onerar em demasia). Mas um Estado que seja “o menor possível” não equivale a “Estado mínimo”, conforme defendido pelos liberais. A esse respeito, Comte criticava fortemente os economistas políticos de sua época por erigirem em dogma político a inação e a omissão do Estado em relação aos problemas sociais. Por outro lado, há momentos em que a ação estatal é necessária para estimular e desenvolver aspectos da sociedade, em particular os relacionados à economia e aos problemas econômicos[2]. Mas é importante notar: a ação do governo, no que se refere ao conjunto da sociedade e à economia em particular, é limitada e complementar em relação à “sociedade civil”.

Ao mesmo tempo, Comte estabelecia como característica fundamental do regime político da sociedade positiva a separação entre os poderes Temporal e Espiritual. Veremos novamente esse tema na próxima seção, mas importa notar agora que tal separação tem como conseqüência uma sociedade civil articulada e forte (o poder Espiritual), capaz de fiscalizar o Estado (o poder Temporal).

Dessa forma, não há como reduzir no pensamento comtiano o “público” ao “estatal”, nem, muito menos, deduzir que o “público” em Comte revelaria uma “estatolatria”, um totalitarismo em germe.

Embora tanto Bosi quanto Carvalho tenham cometido o mesmo erro interpretativo, o de Bosi foi menor: seus comentários sobre a expressão foram desenvolvidos, além disso, por uma clara simpatia – no mínimo, por um respeito à letra e ao espírito de Comte. Já no caso de Carvalho, o erro foi maior e pior: sua interpretação, mais extremada, animou-se por um vivo desprezo pelo fundador do Positivismo[3].

II

Passemos à primeira questão que nos propusemos a tratar neste artigo, relativa ao afirmado autoritarismo de Augusto Comte. Essa questão, por apresentar conseqüências maiores e basear-se em pressupostos valorativos mais profundos, requer um tratamento um tanto mais detalhado.

Antes de mais nada, que é ser autoritário? Etimologicamente, autoritário é aquele que faz questão de enfatizar a autoridade nas relações humanas, especialmente nas que assumem aspectos políticos; além disso, essa autoridade é percebida como hierárquica, isto é, deixando claro que os que estão embaixo devem obediência aos que estão acima deles, com o adicional de negar aos primeiros a legitimidade na apresentação de objeções ou reparos à ação dos segundos. Relacionada a essa acepção mas dela distinta, há outra, que se vincula à falta de liberdade: aquele que nega a liberdade de ação e, principalmente, de expressão a outrem é tachado de autoritário.

Nesses termos básicos, a doutrina política de Augusto Comte não é autoritária: embora afirme a validade do princípio da autoridade, fá-lo para contrapor-se aos anarquistas, àqueles que negam a validade de qualquer autoridade, de qualquer governo. Ora, para um anarquista, qualquer governo é, por definição, autoritário; por essa mesma senda seguiram os “libertários” dos anos 1960 e 1970, que, revoltando-se contra “o que está aí”, afirmavam que todo governo, qua governo, é opressivo: a obra política de Michel Foucault é um bom exemplo disso. Mas esses casos são extremos e, de modo geral, a Teoria Política não considera que a mera autoridade dos governos seja fator de autoritarismo; para comprovar essa idéia, basta pensar a contrario: um governo sem autoridade é percebido como um governo fraco e incapaz de ação – portanto, um governo inútil.

Entretanto, é necessário complementar essas observações com o elemento de liberdade que se deve associar à autoridade. Um governo que não aceite, nem de facto nem de jure, as diversas liberdades, é considerado autoritário. Quais são as “diversas liberdades”? Basicamente, as chamadas civis e políticas, ou seja, as relativas às capacidades dos cidadãos de professarem as idéias e as fés que desejarem, expressarem-se conforme considerarem correto e adequado, de irem e virem; também as relativas às possibilidades de associarem-se, realizarem manifestações públicas e “ações coletivas”. (Deixamos de lado as liberdades econômicas pois consideramos que, de um lado, elas estão subsumidas nas civis e políticas e, por outro lado, os governos chamados de autoritários somente o são em termos econômicos quando a burguesia não mais aceita a ação econômica do Estado.) No que se refere a essas liberdades, Comte era explícito e enfático: não há que se as limitar.

Uma análise bastante refinada do conceito de liberdade foi elaborado em meados do século XX por Isaiah Berlin, retomando em termos estritamente políticos uma distinção sociopolítica elaborada quase um século e meio antes pelo primeiro Benjamin Constant; Berlin separava a liberdade positiva e a negativa. Enquanto a primeira consiste em ser livre no Estado, a outro consiste em ser livre do Estado. O sentido da “liberdade” que apresentamos no parágrafo acima é o da liberdade negativa: os cidadãos não são impedidos pelo Estado de agirem como considerarem correto ou, mais diretamente, de simplesmente agirem. A liberdade positiva consiste em os cidadãos exercerem e realizarem sua autonomia decisória por meio de sua participação direta na formulação das políticas de Estado. Embora não haja, do ponto de vista lógico, uma verdadeira oposição entre uma e outra, o fato é que elas correspondem a tipos diferentes de sociedades e arranjos políticos – nisso consistindo a exposição de B. Constant: a liberdade negativa é característica das sociedades modernas, de caráter industrial e dedicadas à produção de bens, com grandes contingentes de trabalhadores livres organizados em fábricas; a liberdade positiva era característica das sociedades antigas – Grécia e Roma –, de pequena extensão territorial, voltadas para a conquista militar e em que o número de cidadãos (isto é, de indivíduos livres e capacitados pela leis a integrar a vida política) era pequeno e, portanto, era fácil e simples reunir o corpo político[4].

Mais recentemente, a Teoria Política formulou um terceiro tipo de liberdade, a “republicana”. Fruto da lucubrações de Phillip Pettit, a “liberdade republicana” prevê que um cidadão somente é livre no quadro de uma república, isto é, de um governo que não o domine, não interfira em sua vida de maneira arbitrária. Na liberdade republicana, ao contrário dos defensores da liberdade negativa – como o próprio Berlin –, o problema não consiste na interferência do Estado na vida dos cidadão, pois ela fatalmente ocorre e é mesmo necessária; a grande questão é que essa interferência não seja arbitrária. A fim de garantir a não-arbitrariedade, uma república prevê e exige a participação dos cidadãos no sentido de fiscalizar o Estado, tendo para isso os canais necessários: esse é o próprio conceito de accountability. Não sendo uma liberdade negativa, a liberdade republicana também não é positiva, pois afasta a participação direta e contínua dos cidadãos na formulação das políticas de Estado.

Retornando ao tema do autoritarismo: deixando de lado a idéia de que todo governo, por definição, é autoritário, é necessário perceber o autoritarismo como uma limitação da liberdade. Já vimos que Augusto Comte no mínimo aceitava em termos gerais a liberdade negativa: mas e quanto às outras duas liberdades, a positiva e a republicana?

Comte rejeitava a participação direta da massa de cidadãos – por ele equiparada, em termos numéricos, ao proletariado – no governo, embora aceitasse e mesmo propugnasse a condução do governo por proletários tomados individualmente. Por outro lado, afirmava que o governo deveria ser fiscalizado por órgãos da sociedade; essa fiscalização, além do ato de verificar os projetos governamentais no dia-a-dia (sugerindo mesmo alterações ou supressões de projetos), subentende um elemento de legitimação: um governo que não passe no teste contínuo do escrutínio público perderá sua legitimidade, com as conseqüências naturais disso. Detalhe: esse escrutínio deve ser feito pela sociedade, não pelo Estado, ou seja, deve ser feito por um órgão externo ao governo[5]. Isso significa duas coisas: em primeiro lugar, a fiscalização do governo deve realizar-se pela opinião pública, organizada pelo que Augusto Comte chamava de “sacerdócio” e secundada pelos proletários e pelas mulheres; em termos atuais, para Comte a fiscalização do Estado deveria realizar-se por uma sociedade civil organizada e forte[6] – é um dos sentidos profundos da “separação entre os poderes Temporal e Espiritual”. Em segundo lugar, Comte rejeitava a utilidade dos parlamentos como órgãos de representação, de fiscalização e de formulação de políticas públicas; em outras palavras, os parlamentos deveriam ser apenas câmaras orçamentárias[7], não governamentais em sentido estrito.

Em suma: à exceção do fim dos parlamentos, a proposta de Comte é a própria liberdade republicana, que é tão “liberdade” quanto qualquer outra “liberdade” tomada no sentido comum. Dessa forma, não há autoritarismo no projeto político de Comte.

Mesmo assim, é necessário determinar a origem da acusação de um Comte autoritário: em que consistiria o autoritarismo comtiano? Por um lado, já vimos que isso se deve à afirmação de Comte de que o Estado deve ser forte. Embora essa mesma postulação seja também feita pelos regimes que correntemente chamamos de “autoritários”, essa afirmação em si não implica nada: regimes democráticos – isto é, aqueles que, como o proposto por Augusto Comte, celebram e realizam as diversas liberdades – também exigem “estados fortes”. No fim das contas, não é necessário despender muito tempo comentando como essa afirmação é, na melhor das hipóteses, simplesmente gratuita.

Mas o grosso do argumento a favor do suposto autoritarismo comtiano reside em uma confusão teórica e histórica relativa ao papel dos parlamentos nas chamadas democracias contemporâneas[8]. Comte era muito claro a respeito: ele rejeitava os parlamentos, afirmando que eles são instituições próprias ao conflito entre as monarquias e as aristocracias, em particular a inglesa: afinal, na Inglaterra o parlamento foi o instrumento utilizado para submeter – e, ao final, neutralizar – o rei em benefício da aristocracia, com o apoio da burguesia. O parlamento, dessa forma, representa a manutenção do sistema de castas – que dá origem à aristocracia – e a mistura de duas formas opostas de pensar, a teológica (com a monarquia, que é de direito divino) e a metafísica (com a idéia de soberania popular). Para Comte, embora afirme-se correntemente que foi a instituição do parlamento como órgão governativo que permitiu as liberdades civis e políticas, isso não passa de um sofisma do ponto de vista sociológico e teórico: o que realmente garantiu as liberdades na Inglaterra foi o escrutínio público, realizado pela opinião pública – a partir do fim da Idade Média inglesa consubstanciado temporariamente na aristocracia –, que as garantiu.

A questão é saber se a existência do parlamento é garantia real das liberdades públicas. A pesquisa histórica, todavia, não aponta correlação positiva entre parlamento e liberdades públicas: parlamentos podem coexistir com a inocorrência das liberdades públicas, com a coibição dessas liberdades e – o que é a regra, em se tratando de parlamentos – podem também ser fonte de corrupção política, econômica e social, além de serem geralmente órgãos simplesmente inúteis[9].

Disso tudo resulta que o famoso autoritarismo comtiano na verdade é um sofisma, um mito, ou melhor, uma difamação demagógica de quem considera os parlamentos ou a atuação direta do “povo” no governo são as únicas e, principalmente, as mais eficazes formas de garantir as liberdades públicas.

III

Talvez algumas palavras a respeito da obra comtiana sejam interessantes.

Comte observava os movimentos opostos, profundamente daninhos ao conjunto da sociedade, dos retrógrados – que, de extração católica, enfatizavam a importância da ordem social –, e dos revolucionários – que, de extração rousseauniana, negavam as instituições sociais em nome da liberdade e da igualdade. Para criar uma síntese original, respeitando o “conjunto do passado”, isto é, reconhecendo a legitimidade das reivindicações de cada um desses grupos, ao mesmo tempo que as ultrapassando, afirmou a necessidade e a possibilidade de realizar um regime sociopolítico de “Ordem e Progresso”. Essa síntese é marcada por uma dupla originalidade, que consiste, por um lado, na originalidade que todo pensador possui, a par de sua agência humana (cf. BEVIR, 2002); por outro lado, ao contrário do que afirmou Habermas (1982, p. 93-94), a obra de Comte não é uma colcha de retalhos, uma espécie de ecletismo teórica e metodologicamente incoerente como o de Victor Cousin: a obra de Comte de fato integra as perspectivas opostas, reconhecendo-lhe os méritos e as deficiências e criando uma nova teoria, que ultrapassa as anteriores.

Pois bem: essa síntese original, ao unir elementos da “direita” e da “esquerda”, sujeita-se ao ataque de ambos os lados, seja porque ela não representa “adequadamente” as opiniões de cada um dos pólos, seja porque representa para um pólo as opiniões do pólo oposto.

Mas há um problema extra. Temos procurado indicar (LACERDA, 2007; 2008) de que maneira a lógica profunda do pensamento comtiano não segue a do senso comum, na medida em que este é igualitário e individualista e a de Comte é englobante (conforme as definições de Louis Dumont (1992; 1995)). Dessa forma, abordar os textos do fundador do Positivismo sem maiores cuidados metodológicos – ou mesmo animado por um espírito de animadversão a seu respeito – tem por resultado erros como os indicados aqui.

Além disso, o estilo de escrita comtiano – sintético e denso – era marcado por idiossincrasias, que Ângelo Torres (1997) chamou de “criptografias”. Some-se a lógica englobante ao estilo “criptográfico” e teremos facilmente interpretações – como se viu, errôneas, mas mais ou menos bem-intencionadas – que tomam no senso comum o que deve ser percebido dentro do específico espírito da obra de Comte.

Jeffrey Alexander (1996) definiu como “clássico” o autor capaz de apresentar às sucessivas gerações de pensadores e pesquisadores um conjunto de modelos e sugestões teóricos e metodológicos, intuições, valores e interpretações; é claro que, para fornecer essa riqueza intelectual e moral é necessário que o clássico seja no mínimo lido.

Por seu turno, Mark Bevir (1994) estabeleceu que as interpretações das obras dos autores e o desenvolvimento de hipóteses e teorias têm que ser “progressistas”, ou seja, têm que ter, entre várias outras características, a abertura, a “afirmatividade” e a “compreensibilidade”, ou seja, têm que estar abertas à crítica e ao aperfeiçoamento, têm que mais afirmar que refutar afirmações diversas e, por fim, têm que ampliar cada vez mais o escopo de fatos explicados e interpretados.

No que se refere a Comte, o uso de sua obra como um “clássico” em uma pesquisa “progressista” foi recentemente feita por Steiner (2008). Apesar disso, o fundador do Positivismo não é de modo geral lido e sua serventia consiste muito mais em ser um espantalho para linchamento em praça pública que em uma referência intelectual efetiva. Está mais do que na hora de tornar Augusto Comte um “clássico” no sentido verdadeiro e profundo da expressão – em um sentido... “progressista”.

Referências

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[1] Gustavo Biscaia de Lacerda (gblacerda@ufpr.br) é doutorando em Sociologia Política na Universidade Federal de Santa Catarina, sociólogo da Universidade Federal do Paraná, editor da Revista de Sociologia e Política e de Política & Sociedade e bolsista do CNPq.

[2] Ora, essa é precisamente a mesma posição de teóricos (e práticos) atuais da “reforma do Estado”: cf. Bresser Pereira (2005); Bresser Pereira e Pacheco (2005)e Nóbrega (2005).

[3]Pode-se encontrar um desprezo semelhante, mas a partir de uma perspectiva marxista, em Benoit (1999).

[4] Uma particularidade: embora a teoria política grega – bem entendido: ateniense, no período clássico, de Péricles – previsse e realizasse a plena igualdade dos cidadãos na magistratura por meio do sorteio, para os assuntos que realmente importavam, ou seja, a realização das guerras não havia “democracia”, não havia “liberdade positiva”, mas a ação de generais reconhecidos e respeitados como capazes e competentes.

[5] O Brasil, desde a promulgação da Constituição de 1988, possui um órgão estatal estritamente dedicado à fiscalização pública, que é o Ministério Público e cuja atuação é por todos reconhecida como importante, “republicana” e “democrática”. Evidentemente, seria um anacronismo caso condenássemos Comte por não pensar em uma instituição desse tipo, mas, considerando suas idéias e suas opiniões, é lícito supor que a aplaudisse.

[6] Embora utilizemos aqui a expressão “sociedade civil organizada e forte”, também poderíamos usar outra: a habermasiana “esfera pública”, que foi objeto de detida análise por Pickering (2007).

[7] Para os ciosos da importância política dos parlamentos, a sua atuação como câmaras orçamentárias não deve ser diminuído, devido ao caráter absolutamente estratégico, em termos políticos, que tem a peça orçamentária para qualquer governo. Nesse sentido, aliás, manifestou-se Delfim Netto (2007). Por fim: a proposta de “orçamento participativo”, do Partido dos Trabalhadores, não é estrangeira às preocupações de Comte (cf. SOUZA, 2001).

[8] Um claro exemplo disso pode ser visto em Franco (2007).

[9] Isso é o que se percebe na atuação generalizada dos parlamentares dos três níveis de governo (no caso brasileiro) que apresentam projetos sem sentido apenas para terem “produção legislativa”; no que se refere às câmaras de vereadores e às assembléias legislativas, a regra é a apresentação de projetos de homenagem a personalidades e instituições variadas. Nada disso parece propriamente útil, defensor das liberdades públicas ou função do governo.