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26 outubro 2022

Miguel Lemos: celebração do 7 de Setembro

Abaixo apresentamos imagens de um extrato do opúsculo n. 4 da Igreja Positivista do Brasil, com o discurso sociolátrico proferido por Miguel Lemos (fundador e Diretor da Igreja Positivista do Brasil) para celebrar o 7 de Setembro, em 1881.

É notável indicar também que nesse opúsculo justifica-se a data de 7 de Setembro para representar a Independência do Brasil e, ao mesmo tempo, celebrar a figura de José Bonifácio por esse importante acontecimento. Tal celebração, além disso, ocorreu já no ano da fundação da Igreja Positivista do Brasil e, embora a independência do Brasil tenha-se constituído por meio da monarquia (de uma monarquia bastarda nas Américas, diga-se de passagem), nem por isso os positivistas foram mesquinhos em negar a José Bonifácio a importância de sua ação.

Agradeço a colaboração do amigo e correligionário Luiz Gustavo Mota pelo envio das fotos abaixo.








27 agosto 2020

Roteiro da exposição sobre o nono mês dos calendários positivistas (Gutenberg e monoteísmo)

As anotações abaixo consistem no roteiro da celebração gravada do nono mês dos calendários positivistas, que abordam Gutenberg (a indústria moderna, no calendário concreto) e o monoteísmo (no calendário abstrato), além dos centenários compreendidos nesse período.

A gravação encontra-se disponível aqui.


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Roteiro da exposição sobre o nono mês dos calendários positivistas


Parte I – Mês concreto: Gutenberg


Gutenberg, em lâmina da Igreja Positivista do Brasil



-        9º mês do calendário positivista concreto
 o   Considerando o ano júlio-gregoriano de 2020 (ano bissexto), o mês de Gutenberg começa em 12 de agosto e termina em 8 de setembro
o   O oitavo mês concreto representa a indústria moderna
§  É o segundo mês da modernidade 
·         Como já vimos, após os sete meses da Antigüidade e da Idade Média, a modernidade é representada por seis meses (Dante, Gutenberg, Shakespeare, Descartes, Frederico, Bichat) 
o   Para entendermos a indústria moderna, é necessário caracterizarmos as duas palavras, “indústria” e “moderna” 
§  A indústria, para Augusto Comte e no presente contexto, não consiste nas fábricas, mas em uma forma de organizar a produção material (ou seja, a “economia”) 
·         O melhor a falar, então, seria em “sociedade industrial”, que se opõe a “sociedade militar”; esta busca a conquista do ser humano, ao passo que a primeira busca a conquista da natureza 
·         Em termos de organização do trabalho, a sociedade militar baseia-se não raro na escravidão e, de qualquer maneira, na desvalorização do trabalho (“maldição divina”, impedimento do “ócio criativo” e do ócio contemplativo) 
·         Já a sociedade industrial baseia-se no trabalho livre (e na correlata valorização do trabalho) e na divisão entre trabalhadores e patrões 
§  Por outro lado, a indústria moderna tem que ser distinguida da indústria antiga 
·         A indústria antiga era organizada em pequena escala, por vezes em caráter individual, em que não havia a divisão entre patrões e empregados 
·         Uma outra forma de organizar a indústria na Antigüidade era por meio das castas, em que as profissões eram hereditárias e características das famílias 
·         A indústria moderna, então, baseia-se no trabalho livre, em que a sociedade como um todo organiza-se em uma atividade pacífica e de grandes proporções; em virtude disso, ocorre a separação entre trabalhadores e patrões e os grandes contingentes de trabalhadores organizam-se em sindicatos (igualmente livres) e cada trabalhador pode escolher o ramo industrial em que deseja trabalhar 
§  Uma outra forma de entender o espírito da indústria moderna é por meio de uma oposição elaborada em 1819 pelo suíço Benjamin Constant, entre a “liberdade dos antigos” e a “liberdades dos modernos” 
·         Esse Benjamin Constant não é o nosso fundador da República; o suíço viveu entre 1767 e 1830, ao passo que o nosso deveu seu nome ao primeiro e viveu entre 1836 e 1891 
·         Na verdade, essa oposição elaborada por Benjamin Constant também não é original; ela remonta à querela dos antigos contra os modernos, que se desenvolveu após o Renascimento e que continuava viva no século XIX, como se pode ver tanto pela obra de Benjamin Constant quanto pela de Augusto Comte (bem como pela de outros pensadores) 
·         Para Benjamin Constant, a liberdade dos antigos caracterizava-se pela participação ativa nos negócios públicos, enquanto a liberdade dos modernos caracteriza-se pela ausência de impedimentos estatais à ação individual privada 
·         Mas, para além do elogio do individualismo burguês e do governo representativo, a oposição proposta pelo suíço Benjamin Constant afirma que os antigos buscavam a glória das conquistas, ao passo que os modernos buscam o conforto da produção material 
§  O mês da indústria moderna, portanto, valoriza a atividade pacífica e cooperativa entre indivíduos, classes, países e civilizações 
·         A segunda lei dos três estados, relativa à atividade prática, sintetiza essa evolução histórica: “A atividade é primeiro conquistadora, em seguida defensiva e enfim industrial” (oitava lei da Filosofia Primeira) 
o   A sociedade industrial deve organizar-se da seguinte maneira, conforme o Positivismo: 
§  Separação entre patrões e empregados, com relativamente poucos patrões e muitos empregados 
§  Os patrões têm a responsabilidade de organizar a produção material e de gerar empregos e renda para os trabalhadores 
§  Em suas atividades, os patrões empregam de maneira altruísta alguns instintos egoístas, como o de destruição, o de construção e o orgulho; assim, eles ficam mais sujeitos aos desvios do egoísmo à portanto, sua situação não é invejável e deve ser constantemente cobrado por seu comportamento e pelos resultados de suas ações 
§  Augusto Comte era fortemente crítico da burguesia francesa de sua época, que ele considerava frívola, mesquinha e egoísta à no lugar da burguesia desprezível, ele propunha a renovação moral dos patrões, que se transformariam em “patrícios” 
§  Como deve ocorrer a separação entre patrões e empregados e como a condição moral e profissional dos patrões não é invejável, os trabalhadores devem constituir a grande massa da sociedade e evitar buscar a sua transformação em patrões à assim, em particular, ocorreria a extinção da “classe média”, que seria decomposta em poucos patrões e muitos empregados 
§  A definição-recomendação de Augusto Comte para os empresários é esta: deve ocorrer a concentração de capitais e de recursos de tal forma que seja possível a um indivíduo controlá-los e dispô-los de maneira responsável 
§  Assim, o capital deve ser concentrado à mas, da mesma forma que o capital tem origem social, ele deve ter necessariamente uma destinação social, mantendo-se privada a propriedade 
§  As atividades industriais evidentemente não são iguais nem homogêneas; por isso, ocorre uma hierarquia prática que se revela também uma hierarquia moral e social, baseada na generalidade e na responsabilidade coletiva crescentes; a hierarquia dos patrões origina uma correspondente hierarquia dos trabalhadores: agricultura, indústria, comércio, bancos 
o   O mês e as semanas correspondem ao seguinte: 
§  Gutenberg – criador do instrumento que permitiu a difusão do conhecimento e o aumento das comunicações humanas (em termos estáticos e dinâmicos) e, assim, permitiu a ação pacífico-industrial sobre o planeta Terra 
§  Colombo – corresponde aos exploradores do planeta Terra, que ampliaram o nosso conhecimento sobre o Grande-Fetiche e estabeleceram as ligações entre os mais diferentes povos, permitindo, assim, a constituição da Humanidade em termos realmente universais (incluem-se aí os caminhos para as Índias, a ultrapassagem do Cabo das Tormentas, a circum-navegação, a exploração da Oceania, a ligação entre Ocidente e Oriente, entre Europa e África etc.) 
§  Vaucanson – corresponde aos inventores propriamente ditos, que buscam meios de aumentar o rendimento do nosso trabalho (incluem-se aqui o tear mecânico, o telégrafo, o cronômetro); também os artesãos de obras artísticas 
§  Watt – corresponde aos cientistas que, com suas pesquisas, permitiram a aplicação da ciência à indústria, seja ampliando o rendimento de nossa ação, seja ampliando as possibilidades de intervenções (incluem-se aqui o motor movido pela pressão do vapor, as aplicações da termologia, da física dos gases e também a aplicação da Química à vida humana) 
§  Montgolfier – corresponde às futuras e possíveis aplicações técnicas proveitosas para o ser humano, como o domínio dos ares, a agricultura científica, a manipulação genética e mesmo o embelezamento da indústria e da arte de viver 
-        Há um aspecto no mês de Gutenberg que apresenta uma importância à primeira vista inusitada, mas que, bem vistas as coisas, acabaria sendo formulada cedo ou tarde 
o   Trata-se da crítica feita pelos povos colonizados do papel dos colonizadores, muitas vezes daninhos para os dominados 
§  Esse problema está não por acaso concentrado na semana de Colombo, que reúne os exploradores (Colombo, Vasco da Gama, Fernão de Magalhães, James Cook) 
§  A grita atual consiste em criticar e mesmo desprezar os grandes exploradores, bem como figuras acusadas (justa ou injustamente) de racismo; assim, estátuas estão são destruídas tanto por grupos sociais quanto por governos, nomes de instituições estão sendo modificados etc.: estátuas de Colombo e James Cook (“chacinadores”) e de Churchill (“racista” e “imperialista”); a Escola de Relações Internacionais da Universidade de Princeton retirou a referência a Woodrow Wilson de seu nome (ele era racista) 
§  Além disso, tem sido estimulada uma postura de raiva e de negação do passado; no caso dos descendentes de antigos donos de escravos e, de modo geral, no caso dos “brancos”, estimula-se um forte sentimento de culpa e de responsabilidade atual pelos crimes (efetivos ou imputados) aos antepassados 
§  É importante notar que, se por um lado o presente movimento (internacional) justifica-se pouco, a sua origem imediata ensejou e enseja os mais vívidos e corretos clamores por justiça: o assassinato de um desempregado por policiais racistas nos EUA; esse desempregado chamava-se George Floyd e morreu em meados de 2020 enquanto pedia para respirar mas tinha a garganta pressionada pelo joelho de um policial insensível ao sufocamento do homem 
o   É necessário aplicarmos o relativismo histórico: 
§  Por mais justas que sejam em parte as reclamações atuais de povos outrora dominados, é importante notar que tais reclamações baseiam-se em valores que, em grande medida, são nossos e são de nossa época 
§  Afirmar a contemporaneidade dos nossos valores não tem como objetivo torná-los “particulares”, “específicos” de nossa época e, portanto, não tem como objetivo desvalorizá-los (como os pós-modernos, os ultra-relativistas e os ultracontextualistas fazem); bem ao contrário, é necessário entender que os valores de respeito mútuo, de respeito universal, de tolerância, de rejeição da violência são valores nossos, ou melhor, são valores “novos” e recentes e que, portanto, nossos antepassados desgraçadamente não os tinham 
·         É claro que a novidade dos valores da fraternidade universal, do pacifismo, da tolerância não é tão grande assim: eles já tinham sido afirmados com clareza por Augusto Comte no século XIX – que, a esse respeito, seguia e prosseguia uma tradição que vinha pelo menos do século XVIII (com o Iluminismo) 
·         Da mesma forma, os romanos, na fase final da República (Júlio César) e já no Império (Trajano, Adriano e, de modo geral, a sua dinastia nervo-antonina) afirmavam o primado da paz e do respeito mútuo 
§  Também é necessário notar que a atividade pacífica só surge como desenvolvimento da atividade militar e em conseqüência dela; dito de outra forma, mesmo a paz e a indústria exigiram antes delas a guerra e a violência 
§   A violência praticada por exploradores contra diferentes povos é lamentável, não há dúvida 
·         Mesmo no período das colonizações, em meio às violências, havia cobranças, reprimendas, perorações: o padre Bartolomeu de las Casas na América espanhola é um exemplo 
·         Embora a violência praticada pelos colonizadores europeus seja, para nós, ocidentais atuais, motivo de vergonha e tristeza, é necessário considerar se à época em que eles agiam o seu repertório de comportamentos aceitáveis excluía a violência sistemática: de modo geral, a resposta é negativa 
§  Todavia, convém distinguir a atuação de personagens como Colombo e Cook da de Pizarro e dos ingleses na Austrália: os exploradores de modo geral foram apenas exploradores, não conquistadores 
§  Além disso, no caso dos exploradores, é importante notar que a sua ação como exploradores é por si só altamente meritória e digna de respeito e veneração 
·         O respeito e a veneração devidos aos exploradores deve-se à ampliação do conhecimento do planeta e ao estabelecimento de relações entre todas as porções da Humanidade 
·         Além disso, as epopéias de Colombo, Vasco da Gama etc. demonstram uma coragem gigantesca, ao realizarem viagens que eram, na melhor das hipóteses, meras apostas 
·         De quebra, vale notar que os exploradores comprovaram na prática, após as demonstrações gregas, que a Terra é um planeta redondo 
§  Um outro aspecto do relativismo histórico consiste em notar que a ação de povos e indivíduos não se resume a um único aspecto, de tal sorte que em suas vidas e histórias podem apresentar – e, com efeito, apresentam de fato – comportamentos positivos e negativos, altruístas e egoístas, construtivos e destrutivos 
·         O relativismo, portanto, consiste em pesar, contextualizadamente, aspectos positivos e negativos 
o   Apenas em casos excepcionais – e, a bem da verdade, patológicos – é que se pode reduzir a carreira de um povo, ou de um indivíduo, a um único traço 
·         Os “contextos” em que se deve inserir a ação de indivíduos e povos deve incluir não apenas as estruturas sociais, mas também as idéias e os valores disponíveis em cada momento 
§  Em virtude das considerações acima, destruir (ou, de qualquer maneira, suprimir) estátuas de Colombo e de Cook é um erro 
·         Da mesma forma, embora Churchill fosse mesmo imperialista, o que ele compartilhava da mentalidade do “white man’s burden” não o impediu, nunca, de buscar a fraternidade, de buscar a tolerância, de ser razoável e, acima de tudo, não o impediram de ser o brilhante e corajoso líder que manteve a Inglaterra como inimiga do nazismo durante a II Guerra Mundial 
·         No caso de Woodrow Wilson: ele era do Sul dos Estados Unidos (Virgínia), o que estimulava o racismo, não há dúvida; ele apoiava o movimento da eugenia, postulando em particular que a miscigenação (especialmente entre brancos e não brancos) causava a delinqüência social, a prostituição, o retardo mental etc.; ele apoiou essas idéias mesmo quando foi Reitor de Princeton. Essas idéias são desprezíveis e são inaceitáveis sob qualquer perspectiva; além disso, o anti-racismo já era uma causa antiga no início do século XX, especialmente após a violenta Guerra da Secessão dos EUA. Todavia, a despeito dessas idéias e dessas práticas, a atuação doméstica de Wilson foi progressista (favorável aos direitos trabalhistas) e a atuação internacional foi mais importante ainda: ele levou os EUA ao decisivo ingresso na I Guerra Mundial junto dos Aliados (França e Inglaterra), ele promoveu o chamado “idealismo” na política internacional, que consistiu na moralização da política internacional; ele defendeu a autodeterminação dos povos e, se isso tudo não fosse pouco, ele foi o responsável pela criação da Liga das Nações. Assim, é no mínimo problemático e, bem vistas as coisas, é incoerente e mesmo hipócrita desprezar a atuação de Woodrow Wilson (em particular suprimir o seu nome da Escola de Relações Internacionais da Universidade de Princeton): não há dúvida de que seu racismo travestido de uma ciência desprezível era odioso; todavia, é necessário um esforço moral e político muito grande para negar, desprezar e rejeitar a sua atuação política, principalmente na política internacional 
o   É importante insistir em uma idéia fundamental do Positivismo e do culto positivo: o calendário histórico concreto foi instituído não apenas para exibir (para o público ocidental) de maneira sintética o conjunto da evolução ocidental, mas também, e talvez principalmente, para estimular justamente o relativismo histórico 
§  O que o relativismo histórico recomenda é que respeitemos e valorizemos nossos antepassados, sabendo pesar e avaliar suas limitações e seus defeitos 
§  De maneira correlata, o elogio histórico não é devido a qualquer indivíduo: a incorporação na Humanidade exige que o indivíduo em questão seja merecedor e que cumpra a definição de Humanidade (“conjunto de seres convergentes, passados, futuros e presentes) 
·         O elogio histórico, quando adequado e justificado, exige a valorização dos aspectos positivos, mas não esconde, nem camufla, os aspectos negativos

Parte II – Mês abstrato: monoteísmo 

-        O nono mês do calendário positivista abstrato celebra o monoteísmo 
o   O monoteísmo é a terceira e última fase das fases sociológicas históricas (dinâmicas) preparatórias; as anteriores são o fetichismo e o politeísmo 
o   O monoteísmo consiste na concentração dos vários deuses em uma única entidade, todo-poderosa e reinante sobre tudo 
§  Alegadamente o monoteísmo surgiu com Moisés; mas, na verdade, o deus mosaico não se afirmava o único deus, mas o maior e superior a todos; apenas com o passar dos séculos e, em particular, após o cativeiro na Babilônia é que o judaísmo converteu-se de fato em um monoteísmo 
§  De um ponto de vista sociológico, o monoteísmo constituiu-se após o declínio moral e social do politeísmo e, na verdade, em virtude desse mesmo declínio 
§  Sugestões para a constituição do monoteísmo vinham pelo menos desde o século IV aec, como com Sócrates e, depois, como Aristóteles 
·         Em particular Aristóteles defendia um deus único que operasse como “motor inicial”, ou seja, como uma entidade que tivesse criado tudo e posto o universo em movimento, mas depois disso se afastando radicalmente de tudo 
§  O monoteísmo só vingou no início da era corrente quando as necessidades de renovação moral ficaram bastante evidentes; a partir daí é que atuou São Paulo, que criou o catolicismo mas que, em sua modéstia, em sua sabedoria e em sua perspicácia, atribuiu a sua obra a outro, que lhe assumiu o nome da doutrina 
§  As necessidades de renovação moral só ficaram evidentes quando o Império Romano dominou toda a bacia do Mediterrâneo (além da Península Ibérica, das Gálias, dos Bálcãs e do Oriente Médio): essa dominação permitiu a imposição dos hábitos da paz e a necessidade de reorientação das vidas individuais e dos destinos coletivos dos povos envolvidos 
·         Essas considerações histórico-sociológico-morais têm algumas conseqüências: por um lado, o judaísmo, embora seja em si mesmo um monoteísmo e tenha influenciado o catolicismo, para o que nos interessa, é secundário e não foi determinante para a constituição do catolicismo; além disso, a partir dessas considerações o surgimento do catolicismo deixa de ser milagroso, como nos relatos tradicionais, e passa a ser explicado racionalmente 
§  Os monoteísmos considerados por Augusto Comte (catolicismo e islamismo) têm algumas características (ou “propriedades”) importantes para nós: 
·         Eles passaram a afirmar diretamente a necessidade de moralidade na conduta humana; o politeísmo, embora regesse até certo ponto a moralidade, servia mais para explicar o mundo e menos para regrá-lo 
o   O monoteísmo em última análise é imoral, pois a divindade é profundamente arbitrária; mas, ainda assim, atribui-se a ela alguns motivos morais e, de qualquer maneira, a partir dela estabelece-se um código moral de conduta 
o   A moralidade monoteísta, além disso, em si mesma é profundamente imperfeita, pois rejeita o caráter inato dos instintos altruístas e também estabelece móveis egoístas para a conduta humana (a ambição do paraíso, o medo do inferno); mas, enfim, era o possível na época e era o possível para regrar populações com hábitos grosseiros 
·         Embora em si mesmos exijam a adesão aos seus dogmas – que, na época em que foram estabelecidos, eram radicalmente contrários aos hábitos mentais, morais e sociais das populações (os romanos, por exemplo e com justiça, repudiavam os dogmas católicos como imorais) –, os monoteísmos permitem a constituição de religiões universais, pois que ultrapassam as origens nacionais dos politeísmos 
§  O catolicismo surgiu no ambiente romano; no século VII surgiu o Islã, que, em sua rápida expansão seguida da reação católica, acabou dividindo mais ou menos ao meio os antigos territórios romanos: como se sabe, tomando-se como divisor a linha que vai da Grécia ao Egito, os territórios a Leste ficaram sob o Islã, os territórios a Oeste (o Ocidente) ficaram sob o catolicismo 
·         O catolicismo e o islamismo são os monoteísmos principalmente considerados por Augusto Comte justamente porque eles foram duas formas que buscaram resolver a moralização da vida e da política, a partir do Império Romano 
·         O catolicismo é profundamente complicado, com seu dogma da trindade, com a postulação da vida após a morte e a reencarnação (ou ressurreição) etc.; o islamismo, em contraposição, embora mantenha a promessa da vida eterna após a morte, simplifica o dogma, ao suprimir a trindade e ao postular o caráter santo (mas não divino) do “filho” (reduzido à condição de profeta anterior a Maomé) 
·         A simplicidade islâmica evita os debates tão próprios às populações submetidas ao Islã e garante que o chefe islâmico (o califa e, em menor grau, o sultão, após o próprio Maomé) mantenha-se como chefe temporal (isto é, como chefe militar) em vez de ser também um chefe espiritual 
·         A complicação do dogma católico foi possível também devido à separação (imperfeita, claro está) entre os dois poderes: o chefe temporal governava, o chefe espiritual regia as discussões teológicas 
·         Os defeitos morais e intelectuais próprios ao catolicismo – que, como indicamos, já eram bastante claros para os romanos – foram atenuados pela sabedoria prática do clero católico, especialmente por inúmeros papas que reinaram até cerca de metade do ciclo das cruzadas (século XII) 
§  O catolicismo e o islamismo são incompatíveis, o que conduziu à disputa entre ambos por hegemonia 
·         No Ocidente, a reação feudal proposta e coordenada pelo papado realizou, na última fase da Idade Média, a realização final e plena do feudalismo, que consiste na combinação digna entre a independência e o concurso entre as unidades políticas à isso deixa claro que o feudalismo não se caracterizava por “anarquia” 
·         A reação ocidental ao avanço muçulmano consistiu, em um primeiro momento, em barrar o avanço na França, com Carlos Martel, em Poitiers; depois, nas guerras de reconquista ocorridas ao longo de vários séculos na Península Ibérica; a partir do século XI, esforços mais sistemáticos, de grande envergadura e agrupando o conjunto dos povos ocidentais ocorreram por instigação do papado, na forma das cruzadas 
·         Os constantes choques entre catolicismo e islamismo conduziram à sua neutralização mútua e às suas decadências, cujo marco e símbolo foi a batalha de Lepanto (próximo a Corinto, na Grécia), em 1571, em que as armadas das duas religiões bateram-se; a batalha foi mais ou menos vencida pelas forças cristãs, mas, de qualquer maneira, ela indicou o empate entre Islã e catolicismo e, portanto, a aceitação mútua da incapacidade de um dominar e destruir o outro à sinal desse reconhecimento foi os cristãos abandonarem aos muçulmanos o suposto berço de Cristo (até 1948, bem entendido) 
§  A incapacidade dos dois monoteísmos e sua mútua neutralização deixam claro a necessidade de uma fé demonstrável e plenamente universalizável, isto é, do Positivismo 
o   Um último aspecto dos monoteísmos é que eles afirmam a síntese objetiva e absoluta 
§  Após a síntese subjetiva absoluta, própria ao fetichismo, tanto o politeísmo quanto o monoteísmo consagraram a síntese objetiva absoluta: ora, a única síntese verdadeira e durável tem que ser subjetiva e relativa, que é a instituída pelo Positivismo 
§  Apesar desse defeito intelectual do monoteísmo, é importante assinalar que ele foi a última síntese que no Ocidente afirmou a lógica afetiva (ao mesmo tempo que afirmava a importância da lógica dos sinais) 
o   As quatro festas semanais comemorativas do monoteísmo são as seguintes: 
1)      Monoteísmo teocrático (Abraão, Moisés, Salomão) 
2)      Monoteísmo católico (São Paulo; Carlos Magno; Alfredo; Hildebrando; Godofredo; São Bernardo) 
3)      Monoteísmo islâmico (Lepanto) (Maomé) 
4)      Monoteísmo metafísico (Dante; Descartes; Frederico)

 

Parte III – Comemorações de aniversários 

-        Em termos de aniversários, comemoramos neste mês as seguintes figuras: 
o  Em 15 de Gutenberg (26 de agosto): 
§  Morte de Stevin (1548-1620) 
o  Em 16 de Gutenberg (27 de agosto): 
§  Nascimento de Mariotte (1620-1684) 
Em 17 de Gutenberg (28 de agosto): 
§  Nascimento de Agustín Aragón (1870-1954) 
o  Em 25 de Gutenberg (5 de setembro) 
§  Morte de Augusto Comte (1798-1857) 
o  Em 27 de Gutenberg (7 de setembro) 
§  Independência do Brasil (1822)

Possível rosto de Gutenberg
Simon Stevin
Edme Mariotte
Agustín Aragón
Túmulo de Agustín Aragón
Monumento em homenagem a Augusto Comte, na Universidade Sorbonne (Paris)
Reprodução de daguerreótipo de Augusto Comte
Memento mori (foto do morto) de Augusto Comte
Memento mori (foto do morto) de Augusto Comte
Memento mori (foto do morto) de Augusto Comte
Augusto Comte
José Bonifácio retratado no quadro de Eduardo de Sá, "A pátria brasileira"
Estátua de José Bonifácio em Washington (DC)
José Bonifácio



Referências bibliográficas 

Ângelo Torres: Calendário Filosófico 
David Carneiro: História da Humanidade através dos seus grandes tipos, v. 4-5 
Jean-François Eugène Robinet: Notice sur l’oeuvre et la vie d’Auguste Comte 
Joseph Lonchampt: Epítome da vida e dos escritos de Augusto Comte 
Raimundo Teixeira Mendes: As últimas concepções de Augusto Comte