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26 dezembro 2023

Augusto Comte: triplo ofício da arte e resumo da teoria positivista da arte


“A principal função da arte consiste sempre em construir os tipos de que a ciência fornece as bases. Ora, essa operação é sobretudo indispensável para a inauguração do novo regime. Quando a filosofia tiver elaborado suficientemente as suas diversas concepções essenciais, elas permanecerão ainda demasiadamente indeterminadas para bastarem ao seu destino prático. Afinal, o estudo sistemático do passado não pode fornecer-nos diretamente senão o caráter geral do porvir. Mesmo a respeito dos menores fenômenos, a determinação científica não poderia tornar-se completa sem ultrapassar os limites próprios à verdadeira demonstração. Nas pesquisas sociológicas, seus resultados devem então se manter mais abaixo do grau de plenitude, de clareza e de precisão que exigem noções destinadas à mais familiar universalidade. É então à poesia que convém preencher as inevitáveis lacunas da filosofia para inspirar a política. No começo do politeísmo, ela já realizou esse ofício natural em relação às criações imperfeitas da teologia sistemática. Pertence-lhe ainda mais completar uma apreciação objetiva em que a imaginação participa menos. Na conclusão geral deste discurso[1], eu indicarei mais essa indispensável função poética no tema da concepção central do Positivismo. O leitor poderá desde então estender a mesma explicação a todos os outros casos principais.

Para cumprir esse grande ofício, a arte positivista encontrar-se-á naturalmente conduzida a oferecer-nos quadros antecipados da regeneração humana, apreciada sob todos os aspectos suscetíveis de idealização. Essa será sua segunda cooperação geral para o impulso renovador, ao desenvolver sua participação inicial. No fundo, esse novo ofício reduz-se a regularizar as utopias, subordinando sempre a idealidade à realidade, como em toda outra composição poética. A liberdade especulativa que parece proporcionar-lhe a anarquia atual acaba restringindo bastante seu desenvolvimento efetivo, conforme os medos de divagação que ela inspira mesmo aos mais sonhadores, cujos espíritos não poderiam tornar-se insensíveis às necessidades comuns de harmonia mental. Mas, quando o domínio da imaginação limita-se em desenvolver e vivificar o da razão, os mais austeros pensadores sofrem de bom grado um encanto que, longe de alterar a realidade, não faz senão melhor sobressair sua principal característica, bem pouco determinada pela ciência. Assim, ao assinalar às utopias sua verdadeira destinação, o Positivismo estimulará bastante esse gênero moderno de composições poéticas, que, sob a inspiração sociológica, pode tanto concorrer para impulsionar o conjunto do povo ocidental em direção ao estado normal da humanidade. Os cinco modos estéticos[2] participarão todos desse salutar impulso, ao fazer-nos apreciar, antecipadamente, conforme a idealização própria a cada um deles, os encantos e a grandeza da nova existência, pessoal, doméstica e social.

Essa segunda assistência geral da arte na grande reconstrução suscitará naturalmente uma terceira, cuja necessidade não é menor hoje, para terminar de livrar [détacher] os ocidentais dos vãos destroços do passado que impedem de sentir o futuro. Bastará dar uma direção comparativa aos quadros antecipados que venho indicando. Depois do início da transição moderna, no século XIV, a arte é sobretudo desenvolvida sob uma intenção crítica[3], que entretanto convém pouco à sua natureza eminentemente sintética. Seu desenvolvimento orgânico pode então conciliar-se plenamente com a luta secundária que exige ainda a situação atual em relação às opiniões, e sobretudo os hábitos, que permanecem do regime caído ou da fase transitória. Essa comoção complementar, relativa às mais íntimas raízes do passado, alterará tanto menos a grande missão da arte positivista que ela realizar-se-á sem jamais exigir uma crítica direta. Nem em relação à teologia, nem somente quanto à metafísica, não termos doravante necessidade de nenhuma discussão, mesmo filosófica, e, com mais forte razão, poética. Tudo reduz-se agora a uma simples concorrência, o mais freqüentemente implícita, entre os modos opostos segundo os quais o catolicismo e os positivistas correspondem às mesmas necessidades morais e sociais. Ora, esse ofício assessório, cujas bases científicas já foram postas, é sobretudo da alçada da arte, pois que ele deve dirigir-se mais ao sentimento que à razão. Eu já indiquei o seu caso mais característico, no fim da quarta parte[4], para a nobre cooperação que reservava à minha santa colega[5] em relação à iniciação positivista de nossas duas populações meridionais[6], principalmente devida à intervenção estética das mulheres.

Nessa terceira função social, a nova poesia religará diretamente sua missão atual ao seu ofício final, ao idealizar o passado, como esta última o futuro. Afinal, o advento do Positivismo exige, a todos os respeitos, uma escrupulosa justiça em relação ao catolicismo. Longe de atenuar o mérito moral e político do regime próprio à Idade Média, a poesia, guiada pela filosofia, deverá inicialmente o glorificar dignamente, a fim de melhor caracterizar a superioridade necessária da ordem final. Ela constituirá, assim, o prelúdio de seu dever normal de reanimar o passado, cujo vínculo natural com o futuro deve tornar-se profundamente familiar, no interesse simultâneo da razão sistemática e do sentimento social.

Ainda que próximo, esse triplo ofício, por meio do qual a arte positivista inaugurará sua incorporação à ordem final, não poderá ser imediato, pois ele exige uma preparação filosófica que não foi ainda realizada, nem pelo público ocidental, nem por seus órgãos estéticos. A geração pacífica que começa, na França, a segunda parte da grande revolução, pode fazer livremente prevalecer o Positivismo, não somente entre os verdadeiros pensadores, mas também entre o povo parisiense encarregado dos comuns destinos do Ocidente, e mesmo entre as mulheres melhor dispostas. Elevada por esse impulso, a geração seguinte poderá então, antes do fim do século iniciado pela Convenção[7], completar espontaneamente essa inauguração mental e moral ao manifestar o novo caráter estético da humanidade regenerada.

 

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O conjunto desta quinta e última[8] parte representa diretamente a filosofia positiva como mais favorável que qualquer outra ao desenvolvimento contínuo de todas as belas-artes. Uma doutrina que chama a humanidade ao aperfeiçoamento universal deveria incorporar-se profundamente a especulações as mais próprias a desenvolver o nosso instinto da perfeição. Ela não os subordina ao estudo sistemático da realidade senão para fornecer à idealidade uma base objetiva, indispensável à sua consistência e à sua dignidade. Mas, assim constituídas, as funções estéticas convêm mais que as funções científicas, seja à natureza e ao alcance da nossa inteligência, seja sobretudo ao seu destino essencial, a organização da natureza humana; pois elas referem-se imediatamente ao princípio afetivo dessa sistematização. Após a cultura direta do sentimento, é a arte que pode habitualmente fornecer os melhores meios para tornar-nos ao mesmo tempo mais ternos e mais nobres.

Sua reação lógica deve mesmo aperfeiçoar nossa aptidão sistemática, ao familiarizar-nos cedo com as verdadeiras características de toda construção humana. A ciência pôde durante longo tempo preferir o regime analítico; ao passo que, mesmo em meio à sua anarquia, a arte visa sempre à síntese, objetivo necessário de todas as nossas contemplações. Quando, contra a sua natureza, ele trabalha para destruir, sua obra qualquer não se realiza ainda senão construindo. O gosto e o hábito das construções estéticas devem assim nos dispor a melhor construir sobre o solo mais refratário da realidade.

Por todos esses títulos, a arte, dirigida pelo sentimento, torna-se, para o Positivismo, a principal base da educação universal, em que a ciência não preside em seguida senão a uma indispensável sistematização objetiva. A vida ativa completa essa preponderância inicial ao imprimir um caráter mais estético que científico às funções regulares do poder moderador[9]. Os três elementos necessários da força moral[10] tornam-se assim os órgãos espontâneos da idealização, doravante inseparável da sistematização.

Uma tal fusão obriga os novos filósofos a sentir profundamente todas as belas-artes. Ainda que habitualmente passiva, essa aptidão deverá poder elevar-se, entre os principais dentre eles, à mais sublime atividade, nas idades de intermitência filosófica e de vivacidade poética. Sem esse difícil complemento, seu ofício não poderia obter o livre ascendente moral que comporta sua natureza e que exige sua destinação. O padre da Humanidade não desenvolverá sua superioridade necessária sobre o padre de Deus senão quando sua razão sistemática combinar-se dignamente com o entusiasmo do poeta comum como com a simpatia feminina e a energia proletária.”

 

Fonte: Augusto Comte. 1929. Aptitude estéthique du Positivisme. In: _____. Discours préliminaire sur l’ensemble du Positivisme[11]. 5e ed. Paris: Société Positiviste, p. 315-320. Tradução de Gustavo Biscaia de Lacerda.



[1] A referência é ao Discurso sobre o conjunto do Positivismo, de que o presente trecho integra o capítulo quinto e antepenúltimo. (Nota do tradutor.)

[2] Os cinco modos estéticos são, conforme o princípio de classificação (generalidade decrescente, particularidade crescente): poesia, música, pintura, escultura e arquitetura. (NT.)

[3] A palavra “crítica” é usada aqui no sentido de “destruidora”, “corrosiva”, conforme o sentido da “metafísica” para Augusto Comte. A esse respeito, cf. Gustavo Biscaia de Lacerda, “O Positivismo e o conceito de ‘metafísica’” (https://filosofiasocialepositivismo.blogspot.com/2011/03/o-positivismo-e-o-conceito-de.html).

[4] Referência ao capítulo quarto do Discurso preliminar sobre o conjunto do Positivismo, intitulado “Influência feminina do Positivismo”.

Talvez valha a pena indicarmos os títulos dos capítulos desse livro em sua edição de 1851, que é um verdadeiro “manifesto positivista” e uma exposição geral da doutrina e da religião:

- Preâmbulo geral

- Primeira parte: espírito fundamental do Positivismo

- Segunda parte: destinação social do Positivismo [, conforme sua conexão necessária com o conjunto da grande revolução ocidental]

- Terceira parte: eficácia popular do Positivismo

- Quarta parte: influência feminina do Positivismo

- Quinta parte: aptidão estética do Positivismo

- Conclusão geral do discurso preliminar [do discurso sobre o conjunto]: Religião da Humanidade

Os trechos entre colchetes referem-se aos subtítulos presentes na versão original do livro, publicada em 1848. (NT.)

[5] Referência a Clotilde de Vaux (1815-1846). (NT.)

[6] Referência à Espanha (e Portugal) e à Itália. (NT.)

[7] Referência à Convenção Nacional, fase da Revolução Francesa vigente entre 1792 e 1795, durante a qual, para Augusto Comte, após os momentos decisivamente destruidores do Antigo Regime próprios à Assembléia Nacional (1789-1792), desenvolveram-se os episódios mais progressistas da Revolução, em particular sob a liderança de Georges Danton (1759-1794). Evidentemente, o “século iniciado pela Convenção” é o século XIX. Sobre a avaliação positivista da Revolução Francesa e sobre o conceito de “estado normal”, bem como, de modo geral, para a filosofia positivista da história, cf. Augusto Comte, Catecismo positivista (Rio de Janeiro, Igreja Positivista do Brasil, 1934) e Apelo aos conservadores (Rio de Janeiro, Igreja Positivista do Brasil, 1899), além de Gustavo Biscaia de Lacerda, O momento comtiano (Curitiba, UFPR, 2019). (NT.)

[8] Augusto Comte refere-se ao capítulo quinto como sendo o “último”: é o último antes do capítulo final, intitulado “Conclusão geral” (e que, aliás, apresenta pela primeira vez os conceitos de “Humanidade” e de “religião da Humanidade”). (NT.)

[9] Referência ao poder Espiritual, que modifica a conduta de indivíduos e grupos via aconselhamento; ele contrapõe-se de maneira complementar ao poder Temporal, que modifica a conduta de indivíduos e grupos via coerção. Para mais detalhes, cf. os já citados Augusto Comte, Catecismo positivista e Apelo aos conservadores, além de Gustavo Lacerda, O momento comtiano. (NT.)

[10] Os três elementos componentes da força moral (isto é, do poder Espiritual) são: o sacerdócio, de caráter intelectual; o proletariado, de caráter prático; as mulheres, de caráter afetivo. Eles são abordados respectivamente nos capítulos dois, três e quatro do Discurso sobre o conjunto do Positivismo. (NT.)

[11] O Discurso sobre o conjunto do Positivismo foi originalmente publicado em 1848 e, com alterações tópicas, inserido em 1851 como apresentação geral do volume primeiro do Sistema de política positiva. (NT.)

29 outubro 2023

Augusto Comte: a arte idealiza (e enaltece) o que a ciência explica

Augusto Comte: trecho de “Aptidão estética do Positivismo”

O trecho abaixo corresponde à tradução, a partir do original em francês, das páginas 279 a 284 da quinta parte do Discurso preliminar sobre o conjunto do Positivismo, intitulada “Aptidão estética do Positivismo”. Esse trecho está faltando na edição digitalizada e publicada no portal Internet Archive (https://archive.org/details/augusto-comte-aptidao-estetica-do-positivismo) em setembro de 2023. Por sua vez, essa edição é a tradução brasileira do referido capítulo do Discurso, feita em 1949 por F. A. Machado da Silva; as páginas faltantes nessa edição brasileira vão da 9 à 12. Tradução de Gustavo Biscaia de Lacerda.

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Tal é a filiação histórica que ao mesmo tempo explica e refuta as utopias anárquicas de nosso século sobre uma espécie de pedantocracia estética. Esses sonhos de um orgulho sem freio não podem tornar-se especiosos senão entre espíritos metafísicos, sempre inclinados à consagração absoluta dos casos excepcionais. Se os filósofos devem ser excluídos do comando, os poetas são-lhe ainda menos próprios. Sua versatilidade mental e moral, que os dispõem a melhor refletir o meio correspondente, interdita-lhes mais toda autoridade diretiva. Apenas uma severa educação sistemática pode conter o suficiente seus vícios naturais, que devem então ser bastante desenvolvidos em um tempo estrangeiro a toda convicção profunda. Membros assessórios do poder intelectual, os poetas não podem seguir sua vocação normal senão ao renunciarem à supremacia temporal ainda mais completamente que os membros principais. Os filósofos não são impróprios senão para a ação, mas as consultas convêm-lhes; ao passo que os poetas não devem, em geral, pretender mais um que a outra. Idealizar e estimular, tal é seu duplo ofício natural, que não se realiza dignamente senão conforme uma concentração exclusiva. Essa função é assaz nobre e assaz estendida para absorver todos os que se encontram verdadeiramente destinados a ela. Da mesma forma, esses desvios de conduta da ambição estética não surgiram plenamente senão depois do advento passageiro de uma situação incompatível com a arte verdadeira, falta de costumes pronunciados e de convicções reais. Todos esses poetas falhos ou equivocados dariam um outro curso à sua vida pública se a verdadeira poesia estivesse já tornada possível, por meio da preponderância de uma doutrina universal e de uma direção social. Até um tal resultado, as naturezas estéticas continuarão a estender-se ou a corromper-se em uma miserável agitação política, mais favorável às mediocridades especiosas que às superioridades reais.

O estado normal da natureza humana subordina tanto a imaginação à razão quanto esta ao sentimento. Toda inversão prolongada dessa ordem fundamental é igualmente funesta para o coração e para o espírito. O pretendido reino da imaginação tornar-se-ia ainda mais corruptor que o da razão, se ele não fosse ainda menos compatível com as condições reais da humanidade. Mas, ainda que quimérica, apenas sua busca pode atrapalhar bastante a existência privada, ao substituir por uma exaltação falsa, e com grande freqüência mentirosa, as emoções espontâneas e profundas. Com mais forte razão, essa viciosa preponderância da imaginação deve alterar a vida pública, quando nenhuma barreira social contém mais as ambições estéticas. A arte tende então a perder sua verdadeira destinação de encantar e melhorar a humanidade. Tornada o objetivo da existência, ela degradar-se-ia logo, ao desmoralizar ao mesmo tempo seus órgãos e seu público. Ela reduzir-se-ia cada vez mais aos seus ornatos sensuais, ou mesmo às dificuldades técnicas, sem nenhuma tendência moral. As inclinações estéticas, que, dignamente subordinadas, tanto aperfeiçoaram os costumes modernos, podem tornar-se profundamente corruptoras por seu ilegítimo ascendente. Sabe-se a que prática atroz a Itália foi conduzida, durante muitos séculos, com o objetivo único de embelezar as vozes masculinas. Assim degenerada, a arte, tão própria a desenvolver os instintos simpáticos, pode diretamente suscitar o mais abjeto egoísmo, provocando uma inteira indiferença social, entre aqueles que assumiram como sua principal felicidade o gostar de sons ou de formas. Tal é o íntimo perigo, ainda mais moral que mental, inerente à preponderância privada, e sobretudo pública, das inclinações estéticas, mesmo quando elas são reais. Mas também é necessário reconhecer que essa violação da ordem fundamental conduz logo ao inevitável triunfo das mediocridades, entre aqueles que um longo exercício desenvolve facilmente a habilidade de execução.

É assim que gradualmente caímos sob a vergonhosa dominação, não menos funesta à arte que à filosofia e à moral, das influências evidentemente votadas à subordinação social. Uma deplorável aptidão para exprimir o que não se sente nem se crê fornece hoje um ascendente efêmero a talentos tão incapazes de toda criação estética quanto de toda concepção científica. Essa anomalia política, principal característica de nossa situação revolucionária, deve tornar-se moralmente desastrosa quando esses triunfos imerecidos não ecoem mais, seguindo uma rara exceção, nas almas elevadas para conter-lhes com freqüência o vicioso impulso. Conforme sua maior generalidade, que lhes permite uma ambição mais alta, os poetas são mais expostos a esses perigos que os artistas propriamente ditos. Mas a cultura das artes especiais reproduz esse mal sob uma outra forma, ainda mais degradante, pela avidez pecuniária que macula hoje tantos talentos. É sobretudo aí que a ausência de toda regra deixa ingenuamente surgir uma vaidade pueril que doravante aplica o mesmo título habitual aos verdadeiros criadores estéticos e aos simples órgãos das produções alheias.

Tais são os resultados necessários do gradual desvio de conduta das ambições poéticas durante a longa transição moderna. Eu deveria caracterizar aqui sem hesitação as aberrações que impedem hoje toda sã apreciação da natureza e da destinação da arte. Mas esse severo preâmbulo não poderia chocar as almas verdadeiramente estéticas, já pessoalmente dispostas a sentir o quanto o regime atual contraria toda vocação real. Malgrado declamações interessadas, o verdadeiro desenvolvimento da arte exige pelo menos tanto a compressão das mediocridades quanto o encorajamento das superioridades. O verdadeiro gosto não existe nunca sem o desgosto. É exatamente por que a arte deve sobretudo desenvolver em nós o instinto familiar da perfeição, seus sinceros apreciadores ficam vivamente chocados com toda fraca produção. O feliz privilégio das obras-primas de suscitar uma admiração que os séculos não amenizam preserva-nos da pretensa necessidade de entreter o gosto com novidades que se alteram. Se eu ouso invocar aqui minhas próprias impressões, eu posso declarar que, após 13 anos, pela razão tanto quanto por inclinação, eu reduzi minhas leituras habituais aos grandes poetas ocidentais, sem provar a menor curiosidade a respeito dos produtos cotidianos de uma deplorável fecundidade.

Após essa retificação preliminar, é necessário caracterizar diretamente a aptidão estética do Positivismo, indicando inicialmente como ele constrói naturalmente a verdadeira teoria geral da arte, limitada até aqui a felizes vistas parciais. Tal sistematização estética resulta ao mesmo tempo do princípio subjetivo, do dogma objetivo e do fim ativo, atribuídos à nova filosofia nas duas primeiras partes deste discurso.

A arte consiste sempre em uma representação ideal do que é, destinada a cultivar nosso instinto da perfeição. Seu domínio então é tão estendido quanto o da ciência. Cada uma delas abarca, à sua maneira, o conjunto das realidades, que uma aprecia e a outra embeleza. Suas contemplações respectivas seguem o mesmo curso natural, conforme a minha lei enciclopédica, elevando-se das especulações mais simples e mais exteriores às mais complicadas e mais humanas. Assim, essa escala fundamental do verdadeiro, que nós reconhecemos, na segunda parte, constituir também a do bom, coincide ainda com a do belo, de maneira a estabelecer a mais íntima harmonia entre as três grandes criações da humanidade, a filosofia, a política e a poesia. Com efeito, é o espetáculo inorgânico, sobretudo celeste, que nos manifesta os primeiros caracteres da beleza, da ordem e da grandeza, ali melhor cognoscíveis que em relação aos fenômenos mais complexos e menos regulares. Os graus superiores do belo não poderiam ser verdadeiramente apreciados pelas almas insensíveis a esse grau inicial. Mas, se a filosofia não considera o estudo inorgânico senão como um indispensável preâmbulo para elevar-se à sua destinação humana, a poesia deve ainda mais proceder assim. Sua tendência é mesmo mais pronunciada, a esse respeito, que a da política, que, limitada inicialmente ao aperfeiçoamento material, limita-se por muito tempo ao aperfeiçoamento físico, e em seguida intelectual, antes de subir diretamente ao seu objetivo principal, o aperfeiçoamento moral. A poesia percorre mais rapidamente os três graus preliminares, e eleva-se com menos ainda de esforço à contemplação das belezas morais. Assim, o sentimento constitui naturalmente seu domínio essencial. Ela encontra aí seus meios tanto quanto seu fim. Entre todos os fenômenos humanos, as afeições são as mais modificáveis, e dessa forma os mais idealizáveis, como os mais perfectíveis, em virtude de sua complicação superior, que determina uma imperfeição maior, conforme a lei positivista. Ora, a expressão, mesmo imperfeitíssima, deve reagir bastante sobre as funções que, por sua natureza, tendem a espalhar-se para fora. Se sua eficácia é reconhecida a respeito dos pensamentos, não poderia ela desenvolver mais os sentimentos, mais dispostos à manifestação? Toda cultura estética, mesmo limitada à pura imitação, pode tornar-se então um útil exercício  moral, quando ela estimula dignamente nossas simpatias e nossas antipatias. Mas essa aptidão deve ser bastante mais completa se a representação, em vez de uma estrita fidelidade, encontra-se convenientemente idealizada. [...]

(Augusto Comte, Discurso preliminar sobre o conjunto do Positivismo, 5ª ed., Paris, L. Mathias, 1929, p. 279-284).

06 dezembro 2022

Negacionismos de direita vs. negacionismos de esquerda

É realmente interessante e instrutivo o Dicionário dos negacionismos no Brasil, organizado por José Leon e José Luiz Ratton. Considerando a época em que vivemos, em que movimentos políticos (mais uma vez) negam a ciência e vários de seus mais importantes resultados, é uma obra de referência, ao mesmo tempo ampla e didática.

Há alguns aspectos curiosos. Por exemplo: saltando à vista, existe um certo cientificismo, a que se alia um forte academicismo. O primeiro aspecto acaba sendo um pouco inevitável, haja vista que o livro é uma defesa da ciência, de seus métodos e de seus resultados; já o segundo aspecto é bem menos inevitável, embora largamente (em particular desde os anos 1960-1970) o academicismo seja entendido como sinônimo, quando não substituto, do cientificismo.

(O verbete que abre o livro, dedicado à Academia Brasileira de Ciências devido à ordem alfabética dos temas, é exemplar tanto do cientificismo quanto do academicismo. Mas, enfim, talvez esses dois defeitos fossem inevitáveis no livro em geral e nesse verbete em particular; de qualquer maneira, outros verbetes não apresentam esses problemas.)

Mas, enfim, dois outros aspectos chamam em particular a atenção no livro. O primeiro é a variedade, a profundidade e o caráter absolutamente retrógrado (e não meramente reacionário ou conservador) dos negacionismos atuais. Em séculos anteriores a Humanidade presenciou vários negacionismos, sempre a partir de motivos "religiosos" e/ou "ideológicos": a perseguição contra Galileu é exemplar, mas também as ciências identitárias "ariana" de Hitler e "proletária" de Stálin. Nesses casos, o que estava em questão eram concepções filosóficas que tinham consequências políticas e sociais muito diretas. Os negacionaismos atuais também se referem a concepções filosóficas, mas ampliaram-se para questões científicas substantivas, com consequências econômicas, ambientais e até clínicas muito mais amplas que aquelas "apenas" sociais e políticas: o negacionismo climático e o negacionismo vacínico são dois exemplos imediatos que temos visto e vivido nos últimos anos.

O segundo aspecto que chama a atenção é a inclusão, como alvo dos negacionismos, de posturas filosóficas, "narrativas" acadêmicas e "interpretações" alinhadas ao pós-modernismo (como os verbetes dedicados à política identitária e também às "teorias queers"). A inclusão desses verbetes chama a atenção porque, embora sejam alvo dos negacionismos, essas "interpretações", essas "narrativas", essas "teorias" são, elas mesmas, radicalmente anticientíficas (embora sejam profundamente academicistas). Em outras palavras, são - como dizer? - "práticas acadêmicas" que negam, por princípio, a ciência; que rejeitam a concepção de uma realidade objetiva, mais ou menos independente da vontade e da subjetividade humana; que rejeitam a possibilidade de investigação objetiva dessa realidade; que rejeitam a possibilidade de acordo racional e bem intencionado entre as pessoas a respeito dessa objetividade e dessa investigação objetiva. Tudo ao contrário: essas "práticas acadêmicas" entendem que há apenas subjetividades; que há apenas "narrativas"; que essas "narrativas" são sempre particulares e particularizantes; que não há objetividade (na verdade, a objetividade seria um mito ocidental, "branco", "macho", falocêntrico, burguês e qualquer outro adjetivo que esteja à disposição como xingamento ressentido); que não há acordo entre as pessoas, mas apenas lutas, conflitos e dominações (mais ou menos temporárias). Mas, ao mesmo tempo em que são radicalmente anticientíficas - de modo que, por qualquer parâmetro, a elas dever-se-ia aplicar o adjetivo de "negacionistas" -, elas são profundamente academicistas, ou seja, são práticas realizadas por pessoas que vivem nas e das universidades e que fazem questão de viver em ambientes ultraintelectualistas (de preferência, mas é claro que não somente, nos Estados Unidos, embora esse país seja a atual pátria do capitalismo) e que também fazem questão de divertir-se passeando e ganhando dinheiro em amplos circuitos internacionais de palestras.

Surge então a pergunta: se essas "práticas acadêmicas" são negacionistas, por que elas foram incluídas em um livro que denuncia os negacionismos? Eu sugiro dois ou três motivos. O primeiro é que essas "práticas acadêmicas" são negacionistas de esquerda: é o negacionismo de direita que atualmente tem causado os maiores danos. Em segundo lugar, como os negacionismos de direita criticam não apenas questões científicas mas também criticam os negacionismos de esquerda, estes últimos beneficiaram-se, como passageiros clandestinos, da crítica às posturas negacionistas de direita. Em terceiro lugar, os negacionismos de esquerda são academicistas: como o academicismo cada vez mais é o sinônimo, quando não o substituto, da cientificidade, novamente os negacionismos de esquerda beneficiam-se como passageiros clandestinos de algo que, em situações normais, não lhes seria oferecido.




02 julho 2020

Réplica a S. Schwartzmann: Positivismo e falsa analogia das crises de 1904 e 2020

O texto abaixo é uma réplica a um artigo originalmente publicado no jornal O Estado de S. Paulo no dia 12.6.2020, de autoria do sociólogo Simon Schwartzmann. Embora, como observo abaixo, o artigo original tenha feito inúmeras sugestões extremamente maliciosas contra o Positivismo e os positivistas e, portanto, uma réplica tenha-se mostrado necessária, o jornal paulistano recusou-se a publicar essa minha réplica. Assim, publico-a no espaço que me é permitido, a despeito do inflamado discurso do conservador jornal paulistano a respeito do "pluralismo", da "democracia" e do "debate de idéias".

Além disso, como também observo abaixo, o Positivismo é habitualmente empregado como o bode expiatório preferencial por todos os grupos político-intelectuais que querem encontrar algum responsável pelos problemas nacionais. Esse comportamento é intelectualmente desonesto e politicamente irresponsável, sem contar que, na quase totalidade das vezes, é historicamente mentiroso. Já passou da hora de os autodenominados "intelectuais" brasileiros abandonarem esse hábito infantil, de amadurecerem e de passarem a valorizar as inúmeras, enormes e profundas contribuições do Positivismo para o país, para o Ocidente e para o mundo.

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Positivismo e falsa analogia das crises de 1904 e 2020

Desde o início do governo Bolsonaro, devido à renovada importância que os militares assumiram no poder Executivo federal, o Positivismo voltou à baila. Entretanto, esse retorno do Positivismo dá-se mais por referências oblíquas e insinuações que por alguma influência direta e, mais importante, por alguma influência efetiva. Em outras palavras, o Positivismo serve como bode expiatório, como uma justificativa ad hoc para todos os incontáveis e injustificáveis erros, problemas e desvios que o governo apresenta. O mais notável é que esse papel atribuído ao Positivismo é mobilizado tanto pelo próprio governo e por seus apoiadores – basta ver as virulentas e assustadoras referências feitas por filhos do Presidente da República, pelo seu guru-astrólogo e pela grande imprensa conservadora – quanto por setores “liberais” e mesmo oposicionistas: no que se refere ao governo e aos conservadores, já tive ocasião de publicar uma refutação mínima (na Gazeta do Povo e no Monitor Mercantil); agora o sociólogo Simon Schwartzman retoma a tradição do liberalismo conservador brasileiro para, com argumentos que parecem inspirados no realismo mágico, atribuir ao Positivismo vícios da política nacional.

No artigo “A revolta da vacina”, publicado em O Estado de S. Paulo de 12.6.2020, Schwartzman afirma que a atual politização da crise sanitária encontra um precedente na Revolta da Vacina de 1904; supostamente em ambos os episódios notam-se políticos radicalizados afirmando a falta de eficácia de medidas sanitárias recomendadas pelas autoridades públicas, estimulando a resistência do comum do povo a essas medidas, com o apoio de militares. Embora décadas atrás Schwartzman tenha feito algumas pesquisas de história da ciência no Brasil, ele limita-se a citar literatura de segunda e terceira mão para reiteradamente afirmar que o Positivismo como doutrina e os positivistas como agentes teriam apoiado os radicais do início da I República – os “jacobinos” – na Revolta; essa insistência em referir-se ao Positivismo tem o claro e evidente efeito de sugerir que essa mesma doutrina inspiraria ainda hoje o radicalismo conservador da extrema direita. Vamos aos fatos, então.

Em primeiro lugar, o procedimento de Schwartzman é sofístico. O atual governo é ao mesmo tempo ultraconservador (com sua apologia da “tradição” e da monarquia (sociedade de castas, escravismo, nacionalismo estreito), mas contra todas as tradições republicanas efetivamente afirmadas pelo Positivismo (pacifismo, tolerância, fraternidade universal, racionalidade científica, civilismo, respeito ao meio ambiente, aos índios, às minorias, às liberdades de pensamento e de expressão)) e revolucionário (com o combate ativo e militante contra os “progressistas”, o “globalismo”, o “marxismo cultural”); assim, Schwartzman é incapaz, por ser impossível, de provar qualquer influência do Positivismo no governo Bolsonaro. Dessa forma, o sociólogo mineiro sugere um paralelo entre duas situações históricas; essa mera sugestão atua como “prova” de seu argumento. Ele não demonstra; ela faz uma afirmação e deixa para o leitor o trabalho de tirar as consequências, que, todavia, permanecem sem qualquer base empírica. Vale notar que esse mesmo procedimento está na base de todas as teorias da conspiração – que, como tristemente se sabe, têm enorme relevância política nos dias atuais.

Mas, em segundo lugar, é claro que a atuação dos positivistas na I República e, de modo particular, na Revolta da Vacina está muito mal contada por Schwartzman. Em 1904 o médico Oswaldo Cruz decidiu combater a febre amarela, empregando o que era então uma técnica inovadora: a inoculação de patógenos enfraquecidos por meio de injeções, a fim de gerarem-se anticorpos contra a doença. Ora, esse procedimento da vacina foi estabelecido ao longo do século XX como correto e necessário; todavia, no início do século XX isso não estava firmemente estabelecido como adequado e seguro e – isto é o principal – os procedimentos adotados por Oswaldo Cruz eram anti-higiênicos e profundamente autoritários. As exitosas campanhas de vacinação levadas a cabo no Brasil pelo menos desde a década de 1980 buscam conscientizar a população da necessidade da vacinação; em outras palavras, tais campanhas postulam o caráter voluntário da vacinação: respeita-se a livre decisão individual e familiar. Ao mesmo tempo, a aplicação das vacinas é cercada por inúmeros protocolos higiênicos, incluindo aí a assepsia da pele (no caso da inoculação da vacina via injeções) e o descarte de seringas e agulhas descartáveis.

Nada disso estava presente na campanha de 1904: as agulhas e as seringas eram reutilizadas (e sem assepsia entre uma aplicação e outra) e, mais importante, os agentes sanitários forçavam os cidadãos a serem vacinados, injetando à força as agulhas em seus corpos, invadindo casas e violentando as pessoas para submeterem-se aos seus desígnios; evidentemente, essa violência era particularmente empregada contra a população pobre – que, ao fim e ao cabo, acabou revoltando-se contra invasões, espancamentos, a disseminação de doenças e a aplicação de um procedimento cuja eficácia estava então longe de estar estabelecida (e que, nas condições específicas daquela “campanha”, era efetivamente muito discutível). Não é por acaso que o vice-Diretor da Igreja Positivista do Brasil e autor da bandeira nacional republicana, Raimundo Teixeira Mendes, chamava toda essa lamentável situação de “despotismo sanitário”. Dessa forma, os positivistas foram, sim, favoráveis à revolta popular contra a vacina; entretanto, ao contrário do que Schwartzman consegue apenas “sugerir”, não se tratava de uma postura anticientífica e de radicalismo anti-intelectualista, mas de um profundo respeito à dignidade humana, à inviolabilidade dos corpos e dos domicílios e às liberdades de pensamento e expressão. Em outras palavras, os positivistas defendiam todos os valores mais caros ao liberalismo – aliás, justamente ao liberalismo que supostamente Schwartzman defende –; da mesma forma, os positivistas opunham-se ao que se chama hoje em dia de “tecnocracia” e de “cientificismo”, ao contrário do que Schwartzman parece defender em seu artigo.

O sociólogo mineiro dá a entender que todos os que se opunham à campanha de vacinação de Oswaldo Cruz eram (1) positivistas e (2) políticos demagógicos que politizavam e radicalizavam sentimentos populares irracionais contra a vacina. Essas duas presunções são exageradas e estapafúrdias. É aceitável considerar que houvesse demagogos explorando a insatisfação popular; a política da I República era infelizmente e por vezes dada a disputas agressivas; entretanto, como vimos, quem se opunha à campanha da vacinação estava longe de ser necessariamente irracional, anticientífico, favorável a guerras civis. Entre os republicanos radicais, os “jacobinos”, havia efetivamente alguns que se identificavam com e como positivistas; todavia, o próprio Teixeira Mendes afirmava que a política republicana deve ser pacífica e, assim, condenava tanto a violência governamental do despotismo sanitário quanto a explosão popular e a exploração demagógica dela. Vale notar que todos esses argumentos são públicos e, embora um tanto restritos, são facilmente acessíveis para qualquer pesquisador minimamente preparado, como supomos ser Schwartzman, cuja carreira tem muitas décadas de duração.

Para concluir: a conjuntura político-sanitária de 2020 é muito, muito diferente da de 1904. As campanhas de vacinação respeitam a dignidade humana e são higienicamente adequadas; a racionalidade científica subjacente a elas está bem estabelecida. Assim, ao contrário do que ocorreu em 1904, a politização sistemática de uma crise sanitária é, sim, demagógica, mesmo quando realizada pelo governo; mas, assim como em 1904, o governo e os liberais opõem-se aos positivistas, ao “Ordem e Progresso”, em seus desígnios. É difícil não considerar que as coisas estão bastante erradas.

16 setembro 2015

Gazeta do Povo: "Consenso científico perde espaço para verdades seletivas"

O texto abaixo observa algumas fortes tendências contemporâneas, que infelizmente a internet somente veio reforçar. 

Trata-se de concepções segundo as quais a ciência é apenas um conjunto de "versões", em que se pode escolher à la carte o que se deseja; essas concepções, além de evidentemente esposadas pelos variados teológicos (cristãos e muçulmanos, por exemplo), também são defendidas pelos metafísicos, acadêmicos ou não (nos quais se incluem na linha de frente os chamados "pós-modernos").

A publicação original em português, ocorrida no jornal Gazeta do Povo de 15 de setembro de 2015, está disponível aqui.

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ENSAIO

Consenso científico perde espaço para ‘verdades seletivas’

Quando nem a prova mais contundente muda mentalidades

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  •  THE NEW YORK TIMES

Há quase meio século, muitos norte-americanos ficaram indignados com uma edição da revista “Time”. Em vez do habitual retrato de um líder mundial —Indira Gandhi, Lyndon Johnson ou Ho Chi Minh—, a capa de 8 de abril de 1966 trazia apenas três palavras em vermelho sobre um austero fundo preto: “Deus está morto?”.

Milhares de pessoas enviaram cartas de protesto à “Time”. Mas o motivo de tanto furor —um longo ensaio de 6.000 palavras, algo característico da revista na época— não era, como muita gente imaginou, um libelo contra a religião.

Citando inúmeros filósofos e teólogos, o então editor de religião da “Time” analisava ponderadamente a forma como a sociedade estava se adaptando ao papel cada vez menor da religião numa era de secularização, urbanização e avanço da ciência.

Astronautas começavam a caminhar pelo Espaço, e era natural supor que as pessoas acreditariam cada vez menos em algo só por terem sempre acreditado. A fé progressivamente daria lugar ao método científico, à medida que a humanidade convergisse para uma melhor compreensão do real.

Quase 50 anos depois, esse sonho parece estar desmoronando.

Em sucessivas frentes, o consenso científico arduamente conquistado vai sendo moldado para acomodar crenças pessoais, religiosas ou não, a respeito de assuntos como segurança das vacinas, cultivos transgênicos, uso do flúor ou ondas de rádio emitidas por celulares, sem falar na existência ou não da mudança climática global.

Como os criacionistas com seu “design inteligente”, os seguidores dessas causas chegam armados da sua própria ciência pessoal, montada com o auxílio de buscas na internet que inevitavelmente revelam as contorções feitas por grupos interessados.

Numa tentativa de diluir essa forma de sabedoria popular, o Google recentemente alterou seu algoritmo para que uma busca sobre “vacinação” ou “fluoretação”, por exemplo, coloque informações com respaldo médico no topo da lista de resultados.

No entanto, aparentemente, muita gente não se convence com essa oferta de trabalhos científicos confiáveis. Um estudo publicado no mês passado na revista “Proceedings”, da Academia Nacional de Ciências dos EUA, sugeriu que, para demover os participantes do movimento antivacina, o mais eficaz seria apelar para suas emoções, mostrando relatos e fotos de crianças com sarampo, caxumba ou rubéola —um lembrete de que as pessoas ainda confiam mais nos seus sentimentos subjetivos do que nos conhecimentos científicos.

Até mesmo condições já descritas como patologias estão sendo redefinidas. Enquanto alguns pais se apegam a pesquisas desacreditadas que culpam as vacinas pelo desenvolvimento do autismo, outros encaram esse transtorno meramente como uma outra forma de ser, chegando a propor um novo movimento dos direitos civis que promova a “neurodiversidade”, tema de um livro lançado em agosto por Steve Silberman.

Vendo de longe, o mundo parece quase à beira de admitir que não existem verdades, apenas ideologias concorrentes —narrativas lutando contra narrativas. Nessa guerra epistemológica, os mais poderosos são acusados de impor a sua versão da realidade —o “paradigma dominante”— sobre os demais, cabendo ao lado mais fraco reagir com suas próprias formulações. Tudo vira versão.

19 abril 2013

Principais resultados da ciência moderna para o relativismo filosófico


Para Augusto Comte, a relatividade filosófica consolidou-se com dois resultados das investigações científicas ocorridas entre os séculos XV e XIX, um astronômico, o outro biológico: o duplo movimento da Terra e o caráter inato dos pendores altruístas. 

Enquanto o duplo movimento da Terra, com caráter objetivo, tirou o ser humano da condição de "centro do universo" (ou, na mitologia judaico-cristã, de "rei da criação"), o altruísmo inato, com caráter subjetivo, permite que se sistematize o esforço de cada um sobre si mesmo em benefício dos demais, ou seja, permite ao mesmo tempo que a sociabilidade aconteça e que se elabore a síntese subjetiva altruísta seja elaborada

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“L’innéité des penchants bienveillants et le  mouvement de la terre constituent les principaux résultats de la science moderne, comme posant les deux bases essentielles, l’une subjective, l’autre objective, de la vraie relativité” (Comte, Système de politique positive, v. IV, p. 20).

30 julho 2012

"El rol del intelectual es buscar la verdad y difundirla"

Entrevista com Mario Bunge; disponível originalmente aqui.


Vino a la Argentina especialmente invitado por la Universidad Nacional del Litoral. Dictó un curso de cinco días y fue nombrado Dr. Honoris Causa de la casa de altos estudios. Es, en pocas palabras, un gran maestro.

21/01/2004

Entrevista exclusiva con Mario Bunge. 
Fuente: Prensa UNL

Erudito, sagaz, polémico, didáctico y ocurrente. Cinco cualidades que, sumadas a su espontánea y polémica sinceridad para decir las cosas, a su ocurrencia, a su buen humor y a sus 81 años hacen de Mario Bunge no sólo un intelectual de primera línea, sino un gran maestro en diversas disciplinas. Su capacidad intelectual le permite refutar a Thomas Kuhn en cuestión de segundos, denostar a Foucault y a Derridá como a Habermas con sólo una frase, como hacer referencia a Pitágoras, Ptolomeo, Platón, Einstein, Newton y Darwin con una facilidad asombrosa. Pero además, lo hace con una solidez intelectual que parece ser, sencillamente, irrefutable e incuestionable. Se podrá disentir o acordar con él. Habrá quienes lo tilden de empirista y reduccionista, pero nadie podrá negar que se trata de un intelectual como pocos en el mundo.
-¿En que año se fue del país?
-En febrero de 1963. Y menos mal que tomé esa decisión a tiempo, porque sino no hubiera conseguido pasaporte o me hubieran matado. Ya se veía que el gobierno de Guido era muy débil y que los militares estaban detrás de todo. Por ejemplo, para completar mi magro salario, yo daba dos clases en Montevideo todos los jueves, y cada vez que volvía me revisaban todos los papeles buscando documentos subversivos. Además, a fines de 1962 se dio la lucha entre dos facciones del ejército: los colorados y los azules. Con todo, me percaté de que se venía una dictadura militar. Así fue.
-¿Antes de irse lo habían echado de la universidad?
-Sí, los peronistas. En realidad, me echaron indirectamente, porque exigían afiliación al partido y una contribución económica. Yo no sólo me negué a la afiliación sino que todos los meses depositaba un escrito diciendo que deseaba que no se me descontara nada de mi sueldo. Además, como habían echado a un compañero de trabajo, firmamos una solicitud para que reingresara y eso fue la gota que colmó el vaso.
-¿Tuvo militancia política?
-Militante no fui nunca, porque no me interesaba ni me parecía constructivo, ni siquiera el movimiento estudiantil. Por eso es que, mientras fui estudiante y mientras no la cerró el gobierno, organicé la Universidad Obrera Argentina. Eso sí me pareció constructivo. De todos modos, para responder su pregunta, era simpatizante de la extrema izquierda.
-¿Qué haría si fuera Secretario de Ciencia y Técnica de la Nación?
-En vez de dar directivas inútiles como hicieron muchos funcionarios, empezaría por preguntarle diversas cuestiones a los científicos y a los técnicos. Insistiría en hacer una comisión para que debatiera un programa de desarrollo de la ciencia y de la técnica. Estoy convencido de que mientras no haya un programa de desarrollo científico y técnico que sea parte de un plan vasto, de un proyecto nacional, siempre se va directo al fracaso. Pero además, para que un país se desarrolle también hay que desarrollar la salud, la cultura, la enseñanza primaria y la secundaria, la industria, modernizar el campo, afianzar la democracia. No creo que haya un motor último de la historia como dicen los marxistas y los economistas neoliberales. Es mentira que una vez que la economía está en marcha todo lo demás funciona. Para que realmente funcione la economía, tienen que funcionar las otras tres ruedas: la política, la cultura y el medio ambiente.
-¿Qué se debe hacer en un país como el nuestro para articular la ciencia y la técnica con el sistema productivo?
-Formar buenos técnicos. Ellos son los encargados de diseñar. De todos modos, mejorar la enseñanza de las ciencias básicas en las facultades de ingeniería y de administración por ejemplo, sería una muy buena manera de articulación. Además, es fundamental hacer hincapié en la formación que reciban los maestros. ¿Y dónde se forman los maestros? En la escuela primaria y en la secundaria. Por eso, hace años que vengo proponiendo que se hagan escuelas piloto en las que se concentren los recursos y la excelencia, para que luego, y de a poco, las otras escuelas traten de imitarlas.
-En la Argentina contamos con otro problema: no se le da al desarrollo de la ciencia el status que merece.
-Es lógico. La enseñanza de la ciencia en las escuelas primarias y secundarias es tan mala que la gente no sabe qué es ni para qué sirve. Hay que mejorar esa enseñanza y para eso se necesitan maestros mejor capacitados y laboratorios y talleres en todas las escuelas. Cuando yo iba a la escuela primaria no había laboratorios ni talleres, y en mi escuela secundaria - el Nacional Buenos Aires - había laboratorios en los que los alumnos no podíamos tocar ningún aparato, ni hacer medición alguna. Y eso que se trataba de un colegio dependiente de la Universidad y que supuestamente era el mejor de la ciudad. Sin embargo, todo era puramente libresco. Era para formar abogados. La universidad argentina está diseñada para formar abogados.
-¿Qué rol le cabe a la educación pública hoy en día?
-Es el Estado quien tiene la obligación de formar técnicos, para que ellos tengan la posibilidad de ser empleados por las industrias, lo cual permitiría que éstas, a su vez, puedan exportar. Es por la falta de técnicos adecuados que no hay industrias, o que las que había no podían competir con las importaciones extranjeras. El martes 29 de mayo salió publicado en el diario La Nación un artículo de Jeffrey Sachs, profesor de Economía de Harvard, en el cual dice que la Argentina exporta sólo un 10% de productos industriales, y el resto son agropecuarios, lo cual es típico de un país del tercer mundo. El artículo dice "los que hicieron la reforma del mercado se concentraron en reducir el tamaño del estado, pero se olvidaron del papel del estado en aumentar la capacidad tecnológica del país. La capacidad tecnológica de una economía depende de una amplia gama de instituciones sociales, en particular de las universidades".
-¿Qué se sabe de la Argentina en Canadá?
-Lo único que se ve, y de vez en cuando, son las actuales dificultades. Somos el último orejón del tarro y nadie tiene confianza en el país.
-¿Qué siente cuando se entera de esto?
-Tristeza. Además, pienso en la cantidad de oportunidades perdidas, en lo que era el país hasta 1930: un país que iba para adelante. Hasta que ocurrió el primer golpe fascista en la historia de América - golpe que fue aplaudido fervorosamente por la Santa Iglesia Católica - y desde entonces el país no se ha recuperado. Ha tenido breves períodos de ascenso, pero volvió a caer y está sin brújula. Si usted compara Brasil con la Argentina, se observa que, pese a todo, Brasil tiene un proyecto nacional y está avanzando, pero Argentina no. Los científicos brasileños contribuyen en un 1% a la literatura científica internacional, los argentinos no llegan al 0,3%. A los científicos brasileños se les paga comparativamente bien, mucho mejor que a los argentinos.
-¿Siente ganas de regresar?
-Todas las semanas. Es más, hoy por la mañana oí un benteveo y un tero que hacía años que no oía, y sentí una nostalgia terrible.
-Y de esa nostalgia a la concreta posibilidad de volver ¿ cuánta distancia hay?
-La nostalgia es puramente sentimental. Cuando razono fríamente, me doy cuenta que en la Argentina tendría más enemigos que amigos. En este país hay muchos filósofos a los que no les gusta escuchar lo que yo pienso y digo frontalmente: que no hay filosofía creadora, que no hay creación filosófica y que muchos de ellos sólo se limitan a leer y comentar textos en vez de hacer buena investigación.
-De todos modos, si es como usted dice, su regreso aportaría al debate y eso sería positivo.
-Así tendría que ser. De todos modos, nadie me dejaría dar clases ni me invitaría a dar cursos, salvo ocasionalmente como el que estoy dando ahora en la UNL. Le cuento una anécdota. En el año 1985 regresé a la Argentina para dar una serie de conferencias para la Fundación Thompson acerca del avance en la neurociencia. También me invitaron de distintas facultades de la UBA para dar charlas, entre ellas, Filosofía. Di la conferencia, y desde entonces no me han vuelto a invitar nunca, y eso que vuelvo casi todos los años y doy conferencias en diversas instituciones y universidades privadas. Hace dos años, el rectorado de la UBA organizó un curso de Filosofía, pero resulta que en la Facultad de Filosofía y Letras no se disponía de aulas ni locales para que se dictara el curso. Tuve que darlo en el diario La Nación. Y eso que era organizado por el rectorado... Entonces, en un momento pregunté a los asistentes si había algún filósofo, y sólo una persona levantó la mano. Eso se llama boicot, porque no era un curso de filosofía, y no de física ni de filosofía de la ciencia. Lo mismo le pasó a Guido Beck - mi maestro - cuando vino a la Argentina en 1943. No lo había invitado una universidad, sino que lo había invitado el Observatorio Astrónomico. Yo quise organizarle alguna conferencia en la Facultad de Ciencias, y los físicos no tenían interés. Entonces tuve que recurrir al matemático Julio Rey Pastor que fue el maestro del Ing. Babini - el reconocido matemático santafesino a quien conocí en el año 1943 cuando estuve por primera vez en la UNL - e inmediatamente se encargó de conseguir un aula, de presentarlo, de convocar a la gente. Es decir, un matemático hizo todo, porque a los físicos no les interesaba, lo cual muestra el gran temor a la competencia y la indiferencia que existe.
-¿Qué opina de la divulgación científica en la Argentina?
-A diferencia de lo que sucede en otras partes del mundo, en este país no existe la profesión del periodista científico. Hay periódicos, como el que leo yo en Canadá, que todos los días tienen una página entera de divulgación científica en la que resumen los artículos que se publican en las revistas Nature y Science, las dos más importantes de divulgación científica.
-De todos modos, si en Canadá hay un periódico que puede tener todos los días una página de ciencia, es porque hay gente interesada en leerlo. ¿Cómo hacer para que la gente se empiece a interesar por la ciencia?
-Se necesitan periodistas y directores de periódicos que en vez de publicar horóscopos publiquen páginas de divulgación científica.
-A pesar de que la Argentina destina un magro 0,03% del PBI al desarrollo científico, los científicos argentinos son reconocidos mundialmente.
-Eran reconocidos. Ya no hay más científicos. Los que pudieron emigrar ya lo hicieron y se establecieron en tres países principalmente: Venezuela, México y Brasil. Por ejemplo, mi hijo mayor, que hace física atómica, está en México hace un cuarto de siglo y ahí tiene todo lo que necesita: revistas, colaboradores, un sueldo que le permite vivir bien, acceso a computadoras de gran potencia y está en el instituto de física más poderoso de América Latina, en el que hay alrededor de 200 físicos. Sin embargo, la producción científica argentina, a pesar de ser más baja que la brasilera, es mayor que la de México y que la de Chile. Todavía queda gente competente y bien formada.
-¿Cree que la propia lógica de funcionamiento de las comunidades científicas impone obstáculos para plantear posturas distintas?
-Están tan cerrados en lo suyo, que ni siquiera les interesa. Muchos científicos no se dan cuenta de que, a pesar de la excesiva especialización que hay hoy en día, es necesario tender puentes, porque sino se pierde la visión de conjunto y el horizonte, se deja de aprender de las ramas ajenas, y uno empieza a aburrirse.
-¿Esto tiene que ver con la llamada globalización?
-En realidad, lo único que realmente se ha globalizado es el mercado de capitales y el conocimiento científico, e incluso ese mismo conocimiento no atraviesa libremente las fronteras, porque para poder entenderlo hay que estar capacitado. Y en este sentido, el tercer mundo se está quedando muy atrás. Por ejemplo, supóngase que hubiera alguien en este país que quisiera hacer psicología en serio y buscara estudiar las funciones mentales del cerebro. Para eso hay que empezar por estudiar neurociencia, para lo cual se necesitan aparatos muy costosos que cuestan millones de dólares. Además, estos científicos tendrían que ser entrenados, y aquí en el país no hay nadie capacitado para ello, por lo cual tendría que haber presupuesto para que estudien en el exterior. Pero también sería preciso asegurar que a su regreso tengan trabajo. Y por último, sería necesario disponer de becas para que los estudiantes y los docentes trabajen full time sus tesis. En este país, tal vez algún chico muy rico sea full time, pero ni los profesores ni los estudiantes son full time.
-Hay pensadores que, acerca de la globalización, sostienen que en realidad, todavía no hay acuerdo para fechar su inicio, sus objetivos y las consecuencias que produce. ¿ Qué opina al respecto?
-La fecha exacta de comienzo de la globalización es el 12 de octubre de 1492. Creo que ha habido un flujo de mercancías por medio del que los países del tercer mundo venden a los países del primero - Europa y Estados Unidos - a vil precio alimentos, tabaco, azúcar y materias y a cambio les dan, principalmente, armas y cigarrillos. Precisamente, ése fue uno de los temas en mi disertación "Tres mitos de nuestro tiempo: virtualización, globalización, igualamiento" cuando me entregaron el Dr. Honoris Causa.
-Hay un texto de Foucault...
-¿ De quién?
-De Foucault
-Ay..., por favor, hablemos en serio.
-Él hace una distinción entre el intelectual específico y el intelectual universal...
-No me interesa discutir sobre Foucault, es un charlatán. Es una pérdida de tiempo. ¿Por qué no leen a gente seria?
-La referencia a Foucault era simplemente para preguntarle acerca del rol de los intelectuales hoy en día.
-El primer rol es buscar la verdad. El segundo es difundirla. Es decir, investigar y enseñar. Si no investigan auténticamente y si lo que enseñan son pavadas, entonces no son intelectuales, son farsantes.
-¿Qué opina de los intelectuales en las ciencias sociales?
-Dentro de los estudios sociales hay gente seria y hay charlatanes como Derridá, Foucault, Habermas, Castells, entre muchos otros. Ellos hablan y hablan, pero nunca hacen investigación empírica, y no digamos teórica. No es gente seria. Además, son casi todos irracionalistas, anticientíficos. Por ejemplo, Habermas es hermeneútico, todo lo contrario a la ciencia.
-¿Qué opina de la posmodernidad?
-Es irracionalismo. Es la tentativa de volver a la época anterior a la Ilustración.
-¿Y por qué cree que tiene bastante eco?
-Porque es fácil. Es mucho más fácil denostar contra la razón que afilarla y usarla. Es el camino de los haraganes. Creo que hay que ser pre - posmodernos. Hay que volver al siglo XVIII, es decir a la Ilustración
Andrea V. Valsagna y Gustavo N. Risso Patrón, Prensa Institucional Universidad Nacional del Litoral